Every Rose Has Its Thorn escrita por apataeavaca


Capítulo 11
Just another Sunday


Notas iniciais do capítulo

AEAE, demorou, mas chegou. Tomara que você aprovem, nos vemos nas notas finais :B



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“Just another Sunday, there's too many games in a day for a simple man to face”

08 de março de 2003 – Hopi Hari.
Maely P.O.V

- Eu não acredito que vocês gastaram TUDO ISSO pra vir num parque de diversões que fica a uma hora e meia de São Paulo! – disse Gabrielle contando moedinhas para comprar um sorvete. Pessoas pão duras: ela com certeza é.

- Não é um parque qualquer, é o HOPI HARI! A gente tinha que comemorar, nós passamos na segunda fase, deixamos os jurados de boca aberta… - disse Suzannah pulando de um lado para o outro na fila do “elevador”.

- Acho que a gente só passou porque o jurado pensou que a Maely ia azarar ele, sei lá – comentou Gabriel – Quem foi o energúmeno que deu a ideia de cantar Welcome to the Jungle?

- Foi você – falei dando um soco no ombro dele.

- Aai, mal ae…

- Caaaara, que fila enorme! – comentou Suzannah pulando para enxergar lá na frente.

- Qualquer coisa fica enorme perto de você – disse Matheus apoiado no divisor de fila.

- Só não te mato porque eu to feliz hoje – respondeu Suzannah.

- Por que essas pessoas estão me olhando assim? – perguntou Will esticando a calça para os lados na altura da coxa.

- Por que será?! – ironizou Matheus. Fala sério, que calça era aquela?

- Will, o que aconteceu com aquela história de “eu nunca vou usar isso porque é extremamente gay” quando fomos fazer compras? – perguntei. Ele revirou os olhos e continuou a encarar com um olhar matador as pessoas que passavam e olhavam para ele. Isso porque agora ele tinha parado de mostrar o dedo do meio…

- A Suzannah não vai poder entrar nesse brinquedo – disse J.C.

- Ah é, saca só! – respondeu ela passando para dentro da faixa de segurança do brinquedo.

- Lembrando que crianças não podem entrar nesse brinquedo – disse uma voz no auto falante. Uma mulher com o uniforme do parque se aproximou de nós e se abaixou para falar de frente com Suzannah.

- Garotinha, onde estão seus pais?

- Mas o que? – gritou Suzannah em resposta – Ô tia, eu tenho dezessete anos, não me chame de garotinha! E qual é a do preconceito?

- Eu vou precisar ver sua carteira de identidade – disse a mulher barrando Suzannah e mandando que eu, J.C, Matheus, Gabriel, Will e Gabrielle fossemos até nossos lugares no brinquedo.

Suzannah mostrou a carteira e, apesar do tamanho, ela tinha idade pra ir no brinquedo, então sentou-se no único lugar vago, ao lado do J.C.

O negócio começou a subir e não parava mais. Olhando de baixo, não parecia tão alto quanto realmente era.

- Maely? – perguntou Will se inclinando para poder me enxergar – Você ta meio… pálida!

- I-impressão sua – respondi; bela hora pra gaguejar.

- Você era a que estava mais animada pra vir no elevador – comentou Gabriel. Eu já estava ficando com agonia, aquele negócio não descia logo! - e agora fica ai com essa cara de maria-mole e… AAAAAAAAAH!

O brinquedo simplesmente despencou de lá do alto, nem deu tempo de gritar.

- NOSSA, EU QUERO IR DE NOVO! – gritou Suzannah lá do outro lado do brinquedo quando as travas de segurança foram liberadas.

- É, até que foi legal – disse eu, provavelmente aparentando que tinha visto toda a minha vida passar diante dos meus olhos.

- Ai, meu Deus! – disse Gabriel com cara de enjoado – Eu não gostei disso, não!

Ignorei. Não era ele que estava tirando uma com a minha cara?!

- Agora eu quero ir na montanha russa! – disse Suzannah pulando de um lado para o outro e correndo na frente para chegar até a fila que, surpreendentemente, não estava tão grande como esperávamos.

Suzannah não parava de pular, mas havia um grupinho de garotos que conseguiam ser mais inconvenientes que ela, falando alto e gritando para pessoas que nem mesmo estavam na fila.

