I Hate You Then I Love You (mcfly) escrita por Tatiana Mareto


Capítulo 11
Capítulo 10




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— Tom! - Júlia encontrou-o no café da manhã, no hotel. Ele estava bastante acabado, talvez mais do que se esperaria, mas era a ressaca.  – Tom, preciso falar com você.

— Sim, fale. – Tom serviu-se de suco de laranja. – Adoro frutas tropicais... onde está Brenda?

— Ela está lá em cima... Tom, ela ontem me contou algo chocante, horrível. Ela falou sobre um estupro, mostrou umas marcas... ela estava transtornada por causa do álcool, então foi impossível conseguir que ela falasse claramente. Mas eu fiquei apavorada. O que é tudo isso?

— Oh, oh... Brenda não deveria ter bebido.

— O que houve? Ela foi estuprada? Ela culpou Harry!

— É, a cabeça de Brenda distorce as coisas com muita facilidade. – Tom riu. – Sente-se, vou te contar a história. Mas me diga, onde está Harry? Ele não dormiu no quarto dele.

— Ele dormiu conosco.

— Ele está lá em cima com ela?

— Mais precisamente, ele está lá em cima na cama, com ela.

— Eles dormiram juntos? - Tom bateu a mão na cabeça. - Cruze os dedos. Vamos precisar de sorte para terminar esse comercial.

Tom contou resumidamente a Júlia o que aconteceu comigo, há quase seis anos atrás.  Nós éramos muito jovens, ainda cursando o ensino médio. Eu me preparava para a fazer faculdade de jornalismo, e por muito tempo e estagiei com uma companhia de televisão. Harry ficou de me pegar na saída dos estudos; era bastante tarde. Como ele não apareceu, nem atendeu ao telefone, Eu decidi ir andando. No caminho, fui atacada por um homem. Nunca pegaram o culpado, e eu nunca me recuperei propriamente do ocorrido. Meses depois, voltei de vez para o Brasil, e nunca mais pisei na Europa.

Júlia ouviu a história assombrada. Ela nem deveria se espantar mais com nada, mas aquela história era horrível demais para não causar horror, principalmente a outra mulher.

— Fui eu quem cuidou dela todo esse tempo. Mas ela sempre se recusou a tocar nesse assunto. Agora, está tudo de volta. Eu deveria ter impedido isso. Vou ver como ela está.

— Mas ela culpa Harry por ter sido estuprada?

— Ela acha que ele a abandonou. Você não o culparia? Ainda mais se ele fosse seu yang?

Sim, Júlia culparia. Se ele deveria estar comigo para me proteger, eu poderia culpá-lo. Mas seis anos haviam se passado, era muito tempo para continuar com tanto ódio. Era o que ela achava, não eu. Aturdida, Júlia seguiu até a cobertura para tentar apressar os atrasados, com Tom a seguindo.

Eu abri os olhos detestando a ideia de fazê-lo. Minha cabeça estava latejando o suficiente para que eu não quisesse acordar. Senti o mal estar me consumir no instante em que a luz atacou minha retina. Virei-me para o lado, pensando se deveria levantar, tendo certeza que eu estava atrasada. Assustei-me com Harry; ele estava sentado em uma cadeira que estava ao lado da cama. Sério, compenetrado, olhando para mim como se algo estivesse muito errado.

— Bom dia. - A voz dele doeu meus ouvidos. - Dormiu bem?

— Sim. - Eu não tinha que lhe dar satisfações. - O que faz no meu quarto, musgo? Dê meia volta e desapareça. Você nem está vestido ainda, e estamos atrasados.

— Não estamos. - Ele segurava o braço da cadeira com força. - Brenda... o que houve essa noite? Você estava fora de si e falando umas coisas tão esquisitas.

— O que eu falei? - Gelei. Eu tive, naquele instante, certeza de que tinha contado coisas que não devia, para ele.

— Por que você foi embora? - Eu não estava preparada para aquela pergunta, não naquele instante. Levantei-me da cama, o enjoo me empurrando para baixo de novo, e ignorei-o. Ouvi Harry levantar e vir atrás de mim, mas alcancei o banheiro antes, e fechei a porta entre nós.

Julie chegou ao quarto alguns minutos depois, e Harry estava no hall do quarto, andando em círculos, com as mãos no bolso.

— Ainda aí? – Ela perguntou a Harry, mas ele não parecia amistoso.

— Espero ela sair.

— Não preciso que esperem por mim. - Saí do banheiro, cabelos ainda úmidos e óculos escuros.

— Brenda. – Harry parou na minha frente. Puxou os óculos escuros e segurou minha face pelo queixo, fazendo-me olhar diretamente para ele. – Acho que deveríamos conversar um pouco.

— Não temos tempo, musgo. – Recusei-me a olhá-lo. – Estamos bastante atrasados, e ainda temos o que fazer na Bélgica. E eu não acho que tenha nada para conversarmos.

— Você estava chorando, Brenda! – Ele disse, sensível. Harry sempre era sensível, e ele costumava ser mais na minha presença. Ele nem se incomodou com Júlia. – Precisamos conversar, mesmo.

