09 - Harry Potter e os Guardiões da Fronteira escrita por alinecarneirohp


Capítulo 14
SOBRE ESCOLHAS E AFINS




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-         Aqui – começou a Morte – não há o tempo, isso que escraviza os seres humanos, aqui só há o eterno, pois não há que se preocupar com o tempo quem tem toda a eternidade disponível. Nada mais natural, mas seus irmãos, os homens, me temem e não me amam. Não há diferença entre o homem mais rico ou o mais humilde quando chega a minha hora com ele... por isso os homens tem tanto medo de perderem seu tempo. Esse é meu reino, o reino do depois... aquilo que você foi em seu mundo, e há muitos mundos, vai te dizer o lugar que você conseguiu aqui...

-         Como aquela coisa de céu, inferno, anjos e demônios?

-         Não, Abel... não é preciso morrer para se ir ao inferno. Os demônios me temem tanto quanto os homens, porque nenhum poder têm sobre mim. Mas eu não sou o fim, e sim o começo...

-         O começo da eternidade... – disse Kayla, até então calada.

-         Isso mesmo – sorriu a morte – vejo que você veio salvá-la... mas não foi isso que você veio fazer aqui, Abel.

-         Não?

-         Não... você veio fazer a sua escolha, aquela para qual não terá ajuda alguma. – a morte fez um gesto largo e repentinamente, eles estavam num largo salão que pouco depois ele reconheceu como o salão principal de Hogwarts, ainda sem o encanto do teto e um pouco diferente, mas inconfundível. Não havia alunos, apenas quatro pessoas sentadas à mesa principal. Duas mulheres e dois homens, envolvidos em uma discussão, até que um deles ergueu-se e disse:

-         Se mais algum sangue sujo atravessar os portões desta escola, irei para sempre embora!

-         Vá- disse uma mulher muito loura, de olhos pálidos e cabelos escorridos – sentiremos sua falta, Salazar, mas não morremos pela sua ausência.

-         Salazar, nossa decisão é irrevogável. Não vamos suspender o ingresso dos nascidos trouxas porque você não aprova a presença deles. Rowena é filha de um trouxa com uma bruxa... você deixou de amá-la por isso?

-         Rowena é um caso único! – disse ele dirigindo-se à outra mulher, de longos cabelos negros e olhos de um azul violáceo. Ela olhou para ele com tristeza e disse apenas:

-         Se essa é sua opinião, vá. E saiba que jamais voltarás a atravessar os nossos portões se fores. Isso não é uma suposição ou uma ameaça, Salazar, é uma profecia.

O homem arregalou os olhos em uma expressão indignada e ameaçadora e virou as costas aos outros. O outro homem, que logo Abel compreendeu ser Godric Griffndor, levantou-se da mesa e aproximou-se de Rowena, dizendo:

-         É verdade isso? – a mulher olhou-o com tristeza e apenas balançou a cabeça. A loura ficou em silêncio e então, abandonou o salão murmurando uma desculpa qualquer. Depois de longo silêncio, Rowena tirou as luvas negras que lhe cobriam as mãos e tocou as do homem.

-         Sobreviveremos sem ele, Godric...

-         E a escola?

-         Ele nos ameaçará, e eventualmente, atacará. Mas terá um fim triste, eu sabia disso antes mesmo de amá-lo... antes mesmo de ter um filho com ele, e não evitei isso, Godric. Precisávamos todos passar por isso, precisamos do que vai vir. A escola precisará dessas adversidades para crescer e prosperar.

-         Eu odeio Salazar, Rowena... primeiro ele a tirou de mim... depois... isso... eu o odeio

-         Nunca diga isso.

-         Mas é a verdade, Rowena... você sabe que eu sempre a amei. Meu casamento com aquela princesa bruxa não aconterá se você disser que o superou... que agora me aceita.

-         Não, Godric, não foi isso que eu disse para você não falar... eu disse para não dizeres jamais que odeia Salazar.

-         Porque não o odiaria? Ele rompeu nosso pacto de amizade, ele quer destruir a escola!

-         Muito mais está por vir, não te atenhas à nossa geração, Godric, odiando ou não Salazar, e os descendentes dele odiarão os teus mais que tu o odeias hoje, mas, um dia, daqui a séculos, tua descendência e a dele serão uma só...

-         Rowena... o que queres dizer com isso?

-         Que alguém de tua linhagem se unirá por amor a alguém da linhagem de Salazar... e isso reconciliará Griffindor e Slyterin.