- VIADO! – estava gritando um dos garotos para alguém que não conseguíamos ver do outro lado das escadas. Vi Will se empertigar do meu lado e dar uma risadinha.

- E você nem parece viado com essa roupa – comentou Will baixinho, mais para nós do que para o garoto escutar, mas ele escutou e se virou, olhando para Will de cima a baixo.

- Olha quem fala, com essa calça apertada e esse cabelinho… - disse ele, fazendo sons e gestos que insinuavam que Will era gay.

- Escuta aqui… - começou Suzannah tentando voar em cima do garoto, enquanto ele continuava fazendo sons que soavam como “ui”. J.C segurou ela, mas não teria muito sucesso em tentar segurar o Will, que já estava segurando o carinha pela gola e com os punhos serrados.

Antes que ele pudesse fazer qualquer coisa, a funcionária do parque abriu o portãozinho e tivemos que nos adiantar para ocuparmos nossos lugares no brinquedo, então Will largou o cara e foi até o vagão da montanha russa.

Me sentei ao lado da Suzannah, Will se sentou com Gabrielle e J.C com Matheus, de modo que Gabriel teve de se sentar com uma garotinha loira, um pouquinho maior do que a Suzannah – o que não quer dizer muita coisa.

- Moço, se eu gritar muito, você não liga, não, é que eu to com um pouco de medo – disse a menininha quando Gabriel se sentou ao lado dela.

- Tudo bem, fica tranqüila, eu te protejo – respondeu Gabriel com um sorrisão galanteador.

Virei-me para frente e parei de prestar atenção na conversa dos dois, me ocupando em me concentrar e ter certeza de que a trava de segurança estava no lugar certo. Suzannah, ao meu lado, não conseguia parar quieta, aparentemente tinha muito espaço sobrando no acento dela, o que é perfeitamente compreensível.

Quando o vagão começou a se mexer, algo no meu estômago deu uma volta completa, mas até que não era tããão ruim assim, se nós descontarmos o fato de que aquela era a maior montanha russa da América Latina e que vai a 105Km por hora, e o fato de que o cabelo do Will ficava voando para trás a todo momento.

- WILL! – gritei quando uma curva particularmente brusca fez com que eu enchesse a boca de cabelo laranja.

- O que? – perguntou ele virando o rosto para trás. Que tipo de pessoa anda numa montanha russa daquelas e fica tranqüilo daquele jeito? Quero dizer, ele sequer alterou a expressão do rosto.

- SEU CABELO TÁ NA MINHA CARA! – respondi; com certeza eu estava berrando.

- Foi mal – respondeu ele. O cara soltou a mão que estava usando pra se segurar e prendeu o cabelo com um elástico que estava preso ao pulso.

Depois de mais algumas curvas fechadas, passamos por uma estrutura que lançou um flash e Suzannah me abraçou nesse momento, gritando:

- Sorria pra foto!

Nem deu tempo de pensar em sorrir, quando Suzannah me abraçou, acabei largando a barra em que estava me segurando desesperadamente, de modo que devo ter saído com cara de quem estivera tentando engolir um elefante na fotografia.

- ADOREI! – gritou Gabrielle quando o vagão parou, pulando para fora e cutucando Will com o cotovelo – Você nem gritou! Que tipo de pessoa… nossa, que cara péssima!

Matheus e J.C pularam para fora, ligeiramente esverdeados e acredito que estavam evitando falar para não acabar vomitando.

- Viu, não foi tão ruim – disse Gabriel à menininha, pulando para fora do vagão meio desajeitado. – (Gabrielle, me segura!) Quando você quiser ir de novo, é só me chamar, viu?!

A menininha ignorou-o e se adiantou para a saída. Dirigimos-nos para lá também, mas Will hesitou.

- Eu preciso fazer uma coisa antes – disse ele observando as pessoas que passavam. Assim que vi o carinha com o qual ele estivera discutindo há pouco, soube o que aconteceria. E não era nada bom.

Will simplesmente se aproximou do cara, que se encolheu um pouquinho, mas não recuou, fechou as mãos e, segurando o cara pelo colarinho, meteu um soco no meio da fuça dele. Cara, o soco dele foi mais bonito que o que eu dei, bem, nele mesmo.

- O que foi que nós fizemos com esse garoto? – perguntou Suzannah. Não consegui nem responder.

- Beleza, agora eu to feliz – disse Will com um sorrisinho besta na cara e descendo as escadas da saída.

