Crônicas de Sieghart escrita por xGabrielx


Capítulo 19
A Princesa 6 — Entardecer


Notas iniciais do capítulo

Adicionado em: 24/01/15 16:26. Vamos ver se eu consigo lembrar de continuar com isso até o fim.

Boa leitura!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/135239/chapter/19

— A bem da verdade, não foi tão difícil assim, sabe?

Tornar-me um membro da Ordem.

Vai ver minha ascendência ajudou. Sou uma Erudon. Sim, aqueles Erudon. As mulheres não são obrigadas, mas sempre quis entrar para a Guarda Real. Como eu poderia não querer? De todos os lugares do mundo, nasci em Canaban, uma Erudon! Não querer aprender a arte da guerra seria o mesmo que não me aproveitar de algum incrível talento com o qual eu tivesse nascido. Tá certo que no final das contas o reino é bem estranho em comparação com os outros, mas era de se esperar. Só Canaban tem sua história militar, e apesar de tudo, até que tudo funciona bem. Um exército consolidado a comando do Intendente Chefe para assuntos gerais, os Cavaleiros Vermelhos, dos Kriewalt, focados em lidar em assuntos exteriores ao reino e a Guarda Real, dos Erudon, para assuntos interiores.

Nossa história segue a de Canaban desde seus primórdios, e nunca deixou de acompanhar. Em algum momento, os Erudon acabaram se especializando na defesa, na proteção da realeza e das pessoas. Os Kriewalt, de seu modo, também protegiam, embora de um modo menos indireto. Em vez de defesa, esperando o inimigo chegar para então lutar, favoreceram a ofensa. Sem dúvida ambos precisamos de disciplina, mas não podemos estar em constante comunicação com a linha de frente, então a independência é meio que uma necessidade, e levando isso em conta, suponho que não é tão estranho eles serem assim, mais... Selvagens. Caóticos.

É como se estivessem sempre à beira de uma revolta, honestamente. Não que eles pudessem pensar em fazê-lo. Assim, como nós, eles sabem onde resta sua lealdade e o dever que devem honrar. Somos a espada e escudo de Canaban.

Talvez o exército pudesse ser a armadura?

Mas a Ordem, sim. Para falar a verdade, dos poucos rumores que eu ouvia nunca tive muito interesse, sabe? Não que eu duvidasse. Bem, não é como se eu acreditasse também. É do tipo de coisa que sendo verdade ou não, não me surpreenderia muito.

Acho que nunca pensei muito nisso.

Suponho que serve para mostrar o nível de meu interesse.

Mas um dia meu tio vem e me faz uma proposta, sabe? Tipo, do nada, “Quer entrar para a Ordem?”, e eu pergunto “Quê Ordem?”, daí ele dá aquele meio-sorriso dele e responde “Você sabe quê Ordem.”. E pronto. Bam, não é que ela existia? O quê acha que respondi? ...bom, óbvio que “Sim”, senão eu não estaria aqui, mas... né? Não é como a Guarda, onde a gente espera o problema chegar, e também é bem diferente dos Cavaleiros porque a gente não é tão... violento... tirando os assassinatos.

Mas nosso objetivo é diferente. Não é Canaban. É toda Vermécia! E eles só pensam em lidar com o problema. A Ordem impede o problema de sequer surgir. Ou pelo menos é o que a gente tenta. Mas o que eu sei, também, né?

Sabe o que eu acho? No final das contas eu fui tão... “na média” em tudo na minha vida... sabe? Altura mediana, cabelos e olhos azulados dos Erudon, vida mediana, entrada para a Guarda aos dezessete... tudo comum. Não tinha nenhum motivo em particular para eu não poder entrar na Ordem. E a oportunidade acabou aparecendo, então por que diabos recusar?

E depois, também, tudo comum. Três anos sob comando de um superior e então um ponto fixo por cinco anos. Como sou nova, fiquei com o comum; bastante relaxado, até.

Sabe o tipo de gente que passa por Veraban? Ultimamente, só mercadores e uns viajantes meio perdidos. E eu só precisaria ficar de olho em irregularidades, sabe? Avisar o Centro em caso de alguém estranho passar por aqui, ou algum mercador estar transportando algo peculiar, ou uma caravana de que não fui avisada passar por aqui.

Mas sabe o que acontece? No primeiro –primeiro dia meu aqui você me traz uma carta dessas?! Faz ideia de todo o trabalho que tive me movendo para esse quarto, me apresentando para todo mundo por aqui? E você vem e me traz uma carta dessas?

— Ei, culpa os três lá. Tô só fazendo meu trabalho. — respondeu a ave, empoleirada na janela.

