Entre a Promessa e a Flor escrita por Nymus


Capítulo 7
7 - Visões Diferentes do Amor




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/158499/chapter/7

Era bem cedo e dois noviços caminhavam pela ala de dormitórios dos sacerdotes em Prontera. Pararam a porta de um quarto e um deles bateu na porta de madeira, não obtendo resposta.

- Ele saiu? - perguntou o outro.
- Não o vi passar.

Voltou a bater na porta com um pouco mais de força e então ela abriu-se. Tendo como obrigação falar com aquele sacerdote, o noviço que batera na porta a empurrou e olhou para dentro. Uma lufada de ar apodrecido bateu em seu rosto, o fazendo ficar enjoado. Afastou-se da porta contendo o enjôo e o outro noviço olhou para dentro do quarto, abrindo totalmente a porta.

- Pelo Grande e Poderoso Odin... - murmurou.

Dentro do quarto simples, sob um tapete, estava o corpo de Dommenicus escuro, apodrecendo a luz matinal. O quarto estava revirado e as roupas que pertenciam a ele estavam jogadas no chão. Com um olhar rápido, o noviço notou que apenas a túnica que o sacerdote utilizava no Alto Conselho não estava ali. Ao que parecia, ele estava morto a dias, embora ninguém tivesse dado sua falta ou sentindo o cheiro que agora estava pesado no corredor. Aquele noviço achou estranho, porque ontem ele havia dado um recado a Dommenicus, em pessoa.

Ele virou-se para o outro noviço, que ainda apertava o estômago.

- Vá avisar o Conselho que o sacerdote se foi... que há algo errado!

O outro nem esperou segunda ordem para sair dali, indo correndo avisar os superiores. O noviço que ficara cobriu o rosto com o braço e entrou no quarto, passando pelo corpo e abrindo as janelas. Quando se virou para sair dali, ficou estático ao ver uma mensagem escrita na parede, com uma tinta vermelha que ele sabia ser sangue. Sangue de Dommenicus.

"Vermelho cobre o meu corpo, da carne morta eu vivo, o poder da vida e da morte, sou eu quem decido."

Atrius moveu-se na cama, aconchegando Florette perto de si. Não queria acordar e toda vez que percebia que o faria, apertava os olhos com força e voltava a dormir. Fazia anos que ele não utilizava essa técnica, desde quando era pequeno. Sempre levantava cedo, não se importava com o fato de muitas manhãs o Sol nem sequer dar sinais no céu. Logo cedo comia e fazia as primeiras orações a Odin. No santuário a Odin de Prontera, as atividades começavam cedo para que o dia fosse longo. Geralmente logo que o Sol sumia no horizonte, a maioria dos noviços e sacerdotes voltara a lábios adquiriram um sorriso satisfeito quando se viu sonhando com Florette em seus braços.

Quando acordou, o Sol já estava alto e pássaros cantavam próximo as janelas. O perfume das flores que emanava do jardim espalhava-se pelo quarto sutilmente. Ele virou-se e abraçou Florette contra si, sentindo-se muito bem por te-la com ele, por poder acordar com ela e por ter tido um sonho tão real com ela. Beijou-lhe os cabelos e fechou os olhos, lembrando do sonho, sentindo o corpo despertar febril e o sangue correr rápido por suas veias como se fosse lava. Se ao menos ela pudesse corresponder... ele seria um novo homem pela manhã. Afagou as costas dela e a puxou o quanto pode para si, sentindo a pele macia fria.

Enquanto a matinha perto de si, Atrius abriu os olhos e fitou a cota no chão. Lembranças passaram por sua mente, como lampejos de luz, cada cena representando aquele que ele tinha de mais precioso em sua vida. Eram em momentos como aquele, que ele podia se dar ao luxo de pensar em sua vida, sem que tivesse os pensamentos lidos pelo Alto Conselho de Prontera. Ficou ali, durante algum tempo como os olhos fixos na cota, a mente longe, levada por lembranças.

Voltou ao presente quando ouviu os sons de uma animada conversa no andar inferior. Ele afastou Florette para poder olhá-la, tocou o rosto sentindo a pele quente e macia, descendo para contornar os lábios bem desenhados e macios. Um sorriso apareceu em seus lábios e ele beijou a testa dela.

Tantas vezes ele havia imaginado aquela cena, desejado poder estar ali. Agora queria que Florette estivesse bem, para poder desfrutar da mesma sensação que ele, que correspondesse a ânsia que ele sentia. No entanto, era apenas um desejo. E ele havia se esquecido de tudo por ela. De tudo o que prometera e do que ele representava.
"Em nome de Odin", pensou ele olhando para os lábios dela, "me perderia em um beijo". Aquele pensamento não o assustava, mas a vontade que tinha de se perder nela que o fazia ficava arrepiado por antecipação. Seriam momentos maravilhosos, pensou ele extasiado depois, mergulhado em antigas e quentes memórias, tão vivas quanto seu último sonho.

A estreitou em seus braços, sentindo seu próprio calor passar para o corpo dela, desejando aquela proximidade mais do que qualquer coisa no mundo.

- Flor?