Naquele instante, Tom nos interrompeu. Júlia não faria aquilo, ela estava curiosa para ver até onde íamos. Mas Tom, ele temia qualquer momento que tivéssemos a sós  depois de uma noite regada a álcool. Eu sabia que, para ele, nós estaríamos juntos, mas ele sabia que eu era impossível. E deixar Harry em minhas mãos era cruel demais, ele também sabia. Coloquei novamente os óculos escuros, e desvencilhei-me de qualquer amarra que me atasse a Harry. Fosse física ou não. Descemos para se encontrar com o resto do grupo, e eu esperava que estivessem todos já vestidos.

Depois de algumas tentativas frustradas, o photoshoot da CKU estava finalmente terminado. A produção era pequena, apesar do grupo ser muito famoso. Mas era como trabalhávamos, sempre com pouca gente. Eu, particularmente, detestava exageros. Com gastos reduzidos, fazendo quase tudo sozinhas, nós conseguíamos mais facilmente aprovar nossos projetos. E ficavam famosas por isso.

A tarde, então, seria mais livre. A programação para depois do photoshoot seria duas aparições em programas de TV, com apresentações ao vivo. Depois do acidente com o camarão estragado, cancelei um programa e adiei as filmagens de outro, para semanas depois. Eu não arriscaria apresentar os rapazes doentes, principalmente porque todos eram importantes para o grupo. E o outro programa, semanal, aconteceria somente no mês seguinte.

— Estamos de folga. - Dougie demonstrou entusiasmo. – Estou gostando dessa nova produção, nunca tivemos tanto tempo livre.

— Menos, Poynter... não temos tempo livre. Só intervalos. – Danny ponderou. – Ok, vou fazer compras. Soltem-me em um shopping.

— Vocês parecem duas garotas. – Tom caiu na risada.

— Não falem em shopping perto de uma mulher. – Júlia achou a ideia tentadora.

— Nada de passeios, D. Júlia. Vamos voltar ao escritório para reorganizarmos a agenda. Vamos deixar que eles se divirtam, nós temos trabalho.

A van que carregava o grupo deixou Danny e Dougie onde queriam, e carregou os demais para o escritório da produção. De lá, ela levaria quem quisesse para o hotel. O problema é que ninguém estava a fim de hotel.

— Bem, vamos descobrir o que essas mulheres fazem para viver, afinal. – Tom implicou.

Lydia Wang quase passou mal ao ver metade do Mcfly entrando escritório adentro. Nosso mal era aquele, eu e Júlia sempre levávamos serviço “para casa”. Foi engraçado ver a cara da secretária ao ser cumprimentada pelos dois rapazes. Ela nunca os tinha visto pessoalmente, mesmo estando no show business. E eu não era só a produtora, eu era amiga pessoal deles. Isso significava conseguir coisas que outras produtoras não tinham liberdade para pedir.

— Vamos trabalhar por aqui hoje. – Júlia puxou a porta de vidro do escritório. – Lydia, você poderia pedir um café para todos? E o almoço, claro.

— Podemos comer hoje? – Harry questionou.

— Sim, podem. – Júlia sorriu. – Mas não escolham camarão de novo, por favor!

Bélgica.

Nós íamos para Bruxelas. Aquilo era excitante porque eu poderia treinar meu francês, e porque nada conhecia daquela cidade. A Universal tinha estúdios lá, e nós íamos para filmar alguns vídeos para o novo website do grupo, que estava sendo desenvolvido por outro setor da empresa na qual estávamos vinculadas. Eles também estavam gravando o novo CD do grupo, e precisavam dos estúdios. Ficaríamos  algum tempo por lá, e nas instalações do estúdio mesmo. Parecia bastante divertido, mas para mim era só trabalho.

Iríamos de avião, naquela mesma noite, o que significou resgatar os dois perdidos no shopping, arrumar as malas em tempo recorde e ir para o aeroporto, enfrentar check-in. E enfrentar fila. E enfrentar sala de embarque. Eu duvidava que, só porque o Mcfly era famoso, eles teriam alguma preferência. Não tivemos, na verdade. O que tivemos foi alguma comoção, com fãs esperando pelo grupo, no saguão. Mas eles já estavam acostumados. Eu e Júlia também estávamos, porque lidávamos com pessoas famosas sempre.

Mas o voo seria divertido. Ou não, considerando o meu humor. Eram três dias em Londres; três dias de caos. Eu já tinha beijado Harry. Eu já tinha visto Tom, depois de meses e meses sem vê-lo. Eu já tinha contado meus segredos para Júlia. Eu já tinha dormido com Harry. E eu o detestava cada vez mais, por fazer-me sentir daquela forma. Sentir-me agitada. Meu sangue correndo rápido nas veias. Joguei-me ao lado de Júlia em um assento, permitindo que ela ficasse na janela, já estendendo a mão para chamar o comissário. Eu queria beber  alguma coisa, e eu nunca quis tanto ficar bêbada na minha vida.