— E eu com isso? Que deixasse um gavião ou qualquer outra coisa te pegar! Precisava mesmo ter trazido isso? Podia ter pousado para comer alguma minhoca e deixado uma cobra te... — Trea piscou duas vezes — ...comer? Você acabou de falar comigo?

— Não. Estava falando com a parede ali. Ela está com uma ótima aparência hoje, não?

Somente mesmo as paredes ouviram o sarcasmo da ave enquanto a Erudon tentava entender o que estava acontecendo. Agora que pensava, ela já não tinha saído de Debon? Tinha certeza que já fora para a Cidade do Vale e em momento algum esteve conversando com ave alguma. Não tinha, aliás, conversado com ninguém. Era um sonho? Por quê então já não acordara? Sempre acordava quando pensava que devia estar sonhando, mas não dessa vez.

Espera. Por quê fora para a Cidade do Vale? Seu ponto era Debon. ... A mensagem! O quê estava escrito? Olhando para o papel, não conseguiu ler nada. Era como se as linhas tivessem sido rabiscadas sem significado algum e... algo não a deixava ler. Óbvio. É um sonho. Mas como se alguma parte de sua mente entendesse o que desejava, lembrou-se do que tinha antes lido. Aparentemente os “Senhores Tenente Sieghart Kriewalt e o Primeiro-Feiticeiro Mer Ellot” estavam tramando algo com um kwaeli e fugiam para o sul. Qualquer um reconheceria esses nomes. “Sul”, no caso, significava que certamente passariam pelo Vale do Juramento e, consequentemente, pela Cidade do Vale. E dos membros da Ordem, ela era a pessoa mais próxima dos três e acabou cabendo a ela observá-los até que alguém mais qualificado chegasse.

Isso, em si só, era um absurdo. Ela não poderia ser a única disponível naquela região, mas os códigos, o papel, a ave... não mentiam. ...e o pilar! Os eventos estavam definitivamente ligados. Imediatamente começou a dirigir-se para a Cidade do Vale. Quando chegou a Veraban, deparou-se com certa comoção — os três estavam lá. Talvez não pudesse segui-los, mas sabia para onde se dirigiam, então aproveitou-se do atraso proporcionado a eles pela população da cidade em todas as honrarias e apresentações e continuou a seguir caminho em direção ao Vale. Lá alugou um quarto no alto de uma estalagem e pretendia ali esperar pela chegada dos três.

O que faria a partir dali? O melhor a ocorrer seria o suposto superior chegar lá antes dos três, mas não poderia confiar somente nessa possibilidade. Ainda assim, sozinha não poderia atravessar o Vale. Precisaria de um guia. Iria à frente? Mas os caminhos pelo Vale são diversos e diferentes guias usam diferentes caminhos... assim não teria segurança de suas posições. Ir atrás daria na mesma. A única opção seria dar um jeito de juntar-se a eles na viagem. Poderiam compartilhar o mesmo guia. O grupo seria ainda pequeno o suficiente. Se não se enganava, o máximo era por volta de oito pessoas. Estava exausta.

Era isso? Estava dormindo então!? E se eles já tivessem passado por ela!? Se tivesse perdido eles... Não. Não tinha dormido. Lembrava-se de vê-los passando... com... um dragão. Havia mais pessoas junto a eles e então... Sim, lembrou-se.

Vendo-os entrar em um estabelecimento, imaginou que descansariam a noite lá. Não estava acostumada a mentir. Estava com fome, então decidiu comer algo leve. Rápido. Após terminada, dirigiu-se ao local para propor que atravessassem juntos o Vale. Levou alguns minutos ainda para criar coragem, e ainda assim não era o suficiente para realmente se acalmar, mas com sorte eles confundiriam seu nervosismo por emoção de encontrar duas pessoas famosas.

Ao perguntar pelos hóspedes do grupo que acabara de chegar foi direcionada aos seus quartos, e, de fato, encontrou os hóspedes. Três homens, mas nenhum dos que lhe importavam. Soube que já tinham ido para o Vale. “E como não os vira?” A maldita estalagem tinha outra porta do outro lado pela qual eles saíram. O draconiano tinha ido para outro lugar não porque dragão não caberia ali, mas porque iria ainda mais para o sul junto com os outros três.

Desesperada, correu o caminho todo, culpando a si mesma por ter enrolado demais. Com os diversos pontos de entrada e relativa vastidão, em si só já era incrível ter alcançado eles no lugar exato em que estavam. Já sem fôlego algum, andava lentamente em direção aos três que assistiam o draconiano fazendo seu voo quando viu alguém cortar as asas do dragão e atirar Sieghart para o abismo. Era alguém? Aquilo tinha asas.

