Atena se sentou ao lado de Poseidon, irritada. Olhou para o deus ao seu lado, que estava sentado desleixadamente no banco, como se a discussão anterior nunca houvesse ocorrido, e disse numa voz irritada:

                -Tudo bem, então. Eu faço essa maldita aula. Mas ainda não entendo uma coisa.

                -Nossa, a deusa da sabedoria admitindo que não entende algo... Isso é novidade. O que a sua mente brilhante não conseguiu entender, querida? –Perguntou ele, ironicamente.

                Atena bufou, mas decidiu ignorar as piadinhas dele.

                -Eu não consegui entender o que te leva a pensar que eu preciso aprender a me comportar em público. Afinal, eu sou a deusa mais bem comportada do Olimpo!

                -Você quer dizer a mais chata, certo? – A deusa já estava começando a retrucar, mas Poseidon a cortou, não lhe dando tempo de falar nada. –Atena, você não entendeu. Eu não quero que você seja educada e certinha. Isso é chato. E você já faz isso muito bem. Eu quero que você se comporte como uma mulher deve se comportar... Pra chamar a atenção dos homens.

                A boca de Atena caiu assim que ele pronunciou as últimas palavras.  

                -Isso foi a coisa mais horrível e machista que eu já ouvi em toda a minha eternidade! “Como uma mulher deve se comportar”?! “Pra chamar a atenção dos homens”?! Em que século você vive, Poseidon? Estamos no século 21, onde as mulheres têm direitos! E não vivem mais em função dos homens! As mulheres não se preocupam mais em satisfazer os homens e sim em...

                Ela teria continuado com o discurso, mas Poseidon a interrompeu, aos gritos.

                -Atena, pare! Pelo amor de Zeus, chega! Não estou com ânimo pra discutir os direitos das mulheres! Até porque, eu achava que já tínhamos deixado isso claro, mas vou repetir, essa semana, o que conta é a minha concepção de mulher perfeita. E não importa se essa concepção é ou não machista!

                -E eu achava que tínhamos deixado isso claro, mas vou repetir: Não é mais uma semana! São só mais cinco dias!

                Poseidon rolou os olhos.

                -Tanto faz, Atena. –O deus se levantou. –Agora, vamos à lição de hoje. Fica sentada aí.

                Poseidon atravessou a viela, parando apenas ao chegar num muro que havia do outro lado. Ele se encostou e observou as ninfas, deuses e satiros passarem pela rua. Atena o olhou, curiosa, mas não falou nada. Pra ela, quando mais demorasse pra a “aula” começar, melhor era. O movimento na rua continuava, algumas ninfas lançavam olhares a Poseidon, outras chegavam a fazer uma reverencia na sua frente, na tentativa de chamar sua atenção. Atena apenas revirava os olhos, se perguntando o que elas viam nele. Tudo bem, ele é bonito, mas é só! Não passa disso... certo?, pensou a deusa, antes de decidir que era melhor tirar esses pensamentos da cabeça.

                -O que pretende com isso? –Perguntou ela pra Poseidon, tendo que elevar o tom de voz, para o deus conseguir ouvi-la.

                -Estou observando e comparando.

                -Bem, eu já tinha percebido que você estava observando... –Disse ela, sarcasticamente. –Mas o que você está comparando?

                Poseidon sorriu.

                -Nós dois.

                -O quê? –Exclamou Atena.

                -É. –Ele confirmou, andando de volta na direção do banco que Atena continuava sentada. –Você reparou que, bastou eu ficar parado por alguns segundos pra todos virem falar comigo?

                -Falar com você? As ninfas estavam praticamente se jogando em cima de você.

                -Bom, eu não queria te humilhar... O fato é que as pessoas reparam em mim, as ninfas obviamente reparam mais, mas ninguém nota você.

