Os Gêmeos Bouvier - A Resistência escrita por That Crazy Lady


Capítulo 9
O dia em que todo mundo se preocupou comigo


Notas iniciais do capítulo

Capítulo dedicado ao Samuel, que escreveu a primeira recomendação dos gêmeos!
Obrigada ♥



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Se você não sabe o que é ter insônia, acredite em mim: não vai querer saber.

Passei a noite inteira me revirando de um lado para o outro na cama, mudando de posição a cada cinco minutos, tentando inutilmente fazer com que o sono viesse até mim. Na manhã seguinte, eu estava um caco.

– Bom dia, Ell – Lince me cumprimentou na mesa do café.

– Que é que tem de bom? – Deixei minha cabeça cair sobre a mesa.

– Escola?

– É, haha. Muito engraçado.

Nesse momento minha tia e Flávio entraram na cozinha, o que me forçou a erguer a cabeça da mesa para dar espaço.

– Hmmm. Pressinto que alguém não dormiu ontem à noite. – Ela ergueu uma sobrancelha enquanto seus olhos escuros me observavam.

– Muito bem observado – eu disse ironicamente.

Sim, eu tinha me olhado no espelho quando acordei e, convenhamos, não precisava ser nenhum gênio ou mestre da observação para perceber as olheiras que eu tinha ganhado. Mas, como eu já tinha passado muito mais tempo acordada antes, sabia que o grande motivo daquelas bolsas roxas era o estresse. Ironicamente, isso só me deixava mais estressada.

Minha tia terminou de encher sua xícara de café antes de continuar.

– Tem alguma coisa te preocupando, Ell?

Ah, não, imagina. Minha vida é tão calma! Eu só tinha perdido o sono por causa de meia dúzia de preocupações fúteis de adolescente, tipo “o que eu vou fazer com o meu cabelo amanhã”. Nada demais.

Mas minha tia nunca foi das mais calmas, e carregar palavras de sarcasmo era praticamente assinar o atestado de óbito. Portanto, optei por dizer simplesmente:

– Eu estou bem, tia.

– Tem certeza? – ela perguntou. Seus olhos calorosos me observavam atentamente. – Eu sei que tem coisas que você não pode me contar, mas dividir com seu irmão é sempre uma saída melhor do que guardar para si.

É impressionante como uma mulher de bandana colorida na cabeça e roupas velhas totalmente respingadas de tinta pode soar tão sábia.

– Obrigada, tia, mas eu estou bem. Mesmo.

– Então ok, eu acredito em você. – Ela tomou um gole de sua xícara e desviou sua atenção para meu primo. – Flávio, toque nesse pote de açúcar e você nunca mais vai ver o seu videogame!

Tudo está bem quando termina bem, acho.

Mas minha tia havia me lembrado de uma coisa muitíssimo importante: contar a meu irmão sobre a carta misteriosa. Com toda a confusão da noite anterior e de Vince, eu não tinha tido tempo para tocar no assunto. Agora, a carta teria que esperar até depois da aula, e eu esperava sinceramente que nada bizarro o bastante para atrapalhar meus planos acontecesse nesse tempo.

Engoli rapidamente alguma coisa e subi até o meu quarto. Passei alguns minutos enchendo as olheiras de maquiagem, então peguei minha mochila e desci mancando justo quando a campainha tocou. Era Vítor.

– Volta pra debaixo da ponte, tem pão velho não – brinquei.

– Mas eu tô com fome, dona – ele lamentou-se. Então riu pra mim e me deu um selinho. – Dormiu bem?

– Shiu. Fale menos e beije mais.

Passei as mãos por seu pescoço, e ele me puxou para mais perto, colando sua boca na minha. Quando o estresse finalmente se rendeu o bastante para eu aproveitar o momento, Lince fez o favor de nos cortar.

– Ei, cara – disse com um tom irônico –, eu não ligo de você pegar a minha irmã, mas não precisa ser na minha frente.

Vítor riu, ligeiramente desconcertado, e eu resolvi rapidamente a situação:

– Então vai andando na frente, seu chato. A gente te alcança mais tarde.