Atacava os dois restantes. Com o escudo no braço direito, aproximou-se da batalha. Identificou-se, trocando algumas palavras, mas então... o maldito kwaeli a empurrou!

Caíra. Tinha certeza que caíra no Vale. Era isso? Ia morrer, e tudo por causa daquela ave?

— Funcionou! — gritou a ave.

— ...quê?

— Me dá a mão!

— Do quê você tá falando? — e assim que perguntou, sentiu-se caindo.

— Me dá a mão, mulher!

Seguindo a ordem, estendeu a mão para a ave. Outra mão agarrando seu pulso e como se acordasse de um sonho, a paisagem borrada começou a tomar nitidez. Era Sieghart quem a segurava. Seus cabelos pretos não deixavam dúvida. Ele estava agarrado a Mer Ellot e este segurava a perna do kwaeli, que estava fazendo alguma coisa com seu estranho equipamento enquanto anunciou.

— A Megegig está sobrecarregada. Este será seu último salto. Que os Anciões me perdoem.

Uma forte luz ofuscou sua visão e agora estava em um campo esverdeado.

O campo e o céu azul e as poucas nuvens, como naquelas paisagens que se vê em pinturas, pareciam debochar de Sieghart. Depois de tudo o que ocorrera, agora o tempo também decidira parar de fazer sentido. Que o dia agora estava longe de se tornar noite era a menor das obviedades. A mulher à sua esquerda, sem dúvida uma Erudon, caída, ainda estava confusa, mas ele já esperava a mudança repentina de paisagem. Ellot e o outro não estavam por perto. Pelo menos não até onde sua visão alcançava. Metros à sua frente, via outra mulher. Essa, certamente não viera com eles. Tinha espada em mãos, pronta para... se defender? Talvez, mas nem sua forma nem o rosto a trai. Em um rápido movimento, leva as mãos às costas e a cintura e posiciona-se com suas espadas. Ela não se move centímetros sequer. Experiente em batalhas. E segura de sua habilidade. Inimigo? A espada dela é quase toda branca, inclusive a lâmina com detalhes amarelos e azuis. Suas roupas, de algum tecido e couro têm uma cor velha, gasta.

— Seu nome! — grita Sieghart.

— Elear Eleea. — responde. — Soberana deste reino. Você?

A princípio, pensou ter escutado errado. Deveria ter escutado errado, mas a claridade com que ouviu era inequívoca. A simplicidade e absurdez da situação o fazem ignorar a afirmação. Ou é louca ou, por alguma razão, debocha dele.

— Onde é aqui?

Sem resposta. Tem cabelos vermelhos, mas não é uma Kriewalt. Não é de Canaban. Tem algo de... estranho. Uma sensação extremamente familiar. Uma kwaeli.

É ela uma companheira do outro? A separação entre ele e Ellot foi planejada?

Uma luz começa a brilhar no peito dela, assim como em volta da espada que segura. Seus cabelos começam a flutuar no ar, como se estivessem mergulhados em água. Além do vermelho, se torna possível vislumbrar nos fios a cores do amarelo, laranja, dourado. A luz que parecia vir mais de trás dela do que da frente agora a envolvia totalmente, mas estava longe de ser algo ofuscante como a do outro kwaeli. Era algo quente, confortante. Sagrado. E medonho.

Pensando agora que, por mais absurdo que fosse o encontro, ela realmente pudesse ser uma rainha, Sieghart desejou fortemente que ela não fosse um inimigo. Sabia que era perigoso. Precisaria fugir. Estava em perigo.

— Perguntei seu nome. — insistiu Elear.

Teria respondido prontamente, mas seu nome era o assunto de menor importância no momento.

— Não desejo lutar. — falou, dizendo a mais pura verdade.

— Todo o seu corpo diz o contrário.

Não. Não colocaria as espadas de lado. Caso ela atacasse, eram sua única chance de se proteger. De ter alguma chance.

— Não fui o primeiro a empunhar minhas armas. — retrucou.

Passados alguns segundos a kwaeli guardou sua espada e tão rápido quanto seu movimento, a luz que envolvia sua arma e seu corpo desapareceu. Sieghart esperou algum tempo antes de fazer o mesmo, enquanto a Erudon se levantava.

— Sou Sieghart Kriewalt.

Elear passou os olhos então para a mulher ao lado.

— ... Trea Sabranna Erudon. — disse, ajeitando seu escudo no braço direito. Tinha uma forma levemente curvada nos lados e a base era totalmente horizontal, mas em sua parte mais alta as bordas convergiam em ponto levemente à direita. Lembrava um pentágono amassado e entortado. O material de que era feito parecia ser resistente e pesado, embora o homem não soubesse dizer exatamente o quê era.