A chamou, sentindo a doçura do nome dela, a voz rouca a visão do corpo aninhado ao seu, quente. As pernas enroscadas, as mãos dela apoiadas em seu peito. A apertou contra si, não ficando satisfeito por ela parecer uma boneca sem vida em seus braços. Afastou-a para olha-la melhor, e parecia que Florette dormia tranqüilamente ignorando a presença dele e a luxúria causada pela aquela situação.

Como alguém poderia entender o que ele sentia? Era um misto de confusão, paixão e apreensão. Ele a queria, e Florette parecia ligada a um lugar no qual ele não podia entrar para tê-la só para si. Podia sacudi-la e sabia que seria difícil ela acordar, e que de alguma forma algo precisava ser feito para que ela pudesse voltar a seus braços.

A seus braços?
Não, claro que não!

Acariciou o rosto dela, como que querendo visualizar cada centímetro e guarda-lo como seu maior bem. Não podia ficar com ela. Havia a promessa e ele era portador da Cota de Odin. Ela iria somente distrai-lo. Poderia coloca-la em perigo, um perigo que ele sempre sentia, mas que nunca conseguia ver, algo presente que sempre o circundava. Era sabido que muitos desejavam o poder da Cota e se achassem o guardião, teriam a chance que queriam. Como poderia por Flor em risco por sua promessa? Não, ele a amava demais para isso, e preferia viver sem ela a vê-la ferida. Da mesma maneira que se encontrava agora.

- Oh meu amor - murmurou ele.

Ao que parecia fora uma boa idéia dormir com ela, pois ela estava quente, aquele frio a abandonara. Sacudiu-a um pouco e não houve resposta. Voltou a sacudi-la e ela acabou por estremecer e abriu um pouco os olhos. Ele ficou angustiado de vê-los brancos, ainda cobertos por uma espessa camada pastosa. O desejo sumiu, varrido por uma terrível sensação de preocupação por ela.

- Flor... - murmurou arrasado.

Ele a abraçou com força.

- Estou aqui, pode me ouvir? Diga que me escuta querida - pediu ele.
- Aham...- gemeu ela.
- Não querida, fique comigo... acorda Flor.

E antes mesmo de Atrius terminar a frase, Florette já estava adormecida novamente. Tristemente Atrius constatou que ela se achava em Glast Heim ainda, e ainda pedia sua ajuda. A solução de tudo seria acabar com o causador de todo aquele sofrimento. Era o único jeito.

A contragosto ele se levantou, vestiu-se com uma roupa limpa que Lier havia lhe dado no dia anterior, e lavou o rosto. Parado junto a bacia com água limpa, ele secou o rosto em uma toalha felpuda e olhou para Florette e depois para a cota jogada no chão. Com um gesto de mão, a cota voou para o pulso dele e enroscou-se sozinha. Voltou seus olhos para ela, e sentiu aquela angustia crescer. Seus olhos verdes então se fixaram na figura do espelho, e Atrius quase não se reconheceu, preenchido pela energia viva da Cota, as roupas brilhantes e sedosas, o cabelo em desalinho. Uma energia circundava seu corpo em forma de inúmeras bolinhas prateadas invisíveis a outros olhos.

Sentiu-se bem com ela, e porque aquela energia era tudo o que ele precisava para derrotar aquele inimigo. Ajoelhou-se fechando os olhos, e orou para Odin, para que sua sabedoria o abençoasse e que ele pudesse ver entre a escuridão o caminho mais correto a seguir. Que ele ficasse velando por Florette.

Levantou-se e voltou para Florette, beijando-lhe os lábios com suavidade. Abriu os olhos e fitou o rosto adormecido que esfriara. Ele levantou o lençol e observou o corpo dela, não com olhos desejosos, mas com um olhar carregado de preocupação. Grande parte das manchas haviam mudando de tom adquirindo uma coloração mais clara, e reunindo todo seu conhecimento divino, Atrius começou a trata-la e só parou quando todas as manchas haviam sumido. A cobriu depois com carinho, tendo um sorriso triste nos lábios.

- Vou te tirar daí meu amor... eu prometo.

Desceu para o outro andar, onde já ouvia as vozes de Lier e Zanzar Ten. Eles o olharam quando ele apareceu na escada e foi na direção deles.

- Como ela está? - perguntou Lier ficando de pé. Tinha os cabelos ruivos soltos, molhados sobre os ombros, usava uma camisa branca, aberta no peito, feita de um fino tecido. Lier sempre se cercava do melhor, e deixava isso claro naquela casa, onde tudo era fino, delicado, detalhado e caro. Não escondia de ninguém a vida que levava e sempre afirmara que conseguira o que conseguiu com muito esforço. Ninguém duvidava da palavra dele, embora seu apelido falasse o contrario... - Eu ia vê-la, mas ouvi você rezando e decidi esperar.

Atrius agradeceu silenciosamente. Se Lier tivesse entrado no quarto enquanto ele cuidava de Florette certamente acharia que ele estava se aproveitando da situação que ela se encontrava e estaria apalpando o corpo dela.

