Capítulo O3

A mandíbula do Uchiha se contraiu e os punhos ficaram cerrados.

- Isso não tem graça, Sakura! – Esbravejou o moreno. Estreitando os olhos, ele manteve-se onde estava, desviando-os para Tsunade que parecia tão atordoada quanto ele.  – O que fez com ela?!

- Olha como fala comigo, Uchiha. – ralhou Tsunade.

Aquela frase realmente preocupou Tsunade.

- Sakura, você o conhece não é? – ela perguntou receosa enquanto apontava para o moreno. Tudo o que ela viu foi a Uchiha menear um não com a cabeça com os olhos assustados. – Onde estão os exames?!

A enfermeira pegou o envelope que a médica havia deixado em cima da cabeceira da cama onde a rosada estava deitada. Ao abrir, retirou algumas tomografias.

- Sakura! Você não me respondeu! - gritou

A rosada o olhou assustada, enquanto o Uchiha mantinha a testa franzida. Sua cabeça estava pesada e dolorida,  e o simples fato da luz acesa no quarto fazia com que seus olhos ardessem e tivesse vontade de dormir. Era como se não dormisse há dias e as pessoas ao seu redor gritando, não estava ajudando em nada.

O homem moreno, que por algum motivo estava irado com ela, falava cada vez mais alto com ela e Tsunade, a única conhecida até agora, parecia estar disputando quem gritava mais alto.

As vozes começavam a ficar longe e tudo ao seu redor estava borrado. Involuntariamente, levou as mãos à cabeça e tentou controlar sua respiração.

- Tsunade-sama! – a enfermeira gritou, chamando a atenção dos outros dois. – O pulso dela está caindo!

- Me espere no corredor, Uchiha! – ordenou a médica e quando percebeu que ele iria retrucar, gritou. – Agora! Eu já vou e cessarei todas as dúvidas que você tiver...

Relutante e bufando, Sasuke bateu a porta atrás de si sem respeitar o estado em que a esposa se encontrava.

- O que você está sentindo, Sakura? – Tsunade perguntou enquanto abria e examinava os olhos da pupila.

- Dor... de cabeça. – resmungou.

- Fique calma. – ela apertou a mão da Uchiha e voltou-se para a enfermeira. – Sede-a e fique com ela até que eu volte. Qualquer problema não hesite em me chamar, fui clara?!

- Sim, Tsunade-sama.

Sakura pôde ouvir alguns passos afastando-se pouco a pouco e no instante seguinte, sentiu seu braço formigar. Logo em seguida, sentiu que algumas vozes ficavam longe e a última coisa que conseguiu ver foi a enfermeira sorrindo.

- Descanse, Sakura-san.

*

Encontravam-se no mesmo local: a sala de Tsunade.

Impaciente, Sasuke permanecia de braços cruzados encostado na parede, enquanto olhava com impaciência a médica de sua mulher ver alguns exames.

Ele acompanhou com os olhos cada passo da médica, aguardando que ela dissesse alguma coisa.

- Devido a queda, Sakura sofreu uma lesão no lobo temporal. Isso explica o porque dela não saber quem é você!

- E o que isso quer dizer?! – o tom de voz dele pareceu preocupado.

- Que Sakura está com amnésia... – concluiu com pesar. – Precisamos saber os fatos que ela lembra e o que esqueceu.

Sasuke permaneceu calado fitando o chão. Já não bastavam os problemas que tinha.

- Vocês estão casados há seis anos... – Tsunade pareceu pensar alto. – E ela não se lembra de você...

- Quer dizer que ela não lembra das coisas que aconteceram há seis anos atrás?! – perguntou-a incrédulo.

- Talvez até mesmo um pouco mais, Sasuke. – corrigiu-o. – Precisarei fazer mais alguns exames e conversar mais com ela para poder ver até onde a memória de Sakura está intacta.

Ele concordou com um aceno de cabeça.

- Além disso, não sabemos se essa amnésia é permanente ou passageira.

- Isso quer dizer q-

- Talvez ela nunca lembre de você ou dos fatos que aconteceram durante esses anos.

Sasuke passou as mãos pelos cabelos de forma nervosa. Aquilo só poderia ser um pesadelo em que ele estava torcendo para despertar logo.

- Você só pode estar brincando. – grunhiu alterado.

- Agora eu me arrependo de ter dito milhares de vezes que queria que ela nunca tivesse te conhecido. – lamentou  a médica. – Vou analisar esses exames com calma e também a examinarei  melhor. – Tsunade estreitou os olhos para o moreno. – Enquanto isso, você não tem nada a fazer aqui, Sasuke. Vá para casa e descanse. Ligarei quando tiver alguma notícia.

- Não vou a lugar nenhum... – respondeu-a convicto.

- E sua filha?

- Está com Shizune.

- Conheço a minha afilhada e duvido que ela queira ficar com Shizune. – resmungou. – Seja presente na vida de Saky pela primeira vez na sua vida, Sasuke. Aquela menina tem apenas cinco anos, por favor!

Sasuke suspirou cansado. Sua vida já estava um verdadeiro inferno e como se já não bastasse, as coisas pareciam ficar piores a cada dia.

- Quando poderei vê-la?

- Deixe-a descansar e os exames não vão demorar muito. Volte amanhã e terei mais respostas...