Eu e Suze o seguimos. A saída dava diretamente em uma lojinha com um grande monitor mostrando as fotos que haviam sido tiradas na montanha russa.

Matheus e J.C estavam com o mesmo tom esverdeado de quando o vagão parou, a diferença é que eles estavam gritando pra valer. Gabrielle estava com os braços pra cima e um sorriso demoníaco no rosto e Will, ao seu lado, estava com a cara que se faz quando se dá um passeio no parque, uma das mãos segurando o cabelo e a outra com o dedo do meio em riste. Sinceramente, o que a gente fez com esse garoto?

Eu e Suzannah estávamos “normais”, na medida do possível. Ela estava com um sorriso de orelha a orelha e eu, bem, exatamente como se estivesse tentando engolir um elefante. Fazer o que?!

Procurei pelo Gabriel no monitor, mas só enxerguei a garotinha que estava acompanhando-o olhando para o lado com cara de decepção. Olhando mais de perto, até que dava pra ver o cabelinho dele aparecendo por sobre a barra de segurança. Fala sério, que lástima, o garoto ficou abaixado o percurso inteiro.

- Ah, eu queria essa foto! – choramingou Suzannah olhando tristemente para a plaquinha onde dizia que o preço da foto era quinze reais e segurando a nota de dez reais que Gabrielle tinha dado para ela. Só dez reais para cada um, fala sério, a Gabrielle está muito pão-dura ultimamente, tem me lembrado o Raul.

- Pode pegar – disse Will estendendo para ela uma outra nota de dez reais.

- Ah, você vai me dar a sua parte do dinheiro?! – perguntou Suzannah virando-se para ele com os olhinhos brilhando e um sorrisão no rosto.

- Não – respondeu ele -, tirei essa do bolso do Matheus.

- Ah, beleza, então.

Suzannah deu de ombros e entregou as notas para a mulher que atendia o balcão e saiu de lá toda feliz com a foto nas mãos, pulando de um lado para o outro, dizendo que nunca mais ia largar a fotografia; no final, ela acabou pedindo para que eu a guardasse na bolsa.

Depois disso, fomos a mais dois brinquedos: um que girava sem parar, no qual Matheus e J.C nem quiseram chegar perto e um outro que era quase como que uma montanha russa, mas totalmente no escuro, com acentos que giravam.

- Olha só – gritou Suzannah apontando para uma tenda roxa e dourada localizada entre a Vila Sézamo e o lugar onde estávamos. – Eu quero ver o meu futuro!

Na entrada da tenda havia uma plaquinha cheia de estrelinhas dizendo “Madame Zara”. Entramos e demos de cara com uma velhota enrugada com um turbante rosa berrante na cabeça e acariciando um gato laranja.

- Bem vindos, meu nome é Madame Zara. – disse ela numa voz mecanicamente estranha, como se já tivesse dito isso mil vezes naquele dia – Aqui você vai descobrir tudo sobre o seu futuro por um precinho suuuper camarada de apenas quinze reais.

- Gabriel, me dá dinheiro – gritou Suzannah pegando a nota de cinco reais que havia sobrado do dinheiro de Matheus e arrancando a nota de dez de Gabriel das mãos dele antes que ele mudasse de ideia. Ela enfiou as notas na mão da vidente e se sentou num banquinho de três pernas coberto por um pano vermelho e cheio de franjinhas amarelas.

- Dinheiro muito bem gasto – comentou Will sarcástico, dando um tapinha no ombro de Gabriel que ainda estava com o olhar vidrado, provavelmente pensando no porque dele ainda dar ouvidos a Suze. A Madame suspirou, como se estivesse acostumada a céticos e se concentrou em uma bola transparente com uns brilhos violeta em volta.

- Eu vejo… - começou a mulher.

- Puff! – interrompeu Will.

- … que você vai fazer muito sucesso no seu futuro, vai ter uma marido carinhoso e vai ter… caramba… sete filhos.

- SETE? – gritaram Will e Suzannah ao mesmo tempo.

- Vão todos nascer do tamanho de grãozinhos de feijão. – comentou Gabriel.

- Cala a boca, Gabriel, os filhos são meus, não seus – respondeu Suzannah, voltando-se mais uma vez a atenção para a bola de cristal, como se pudesse ver alguma coisa além de fumaça violeta. – Conta mais.