Lince colocou a mochila nas costas, lançou um meio sorriso irônico para mim (eu odeio esse sorriso ARGH) e caminhou despreocupadamente para longe de nós. O seguimos de mãos dadas quando ele já estava a uma distância saudável.

– Hey, você ouviu alguma coisa ontem à noite? - Vítor me perguntou hesitantemente. - Ou, sei lá, viu? Alguma coisa fora do comum?

Mordi o lábio inferior. Não era como se desse para contar que eu estava numa festa lotada de vampiros enquanto era assediada por Vince, então acabei dizendo:

– Não... A não ser que a Maria Rita ter traído o Carlos Eduardo na novela seja algo incomum - brinquei, tentando parecer descontraída. - E geralmente não é, ela faz isso todos os dias. Por que, você percebeu alguma coisa estranha ontem?

Vítor balancou a cabeça negativamente, parecendo desanimado.

– Não... Se você não ouviu nada, é só coisa da minha mãe mesmo.

Apertei sua mão.

– Sinto muito.

– Não, tudo bem. Eu que fui um idiota, mesmo. Afinal, não é como se minha mãe fosse resolver melhorar da noite para o dia, não é assim que funciona. - Vítor parecia extremamente desconfortável, como se tocar nesse assunto fosse uma tortura dos infernos. - Mas, Ell... Se cuida. Tá? Não sai sozinha de noite nem nada assim, ok? Sai comigo, ou com seu irmão. E pode me ligar, nem que seja no meio da madrugada! Eu não ligo de ir até a farmácia comprar absorventes com você às quatro da manhã...

– Credo, Vítor, desde quando você virou o patrulheiro do toque de recolher? - perguntei com as sobrancelhas arqueadas.

Eu sei, eu sei. Ele só estava preocupado comigo e tentando me proteger. Mas eu absolutamente detesto gente tentando me controlar, mesmo que essa pessoa seja o meu namorado.

Pensando bem, principalmente se essa pessoa for o meu namorado.

– Eu não virei o patrulheiro do toque de recolher! - Vítor reclamou. - Eu só... Fico preocupado!

– Não precisa ficar – eu disse em voz calma. – Eu sei um pouco de defesa pessoal, ok? Posso inutilizar um estuprador em cinco segundos. Talvez um pouco mais se ele tiver uma arma. Então relaxa, eu não sou nenhuma Peach pro Mário ter que me salvar de cinco em cinco segundos. Além disso, desde quando você cismou que Riacho Dourado é uma cidade perigosa? Nunca acontece nada aqui!

A essa altura, já estávamos no portão da escola. Mesmo assim, Vítor ainda parecia desconfortável e apertava a alça da mochila compulsivamente.

– Olha, me chame de louco se quiser - ele disse. Então passou a me observar duramente, olho no olho, como se fosse algo extremamente sério. - A minha mãe pode até ser esquizofrênica, mas ao menos ela é uma esquizofrênica calma. Ela não sai berrando e surtando por aí, só... Fica presa em seu próprio mundinho. Mas, nessas semanas, ela tem estado muito inquieta. E, quando ela fica inquieta, alguma coisa realmente ruim costuma estar prestes a acontecer. Só estou tentando evitar que aconteça com você.

Ele desviou o olhar e calou-se. Dava para ver, por baixo da alça da mochila, que seus ombros estavam tensos; e, de perfil, eu consegui perceber como não era a única com olheiras sob os olhos.

Acho que mais alguém andara estressado demais para dormir.

– Vítor. Vítor, ei. - Ele só olhou depois que eu o chamei da segunda vez. Me aproximei e tentei manter contato visual enquanto dizia em voz calma: - Tudo bem, eu acredito em você. Vou ter mais cuidado a partir de agora, prometo.

Ele deu um meio sorriso, e vi que só não me puxou para um beijo porque tinha gente olhando.

– Obrigado.


**

Fiquei extremamente frustrada ao voltar para casa naquela terça-feira.

Minha esperança era poder contar para Lince sobre a carta, mas, mesmo eu tendo avisado que queria falar com ele, o desgraçado do meu irmão cismou que ia dormir na casa de alguém, e sumiu quando o sinal bateu. Só consegui vê-lo novamente no dia seguinte, mas a essa altura já estávamos na sala de aula, então só me restava dar-lhe uma bronca por ter me colocado ainda mais atrás na sua lista de prioridades.