- Presa em Glast Heim - disse Atrius visivelmente triste e abatido. - Não sei mais o que posso fazer. A única idéia que me ocorre é irmos lá e terminar a minha missão.
- Vic não está aqui - disse Zanzar, comendo um pedaço de pão preto sem dar a mínima para o que Atrius acabara de falar. Atrius encarou o Bruxo vendo que ele usava uma túnica azul, ricamente decorada. Os cabelos estavam presos em uma trança muito bem feita. A falta de compaixão dele era conhecida, e aquilo magoou ainda mais o sacerdote porque não estavam falando de uma pessoa qualquer e sim de Florette, que tinha Zanzar como um grande amigo, talvez o melhor. Ela falava muito dele, sobre ele e sobre tudo no que ele pudesse ser mencionado. A principio ele ficara com ciúmes do carinho que ela tinha pelo Bruxo, mas depois compreendera que Zanzar ajudara Florette em muitas ocasiões e que estranhamente, ele era carinhoso e brincalhão com ela, tirando aquele ar inconseqüente do rosto.

Uma das primeiras vezes que os vira juntos, Zanzar dera a Florette uma tiara de antenas verdes e juntos ficaram por horas rindo de alguma piada particular. Sempre quando o Bruxo tinha algo em mente, contatava Florette e logo ela estava pronta para ir ajuda-lo. Dizia ela que Zanzar fora um dos melhores mestres que ela já tivera e que achava sempre que o Bruxo era solitário demais e que um pouco de companhia não lhe faria mal. Para os demais, Zanzar Ten beirava a loucura... se já não fosse louco...

- Vic foi para Izlude. Pediu para a esperarmos - disse Lier, corrigindo a falha de Zanzar. - Você conseguiu dormir naquela cadeira? - perguntou depois, vendo que apesar de triste, Atrius estava muito disposto.

O sacerdote corou até a raiz dos cabelos e uma chispa cruzou os olhos vermelhos de Lier. Zanzar gargalhou.

- Dormi do lado de Florette - respondeu Atrius sem jeito. - Qual a importância disso agora?
- Toda! - esbravejou Lier. - Espero que tenha dormido no chão sacerdote, pois se souber do contrario, assim que terminarmos isso, jamais voltara a ser bem vindo no quarto da minha irmã.

Zanzar gargalhou novamente.

- Florette está doente e você pensa nisso?

Zanzar parou de rir de repente e assumiu um ar sério.

- E quanto a Wild Bill? - perguntou ele.
- Quem é Wild Bill? - perguntou Atrius com uma voz sombria.
- O que fez a minha irmã? - perguntou Lier num rosnado.
- Bom dia pra vocês também - disse Jack entrando na cozinha e vendo a calorosa discussão. Ainda vestia o roupão. Desde que Vic fora embora, ele não conseguira mais dormir. Quase rira daquela situação absurda logo pela manhã.
- Quem é Wild Bill? - Atrius olhou para Jack.

Ele por sua vez olhou para Zanzar, que tinha uma expressão indiferente e depois para Lier que estava ficando vermelho de raiva.

- É o namorado da Florette - respondeu Zanzar, gargalhando depois - ao menos foi o que ela me disse ontem.
- Namorado? - gritaram Atrius e Jack juntos.
- É ué!
- Como assim namorado? - a voz de Atrius foi suavizando, enquanto olhava diretamente para Zanzar. - O que ela disse? Ela disse que estava com alguém? O que ela disse Bruxo?
- Qual é a importância disso também? - Lier falou bravo - você dorme com a minha irmã e depois pergunta do namorado dela?

Atrius endireitou o corpo e olhou para Lier.
Namorado?

Uma estranha sensação se apoderou dele e no instante seguinte, Atrius estava odiando e morrendo de inveja do namorado dela. Não era possível! Ele era o amor dela! Todo mundo sabia disso! Ela não podia te-lo trocado... não por um homem que se chamava "Wild Bill"... Wild Bill... que diabos de nome era esse? Não! Nenhum outro homem podia tocar no que era seu, e Florette lhe pertencia, pois ela mesma sussurra no seu ouvido isso naquela noite que eles se amaram. Ela pedira para ser dele e agora tinha um tal de Wild Bill?

Respirou fundo e tentou dispersar os sentimentos. Estava se corroendo de ciúmes...com muito ciúmes! Engoliu em seco e olhou para a cota no seu pulso. Não sabia o que dizer. Nem sabia quem era Wild Bill e já o odiava. Ficou confuso depois.
Zanzar Ten gargalhou.

- Ela estava com ele na noite que eu a chamei para ir a Geffen - explicou Zanzar, tendo aquele olhar doentio focalizado em Atrius. Era como se soubesse que ele estava se corroendo de ciúmes e o pensamento parecia agradável ao Bruxo.

O sacerdote não pode acreditar! Aquilo era... incrível. Uma idéia passou por sua mente e ele recusou-se a acreditar nela! Não, Florette fora vê-lo porque estava com saudades e não... não porque ia contar que estava com outra pessoa. Ela jamais faria isso com ele!

- Pela última vez Atrius - Lier o despertou de seus pensamentos e encarou o mercenário - aonde você dormiu?
- Sua irmã estava gelada e dormi com ela. Não fiz nada a ela, que não fosse aquece-la e cura-la. Ela está da mesma forma que a viu pela última vez, intocada - Atrius disse, escondendo todo o seu ressentimento. A voz dele soou dura e a expressão que ele tinha era de seriedade.