- Isso, conta mais – disse Will com a voz carregada de sarcasmo.

- Bem, eu não vejo mais nada pra você aqui – respondeu a mulher. A expressão de Suzannah, antes um sorriso, murchou na hora. Era evidente que ela não estava satisfeita. – Mas ainda vou tirar as cartas pra você.

- Você não vê mais nada ou suas idéias acabaram? – perguntou Will com uma sobrancelha arqueada.

- Garoto, já chega, senta aqui! – gritou a madame Zara, empurrando o gato para o chão, que saiu bufando. Fez sinal com a mão para Suzannah abrir espaço e Will, de má vontade, se sentou no banquinho de três pernas. Foi aí que eu percebi como o banquinho era pequeno.

- Mas?! – gritou Suzannah, aparentemente incapaz de formular uma frase completa, de tão indignada que estava. Eu praticamente podia ouvir seu cérebro gritando “WILL, VOCÊ ME DEVE SETE E CINQUENTA PELA METADE DA CONSULTA ROUBADA!”

Will olhava para a mulher embaralhar as cartas com cara de tédio, enquanto ela ia colocando as cartas ao acaso em fileiras em cima da mesa coberta por um pano azul turquesa. Ela parecia cheia de raiva, enquanto Will, bem, parecia que estava fazendo uma visita de rotina ao dentista.

- Certo, garoto, escolha três cartas – disse ela com a cara amarrada, concentrada em mostrar para ele que ela não era nenhuma charlatã. Não que eu acreditasse... e nem ele.

Will apontou para três cartas aleatoriamente, sem prestar muita atenção, com a cara mais cética que eu já tinha visto e um sorrisinho petulante no rosto.

- O mundo – anunciou a mulher ao virar a primeira carta escolhida por Will, com uma guirlanda de flores e uma mulher parcialmente nua – Essa carta está me dizendo que você vai ter muita sorte em seu futuro próximo, com sucesso total, vai concluir seus projetos com lucidez, liberdade e felicidade e vai encontrar o amor em breve.

- Tá bom – disse Will com uma risadinha de lado. Quero dizer, era praticamente a mesma coisa que ela havia dito para Suzannah, tirando aquela parte, você sabe, em que ela vai ter sete filhos.

A mulher ignorou o comentário dele e virou mais uma carta, esta com o desenho de um homem pendurado em uma espécie de forca por um pé, de cabeça para baixo, com as pernas formando uma cruz.

- Mas… - hesitou ela – eu não…

Então virou a última carta, que tinha o desenho de um demônio com chifres e asas, com garras de águia e uma tocha na mão esquerda.

- Eu realmente não consigo entender – tornou ela – Garoto, escolha mais uma carta!

Will olhou para a mulher como se ela tivesse escorregado ainda mais alguns pontos de Q.I para ele, mas fez o que ela pedira.

- Os amantes?! – exclamou ela ao virar a carta com a representação de um homem e uma mulher e uma figura alada acima – Mas isso é… A não ser que…

Will estava a ponto de levantar da cadeira e chamar um psiquiatra, mas a mulher voltou a falar.

- Isso só pode querer dizer uma coisa – disse ela, ainda olhando de uma carta para a outra sem parar – Essas cartas se referem ao seu passado.

- Como é que é? – disse ele com uma expressão entre divertido e curioso.

- Veja bem, O enforcado – explicou a mulher – ele está representando, bem, não sei ao certo, mas creio eu que seja um dos seus pais, provavelmente a sua mãe, ou…

Ela parou um momento para analisar a próxima carta, depois olhou para Will como se subitamente tivesse entendido algo que nós não seríamos capazes de entender.

- Esta aqui se chama O diabo – disse a vidente, apontando para a carta com o demônio de chifres – Ela veio invertida e pode trazer muitos significados, mas com certeza está falando sobre uma pessoa em particular, com as seguintes características Luxúria, Amores proibidos, Intrigas e Artimanhas. Já esta outra…

Ela pegou a carta que tinha o homem e a mulher nas mãos e colocou as demais uma ao lado da outra, depois voltou a olhar para Will.

- Os amantes – concluiu – Talvez queira dizer que essas duas pessoas ao qual as cartas anteriores se referem, tiveram algum tipo de relacionamento, um amor proibido, seguido de provações e momentos de escolha que não foram fáceis.