                Aquilo afetou Atena mais do que ela imaginava que iria afetar. Foi como um soco no estomago. Doloroso, rápido e sem piedade. Ela nunca foi o tipo de pessoa que se importa demais com a opinião dos outros, pelo menos, era isso que ela dizia a si mesma. Talvez (só talvez!) ela escondesse de todos, inclusive si própria, o fato de que fingia não ligar, pra não se machucar. E ouvir Poseidon dizendo a verdade, tão de repente, havia pegado-a de surpresa e destruído uma máscara que ela havia mantido por séculos. Mas, é claro, ela não deixaria Poseidon saber disso.

                -As pessoas não reparam em mim, como fazem com você, porque todos sabem que eu sou uma deusa casta.

                -Atena, acorda! Ninguém aqui liga pra nenhum juramento!

                Bem, nem Atena tinha argumentos contra isso. Os deuses raramente cumpriam suas promessas, e por causa disso, não davam muito valor a um juramento. Ela não rebateu, então Poseidon continuou falando.   

-Bem, hoje, você vai aprender a chamar a atenção. Vamos lá, você precisa melhorar a sua postura.

                -O que há de errado com a minha postura? –A deusa se sentava com as costas eretas, pernas juntas, e pés no chão. Postura perfeita.

                -É certinha demais. –Explicou ele, com uma careta. - Primeiro, cruze as pernas. É bem mais sensual.

                Atena, vestindo um vestidinho curto, cruzou as pernas com cuidado, sob o olhar atento de Poseidon.

                -Ótimo. Agora, se incline um pouco pra frente.

                Atena novamente fez o que ele disse, e ficou absurdamente vermelha ao perceber o olhar de Poseidon indo direto para o seu decote e um sorriso malicioso aparecer em seu rosto.  

                -Perfeito. Garanto que já está bem melhor. Só mais uma coisa, olhar pras pessoas que passam é uma boa idéia.

                Atena deu um sorrisinho debochado e o olhou fixamente.

                -Assim? –Perguntou, numa falsa voz de inocente.

                Poseidon não respondeu imediatamente, estava completamente perdido nos olhos de Atena. Para uma deusa casta, ela tinha um olhar pra lá de sexy.

                -É, assim. Bem, vamos ver os resultados. -Ele se afastou novamente, e ela começou a seguir suas regras.

                De uma hora pra outra, todos os olhos que passavam em frente ao banco se viravam pra ela. Parecia que ela tinha um grande holofote lhe iluminando e chamando a atenção de todos. Era uma sensação estranha, e de um modo igualmente estranho, ela achou bom. Sim, embora uma parte dela se sentisse culpada por isso, ela estava gostando. Estava gostando de ser notada, de finalmente, não passar despercebida. Gostando tanto que até se deixou levar pela sensação. Ela cruzava as pernas lentamente, encarava todos que passavam e sorria de modo malicioso. Pela primeira vez, um lado antes desconhecido da deusa estava se revelando.

                Um pouco distante, Poseidon observava a cena sorrindo. Nunca imanava que poderia mudar Atena tão drasticamente. A deusa estava obviamente gostando de ser notada, e ele não pode deixar de sentir um pouco orgulho. Ele só não sabia direito pelo que. Obviamente, ele estava orgulhoso por poder dizer que estava transformando a deusa mais certinha em uma deusa... Ham... não tão certinha. Mas ele também tinha orgulho de poder dizer que estava transformando Atena numa deusa mais feliz, que não tem medo de mostrar quem é. Até porque ela não tem o menor motivo pra se esconder, pensou Poseidon malicioso, observando-a cruzar as pernas de um modo especialmente sensual.

                Ele andou até ela, sem que ela notasse, e sussurrou em seu ouvido, causando arrepios em sua nuca.

                -Acho que sua aula está terminada por hoje. Já aprendeu sua lição. Muito bem, por sinal. Até amanhã, Atena.

                -Até amanhã, Poseidon. –Sussurrou ela de volta.

                O deus andou tranquilamente de volta para seu palácio. Mas chegando lá, uma pergunta passou a lhe perturbar. Ele próprio havia dito que ninguém notava Atena, mas se era assim, por que ele havia notado ela sentada naquele banco?