Aquilo foi suficiente para Lier, que sorriu e afastou o cabelo do rosto, parecendo mais tranqüilo. Olhou para Zanzar que parecia alheio a conversa tomando chá e olhando pela janela.

- Vamos buscar Vic em Izlude e vamos para Glast Heim.
- Com que armas? - perguntou Lier com sua voz calma, a discussão sumiu e a tensão desapareceu.
- Vic tem uma coleção na casa dela segundo o que Anakin falou. Ela deve ter armas para todos - respondeu Atrius fazendo um esforço para parecer indiferente. - Devemos partir o mais rápido possível. Aquele Druida tem que ter o que merece - E alguém chamado Wild Bill também, pensou raivoso.

Nele surgiu uma necessidade de resolver logo a situação para que pudesse esclarecer pessoalmente com Florette a outra situação.

Vic mal podia acreditar que antes do final da tarde ela estava em Izlude. As patas fortes do PecoPeco que pertenciam a Lier a deixaram abismada tanto em força como em velocidade. Ela adorava andar de PecoPeco e jamais antes havia andado em um que corria como aquele. Era seu dia de sorte, pensou depois, quando adentrou os arcos de Izlude e comandou o Peco em direção a sua casa. O serviço Kafra de Teleportes havia atendido ela com agilidade e o beijo ainda queimava em seus lábios e mesmo não sendo o primeiro trocado entre eles, para ela, todos os beijos de Jack tinham importância.

Desmontou do Peco e amarrou as rédeas na cerca da varanda, depois subindo os quatro degraus e entrando na casa. Sua surpresa ainda foi maior quando ouviu a voz do pai falando alguma coisa sobre o Alto Conselho de Thor. Ela caminhou até a sala de estar e o pai recebia o jovem Mestre Espadachim Leon. Ele levantou-se assim que a viu, e Vic afastou o capuz dos cabelos loiros e evitou o olhar cheio de ressentimento do homem. Fixou-se seu olhar no pai, e ele deu um sorriso cálido a ela, estendendo a mão. Em sinal de total respeito, Vic beijou a mão estendida e fez uma mesura para Leon, que se sentara novamente.

Angus Pendragon fez um sinal com a cabeça para que Vic sentasse a seu lado, e ela o fez, tendo as mãos do pai entre as suas.

- E então, o que sugere? - perguntou Leon. Angus o olhou com seriedade e depois de ficar um pouco em silêncio, respondeu com sua voz grossa e potente, que poderia fazer um exército tremer.
- Vá falar com o Cavaleiro Honroso – disse ele - o Grã Mestre Espadachim deve ter uma solução para o caso, e terá sua resposta caso o Conselho de Thor venha a procura-los. É muito grave o que aconteceu e espero de vocês o máximo do empenho para resolver o caso.
- Certamente meu senhor - Leon deixou alguns pergaminhos sobre a mesa de centro e levantou-se depois, o gesto sendo seguido por Angus e Vic. - Aqui estão os pergaminhos que me pediu, isso é tudo o que temos de informação na Academia.
- Será o suficiente, senhor Leon.

Leon fez uma mesura e lançou um último olhar para Vic. Sentindo um leve aperto de mão, ela olhou de relance para o pai e Angus fez um imperceptível sinal que Vic acompanhasse Leon até a porta. De má vontade ela atendeu a vontade do pai, seguindo Leon pelos corredores e abrindo a porta para ele depois. O espadachim saiu e sem dar mais um passo, olhou para o PecoPeco e depois para ela, ironicamente.

- Um PecoPeco Pena Preta... foi ele que deu pra você? - perguntou com a voz carregada de sarcasmo. - É um ótimo Peco de corrida, e bastante caro... como um gatuno como ele pode ter tanto dinheiro?
- Mesmo isso não sendo de sua conta, o Peco não é de Jack.
- Ah... Jack... fala o nome dele como se pronunciasse o nome sagrado de Odin. Ainda está apaixonada por ele Vic? Foi por isso que desistiu de nosso noivado?
- Você sabe porque eu desisti...
- Claro que eu sei... Jack Golpe de Adaga também sabe... alias, acredito que ele saiba mais do que eu!
- Leon por favor - pediu Vic sem nenhuma paciência.

De fato ela fora noiva de Leon, ele prometera cuidar dela, porque sabia que havia algo errado com ela. A brutalidade dos golpes de Vic e sua agilidade quando estava na Academia de Espadachins de Izlude chamou a atenção de Leon. O homem era apaixonado por ela, e Vic gostaria muito de sentir algo por ele que não fosse uma simples compaixão. Mas surgira Jack e ela não podia controlar o seu coração inquieto, e amara o gatuno assim que o virá mesmo sendo ele irônico e provocativo. Leon soubera disso e certa noite, durante um jantar, Vic encontrava-se com os pensamentos distantes e Leon perguntou a ela se o amava e se realmente queria casar com ele. A resposta não foi a que ele esperava e saiu do lugar bufando, a deixando sozinha na mesa e com a conta para pagar.