-         Não acredito nisso – disse o homem, e saiu pisando fundo até que na porta do Salão voltou-se e disse: - e sobre nós dois, Rowena?

-         Sua noiva o espera, Godric, volte antes do verão terminar. Eu e Helga sozinhas não daremos conta de todos os estudantes que vão chegar.

Os dois desapareceram, mas Abel, Kayla e a Morte continuaram no salão de Hogwarts. Depois de um tempo, ele disse:

-         Obrigada por me mostrar como aconteceu... mas eu conheço essa história, já a ouvi durante minha infância umas seis mil  vezes pelo menos...

-         E não mostraria isso a você à toa – disse a Morte. É hora, Abel, de você escolher quem vai te guiar... Salazar ou Godric. Isso ninguém poderá fazer por você.

-         Ei... porque então eu tive que vir AQUI? Não podia fazer essa escolha calmamente no sofá da minha casa? Tinha que ser agora? Eu não podia ter mais tempo para isso?

Duas portas se abriram e de cada uma dela veio um homem. O primeiro tinha cabelos negros e barba longa, olhos escuros e penetrantes. O segundo era ruivo e magro, usava um chapéu que lembrava muito o chapéu seletor. Tirou-o da cabeça e disse diretamente a Abel:

-         Precisamos que você decida agora, porque daqui a muitos anos, nossa escola vai estar nas suas mãos... use isso e mostre-nos seu pensamento

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   Enquanto isso, Harry conversava com os pais em outro ponto do mundo dos mortos:

-         Então... é isso que acontece depois? Vive-se aqui um tempo e segue-se adiante ou volta-se para a terra para viver outra vez, e outra... até que...

-         Até que não haja mais mágoas nem rancores no coração, filho – disse Tiago – um dia eu e sua mãe voltaremos para viver novamente nossa história... mas não queríamos sair daqui sem que você nos visse...

-         Pai, não entendo... não dizem que esse é o mundo sem volta? Porque então se volta à terra?

-         Porque para voltar é preciso renascer, tornar-se outra pessoa... quando eu voltar à terra, não serei mais Tiago Potter, depois de passar o portão do mundo sem volta, esquecemos o que vivemos aqui, e nos tornamos outra pessoa, mas com a mesma essência. É a regra. É a lei, não se leva recordação alguma daqui.

-         E os fantasmas?

-         São aqueles que se perderam, e por muito tempo, sem saber o caminho, ficam presos à propria infelicidade da vida que viveram... pessoas felizes não se tornam fantasmas.

Pensando nos fantasmas de Hogwarts, Harry sentiu pena.

-         E não há inferno?  Eu estive num lugar chamado sala do inferno...

-         Há inferno, Harry, e demônios... mas eles não são castigo para os mortos... são escolhas do homem, os demônios são os maiores interessados nas religiões do medo, filho, porque só  vai para o inferno quem acredita que merece ir para lá...só escolhe o inferno quem quer o inferno.

-         Ou quem negociou com eles sua alma – disse sua mãe – quer seja por meio de contratos, quer seja  por ter se tornado criatura das trevas... só, filho, que o inferno tem entrada e saída, mas poucos sabem realmente disso. Se você acreditar que está no inferno, estará nele, assim como quem acredita que aqui é o céu, estará no céu. Há muitos como nós, há muitos perdidos neste mundo há muitos que escolheram o inferno...

Subitamente, Harry lembrou-se de algo.

-         E os pais de Willy? Quero vê-los!

- Vamos levá-lo até eles – sorriu sua mãe.

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   Draco conversou longamente com sua mãe, e foi incrível para ele como pôde finalmente falar de todas as suas mágoas. Escutar a voz dela o acalmou, como mais nada no mundo poderia acalmá-lo. Ela tinha palavras para seus temores com os filhos e com Sue. era incrível para ele descobrir como a ausência de sua mãe o fizera sofrer sem que ele soubesse disso. Até que ele, que fugira do assunto por tanto tempo, perguntou pelo pai. A mãe encarou-o como se quisesse dizer-lhe algo que não deveria, então, disse:

-         Seu pai não está aqui... ele não veio para nosso mundo ainda.

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   No mundo da realidade cruel, Snape e Henry desceram com dificuldade a falésia e chegaram até à praia cinzenta que era banhada por aquele estranho mar roxo. Henry olhou a distância até a ilhota e encarou o velho.

-         O senhor acha que é muito longe para nadar?

