à Eternidade escrita por GabrielleBriant


Capítulo 5
O Sepulcro de Snape




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V

O SEPULCRO DE SNAPE

Após uma série de discussões que pareciam não ter fim, Severo decidiu que ele deveria parar de pedir a ajuda de Evangeline, caso quisesse manter a sua sanidade. Se a mulher não queria ajudá-lo, tudo bem; ele descobriria o que mudara no mundo trouxa sozinho.

Evangeline, por sua vez, viu que era muito confortável para ela simplesmente aceitar o pacto implícito de silêncio imposto por Severo. Assim, ela limitou-se a levar sua vida exatamente como a levava antes da chegada de Snape, cumprindo a sua rotina e ignorando completamente a presença do homem que perambulava em sua casa, como se ele não passasse de uma sombra.

Com o lento passar das semanas, no entanto, ela começou a se sentir incomodada. Era palpável o clima tenso quando os dois se encontravam na sala ou na cozinha... era claro que eles evitavam se olhar...

Além de tudo, toda aquela situação não estava ajudando nem um pouco na adaptação dele: as poucas coisas que ele aprendera sobre a vida dos trouxas provinham da sua experiência na lojinha de Alexandra... com um aprendizado tão lento ele demoraria mais ainda pra sair da casa dela, e isso ela não seria nada bom.

A soma desses dois fatores contribuiu para que Evangeline chegasse à conclusão que não era a pessoa certa para ajudar aquele homem. Assim, decidida a descumprir o último pedido do seu tio-avô, ela escreveu uma carta para Minerva, solicitando uma visita.

Dois dias mais tarde, um gigante batia na porta da sua casa e explicava ter sido enviado pela bruxa. E, logo, Evangeline estava aparecendo naquele exato ponto onde, há dois meses, ela fora buscar Snape.

- Hogwarts – o gigante disse alegremente, enquanto abria os portões e dava espaço para que Evangeline entrasse. – Aposto que você nunca viu um lugar mais bonito, huh?

Evangeline olhou para o castelo. As flores desabrochavam com a chegada da primavera e alguns alunos passeavam pelos jardins. O sol brilhava forte sobre o lago... Aquela era a imagem que ela tinha de Hogwarts em sua lembrança – e não o lugar sujo e sombrio da sua última visita.

Sentiu um nó na garganta ao lembrar que na última vez que vira aquele lugar cheio de vida fora também a última vez que viu Alvo... E fora nessa ocasião que ele fez o pedido que ela estava prestes a descumprir. Com uma voz fraca, que contrastava com a alegria do gigante, ela limitou-se a responder:

- Eu já estive aqui antes.

- Mesmo? É estranho que trouxas venham aqui; sem ofensa. Mas venha, siga-me. Te levarei para a sala da direção. – Eles começaram caminhar. – Você devia ter conhecido o diretor anterior. Não que a Professora McGonagall não seja maravilhosa, ela é; mas Alvo Dumbledore era excepcional. O melhor bruxo dos últimos tempos!

- Eu conheci Alvo.

O homem a olhou curiosamente, enquanto a guiava para dentro do castelo. Eles passaram despercebidos pelo salão de entrada da escola, e logo começavam a fazer o longo caminho até o sétimo andar de uma das torres.

- Você conheceu Alvo? Como?

- Sou sobrinha-neta dele.

- E é trouxa? Estranho...

- Sou. Minha avó era trouxa e a minha mãe um aborto.

- Não teve muita sorte com o sangue mágico, hein?

Evangeline apenas rolou os olhos, alegrando-se por reconhecer o corredor vazio que levava à entrada para a sala da direção. Logo o homem barbudo estava falando qualquer senha que ela não se preocupou em decorar e guiando-a para dentro.

- Diretora? A Srta. Evangeline chegou.

E, sem mais, ele abriu a porta e, assim que Evangeline cruzou-a, a fechou.

- Evangeline, querida! Em que posso lhe ajudar?

Evangeline mordeu os lábios enquanto entrava: imediatamente deparou-se com um retrato de Severo Snape. As feições eram justamente as esperadas: cara de poucos amigos, lábios ligeiramente crispados e reservou para Evangeline um olhar particularmente frio, quando ela entrou.

Um tanto relutante, Evangeline se aproximou do quadro e passou os dedos delicadamente por sua moldura.

