Johnny veio até nós, furioso, e com cara de que mataria alguém, Caspian percebeu e ficou de pé, fiquei também só um pouco mais atrás dele segurando em seu braço, mais um jeito de impedir que ele reagisse fisicamente às provocações de Johnny.

                - Você está me seguindo, é? – perguntei ao cara de olhos azuis.

                - Posso saber o que você está fazendo aqui com ele? – disse as ultimas palavras com desdém.

                - Tomando sorvete caso ainda não tenha percebido. – eu ainda estava com o meu.

                - E quem é você? – perguntou à Caspian.

                - Caspian é meu primo. – respondi antes de ele falar.

                - Sei...

                - O que você quer Johnny?

                - Preciso falar com você... A sós – acrescentou e já saiu puxando-me pelo braço.

                - Me solte. – tentei fazer isso, mas não me livrei de seu aperto.

                - Acho que você a ouviu. – pronunciou-se Caspian.

                - Não se meta. – rosnou o banqueiro. Os dois se encararam.

                - Então a solte. – Caspian falou ameaçadoramente serio. Controlei-me para não rir quando Johnny me soltou e Caspian me puxou para perto de si.

                De repente Johnny acertou-o com um soco. Caspian revidou e antes que Johnny rebatesse soltei meu sorvete no chão e meti-me entre eles pondo uma mão no peito de Caspian e a outra no de Johnny.

                - Chega! Pare com isso! – rosnei para Johnny. Virei para Caspian, ele tocava a testa com a ponta dos dedos e eu vi que escorria um fio de sangue pela lateral de seu rosto. Voltei a encarar Johnny. – Vá embora.

                - Certo, eu vou, mas não esqueça o que eu lhe falei. – olhou sugestivo para o lado, segui seu olha e vi meus irmãos juntamente com Eustáquio observando-nos de longe preocupados. Fuzilei Johnny mais uma vez.

                - Eu odeio você. - Declarei com lagrimas de raiva. Ele sorriu provocante.

                - Não se preocupe, vai aprender a gostar de mim, temos até que a morte nos separe. – olhou para Caspian uma ultima vez e foi embora. Meus braços baixaram, enxuguei uma lagrima solitária. Voltei-me para os outros.

                - Vamos pra casa.

[...]

                Ninguém pronunciou uma palavra no caminho até lá e permaneceu um silêncio profundo na residência dos Pevensie. Lagrimas se misturavam a água do chuveiro escorrendo por meu rosto enquanto eu permanecia imóvel em um choro silencioso sob ele.

                Após vestir a camisola branca (minha preferida), enrolei-me no robe e desci para a cozinha. Tomei um copo com água, passei pela sala onde Pedro lia um livro de química deitado no sofá e Eustáquio jogava uma partida de xadrez com Edmundo. O silêncio era absoluto. Subi novamente indo para o quarto que era meu e de Lucia (agora era de Caspian, minha irmã e eu nos mudamos para o quarto de nossos pais), a porta estava aberta, apareci nela e vi Caspian deitado em uma das camas, o rosto sério e os olhos estavam em mim como se me analisasse. Lucia vinha saindo, havia trazido as sacolas com as roupas novas dele deixando-as na poltrona. Adentrei com alguns passos. Ela parou a me ver.

                - Su, onde estão as roupas que compramos? – perguntou ela.

                - Em cima da cama. – respondi. Ela assentiu e se retirou fechando a porta. Caspian ainda me fitava do mesmo jeito. – E-eu só vim buscar uma coisa... – apressei-me para a cômoda evitando seu olhar, mas senti que seus olhos me acompanharam, me analisando...

                Ajoelhei-me diante do móvel e abri sua ultima gaveta, revirando em busca do que procurava.

                Revirei até achar a nécessaire branco, (já mencionei que esta é a minha cor preferida?). Organizei as roupas na gaveta igual a minha cara e fechei-a.

                - Achei. – passei o objeto de uma mão para a outra. Ele não fez nada além de me fitar. Vi que havia um novo fio de sangue na lateral de seu rosto. – Precisa cuidar desse corte. – falei suavemente. Por dois segundos ele permaneceu imóvel. Piscou desviando o olhar de mim e assentindo com um suspiro ele sentou-se.

                Deixei a nécessaire sobre a cômoda, peguei o kit de primeiros socorros na gavetinha do criado-mudo e sentei na beira da cama. Durante todo o tempo em que fazia o curativo Caspian fitava-me, sério, sem expressão e com um olhar que continuava a me analisar profundamente.

                - Pronto. – falei ao terminar, guardando as coisas. Mais três segundos.

                - O que ele quis dizer com “temos até que a morte nos separe”? – seu tom de voz era calmo, suave e não demonstrava nenhuma alteração. Não consegui falar nada ao olhar em seus olhos incrivelmente negros. Seu olhar prendeu o meu, de repente minha voz sumiu e senti as lagrimas chegando. – Tudo se você não quiser me falar nada, mas eu quero falar uma coisa para você. – chegou um pouco mais para frente aproximando-se de mim. – Estou querendo lhe falar desde que nos vimos pela ultima vez... Em Narnia... Desde que você quebrou aquele copo... – ele falou com ar de riso, mas logo voltou ao normal. – Eu amo você, Susana.

                Meu coração falhou e as lagrimas transbordaram.

                - Ah, Caspian, o que você está dizendo... ? – Levantei afastando-me da cama e virando as costas para ele completamente vencida pelas lagrimas. Ouvi Caspian levantar e aproximar-se de mim; senti suas mãos em meus ombros logo deslizando por meus braços até antes dos cotovelos. Girei em seus braços ficando de frente para ele, olhando em seus olhos através das lagrimas. Nossas testas se tocaram e uma de suas mãos foi para minha nuca.

                - Estou dizendo que, se estou nesse mundo, é por você, pra você. Eu te amo, Susana.

                - Eu amo você, Caspian. – meu coração se declarou.

                Ele não pensou duas vezes e logo me entreguei ao seu beijo.

                Como senti saudade!

                - Eu não posso... – chorei interrompendo o beijo e afastando-me mais uma vez virando-lhe as costas.

                - Por que não? – quis saber.

                Sentia-me a pior pessoa dos mundos.

                - Por que eu estou de casamento marcado... – solucei de uma vez. Como essa frase me doeu!

                O silêncio de choque de Caspian durou vários segundos.

                - Que...?

                - Johnny me pediu em casamento e eu aceitei. – falei ainda de costas. Chorando.

                - Então quer dizer que... – lutou para falar. – Você o ama.

                Voltei-me para ele. Sua expressão cortou meu coração em mil pedacinhos.

                - Não, Caspian, eu amo você. – disse.

                - Como quer que eu acredite se você vai casar com aquele cara? – seu tom de voz era duro.

                - É por que estou sendo obrigada. – solucei. Ele esperou que continuasse. – Foi a proposta dele: eu me casava com ele assim ele perdoava nossa divida e não tomava a casa.

                - Não acredito que vai se casar com esse canalha por causa de uma casa, Susana!

                - Não é pela casa. – balancei a cabeça lentamente, negando. – estava decidida a recusar, mas aí ele me chantageou: minha felicidade... Ou meus irmãos.

                - Eu não acredito... – falou com sigo mesmo irritado, passando as mãos no rosto.

                - Estava sem saída...

                Ele respirou depois de um tempo e veio até mim, pegando minhas mãos, olhando em meus olhos.

                - Su, escuta... Não importa o que aconteça, eu não vou deixar você ir mais uma vez.