Acordara naquele sábado com vontade de morrer. Não entendia o por que de estar ali, deitada, sujeita ao planeta Terra e suas variações. Havia uma semana desde que falara com Lucas pela última vez e meu coração estava apodrecendo com sua ausência em minha vida. Estiquei meu braço esquerdo em direção ao telefone celular cor-de-rosa em cima de meu criado-mudo e ele caiu no chão. Fiz uma careta e rolei pelo colchão para pegá-lo. No visor, ali estava. Não consegui deixar de sorrir.


CHAMADA PERDIDA DE LUCAS


- 23H03MIN DE ONTEM-


Minha cabeça girava, não sabia o que fazer. Seria melhor ligar de volta? Esperá-lo retornar a chamada? Não aguentei nem pensei duas vezes, disquei seu número e levei o celular ao ouvido.


-Alô? -uma voz feminina murmurou quase silenciosamente.


-Por favor ,o Lucas está?


-Ah, quer falar com ele? Um minuto. - a pessoa cobriu o telefone e ouvi um grito abafado dizendo "Lucas! É para você!". Após alguns segundos e umas reclamações por parte de Lucas, pelo que ouvi, ele atendeu.

- Alô?
-Lucas? É Caroline.


-Carol! Oi! O que aconteceu para me ligar tão cedo?
- perguntou em um tom preocupado.

Olhei o relógio em minha escrivaninha. Ligara para Lucas às sete da manhã de um sábado.


-Ahn... Desculpe, não sabia que era tão cedo... - disse ao corar - É que você me telefonou ontem, achei que era importante. – procurei uma desculpa.

–Não, eu apenas... iria convidá-la para passear algum dia desses. - ele sugeriu de forma educada.

–Ah, entendo... Nesse caso, peço desculpas por incomodá-lo tão cedo, você está com visitas e...

–Ela é só uma amiga, Carol. - sua resposta foi direta e fria, entrecortando o que eu estava prestes a dizer. - Veio me entregar um trabalho e adora bisbilhotar meus assuntos pessoais. Atendeu por acaso, enquanto eu procurava um livro para emprestar-lhe.

–Tudo bem. – resmunguei alheia, tentando soar indiferente. -  Tenho que ir, até mais. - eu respondi rapidamente e encerrei a chamada. Ele estava com alguém em casa. E era uma mulher. Mesmo alegando ser apenas amiga, amigas podem fazer coisas.

Aquilo fazia com que minha vontade de morrer fosse ainda maior. E ali estava: a máscara da Melancolia havia sido criada.

Fiz um enorme esforço para não pensar em Lucas durante aquele dia. Estava decepcionada, pois achava que eles seria melhor que os cafajestes desse planeta, mas tudo indicava que eu estava errada.

Olhando para o céu - branco como leite - pensei que iria nevar durante esses dias, então vesti um enorme sobretudo preto e um gorro da mesma cor, que contrastava com meus cabelo quase loiros. Fui ao café mais próximo e pedi um chocolate quente para tentar me aquecer, mas nada parecia funcionar. A única coisa que poderia me aquecer era ele, infelizmente. Condenava-me por ter me apegando tanto…

Naquela noite, fui ao The Republic novamente. Talvez aquele ambiente onde conhecera meu grande vício poderia me trazer bem-estar novamente. Dessa vez escolhi sentar-me ao balcão, perto do barman, que não se incomodou com minha presença.

–Seu perfume cheira a cerejas. - uma voz atrás de mim murmurou. Virei minha cabeça sutilmente, de modo que meus olhos pudessem ver o dono daquela frase.

–Lucas... O que está fazendo aqui?

O que ele estava fazendo ali?

– Vim vê-la, não posso?

–Pode... - respondi e senti meu rosto ficando quente, e provavelmente vermelho. Eu ficava vulnerável ao seu lado. Ele olhou diretamente em meus olhos - o que era uma das coisas que eu mais amava nele, seu contato visual - e inclinou-se para frente, colocando cada uma de suas mãos nos braços da cadeira onde eu estava sentada. Seu rosto colou-se ao meu.

–Quero você, Caroline. - ele murmurou calmamente. Desviei o olhar, fitando o chão. Eu me sentia entorpecida e com calor, não queria que ele me visse tão imperfeita daquele jeito... Mas tudo o que ele fez ao me ver daquele jeito foi sorrir. Não aquele sorriso envergonhado que se dá quando não se sabe o que fazer. Aquele sorriso sincero de deleite, como uma criança quando ganha um doce.
Ele tirou do bolso uma nota de cinco dólares e deixou em cima do balcão, para pagar a bebida que eu consumira mais cedo. Em seguida, segurou firmemente minha mão esquerda e me guiou até a saída do pequeno bar. Eu só observava-o, sem contestar nem consentir, me sentindo hipnotizada por cada um de seus movimentos. Quando finalmente saímos, o frio pareceu congelar todos os membros de meu corpo e Lucas pareceu notar isso. Ele, como bom cavalheiro, colocou um de seus casacos sobre meus ombros, e atou sua mão à minha novamente. Claramente sem reagir, apenas observei-o enquanto me guiava. Ainda estava magoada, mas eu parecia ter-me esquedico daquele detalhe.

–Caroline... - ele começou.

–Sim? – devolvi velozmente.

- Desculpe por hoje cedo, aquela amiga me deixou estressado e parece que acabei descontando em uma pessoa a que prezo muito.

–Sem problemas, querido. - eu disse enquanto encarava seus olhos, e sorri timidamente. Querido? O que se passava em minha mente? Eu nem sabia mais… Não sei o que aconteceu após isso, foi tudo tão rápido que...

Repentinamente, Lucas me colocou contra uma parede e me beijou lentamente. Sua língua acariciava a minha em movimentos suaves e simultaneamente fogosos, nossos lábios em uma sincronia agradável. Suas mãos estavam nas paredes, uma de cada lado de minha cabeça, impedindo que eu escapasse de algo. Meus braços ficaram parados, mortos, ao lado de meu corpo, e eu apenas retribuí o beijo.

E aquela maldita máscara parecia fugir de mim quando eu estava com ele.

Por que?