- Ele foi diretor?

“O que você acha?” A voz que saiu do quadro era tão irrefutavelmente característica que Evangeline teve vontade de rir. “Estou aqui, não estou? Condenado a passar a eternidade nessa parede, cercado de velhos desinteressantes... Esta é a minha penitência por ter servido a escola! Eu deveria ter escolhido o Lorde das Trevas! Pelo menos poderia passar a minha eternidade em paz!”

Minerva olhou de esguelha para a retrato.

- Ele foi diretor, sim. Por um ano.

- Ah...

Desviando-se do retrato resmungão, Evangeline encaminhou-se para a cadeira que ficava de frente ao gabinete de Minerva.

- Não tem problema, nós conversarmos aqui?

- Não – Minerva riu-se. – Esses diretores sabem todos os segredos da escola. Manter a descrição é uma das grandes virtudes deles todos. Eles já sabem o que aconteceu, Evangeline.

Evangeline olhou ao redor e, por fim, decidiu falar; não seria problema dela se algum desses diretores espalhassem sobre Snape.

- Eu pensava que apenas os diretores mortos ganhavam um retrato.

- De fato. Mas eu providenciei um retrato de Severo antes que as pessoas sentissem falta. Encantei-o para falar ou resmungar vez por outra. Como Severo não era um homem de muitas palavras, certamente ninguém achará que é um retrato falso.

- Você fez um ótimo trabalho!

Evangeline sorriu sem graça e olhou para o chão. Procurou não fitar o retrato que ficava perto de Minerva, olhando-a com os seus olhos cintilantes e com um sorriso simpático, que ele sempre tinha em seu rosto quando sabia que algo estava errado.

E logo a voz calma que ela jamais pensaria ouvir novamente falou com ela.

“O que aconteceu, Evangeline?”

Ela molhou os lábios e voltou a olhar o retrato do tio.

- Eu o odeio. Ele não é o tipo de pessoa que eu quero em minha casa...

O ex-diretor sorriu brandamente.

“Eu imaginei que você acabaria reclamando dele, Evey.”

- Por que eu, tio? De tantas pessoas que lhe adoravam, porque essa tarefa teve que vir a mim?

“Porque, no fundo, vocês são parecidos. Eu sei que vocês podem se entender e...”

- Ele é um assassino! – Ela falou alto, descontrolada. Depois respirou fundo e procurou controlar-se. – Ele me disse que é um assassino, torturador, estuprador... E, eu não tive problemas em aceitar um homem que era um fugitivo, mas era inocente, mesmo que eu o odiasse! Mas um assassino! Você não acha que é demais?

Minerva levantou-se, circulando o seu gabinete e aproximando-se de Evangeline.

- Ele não é isso que você pensa.

- Então o que ele me disse é uma mentira? Ele nunca matou ninguém? Me diga que sim, Minerva, e eu aceitarei tentar novamente!

A bruxa calou-se, dando a Evangeline a confirmação que ela precisava. Depois de um tempo de silêncio, a voz suave de Alvo soou.

“Você já visitou o meu túmulo, Evey?”

- Não, tio Alvo – ela respondeu exasperada.

“Minerva, você faria a gentileza de levar a minha sobrinha lá?”

Minerva apenas assentiu e segurou a mão de Evangeline. Sem entender, ela deixou-se ser guiada novamente para fora do castelo. Mas fez um caminho pelos jardins que ainda não conhecia; e acabou num pequeno cemitério. Logo, as duas se encaminharam para um imenso mausoléu branco, onde jazia o corpo de Dumbledore.

Evangeline sentiu os olhos marejarem, mas não chorou. Apenas passou a mão levemente pelo mármore branco e sentiu-se com aquilo um pouco mais próxima do seu tio.

- Severo Snape – Minerva recomeçou – merece mais do que ninguém a paz. O que ele te disse sobre a guerra?

- Ele me mostrou uma coisa no braço dele e disse que tinha matado e torturado. Só isso.

Minerva suspirou, ajeitando os seus óculos e olhando profundamente para Evangeline.