Quando Leon acalmou-se, foi falar com Vic e a encontrou na companhia de Jack. Odiara o homem no mesmo instante e mesmo Jack sendo o mais simpáticos dos homens, sentiu-se ofendido - e sem razão aparente - pelo espadachim, dizendo a Vic que ela deveria escolher melhor os homens com os quais se relacionava. Fora a gota d'água e Leon lançou-se sobre ele para dar-lhe uma surra. Sem entender nada do que estava acontecendo, Jack defendeu-se dos golpes furiosos do homem, sem ao menos questionar porque estava sendo atacado. Foi então que ele viu algo curioso... a forma que o homem olhava para Vic e a aliança que ela tanto escondia... percebeu tudo, e sem dizer nada, saiu do lugar, deixando que eles se entendessem.

- Isso é tudo? - perguntou Vic.
- Claro - Leon abaixou o olhar - você sabe que ele vai machuca-la. Está fazendo isso somente para me machucar, para dizer a todos que pode ter suas próprias escolhas. Ainda está escondendo segredos, como escondeu de todos que era filha de Angus Pendragon. Nada pode sobreviver onde existem segredos, você sabe disso, da mesma forma que eu sei. Não pode esconder para sempre todos os seus segredos e duvido que Jack o faça também.
- Do que está falando? - ela odiou-se por deixar escapar a pergunta, totalmente cega por algo que Leon sabia e não queria dizer a ela.
- Por que não pergunta a Jack? - ele perguntou suave, dando as costas a Vic, metendo as mãos sobre a capa que usava.

Ela mordeu-se de raiva, e fechou a porta com força, encontrando o olhar de Angus no corredor.

- Desculpe - murmurou ela.
- Está tudo bem, querida. Esse rapaz gosta mesmo de você, heim? Não me surpreendo mais com isso... tantos homens caíram de amor por você, poucos me pediram sua mão, quando descobriram que era milha filha, a maioria desistiu.

Vic sorriu.

- Sua mão é do homem que tiver coragem de terminar um assunto comigo.

E poucos conseguiam. Vic não estava mais aborrecida e encarou o pai com amor, notando que apesar de ter vivido mais de quarenta e cinco outonos, Angus Pendragon era um homem bonito, charmoso e de presença marcante. Fora isso que o levara a ser general da tropa mais organizada de toda Rune Midgard, a cavalaria de Prontera. O pai vestira uma túnica e uma saia comprida, e estava distante de ser visto assim por qualquer um de seus homens, sempre sendo visto com sua reluzente armadura e a capa vermelha com o brasão de Prontera as costas. Os longos cabelos estavam molhados e presos numa trança feita as pressas, e reluziam em um dourado tão brilhante quando o dela, onde fios grisalhos mesclavam-se e sumiam com facilidade. A cicatriz que ele exibia com orgulho no queixo era agora uma fina faixa branca, em contraste com a pele queimada de sol. Os olhos eram cinzentos, poderosos e perigosos. Bastava um olhar de Angus para soldados desviarem de suas intenções de ataca-lo.

Vic e Anakin não o temiam. Conheciam o homem bom e amoroso por trás de toda aquela pose militar que ambos carregavam. Vic conhecia o homem apaixonado e que no fundo ainda suspirava por Saité, o único amor de sua vida.

Ela foi até ele e o abraçou com força, sentiu um beijo do pai nos cabelos dela.

- Minha pequena - disse ele, puxando-a para a sala e mostrando os pergaminhos, então a olhou e sorriu com o canto dos lábios - deve estar cansada. Irei aquecer água para você, vá descansar que já levo a água para a tina. Ani foi buscar algumas coisas no mercado e peço para ele fazer um chá para você.

Sem ter como agradecer a atitude do pai, Vic assentiu e foi tirar o pó do corpo com um banho quente relaxante. Quando terminou, ficou feliz de encontrar Anakin. Depois de se alimentar, viu que a noite já caia como um manto sobre Izlude. Voltara para a sala com o pai e ele ficou sério quando pegou os pergaminhos e os analisou.

- O que faz aqui em Izlude pai? - perguntou Anakin que não tivera oportunidades de conversar com o pai pois ele já chegara na companhia do Mestre Leon.
- Vim resolver alguns problemas - murmurou Angus tendo os olhos fixos nos pergaminhos - além do mais aquela casa é imensa e sua mãe está em Al de Baran.

Ficaram em silêncio e então Angus suspirou e entregou os pergaminhos a Vic, que junto com Anakin passou os olhos por cima dele, sentindo um arrepio percorrer o corpo.

- Sabia disso Vic? - perguntou o pai, assim que ela ergueu o olhar para ele.
- Não... - murmurou ela.
- Estou tentando descobrir quem é o Guardião da Cota de Odin - começou Angus - mas essa informação foi para o túmulo junto com o antigo Sumo Sacerdote da Ordem de Odin de Prontera. Ele era o antigo portador da Cota e a passou para alguém, ampliando a missão. A Cota não somente serve para aprisionar sua mãe e leva-la de volta a Geffenia, mas também como prender aqueles que são frutos dela. Em outras palavras, você. O Portador da Cota está atrás de você!

Vic ficou pálida.

- Você possui parte dos poderes de Saité... eles tem medo de que seja seduzida por eles e que se torne tão cruel quanto afirmam que sua mãe é.
- Ela é pai... os aventureiros desaparecidos é obra dela. Existe um Druida Vermelho em Glast Heim invocado por ela. Eu o vi pai e senti o poder dela.
- Pelo poderoso Thor... temos que localizar o Portador da Cota e impedi-lo de lhe fazer algum mal.
- Não acho que isso seja possível pai... ele prometeu. E mesmo que ele seja confuso às vezes, ele sempre cumpre o que promete.