-         Nadar? Você está louco, menino? Você tem noção da distância? E não sabemos que tipo de mar é esse... além de tudo, eu não sei nadar.

-         Pois eu sei – disse Henry tirando a blusa e jogando no chão – antes de entrar para Hogwarts minha mãe fez questão que eu fizesse várias coisas que meninos trouxas fazem, e uma delas foi natação. Se daqui até lá tem menos de 3000 metros, vou conseguir sem problemas.

-         Mas...

-         Não vou deixar o senhor aqui sozinho. Deve haver algum meio de tirá-lo daqui, e eu prometo que vou voltar e... – o menino parou petrificado. Olhou para o alto da falésia e viu, atônito, que dezenas daquelas estranhas crianças o observavam de lá. Quase podia sentir, concretamente, que eles não queriam que ele chegasse à pequena ilha.

-         Não ligue para eles – disse Snape – algo me diz que eles não vão poder fazer nada comigo... eu vou confiar em você, garoto... por favor, não me largue aqui sozinho, quero pelo menos morrer em meu mundo.

-         Morrer?

-         É, morrer, filho. Não tenho muito tempo de vida, há um câncer no meu pulmão, e minha esperança de conseguir acabar com ele é cada vez menor... tire-me daqui, é só isso que eu te peço.

O garoto olhou para o velho. Achava que ele não merecia aquilo, e pensou que se pudesse, além de tirá-lo dali gostaria de fazer alguma coisa para que ele ficasse bom. Mas não disse nada. Simplesmente acabou de tirar as roupas, ficando apenas de cuecas, e entrou na água sem olhar para trás, mas sentindo os olhares dos estranhos meninos cravando-se nas costas dele como minhares de facas, feitas de todos os sentimentos negativos que existiam, a maioria dos quais ele jamais sequer conhecera. A água, a seus pés, era estranha e quente, e movia-se num ritmo surdo e suave. Prestando atenção no murmúrio daquela maré, viu que ela sussurrava palavras, como se aquele mar estivesse vivo. Ele sentiu uma tristeza enorme, conforme avançou pela água até que ela ficasse na altura de sua cintura. Olhou para a ilha, que nem parecia tão longe, e logo depois para trás. Acenou para Snape e mergulhou.

No primeiro instante a sensação foi de ser engolfado por uma onda de melancolia, e ele sentiu-se tonto, sem querer, bebeu a água, que era salgada e amarga. Ia se afogando, porque parecia não acreditar que daria a primeira braçada, mas a imagem do velho esperando-o na praia veio à sua mente e ele ergueu a cabeça acima d’água, respirando e pensando firmemente: “vou conseguir”. Dominando a tristeza e enchendo o peito com essa confiança, deu a primeira braçada, e em pouco tempo avançava rapidamente, ignorando os murmúrios de tristeza que lhe vinham aos ouvidos. Concentrava-se apenas em pensar que conseguiria.

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   Hope olhava de Stone para Bernardo confusa. Sacudiu a cabeça, e disse a si mesma que devia estar sonhando, porque Bernardo estava muito longe, no mundo deles, e se ela pensara nele fora apenas porque o amava e...

Ela não o amava mais.

Era agora muito óbvio que ela não o amava mais, tanto que aos poucos a imagem dele se evanescia, conforme ela se dava conta disso. Ele havia quase sumido quando ela virou-se confusa para Stone, querendo dizer alguma coisa que não sabia exatamente o que era. O que a assustou foi a expressão que ela surpreendeu no olhar do rapaz. Ela já o vira furioso, chateado, aborrecido. Mas aquele olhar, aquele olhar ela ainda não vira, a decepção estava estampada nele, uma falta de esperança, misto de tristeza e raiva... o olhar dele estava cheio da mais profunda mágoa quando ele disse:

-         Até aqui, Black? Até aqui ele TEM que estar entre nós dois?

Hope não conseguia responder. A imagem de Bernardo desaparecera por completo, e ele também desaparecera do seu coração. Agora ela sabia que havia sido estúpida e se agarrara a um amor que vinha morrendo. Era como quando dormimos pensando em algo, e sem saber direito porque, um sonho que não nos recordamos bem nos traz uma lembrança ou conclusão. Ela chegou a abrir a boca para dizer algo, mas a voz de uma terceira pessoa, que testemunhara tudo que haviam passado desde que haviam chegado ao mundo dos sonhos interrompeu-a mesmo antes que ela dissesse o que precisava.

- Então... Porque dois bruxos entram acordados no mundo dos sonhos?