- O que ele a mostrou foi a Marca Negra. O símbolo dos soldados do exército das Trevas. Mas não se engane, Evangeline. Por quase vinte anos, ele foi um espião. Ele trabalhou dia após dia ao lado da morte. Indo ao encontro do homem que poderia o matar e trazendo informações para o nosso lado. Se não fosse por ele isso não existiria. – Minerva abriu um pouco os braços numa tentativa de mostrar a Evangeline a paz que se instalara naquele lugar. – Eu provavelmente estaria morta. A morte de Alvo teria sido em vão... e eu nem quero imaginarcomo estaria o mundo trouxa.

“Severo não viveu. Ele perdeu a sua juventude. Sacrificou anos e anos de vida fazendo o que ele não gostava, apenas por uma causa. Ele não gostava de lecionar, Evangeline, e ele poderia ter sido muito mais que um mero professor. Ele era brilhante. Ainda assim, ele escolheu permanecer numa posição na qual ele pudesse atuar melhor na guerra.”

Evangeline engoliu seco, talvez começando a entender porque Severo não gostava de falar sobre seu passado – deveria ser doloroso demais.

- Então, quando ele disse o que fez...

- Ele cometeu erros em sua vida, sim. Antes de se tornar espião, ele era do exército das Trevas. Mas ele se redimiu. Ele matou e torturou? Sim. Contra a sua vontade. Ele fazia o que fosse necessário. Ele matava uma pessoa para poupar a vida de dezenas. Eu acho errado que você o crucifique por isso... cada mal que ele fazia, abria uma ferida nele.

Evangeline suspirou.

- Se você ainda tem alguma dúvida do caráter do homem que está em sua casa, olhe ao lado.

Ao lado direito do túmulo de Alvo, estava uma grande lápide em mármore cinza. Ela se aproximou, para ver que a lápide pertencia a Snape... E estava repleta de flores e todos os tipos de homenagem.

- “Aqui jaz Severo Snape, o herói que viveu pela guerra e morreu por amor”. O que isso quer dizer?

Minerva sorriu.

- Isso é uma história que apenas Severo pode contar. O que eu quero dizer é: se ele fosse tão vil quanto você imagina, como a lápide dele estaria assim?

- E por que ele não volta?

- Ele acha, com razão, que jamais descansará no mundo mágico; no mundo que sempre o julgou erroneamente. E você é a única pessoa que pode dar a ele um novo começo. Apenas seja paciente e dê ele mais uma chance.

Ela assentiu.

- Tudo bem. Eu vou tentar.

XxXxXxX

Evangeline suspirou quando chegou à sua casa. Parada de frente à porta e segurando as suas chaves, ela imaginou se realmente conseguiria dar uma nova chance a Severo... e, principalmente, se ele estaria disposto a aceitá-la.

Ela mordeu o lábio inferior, respirou fundo, e abriu a porta. À sua frente, sentado ao sofá, estava Severo Snape, olhando descontente para a televisão e, aparentemente, tentando descobrir como mexer no controle remoto.

Ela deu um meio-sorriso. Entrou em casa, jogou a bolsa sobre a mesa atrás do sofá e sentou-se ao lado dele.

- Você nunca vai conseguir mudar o canal se continuar batendo no controle.

Sentiu os olhos negros e frios cravarem-se nela, tentando intimidá-la. Uma sensação esquisita tomou conta do seu corpo. A voz dele saiu gelada, ameaçadora:

- Tendo em vista que eu não sofro nenhum tipo de retardamento mental, você deveria ter imaginado que eu já descobri como mudar os canais da televisão. O meu problema é com um tal de SAP, que aparente faz a televisão falar em espanhol.

Tentando não rir, ela o olhou. A testa dele estava franzida e os seus olhos... negros e profundo. Perigosos. Evangeline precisou de toda a sua força de vontade para encará-los. Delicadamente, ela tomou o controle da sua mão e desativou a tecla SAP.

- Já que você sabe mudar canais, acredito que já tenha descoberto os que você mais gosta... Se não, você deveria tentar o Discovery Channel e o National Geographic. Tenho a impressão que você se interessaria por eles.

O brilho ameaçador nos olhos dele pareceu se dissipar, ao mesmo passo em que ele erguia a sua sobrancelha e os seus lábios curvavam-se no que parecia ser um sorriso maldoso.

- Então você sabe falar, Redfield?

Evangeline suspirou, devolvendo o controle a ele.

- Estive em Hogwarts, esta tarde. Visitei o seu túmulo.