Lier abriu a porta do fundo de sua casa e olhou para o céu.

- Vic já deve ter chegado em Izlude. Podemos partir agora Atrius - disse olhando para o sacerdote que ficou mau-humorado durante todo o dia.
- Onde está Paganini?
- Já deve estar chegando... ele vai cuidar de Florette enquanto estivermos fora. Já combinei com ele.

Atrius não disse nada e ouviu uma batida na porta da casa, Lier olhava-se no espelho, verificando o estado de sua roupa de aventura. Atrius revirou os olhos quando a batida se repetiu e foi atender a porta. O narcisismo de Lier era conhecido entre os amigos, e tudo o que ele tocava para arrumar ficava perfeito aos olhos de todos, menos aos dele.
Abriu a porta e deu-se com um homem loiro com um buquê de flores na mão. O visitante sorriu e o olhar de Atrius ficou gelado. Não devia ter mais idade do que ele, e uma sombra de barba estava marcada no queixo. Era franzino e de olhos aguçados. Era um arqueiro.

- Oi... a Flor está?

Flor?

O sacerdote apertou com força a porta, até sentir o nós dos dedos ficarem esbranquiçados. Como aquele homem se atrevia a chamar sua Flor de Flor? A pergunta que fez a seguir era só pra constatar o fato que ele sabia. Era ele...

- Quem é você?
- Sou Wild Bill.
- O que você quer com a Florette? - a voz era baixa e perigosa. Wild Bill ergueu as sobrancelhas o mais alto que pode e fez uma expressão de quem dizia "o que você tem com isso?". Não pareceu preocupado com a expressão zangada que o homem lhe lançava, curioso para saber quem era aquele que o impedira de ver Florette.
- Eu vim falar com ela... somente com ela.
- Essas flores são para ela?
- Sim... as favoritas dela - disse o homem com voz sonhadora.
- Eu sei disso - com um gesto brusco tirou o maço de flores da mão do arqueiro e impediu que ele entrasse na casa - Florette está indisposta hoje, deixarei o recado para ela.
- Por favor, diga que eu vim vê-la... é importante o que tenho a tratar com ela.
- Claro, darei o recado.
- Obrigado... e só mais uma coisa...

Bateu a porta na cara do homem, e bufando, ele passou pela ampla sala sem olhar para trás, deixando o buquê sobre uma mesa qualquer, achando que seria exagero de sua parte jogar fora, embora tivesse vontade de fazer isso. Livrar-se daquelas flores seria algo bom, porque ele não ficaria pensando a todo momento que aquele rival havia tido a paciência de comprar flores e leva-las para Florette. Aquelas eram suas favoritas e muitas vezes Atrius a encontrara sentada entre as flores, o olhar perdido, pétalas espalhadas por todos os lados, presas a roupa dela e em seus cabelos. Ela sorria, sempre sorria de um jeito que fazia o coração dele disparar no peito. Sentava-se ao lado dela e sem dizerem nada, ficavam de mãos dadas olhando os campos perfumados e desfrutando da companhia um do outro.

A lembrança se desfez, quando ele fixou seus olhos nas flores bonitas e frescas. Como Florette podia ter se envolvido com outro homem? Voltou a pensar que ela havia ido a Prontera naquele dia para contar-lhe isso e que não sabia como faze-lo. Mas se fosse por isso, porque ela o beijara também? A culpa era dela, que era tão atraente e que ficou conversando sobre assuntos alheios não foi direto ao ponto para dizer que tinha outro homem. Não, estava errado. Nenhuma mulher apaixonada por outro homem poderia beijar daquela maneira intensa e de total entrega. Havia algo errado em toda essa história. Ao menos, era o que ele esperava.

Ficara pensando nisso a tarde inteira e sentado na cadeira ao lado da cama de Florette, ele olhava para ela esperando que acordasse e jurasse amor eterno novamente a ele. Mas a cada instante, ela ficava mais fria, mais distante, longe demais num lugar onde ele não podia ir. Deixa-la era terrível, mas não havia outra escolha. Não queria acreditar que aqueles lábios roxos de frio pudessem ter beijado outra pessoa que não fosse ele.

Ele estava sendo egoísta e sabia disso. Mas como não desejar aquela mulher somente para ele? Não havia mais razão dele procurar alguém, porque tudo estava nela. Tudo o que ele precisava e tudo o que ele queria. Não sentira mais ciúmes enquanto ficara com ela, pois ela estava ali, somente com ele.

Isso até ele descer e ver aquele arqueiro. Queria acreditar numa versão dos fatos que tudo não passava de um mal entendido... assim pelo menos doeria menos.

Mas então por que esse arqueiro surgira para visita-la com flores? Era porque havia algo entre eles... e havia algo com ele também! Não! Ele não queria nada disso. Pegou as flores e as amassou e então se deu conta do que fazia.

Por que ela não poderia ter outra pessoa? Ele mesmo dissera a ela que não havia esperanças entres eles, que havia uma promessa no meio e algo a ser feito e a ser protegido. Fora ele que a afastara, a repelira em sua tentativa de ficar com ele. Quem era culpado dela ter outro homem era ele, que não quisera o seu amor.