Tenho certeza que ele não escutou nem meia dúzia do que eu falei, mas foda-se.

Então lá estava eu, no meu quarto, esperando Lince sair do banho enquanto encarava aquelas letras floreadas como se fossem subitamente começar a fazer sentido, quando ouvi três batidas na minha janela.

– Ell?

Quem dera fosse a paz ou a sorte, mas realmente não acho que elas tenham meu endereço. Ao contrário de Vince, claro.

– Estou ocupada.

– Não, não está - ele argumentou em seu sotaque italiano. Estava agarrado ao peitoril da minha janela como se fosse a coisa mais fácil do mundo, mas estávamos no segundo andar da casa e ali não havia sustentação direito. Sei disso porque já tentei entrar por aquela mesma janela, e não tinha dado tão certo assim. Mas meios-vampiros têm suas vantagens, acho.

– Ok, você me pegou. Eu só não quero ver a sua cara.

– Por favor, mia bella. Eu prometo me comportar - ele disse em um tom aveludado.

– Hã, deixa eu ver se minha opinião mudou... Ops, NÃO.

– Mas, bella, eu vim aqui de dia só para te ver. Não mereço nem entrar?

– Você é só meio vampiro, sol não faz nenhuma diferença. Agora vai embora! - Joguei meu travesseiro na janela, e consegui acertar na cara dele. Quer dizer, talvez ele tenha se deixado acertar, mas quem liga? Ao contrário do sol, ele ainda precisava da minha autorização para entrar na casa como todo vampiro, então não poderia revidar.

– Mesmo se eu tiver notícias sobre o seu namoradinho?

Aquilo me fez levantar na mesma hora da cama. Mesmo com um pouco de tontura por erguer o corpo rápido demais, andei rapidamente até a janela e encarei Vince com raiva.

– Ok, criatura infeliz, aí vai a pergunta de um milhão de dólares: Você andou espionando o Vítor? Porque, se andou - e nessa hora minha voz se tornou um rosnado com ameaça palpável -, eu vou garantir pessoalmente que você nunca mais tenha capacidade para espionar ninguém.

Dio mio, bella, calma. Eu não espionei... Nesse sentido aí. Eu só...

– Só o quê, Vince?

Ele me observou com aquelas duas avelãs que eram suas íris, e parecia realmente sincero quando respondeu:

– Eu só estava preocupado com você.

Ah, ótimo, Vince. Pegue sua senha e entre na fila.

– Eu fiquei... Com ciúmes – ele continuou. – Muitos ciúmes naquela noite. Eu admito que achei que, bom, as coisas ainda eram como antes. E quando você disse que não eram... E que estava namorando...

– Você teve que se meter.

– Não! Bom, sim. Mais ou menos. – Vince revirou os olhos e continuou: – Escuta, eu o observei de longe. E cheguei à conclusão de que você não deve confiar nele.

Inacreditável. Com todas as letras: I-N-A-C-R-E-D-I-T-Á-V-E-L.

– Baseado em que fatos, Vince? – eu disse irritada. – Você não foi com a cara dele? Ele tem uma mania suspeita de respirar frequentemente? Ah, já sei, ele gosta de pizza de alho, é por isso.

Eu vi que realmente consegui irrita-lo com a piadinha do alho, mas ele se conteve e apenas continuou:

– Eu estou falando sério. Olha, a mãe dele...

– É esquizofrênica – cortei. – Ela surtou depois que o pai dele morreu em um acidente. Então o avô mora com eles. Ou você achou muito estranho que ela delirasse com uma enfermeira e um velho do lado?

Vince pareceu chocado que eu soubesse da história. Aproveitei para completar:

– E, sabe, quando eu disse que não estava afim de ver a sua cara, não era mentira. – Com essas palavras, fechei a janela com força. Perdendo seu local de apoio, Vince foi forçado a pular para fora. Então fechei as cortinas e voltei para minha cama como se nada tivesse acontecido.



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Notas finais do capítulo

Reviews não matam e deixam uma autora feliz!
(Eu não mordo, tá)



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