Will agora parecia estar prestando atenção, mas eu duvidava que realmente estivesse acreditando no que a mulher dizia. Eu acho que ele estava mais impressionado do que qualquer outra coisa…

- Em conclusão – disse a vidente, juntando as cartas – aconteceu alguma coisa nesse relacionamento que fez com que ambos saíssem machucados dele. Um deles não se importa mais com o que passou, mas o outro continua extremamente machucado e ressentido. Eu realmente não sei o que aconteceu, mas me parece que sua mãe não era das melhores pessoas...

Com essa, Will se levantou, aparentemente furioso, quase derrubando Suzannah e o banquinho de três pernas.

- Você é uma charlatã desprezível – rugiu ele, ao que a mulher se encolheu com os olhos arregalados – Você realmente acha que me convenceu? Essa historinha medíocre não tem nada a ver comigo, você não sabe o que está dizendo. Não há probabilidade alguma de ter alguém com “ressentimentos”, ambos os meus pais estão mortos e se você acha que pode falar mal da minha mãe desse jeito, eu… Sinceramente, eu só não acerto um soco na sua cara porque é contra meus princípios bater em velhinhas.

E, dito isso, ele saiu da tenda batendo pé. Achei que deveria ir atrás dele, sabe-se lá o que ele poderia fazer, mas me contive para ouvir o que Suzannah ia dizer para a velha charlatã. Ela se limitou a estender a mão na frente do rosto dela e dizer: “Metade da consulta, metade do pagamento! Devolva meus sete e cinqüenta!”

Corri atrás de um pontinho laranja que andava absurdamente rápido e encontrei Will parado na lateral da roda gigante, sentado com uma espécie de “cantil” que cabia na palma da mão dele. Sentei-me do seu lado, especialmente desconfiada.

- Tudo bem? – perguntei. – Por um momento realmente pensei que você fosse bater na velhota.

- Eu só… fiquei um pouco mais nervoso do que deveria – respondeu ele dando um gole no que quer que fosse que estivesse dentro daquele mini cantil. – Eu simplesmente não admito que falem mal da minha mãe.

- Entendo, mas deixe pra lá, ela é só uma velha charlatã – falei, dando um soquinho de leve no ombro dele. – Quero dizer, a Suzannah com sete filhos?

- Eu sei – respondeu ele rindo e dando mais um gole daquela, hm, daquilo – é fisicamente impossível.

- O que você está bebendo? – perguntei.

- Á-água – respondeu ele se engasgando e guardando o cantilzinho de volta no bolso da calça indecentemente apertada. Como cabia um cantil no bolso daquilo? Como aquilo tinha bolsos? - Olha, a fila da roda gigante ta pequena.

Ele ficou de pé num pulo – repito, como isso é possível? – e me ajudou a levantar, logo depois me arrastando para a fila do brinquedo.

- E o resto do pessoal? – perguntei enquanto entravamos numa das cabines da roda gigante.

- Ah, depois a gente acha eles – respondeu Will achatando o nariz contra o vidro da cabine enquanto ela subia lentamente.

- Qual é a graça de andar na roda gigante? – perguntei, já me sentindo entediada, porque fala sério, aquele treco era leeeeeento…

- É girar, girar, girar, girar… - respondeu ele sem tirar o nariz do vidro e fazendo movimentos circulares com o dedo na minha cara. Tentei morder o dedo dele, mas ele recolheu a mão antes que eu pudesse fazer isso e gritou – OLHA, É A SUZANNAH!

- Onde? – perguntei, ficando de pé e achatando o nariz no vidro como ele.

- Alí, ó, aquele pontinho pequenininho e vermelhinho! – respondeu ele apontando, bem, para uma coisinha vermelha saltitante.

- Só podia ser ela mesmo – comentei.

- Claro! – falou Will desgrudando a cara do vidro e sentando-se finalmente – O que mais seria um MINÚSCULO pontinho vermelho que pula?

Sinceramente, ainda bem que estávamos sozinhos. Suzannah mataria ele.

Eu ainda estava com o rosto achatado no vidro e percebi que o sol já estava na linha do horizonte, então o céu estava cheio de nuvens violeta e laranja. Olhei para o lado e Will estava olhando para o mesmo lado que eu - as nuvens, quero dizer – e começou a cantarolar uma música baixinho. Reconheci como sendo Twist and Shout, dos Beatles, e me virei para ele.