O monarca daquele reino, que estivera brincando com eles através dos sonhos que havia encontrado na mente de ambos os observava sentado em seu trono. Ninguém precisaria dizer aos dois que ele era o rei, o senhor daqueles domínios. Era um homem alto e pálido, duma palidez inumana, olhos negros tão profundos que eram impossíveis de serem encarados sem receio por muito tempo. Usava um longo manto negro, onde agitavam-se imagens, que na verdade eram sonhos, e embora não parecesse cruel, impunha o respeito que só os reis de direito conseguem impor. Depois de um tempo encarando-o, finalmente Gilles começou:

-         Perdão, majestade... houve conosco um grande acidente, e viemos parar em seu reino.

-         Eu imaginei isso, ao ver o portal da fronteira se abrindo. Minha pergunta é porque ele se abriu.

-         Não sabemos – disse Hope – a única coisa que temos idéia é que isso aconteceu por causa de uma mulher sombra.

-         Então... se isso está acontecendo... vocês não estão aqui por acaso – o rei pensou por intermiáveis instantes, antes de erguer os olhos para eles e dizer:

-         Sabem quem sou eu?

-         Eu sei – disse Hope – quando eu era criança, ouvi falar do senhor do mundo dos sonhos, o velho-do-sono, Sandman. Mas sempre imaginei um homem velho.

-         Eu sou mais velho que todos os mundos, mais jovem apenas que a morte e o destino. Meu reino abre-se para todos os mundos, e fronteiras, como o reino de minha irmã mais velha. Mas a fronteira de onde vieram tem mais cinco mundos, e um depende dos outros... e deles depende o equilíbrio da mente dos homens de vários mundos. Eu sei que há milhares de anos um destes mundos ruiu, e sei que se as portas foram abertas, de alguma forma, meu outro irmão, o destino, me pede ajuda para reconstruir esse reino.

-         Perdoe-me, senhor – disse Gilles olhando sem medo para o mestre dos sonhos – mas como pode saber disso tudo?

-         Estava escrito, como dizem os profetas do seu mundo.

-         Então... estamos aqui com um propósito?

-         Sim... e mais que isso- disse o rei, olhando diretamente para Hope, que desviou os olhos sem jeito. Um mundo é feito de muitas coisas, entre elas, sonhos, e foi isso que os trouxe aqui. Os guardiões da fronteira querem povoar um mundo estéril com sonhos... e é isso que os dois vão levar daqui, quando forem embora.

-         Como vamos levar sonhos a um mundo?

-         Isso é assunto meu, mortal... Eu tenho vários nomes, mas aqueles que me deram o nome de Morpheus sabiam que eu ajo pelos meus próprios métodos, e posso agir através de outros, principalmente mortais. – ele levantou-se do trono e era ainda mais imponete que eles haviam calculado, com mais de dois metros e os negros cabelos arrepiados. Era estranho imaginar o monarca do mundo dos sonhos, Lord Morpheus, se aproximando de dois simples mortais para entregar-lhes sonhos, mas foi isso exatamente que ele fez. Olhando Hope e Gilles com seus olhos profundos e negros, ele enfiou a longa mão numa algibeira que trazia presa à cintura, e, sem desviar o olhar de ambos, disse:

-         Despertem, adormecendo. 

Ele então soprou um punhado de areia que retirara da algibeira nos olhos dos dois, que adormecendo, resvalaram para fora do mundo dos sonhos, levando com eles seus sonhos e outros, que descobririam mais tarde.

   Abel olhou o chapéu que Godric Griffndor lhe estendia, e então olhou para o rosto do bruxo adulto. Como acontecera com os olhos de Vega, ele podia ver nos olhos do bruxo algo que não era o seu reflexo, mas o reflexo de um leão feroz. Acreditou que se olhasse os olhos do outro, com certeza enxergaria neles a serpente. Olhou em volta para procurar o olhar encorajador de Kalya, ou mesmo perscrutar o que a Morte  tinha a lhe dizer, mas elas haviam desaparecido.

-         Você vai encontrá-las logo que decidir – disse Salazar, que aparentemente lera-lhe os pensamentos.

-         Porque tenho que decidir? Porque eu?

-         Porque o destino conspirou para isso. Porque uma história nunca está sozinha. Sua história, é também a história de seus pais e avós, é a nossa história, e estamos envolvidos, ambos, na queda do mundo das sombras. Para que o mundo das sombras seja reconstruído, nós temos que pagar nosso tributo por suas mãos, menino Griffndor-Slyterin.

-         Como assim?