Se Wild Bill era namorado de Florette, ele era uma pessoa de sorte. Tanto porque Atrius nunca havia chegado a ser alguma coisa dela, talvez amante, mas nada mais do que isso. Eles tinham um relacionamento silencioso. Ambos se gostavam e tinham planos de ficarem juntos, cada um a sua maneira. Sabiam que se amavam, e isso fora revelado na noite que passaram juntos, mas ele devia desconsiderar totalmente aquela noite. Ele nunca podia imaginar que um dia ele ficaria tão inebriado de paixão e que poder acariciar o corpo de Florette pudesse ser tão prazeroso. Ela havia jurado ser dele para sempre e falara isso de boa vontade, embora Atrius começasse a desconfiar que ela falara isso porque estava extasiada em seus braços.

Ele soltou as flores.

Será que ela havia feito algo... com ele? Ele teria provado a pele macia dela e ouvido os suspiros? Ela teria ficado lânguida e ansiosa para recebe-lo? Assim como ficara para ele? Os olhos brilhando de antecipação, os braços dela em torno do seu corpo, puxando-o para perto, suspirando, as pernas enroscando-se em sua cintura, o instigando a continuar, para ficar totalmente dentro dela.

Não, aquilo era torturante demais!

Pegou as flores e as arremessou pela sala, acertando em cheio Jack que passava por uma porta. As flores bateram nele e as pétalas romperam por todos os lados. O perfume familiar espalhando-se pelo ambiente, deixando ele consciente do estado de luxúria que se encontrava.

- Meu Odin - disse Jack limpando o pólen da roupa e olhando intrigando para o sacerdote que estava arfante e corado. - Ficou louco?
- Bah - murmurou o sacerdote, se recompondo.
- Não pode ficar atirando flores por aí... ainda mais essas tão bonitas... nossa... não são as favoritas da Florette? Por que está matando as plantas dela? É por causa de Wild Bill?

Atrius cruzou os braços e fingiu que não sabia do que Jack estava falando.

- Ela vai ficar triste quando acordar e ver que você andou destruindo o jardim dela.
- Eu não destruí nada... isso é daquele... daquele...

Jack se aproximou, olhando Atrius com curiosidade, esquecendo de remover as pétalas presas a seu cabelo.

- Daquele...? - ecoou.
- Do namorado dela - disse seco.
- Ah, o namorado dela veio trazer flores e você as arremessa pela sala? O que há com você? Por que não as colocou num vaso? Lier tem tantos e...
- Ela não vai receber flores de ninguém!
- Não? E por quê?
- Porque eu não quero!
- Ah, por que você não quer? Mas pelo o que eu sei, você não tem nada com a Florette, afinal a dispensou depois daquele festival de Payon do ano passado. Por que ela não pode ter outra pessoa? Por acaso não acha que está sendo egoísta?

Egoísta? Era só o que faltava ele escutar! Ele já sabia que estava sendo egoísta, mas não tinha como evitar.

- Eu e a Flor... nós... nós...
- Vocês o quê?
- Nós... por que tem que se meter nisso? - perguntou bravo.
- Você está fervendo de ciúmes... e está atirando flores pela sala.
- Eu atiro o que eu quiser e se você ficar me questionando eu vou atira-lo para as profundezas para os braços de Hel.
- Grande Odin... - murmurou Jack espantado com o ciúmes do amigo. - Bem - Jack começou recuperando o bom humor - você não tem nada com ela e por isso ela pode se envolver com quem quiser. E antes de ficar por aí atirando flores nos outros, devia se perguntar se é certo ou justo o que está fazendo.

Atrius não falou nada, extremamente zangado.

- Nunca sentiu ciúmes de Vic?

Jack apagou o sorriso do rosto.

- Não sei do que está falando...
- Nunca sentiu ciúmes dela? Nunca?
- O que eu acho que você deve fazer é esfriar um pouco essa sua mente torturada de imagens e ligações que não existem. Vamos salva-la e então você poderá ver com ela se existe outra pessoa. Mas não posso deixar de avisar que quem desperdiçou tudo foi você. Todos sabemos o quanto Florette é apaixonada por você, o único que parece que não viu isso foi você...

Jack mudara de assunto de forma instantânea como se a pergunta de Atrius nunca tivesse sido feita.

Olharam para a porta quando Paganini entrou por ela e tirou a bolsa que carregava a deixando no chão da sala. Olhou para Atrius e depois para Jack sem sorrir. Focalizou os olhos nas pétalas espalhadas e voltou a olha-los.

- Tia Florette não vai ficar feliz em saber que estavam destruindo o jardim dela.
- Era o que eu dizia Paganini - comentou Jack.
- Eu não destruí nada - resmungou Atrius - ainda não...
- Sei... - ele tirou uma maçã da bolsa e esfregou a casca na roupa - mas alguém destruiu.
- Eu não acredito! O homem vem aqui e ainda destrói o jardim dela? - Atrius quase gritou. Olhando para as flores viu que ele tinha terminado com tudo. Que perfeito tolo fora agora. Devia ter deixado as flores num vaso ao lado da cama dela.
- Que homem? - Paganini perguntou curioso.
- Aquele... aquele...
- Wild Bill - respondeu Jack sorrindo do ciúmes de Atrius. Ao menos isso significava que ele ainda amava Florette.
- Ah - disse o garoto sem muita vontade, mordendo um pedaço da maçã - ele sempre está aqui visitando minha tia. Não sei como ela o suporta.