- Well, shake it up baby now – cantou ele ficando de pé e me puxando para o meio da cabine. - Twist and shout…

E foi aí que começamos a dançar. Bem, na verdade, estávamos basicamente girando e girando.

- …come on, come on, come, come on baby now – continuou - Come on and work it on out. You know you twist, little girl, you know you twist so fine. Come on and twist a little closer now and let me know that you're mi…

Mas no momento em que ele foi terminar a estrofe, a roda gigante parou e uma mulher abriu a porta da cabine e nos olhou como se estivéssemos, hm, bêbados?! Saímos da cabine rapidamente.

Andamos uns três passos, nos entreolhamos, e começamos a gargalhar. E, quero dizer, qual foi a de cantar e dançar na cabine da roda gigante?

Continuamos andando, procurando por Suzannah, Gabriel, J.C, Matheus e Gabrielle.

- Deve estar quase na hora do ônibus sair – comentei, olhando para cima e vendo umas nuvens suspeitas – To achando que vai chover.

- Perai – disse Will, indo até um homem que estava entretido comendo churros e perguntando alguma coisa que eu não pude ouvir. Depois voltou com uma cara estranha – Que horas o ônibus sai mesmo?

- Hm, seis horas – respondi, desconfiada.

- Ah – disse ele abrindo um grande sorriso. Sarcástico – Tamo fudido, são seis e quinze.

Nem respondi, apenas agarrei-o pela manga da camisa e começamos a correr desvairadamente até a entrada do parque. Quando conseguimos sair e chegar até o ponto do ônibus, não havia ninguém.

- Talvez ele ainda não tenha chegado – disse Will com um sorrisinho irônico.

Ignorei o comentário e coloquei as mãos na cabeça, não havia esperanças. Certo, tínhamos míseros vinte reais e ainda por cima, estava começando a cair algumas gotas de chuva espaçadas.

- Eu vou ver se aquele cara ali pode nos dar alguma informação – disse Will indo até um cara com o uniforme do parque, varrendo o chão. Um momento depois ele voltou e parecia um pouco mais despreocupado.

- E então? – perguntei, tentando me controlar para não voar no pescoço dele, porque ele simplesmente era calmo demais.

- Seguinte – disse ele se virando para o estacionamento e começando a andar – tem uma pousada mais ou menos naquela direção, perto de uma cidade chamada Louveira. Você conhece?

- Nunca ouvi falar – respondi, esperando enxergar uma construção logo adiante, mas só vi terra e mato.

- É só seguir essa estradinha – disse Will – O cara falou que é um pouco mais de meia hora a pé. A gente vê se consegue ficar por lá.

- Com vinte reais? – perguntei, andando rápido para conseguir acompanhá-lo.

- Qualquer coisa, você finge que desmaia. Eles não vão simplesmente colocar uma garota desmaiada pra fora da pousada.

Continuamos andando pelo que me pareceu dois anos, tentando lutar contra o vento infernal que jogava meu cabelo no meu rosto a todo momento e, acredite, não adiantava mudar de lugar, nem tentar andar de costas, porque eu fiz isso e não adiantou.

- O que você está tentando fazer? – perguntou Will sem parar de caminhar.

- Ué, seu cabelo não tá…? – mas não consegui terminar a minha frase, porque o cabelo dele estava simplesmente ondulando às suas costas. – Cara, eu te odeio.

- O que foi que eu fiz? – perguntou ele, mas nem mesmo se virou para me olhar e cantarolando qualquer coisa.

- É O SEU CABELO! ELE É SIMPLESMENTE MELHOR QUE O MEU! – gritei, para fazê-lo se virar para mim. Mas não adiantou e o pior, começou a chover mesmo, de verdade.


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Notas finais do capítulo

Seguinte, ai vai a tradução da parte de Twist and Shout que o Will canta na roda-gigante:
"Bem, dance agora baby. Gire e grite... Vamos, vamos, vamos, vamos lá baby. Vamos lá, vamos dar certo juntos. Você sabe que gira, garotinha, você sabe que gira tão bem. Vamos, gire um pouco mais perto agora e me deixe saber que é mi(nha)." - a parte entre parênteses foi interrompida pela mulherzinha do parque ¬¬'

Enfim, espero que estejam gostando, comentem se não estiverem... e se estiverem também, por favor ;)