-         Há mil anos, quando este reino caiu, eu e Salazar, achando que fazíamos uma grande ação: negociamos com o maior clã dos homens-sombra sua permanência no nosso mundo, onde viveriam sob a terra. Ainda éramos jovens feiticeiros e não imaginávamos que construiríamos uma escola. Muitos sombrios erravam de mundo em mundo, conduzidos por Maya, a monarca. Não sabíamos da existência de Vega, presa e vigiada então no continente que os homens ainda não conheciam. Não sabíamos o que havia além da fronteira, que ficava nos terrenos mágicos onde Hogwarts acabou construída. Não sabíamos de toda a história, mas em troca de um sacrifício de um povo, aceitamos não mais combater os homens sombra como se fossem criaturas das trevas. Acordos semelhantes foram operados em todo mundo mágico, e o resultado foi a ruína do mundo das sombras.  

-         Então... vocês receberam um pagamento para deixa-los em paz?

-         Os guerreiros da luz não iam mais ao nosso mundo... eles não tinham mais inimigos entre nós, e concordaram em nos recompensar, e a todos os bruxos, se os deixássemos em paz.

-         E o que foi essa recompensa?

Salazar e Godric baixaram os olhos, e Abel soube que devia ser algo vergonhoso.

-         Falem... só farei minha escolha se me disserem o que de tão terrível fizeram...

-         Nossa magia era diferente dos sombrios... – disse Salazar – eles tinham o domínio da vontade e nós não...

-         E a maldição Imperius?

-         A nossa magia era ainda jovem e inocente... não dominávamos as maldições imperdoáveis... – disse Godric – mas o mundo mágico precisava de servos, como eles haviam feito no mundo deles... os guerreiros dominavam os operários, e foi isso que eles fizeram por nós, usaram seu poder para encantar um tipo de criatura mágica do nosso mundo para que obedecesse para sempre os bruxos.

Não foi preciso que Abel pensasse mito para concluir do que ele falava.

-         Elfos domésticos?  Como Dobby e aqueles todos?

-         Exato. – disse Salazar -  Nós os usamos para construir Hogwarts... e nunca soubemos como libertá-los. Com o tempo, não sentíamos mais vergonha de usar escravos. É sempre fácil prolongar o mal, basta dizer que as coisas são como são, que você as aceita... foi isso que ocorreu conosco.

-         E esse é foi o mal que eu e Salazar partilhamos... e agora, Abel, escolha um de nós... nós dois já estamos há muito reconciliados. Precisamos agora apenas que você decida.

Sem dizer palavra alguma, Abel estendeu a mão e pegou o chapéu seletor, enterrando-o na cabeça. O primeiro instante, foi silencioso. Ele imaginou que aquele chapéu talvez não tivesse o poder do outro...

-         Olá! – disse a voz do chapéu seletor, e ele assustou-se.

-         Eu não imaginei que você pudesse estar aqui... você deveria estar no meu mundo...

-         E estou. Mas estou aqui também. O chapéu que está no seu mundo, é o mesmo chapéu que está aqui... com mais 950 anos de experiência... eu sou uma lembrança, apenas.

-         Ah...

-         Então? Decidido?

-         Bem... eu acho que preciso pensar.

E Abel pensou muito, antes de escolher algo bem diferente do esperado.

-----

Enquanto Abel fazia sua escolha, seu pai fazia descobertas. A morte fora ao encontro de seus visitantes, levando a filha de Draco pela mão. A menina estranhou porque o pai ao vê-la de longe gritou seu nome com alegria, como não gritava desde quando eles eram uma família. Ele a apresentou à sua avó e ela viu que ela era tão bonita quanto seu pai a descrevera, e mais do que parecia nas fotos da família. Kayla viu de longe o pai de Abel conversando com a morte. Ela viu a expressão do homem migrar da preocupação para o alívio, conforme a Dama dizia a ele que Abel estava a salvo, e em breve estariam todos reunidos. O pai de Henry parecia nervoso, mas a morte pôs a mão sobre o seu ombro e disse:

-         Não se preocupe. Seu filho tem muita coragem, e também recebeu uma missão.

-----

Henry deu mais uma braçada, ele já estava nadando há algum tempo, e se concentrava em fazê-lo com perfeição, porque se ele não se concentrasse, aquela melancolia o faria afundar e morrer, e ele não podia morrer, nem por ele, nem pelo velho, que o esperava na praia, nem por algo maior, que ele sentia que o impulsionava. Não podia parar, não podia desistir... faltava pouco. Ele rangia os dentes, cuspia a água amarga e salgada que insistia em entrar-lhe pela boca, e respirava o ar que era tão amargo quanto aquelas águas, sempre pensando que chegaria... a sensação era cada vez pior, a ilhota parecia distante, muito mais distante que ele imaginava.