Tom tomou o assento ao nosso lado. Levantou o braço da cadeira e me chamou. Eu pensei em resistir, mas desisti. Não dava para resistir a Tom. Ele passou seu braço ao meu redor e puxou-me para si.

— Você ficou quieta o dia todo, e Brenda nunca é quieta. Você quer conversar, meu amor? - Ele sussurrou em meus ouvidos. Acomodei-me em seu peito, fechei os olhos.

— Eu não quero falar nada sobre nada. - Resmunguei.

— Você dormiu com Harry noite passada? Aconteceu...

— Tom. - Ergui a face e olhei para ele. - Por favor, não comece. E estou me sentindo péssima, e vou provavelmente ficar doente. Eu nunca devia ter voltado.

Ele beijou meus lábios, e manteve-me em seus braços. Adormeci sem nem perceber, ouvindo o burburinho do grupo que animadamente conversava sobre músicas. Júlia estava bastante integrada. Sentada ao lado de Danny, eu podia jurar que ela teria problemas Flones para resolver.

— O que está havendo com minha amiga? - Ela perguntou ao Danny.

— Efeito Judd. - Ele piscou, falando baixo. - Quando eles se entenderem, deve melhorar.

— Você acha que vão se entender?

— Sempre se entendem.

E eu acordei, não sei quanto tempo depois, sentindo meu corpo dolorido. Eu ficaria mesmo doente, e podia apostar que estava com febre. Movi-me e percebi que estava deitada, as luzes do avião parcialmente apagadas. Sorri e encarei aquele que me amparava, crente que Tom cuidava de mim. Meus olhos perderam-se na linha do pescoço, subindo até o queixo de Harry. A barba por fazer dava um ar desleixado. Levantei de supetão, encolhendo-me no canto da cadeira.

Eu não sabia por que Tom tinha me deixado com ele.

— Você está bem? - Harry perguntou, a sobrancelha erguida.

— Sim, ótima. - Menti descaradamente. Eu estava péssima. - Onde está Tom?

Ele virou-se e apontou, duas fileiras de cadeiras atrás de nós. Levantei-me, tirando forças não sabia de onde. Passei por sobre Harry e, enrolada em um cobertor, arrastei-me velozmente pelo avião. Parei ao lado de Dougie.

— Poynter, vá para o lado de Harry. Eu quero falar com Tom.

Tom moveu os ombros em um claro sinal de que ele não tinha condições de me controlar. Ninguém tinha. Dougie sabia. Ele levantou-se e foi ocupar meu lugar, enquanto eu me joguei ao lado do meu ex.

— Você me largou com ele, o que tem na cabeça? - Questionei, sentindo meu corpo entrar em colapso. Eu tinha febre.

— Um cérebro. - Ele riu. - E você, deveria usar o seu. Você está doente, Brenda, o que eu posso fazer por você?

— Eu nunca estou doente. - Protestei. - Vamos pousar em breve, eu vou dormir e acordar como nova. Mas Tom, eu não quero que você fique me empurrando para o lado dele; isso nunca vai dar certo. Você entende a natureza do nosso não relacionamento, o quanto eu odeio esse...

— Ai, ai, Brenda. - Tom puxou-me para si, fazendo-me recostar em seu corpo. Senti imediatamente a dor do meu organismo prejudicado pela febre, mas resisti bravamente. - Você é mesmo tão difícil que eu não sei como pode ser tão adorável.

Ignorei o comentário. Eu ouvia as vozes das pessoas no avião. As luzes estavam apagadas ainda. Júlia interagia com Danny, e eu podia jurar que ela estava adorando aquilo. Eu estaria. Danny era muito divertido e lindo. O barulho do avião em embalou nos braços de Tom, e adormeci novamente.

Eu fui carregada para fora do avião, eu fui carregada para a van, eu fui carregada para os estúdios em Bruxelas. Eu não vi nada claramente, tudo em minha frente era um enorme borrão. Meu corpo não respondia a nada. Meu cérebro estava confuso, efeito da febre alta. Eu ouvia vozes. Mas elas não eram claras. “Você precisa fazê-la tomar o remédio”, alguém disse. Quem pretendia me fazer fazer algo? Era quase impossível forçar-me ao que eu não queria. “Ela vai dormir comigo”, ouvi outra voz. “Eu cuido dela, vocês podem deixar”.

Eu sabia de quem era aquela voz. Mas não tinha forças para discutir. Não tinha mais condições de lutar contra o mal estar que me derrubava. “Você vai arrumar confusão de manhã, Judd”, alguém dizia. Eu queria concordar, e protestar. Eu não dormiria com Harry, não outra vez. Eu não pretendia que nada daquilo acontecesse. “Quando ela acordar...” a voz insistia, e eu me sentia no ar. Eles ainda me carregavam, como se eu fosse leve. “Não sei como você ainda tem forças para discutir, Tom”, aquela era a voz de Harry. E eu fui finalmente depositada em algum lugar macio. Seguraram minha cabeça com as mãos, e uma voz suave me convenceu a beber alguma coisa. Alguma coisa amarga. Eu quis cuspir. Mas nem para isso eu tinha forças.


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