-- Eles vão atacar novamente em breve, chefe.

-- Sim. E agora eles já sabem a respeito dos cinco generais.

-- É mesmo. Vão atacar separadamente.

-- Pelo Labirinto da Noite, né?

-- Claro, eles sabem que não podemos entrar lá.

-- Chefe. Chefe! Eles vão vencer!

-- CALEM-SE! - urrou o chefe. As sombras se retraíram.

-- Eles não vão vencer! Nunca passarão pelo Labirinto da Noite. Há setecentos anos ninguém passa. Serão mortos, duramente mortos, assim como os anteriores.

"E finalmente sofrerão por ter me desafiado", terminou internamente.

Horas depois, andávamos pela cidade esperando anoitecer. Estava tudo destruído. Todos estavam mortos. Havia sangue espalhado por todo canto. Fora muito difícil encontrar um lugar onde pudéssemos sentar e comer algo.

Shitte conseguira despertar a outra alma de Shiori. Ele se identificou como Kuro. Pelo menos não era mais um moleque petulante. Seu cabelo roxo tinha ficado mais espetado quando se transformou, ao contrário do de Shitte, mas no resto foi igual. Olhos azuis e pele branca.

O único problema era que Kuro resolvera ficar grudado em Kibishii. Parece que Hiroko, que já odiava Shiori, passou a odiar Kuro ainda mais. E Kuro estava morrendo de medo do moleque. Que idiota. Ele devia ter medo era de Kibishii. Ela estava ficando muito irritada.

-- Mas o que é esse labirinto da noite, afinal? - perguntou Daiki.

-- É um labirinto. Onde é sempre noite. Dãã. - respondeu Kibishii irritada.

Ei, devolva o controle! Você disse só um pouco!

Não quero, huhuhu. O corpo é meu na verdade. Pare de tentar o controle, a secundária aqui é você.

-- Agora vocês já sabem a respeito dos Cinco Generais. Eles guardam pontos de poder. São como peças para abrir um portal. Destruam os generais, e poderemos lutar contra o chefe deles. - explicou Kuro, escondido atrás de "mim".

-- Dá pra desgrudar dela?! - reclamou Hiroko.

-- Se você parar de fazer essa cara de quem vai me matar - o Instrumenti respondeu com uma voz irritantemente doce.

-- Aff! Que saco! - Hiroko chutou um latão de metal que estava caído ao lado dele. A coisa voou uns dez metros e quebrou uma parede.

-- Você é forte - comentou Heiko.

-- Não sou eu! É esse otário na minha cabeça! - ele parou e olhou para o grupo com uma cara meio cômica - Ele fica pedindo o controle do meu corpo! Eu não vou fazer isso! Vocês podem até ter ficado legais, mas ele é muito esquisito...

-- Pare de drama - cortou Shitte - Deixe ele assumir o controle. Mais feio do que já é você não fica.

-- VOLTA AQUI, PIRRALHA! - Hiroko estourou. Shitte soltou um gritinho e foi se esconder atrás de Heiko.

Os olhos do garoto se arregalaram e começaram a ficar totalmente brancos. Veias pulsaram negras neles. Ele soltou um grito de dor. Seus dentes se alongaram, principalmente os caninos. Mechas prateadas nasceram nos cabelos pretos. As orelhas ficaram pontudas. Um rabo escapou das calças. Seus pés aumentaram e romperam os tênis.

Era um verdadeiro monstro. Até Kibishii se retesou quando ele terminou a transformação.

-- Que inferno! Eu quero matar esse moleque! - a coisa gritou.

-- Q-qual é o s-seu nome? - perguntou Heiko, visivelmente tremendo de medo.

-- Eu sou Hakai. Sou um dos servos de Tenebrae... - ele franzui a testa - Mas não lembro quem é Tenebrae. Por quê?

Oh-oh. O nome dele. Não é bom sinal, não mesmo. Eu não ia confiar nem a pau em alguém cujo nome significa Destruição.

-- Suas memórias foram apagadas - disse Kibishii - É um requisito obrigatório para um de vocês vir para o mundo humano.

-- Ei, todos vocês estão fugindo. Sou tão medonho assim? - ele fingiu que ia chorar. Argh. A personalidade continua quase a mesma.

Kibishii rosnou e deu um sorriso de escárnio.

-- Você deu um susto até em mim. É óbvio que os Instrumenti estão morrendo de medo de você.

-- Que pena. - ele suspirou - Mas eu ouvi a respeito do Labirinto da Noite. Tem certeza? Ninguém volta vivo de lá há setecentos anos.

-- Ninguém leva humanos para lá há setecentos anos - ronronou Shitte, ainda escondida.

-- Como assim? Quer dizer que nós temos algum poder especial? - Daiki perguntou.

-- Não! Exatamente por serem completamente neutros que são especiais para o Labirinto da Noite. Ele se alimenta do sobrenatural. - Shitte continuou.

-- É perigoso demais - rosnou Hakai - Eles podem morrer.

-- Se eles não forem, vão morrer do mesmo jeito - suspirou Kibishii. - Já está quase anoitecendo. É melhor prepararmos o portal. Alguém aí tem uma faca?

-- Uma faca pra quê? - perguntou Heiko, olhando de lado preocupada.

-- Eu preciso de sangue para abrir o portal. O meu é o melhor pra isso. - ela disse em tom despreocupado.

-- Por que o seu? - resmungou Hakai - Não precisa ser o seu. Eu faço isso.

-- Precisa ser o meu sim. Eu sou uma filha da noite, o dom de abrir o Labirinto está no nosso sangue.

Falando isso, cortou o dedo com os próprios dentes. Ai. Eu já me cortei em muitos lugares, mas sinceramente na ponta do dedo dói pra caramba.

Ela começou a fazer um compliado desenho no chão. Nenhum de nós parecia ver alguma coisa, mas ela via. Consegui penetrar na mente dela o suficiente para notar que seu sangue brilhava na sua visão.

Quando terminou, Kibishii se levantou e disse algo numa língua estranha. Não parecia ser uma língua humana. Eram mais uns sons estranhos tipo rosnados. Mesmo assim consegui entender.

"Que se abram as portas do sagrado Labirinto para aqueles que desejam desafiá-lo"

O desenho brilhou em luz branca. Ela se afastou, e do chão surgiu um enorme portal de pedra. As pesadas portas se abriram soltando um gemido medonho, mas por dentro havia uma grade impedindo a passagem.

-- Ei... - começou Daiki - por que isso está fech...

-- Eu aceito vosso desafio - disse uma voz medonha de dentro do Labirinto, mas mesmo assim a grade não sumiu.

-- Ele só abre de noite - explicou Shitte - Ainda faltam exatamente vinte e sete minutos para que seja noite.

-- Então por que não abrir depois? - insistiu o garoto.

-- Se deixasse para abri-lo depois, poderíamos sofrer um ataque surpresa. Não teríamos como entrar. - Kibishii sorriu, saboreando o desafio - De qualquer jeito, deixem suas espadas em punho. Não podemos prever o que virá.

-- Hum... Na verdade, eu posso - murmurou Kuro.

Kibishii se lembrou da existência do Instrumenti e o atirou para longe.

-- Foi um comentário retórico.

-- Ah, sim. Desculpe.

Uma brisa fria soprava do Labirinto da Noite. Não parecia ser um bom presságio. Parecia que aquilo transmitia dizeres... da própria Morte.