Severo rolou os olhos, aparentemente desinteressado. Voltou a sua atenção à televisão e, passando os canais, resmungou:

- Espero que você tenha deixado flores e acendido velas, ou o meu fantasma pode vir te assombrar.

Ela recostou-se ao sofá.

- Sinceramente? Eu não acho que o seu fantasma sentirá falta das minhas flores ou velas. Seu túmulo está cheio de homenagens!

Evangeline imediatamente ganhou a atenção de Severo, que desligou a televisão e a olhou. Seu semblante estava quase divertido.

- Mesmo? Será, então, que os pirralhos que eu costumava torturar esqueceram das inúmeras detenções que eu apliquei e, de repente, decidiram gostar de mim? Acho que não fiz o meu trabalho direito.

- Eu não sei... mas o seu túmulo era o mais florido de lá, então... eu acho que você não deve ser tão mau quanto eu pensava. – Ela sorriu, tentando ignorar que, apesar deles estarem no meio da primeira conversa ligeiramente amistosa, Severo continuava com o seu rosto impassível. – Eu vi também o seu retrato. Ele é reclamão.

- McGonagall fez um bom trabalho, então.

Evangeline respirou fundo e, após um breve silêncio, disse:

- Acho que nós deveríamos fazer um acordo de paz. Assim conviveremos melhor, você se adaptará melhor e...

- ...a deixarei em paz mais rapidamente.

Ela deu um sorriso sarcástico – seria um trabalho difícil. Aquele homem aparentemente tinha resposta para tudo?!

- De qualquer forma, eu posso ser mais solícita e simpática. E você deverá deixar de agir como um imbecil o tempo inteiro.

Ele franziu o cenho, talvez um pouco surpreso com o insulto tão displicentemente jogado a ele. Pausadamente, ele respondeu:

- Obrigado. Eu tentarei suprimir a minha personalidade para o bem desse acordo.

- Ótimo.

- Sem perguntas pessoais, no entanto.

- Mas se eu perguntá-las sem querer, nada de ser extremamente desagradável. Apenas não responda.

- Eu vou tentar, Redfield.

- Evangeline.

Ele ergueu uma sobrancelha.

- Como?

- Evangeline. Eu não vou pedir que você me chame de Evan ou Evey, mas me chame de Evangeline.

Snape deu um longo suspiro.

- Muito bem...Evangeline.

- E eu vou chamar você de Severo.

Ambos passaram um tempo em silêncio, até que Severo fez a pergunta que estava em sua cabeça:

- Por que você está fazendo isso? É óbvio que nós não nos damos bem... Então, por que?

Evangeline suspirou, olhando-o. Severo logo percebeu um brilho ligeiramente melancólico nos seus olhos castanhos.

- Se eu falar que é porque Alvo confiava em você, eu estarei mentindo. Quando eu saí por aquela porta e fui ao seu mundo, eu tinha toda intenção de quebrar a minha promessa e te tirar da minha casa... Mas, quando eu ouvi Minerva falar bem de você e quando eu vi a sua lápide, eu imediatamente soube que vocêtinha que ser uma pessoa boa.

- Sinceramente, se é nisso que a sua decisão está se apoiando, você realmente deveria reconsiderá-la.

Ela deu uma risadinha fraca e sem-graça.

- Você parece ser muito duro ao se julgar, Severo. Mas eu não sou. Eu, aliás, tento não julgar as pessoas. Mas, pelo que eu te julguei hoje, vi que você é uma pessoa que merece ser ajudada... e, eu acho que se nós dois nos esforçarmos um pouco, isso aqui pode dar certo...

- E eu posso sair o quanto antes?

Pela primeira vez, ela sorriu verdadeiramente para ele.

- Não. Esse era o plano inicial, quando eu me sentia obrigada a ter você em minha casa. Agora eu quero você aqui; eu quero ajudar... Logo, o plano atual é ajudar adaptá-lo ao meu mundo e, de quebra, ganhar um amigo. Agora venha – ela levantou-se e estendeu-lhe a mão. – Eu vou ensinar você a dirigir!

Ele pensou duas vezes. Severo não queria, sabia que aquele pequeno gesto seria como se ele desse permissão para que ela, de certa forma, entrasse em sua vida. Mas, ainda assim, depois de um momento de hesitação, segurou a sua mão.

Ele não sabia o que o levou a agir assim... mas, definitivamente, foi algo naqueles olhos castanhos.

XxXxXxX


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