Mesmo  resignado, Sasuke decidiu ir para casa. O cansaço era nítido em suas feições e ele já não se lembrava quando tinha descansado. Infelizmente sua presença não ajudaria em nada, Saky estava “sozinha” e ele teria muitas perguntas para responder à ela.

*

O trajeto para casa foi relativamente tranqüilo e rápido. A sala estava escura e uma luz fraca escapava pela fresta da porta do quarto de sua filha. Já era tarde, mas duvidava que Saky estaria dormindo.

Retirou o casaco preto que usava e o deixou arrumado em um dos encostos da cadeira na sala de jantar. Os sapatos foram colocados ao lado da porta  como sempre fazia e as chaves postas em cima da mesinha do telefone.

- Sasuke? – os olhos do Uchiha encontraram Shizune surgindo da porta da cozinha e pelo tom de voz, a mulher parecia bastante preocupada. – Como ela está?

- Ela não se lembra... – murmurou baixo.

- Como..?

- Quando cheguei e fui visitá-la, Sakura não se lembrou de mim, não sabia quem eu era. – respondeu com pesar. – Tsunade fará mais exames nela. Onde está Saky?

- No quarto, mas está acordada. A pobrezinha está chamando o nome da mãe a todo o tempo.

O Uchiha levou as mãos ao rosto cansado e suspirou. Seria difícil explicar à filha e, por mais que a menina fosse inteligente, era apenas uma criança de cinco anos.

- Fale com ela, Sasuke.

Droga! Ele era péssimo em conversar com sua filha. Algo o bloqueava. Um pensamento que só ele sabia. Haviam coisas que nem mesmo Sakura sabia. Coisas que faziam Sasuke agir da forma que agia, e pensar coisas “absurdas”.

- Papai?

Os dois adultos viraram-se surpresos para o topo da escada, encontrando Saky e seu famoso urso rosa agarrado ao corpo. A menina percorreu toda a sala em busca da figura da mãe, mas não encontrou-a.

- Se quiser posso ficar por essa noite, Sasuke. – Shizune comentou. Conhecia o Uchiha há anos e sabia de sua dificuldade e falta de paciência com a pequena.

- Pode ir, Shizune. Preciso conversar com ela.

- Está bem. Amanhã bem cedo, estarei aqui. Boa noite, Saky... – Ela falou um pouco alto, recebendo um sorriso da menina. – Sasuke...

Vendo a mulher despedir-se e trancar a porta atrás de si, Sasuke subiu as escadas com passos duro. Saky o observava a cada passo e percebeu a irritação no rosto do pai. Não sabia o que estava acontecendo ou se tinha feito algo. O que sabia era que ele estava bravo e que sua mãe não estava em casa.

- Por que não está dormindo? – perguntou duro como sempre. – Já está bem tarde para estar acordada.

- Eu quero a mamãe... Cadê ela?

- Vamos para o quarto, Saky.

Colocando uma das mãos nas costas da pequena, Sasuke guiou-a até o quarto e a sentou na cama desfeita, sentando-se nos pés da pequena.

- Sua mãe está no hospital, Saky...

- Por quê? Ela tá doente?

- Sua mãe caiu e vai ficar alguns dias no hospital até melhorar. – Sasuke percebeu os olhos baixos da pequena. – Enquanto isso, você precisará ficar com a Shizune.

- E você? Você não vai ficar comigo? – Ela resmungou chorosa.

- Preciso trabalhar e ficar no hospital para cuidar de sua mãe.

- E-eu não posso ir?

- Não, Saky. Não pode... – ajeitando a menina debaixo das cobertas, Sasuke colocou a pequena para dormir. – Agora durma.

- Eu quero a mamãe... – resmungou olhando-o. – Eu quero ela...

- Já disse para dormir. – Sasuke disse em um tom alto o suficiente para que a menina se encolhesse debaixo das cobertas.

Apagando a luz do pequeno abajur branco localizado ao lado da cama, Sasuke encostou a porta do quarto e caminhou em direção ao seu. Quando entrou, viu a mala que ele mesmo havia arrumado no dia anterior e novamente as imagens daquela maldita discussão vinham-lhe na mente.

Tudo parecia desmoronar bem diante de si e a culpa parecia lhe invadir cada vez mais.

Se não tivesse sido tão egoísta com ela, se fosse mais presente, se conversasse mais com Sakura e lhe contasse a verdade nada disso estaria acontecendo. Infelizmente não poderia voltar no tempo e tentar corrigir seus erros.

Largando suas roupas em cima da cama, o moreno resolveu que precisava de um banho. Precisava tirar aquele cheiro do hospital de seu corpo ou ficaria louco. Não foi nada muito demorado e em menos de quinze minutos, Sasuke já se encontrava no andar debaixo da casa.

O Uchiha pegou o notebook fechado e colocou na mesa, sentando-se a frente dele. Estava exausto, mas não conseguiria dormir. Assim que colocasse a cabeça no travesseiro e deitasse na cama onde dividia com ela, aqueles olhos verdes chorosos o perseguiriam.

- Droga. – ele fechou os punhos e socou a mesa.

Olhando cansado para a tela do aparelho, Sasuke buscou dentre tantas pastas seu trabalho inacabado.

Seria uma longa noite...

“Na mais escura das noites, eu estarei lá...”