“Não!” ele pensou “quero conseguir, eu preciso...”

Isso o massacrava, e foi assim até que ele sentiu seu pé batendo no fundo de areia. Aliviado, ele pôs o outro pé no fundo e foi andando, aos trancos e barrancos até a prainha na ilhota, onde desabou cansado, nu, porque sem saber como as águas haviam dissolvido sua cueca, e triste como jamais sentira-se em toda sua vida. Estava deitado de bruços, sentindo aquela tristeza oprimí-lo de forma insuportável. Foi Começou a chorar, e suas lágrimas eram tão quentes quanto as águas daquele mar amargo do qual saíra.

Com as lágrimas, parecia sair de seu peito toda a opressão, era um alívio poder chorar, ver as lágrimas caírem sobre a areia e sentir que lavavam as tristezas que ele não sabia de onde vinham... era um choro ao mesmo tempo triste e aliviado, até que sem saber como, ele sentiu o toque de alguém sobre seu ombro, e não entendeu exatamente como nem porque, estava chorando não mais de encontro à areia, mas no regaço de uma mulher, que o ninava como a uma criança de colo, e o consolou até que ele sentiu-se livre das lágrimas e da tristeza, embora cansado como nunca.

Ergueu o rosto para olhar para ela. Era uma mulher alta e magra, com olhos azuis tristonhos e grandes. Não era uma bela mulher, parecia alguém que enfrentara enormes sofrimentos, o rosto marcado por rugas profundas. Ainda assim, quando ele a encarou, ela sorriu.

-         Então... finalmente alguém consegue enfrentar as águas amargas.

-         Q..quem é você?

-         A rainha desse mar. O mundo estéril das águas amargas.

Henry se deu conta de que estava nu, e tentou cobrir-se com as mãos. A mulher disse a ele:

-         Não precisa se envergonhar. É preciso estar nu como se veio ao mundo para enfrentar meu mar. Você devia orgulhar-se de tê-lo atravessado.

-         Eu só queria sair daquele lugar – ele disse, apontando na direção de onde viera, surpreendendo-se que não via praia ou continente. – Eu... onde está a praia? Ela parecia muito próxima!

-         A praia era em outro mundo. Aquele mundo e o meu se tocam. A realidade cruel e as águas amargas. Um guarda todos os sentimentos ruins de todos os universos, cada vez que um ser inteligente guarda dentro de si um rancor...

-         Nasce uma criança como aquelas que eu vi naquele mundo?

-         Exatamente. Raiva e ódio os alimentam. Meu mundo toca o deles porque tristeza e rancor sempre estão próximos. Se você veio de outro mundo e atravessou ambos, é porque está em missão, e vai levar de mim uma dádiva. Os mundos invioláveis estavam esperando há séculos pelos emissários, aqueles que renovariam a fronteira. Quando enfrentou os dois mundos, você tornou-se um emissário.

-         E agora?

-         Agora você vai entrar no portal, e seguir para a fronteira. Um mundo espera para ser reconstruído.

-         Esperando ou não – disse Henry subitamente resoluto – eu fiz uma promessa quando mergulhei no seu mar, e não atravessarei esse portal sem que o Senhor Snape também seja salvo.

-         Ele não enfrentou a jornada... precisa ficar para trás.

-         Não – disse Henry levantando-se – ele não podia entrar nas águas amargas acreditando que chegava ao fim... se você não permitir que eu o leve, eu volto por onde vim, e retorno, sabe-se lá como, para salvá-lo. Quando eu  entrei no mar, ele ficou na praia, confiando em mim. Se eu traí-lo, um garotinho horrível como aqueles que eu deixei para trás provavelmente vai nascer naquele mundo, e eu não quero ser responsável por um deles. Eu posso ainda ser apenas um menino, mas sei o que é certo e o que é errado... e deixar alguém que confia em você para trás é completamente errado.

A mulher sorriu e Henry sentiu que desfalecia. Não sabia disso, mas acabara de dizer exatamente aquilo que ela queria ouvir. Sem dizer uma única palavra, a guardiã e rainha estendeu seu poder, e levou Henry de volta para a fronteira. Ele havia dado o sinal que ela esperava.


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