Os olhos de Atrius brilharam, interessados.

- Como assim?
- Ele está tentando chama-la para ir ao Festival. Mas acredito que ele tenha sentimentos por ela... um dia eu vi ele tentando beijar a minha tia e fiquei com muito nojo.

O sangue de Atrius voltou a ferver, imaginando aquele arqueiro pressionando Florette para beija-lo, forçando a boca dele sobre a dela, tocando os lábios dela. Fechou os punhos e trouxe sua mente para o presente.

- ... e ela disse que não pode gostar de mais ninguém.
- É mesmo? - perguntou Jack.
- Sim... coitada, ela é tão triste. Meu pai diz que ela fez escolhas erradas, mas não fala nada porque a tia Florette é mais velha do que ele. Ele sempre me diz pra não ficar perguntando nada pra ela... pra ela não ter que ficar lembrando dele.
- O que está falando?
- Do homem que a tia Florette gosta.
- Que homem?
- Não sei, ela nunca fala o nome dele.

O sacerdote desconfiou que se tratava dele, mas não falou nada, não a esse respeito.

- E quanto ao Wild Bill? Eles são namorados?
- Namorados? - Paganini riu alto, atraindo a atenção de Lier. - acho que ele gostaria de ser. Mas ele é feio e minha tia é bem bonita... devia ter uma pessoa bonita como ela.

Atrius sentiu um enorme alivio com aquela confissão. Deu um suspiro alto e sorriu sozinho. Ninguém tinha roubado ela dele, embora estivessem tentando. Ele mostraria de quem era Florette, assim que ela estivesse boa. Mostraria a todos que a amava e que ela era sua, unicamente sua. Que todos os seus pensamentos e seu corpo pertenciam a ela, que ele nada mais era do que um escravo a vontade dela, seja ela qual fosse.

- E o que você acha dele? - Jack perguntou apontando o polegar na direção do sacerdote e Paganini olhou para Atrius.
- Você gosta da minha tia? - perguntou o garoto.
- Bem... eu... eu gosto.
- Olha, eu não acho que você seja bonito, mas vai que a minha tia gosta de você? Ela pode ser feliz pelo menos...

A ingenuidade do menino preencheu Atrius com uma pureza que ele achava que não teria naquele dia. Olhou para a cota em seu braço e soube que agora estava pronto para salvar sua Florette. Não haveria distrações em sua mente, só haveria ela, e o amor que moveria a cota.

Pensou em tudo o que fizer e sentiu-se um tolo por ter sido movido por seu ciúmes. Devia ter tratado todos mal, sem falar do próprio Bill, embora esse ele não desse muita atenção. Não podia gostar de um rival, mesmo sabendo que aquele garoto não podia se comparar a ele. Era apenas um garoto e Florette devia ter dez ou onze anos a mais que ele.

Não entendeu porque Zanzar havia falado que eles namoravam, mas discutiria isso depois com ele.

- Filho - Lier passou a mão nos cabelos de Paganini - vamos indo então. Cuide de sua tia está bom?

Todo sabiam que Lier tratava Paganini como se fosse um filho. Havia encontrado o menino na rua e lembrando-se do seu próprio passado, acolhera e cuidara dele para ser um bardo. Mas ao que parecia o menino havia manifestado um outro dom que não era a música. E Lier concordou em deixar o menino ser um mercador. Florette cuidava dele quando Lier não estava, e eles se davam muito bem. Ele sempre estava ajudando-a a cuidar dos animais que Florette levava para casa. Mas ao que parecia, Paganini adorava a outra irmã, a ovelha negra, Raposa Noturna.

- Vou ver como ela está e já vamos - disse Atrius, afastando-se para vê-la. O coração aos pulos renovado por uma esperança de ainda ser o único na vida de Florette.

Quando chegou ao quarto, viu Zanzar Ten sentado na cadeira, em total silêncio. Ele tinha os olhos fechados e uma mão sua segurava a dela. Era uma cena inusitada e nem mesmo o barulho proposital feito por Atrius o fez despertar.

- Está certo - murmurou o bruxo, abrindo os olhos e fitando Atrius, como se soubesse o tempo todo que ele estava ali observando. - Eu sei onde ele está.

Zanzar levantou-se, e o som produzido por sua roupa lembrando ventos fortes que cercavam Geffen. O manto prateado brilhando a luz das velas acesas pelo quarto, o poderoso cajado em uma mão e um livro grosso que flutuava a seu lado. O Bruxo passou por ele com sua expressão séria, e Atrius não falara nada, indo segurar as mãos de Florette sentindo-as fria novamente. Ela mexeu-se e seus lábios se abriram. Murmurou algumas coisas desconexas e apertou a mão de Atrius com força, parando no instante seguinte, abrindo os olhos.

- Frio...sei que está aí... muito frio... vem me tirar daqui...vou congelar... meu corpo dói tanto... vem aqui... por favor.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Entre a Promessa e a Flor" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.