— Onde estamos? — perguntou novamente. Não gostava disso; não gostava de nada disso.

— O gênio da espada dos Kriewalt e uma Erudon, perdidos. — embora tomasse ofensa com o comentário, Sieghart reconhecia ser uma verdade. Teria uma boa conversa com Ellot quando o encontrasse novamente... — Imagino a quê devo este encontro.

Embora os olhasse, parecia estar perdida em pensamentos. Já começava a desconfiar que ela tivesse esquecido a pergunta quando veio uma resposta.

— Estão por volta de duas horas ao noroeste de Amavaile, uma cidade exatamente cem quilômetros diretamente ao norte de Taelia. Terrivelmente próximos da capital do reino. Sugiro que sigam naquela direção, para o território de Viniliera. Vocês poderão então dependendo da sua situação e intenções ser escoltados de volta à fronteira em vez de aprisionados e sujeitos a interrogação.

— ...está dizendo que estamos em Kwaelia? — perguntou Sieghart, quase em tom de escárnio. A ideia era absurda. Assim como diversos acontecimentos de seus últimos dias, pensou, após fechar a boca...

— Duvida de minhas palavras? — a kwaeli começou a andar na direção dos dois. — Suponho que a situação em que ambos se encontram não seja livre de circunstâncias que justifiquem sua desconfiança. — parou do lado direito de Sieghart, a uns dois metros de distância — Diga-me... Têm vocês outros companheiros?

— Sim, mas não sei onde estão.

— Está dizendo que separou-se deles? Não estão aqui?

Só então percebeu a resposta que dera. Algo como raiva surgiu em seu interior, mas como se de algum modo falhasse em seu surgimento, transformou-se em frustração. Não a conhecia nem sabia ser confiável. Nem um idiota daria esse tipo de informação para alguém suspeito.

— Tenho que repetir de novo ou precisa que eu desenhe? — respondeu, reservando para si todo o desafio que pôde demonstrar, por mais infantil que fosse.

Sem reação ao sarcasmo, ela falou com, aparentemente, o ar:

— Você, então, quem seria?

À frente dela apareceu aquele que atirara Sieghart no Vale. Ou seria aquilo? Não era o mesmo, mas a forma lembrava algo de anos atrás. Um capuz cobria a cabeça e escondia a face, e se estendia para o corpo todo, ocultando qualquer forma que se escondesse na roupa, mas dessa vez a figura não era preta, como se a luz não pudesse atingi-la. Sob a luz do sol, o tecido e uma das asas iluminavam-se em um branco leitoso, com sombras meticulosamente definidas. Como se houvesse outro chão no ar, e fosse único conhecedor de seus segredos, estava parado alguns centímetros acima do chão. Aparentemente de enfeite, tanto na asa direita, branca, e na esquerda, rosada, era possível distinguir penas como aquelas que se veriam em anjos.

— Ninguém que te importe, Alteza. — disse uma voz que soava tão feminina quanto masculina.

A primeira impressão de Sieghart foi que a voz estivesse falando diretamente com a sua mente, mas a sensação foi diferente. Este falava.

Não é que aparecera ali. Era como se sempre tivesse estado ali.

Desde quando...?

— Tudo dentro de Kwaelia é de meu interesse. — disse a kwaeli, armando-se com sua espada — Eu vejo sua Natureza. Você carrega a “omissão”. Mais exatamente, aquela por esquecimento, por desatenção. Enquanto sua existência não for apontada, sua presença não será percebida. Também o veem, austros? Suponho que uma mera dica de sua existência já é o suficiente. Mas este modo de exercer Natureza é divergente daquela dos humanos daqui. Você não pertence a este lugar.

— Você, Rainha Elear Eleea Draban, Vossa Alteza, Soberana do Reino de Kwaelia, você, de todas as pessoas, ousa dizer que eu não pertenço a este lugar? Continue sua viagem, Alteza. Avance em sua inútil missão e deixe para trás esses dois como você bem sabe que faria. Não se meta em assuntos alheios.

— Sua “omissão” não funcionará aqui. Pode enganar humanos, mas está em Kwaelia. O próprio ar é meu aliado, e o ar simplesmente não pode cometer omissão. Tudo dentro de Kwaelia é de meu interesse, incluindo assuntos alheios, se eu assim desejar.

— Consegue realmente enganar a si mesma? Quando estava a ponto de seguir seu caminho e deixá-los seguir o deles sem sequer inquiri-los do motivo que os fez surgir repentinamente em um campo no meio de seu reino?

— A diferença entre eles e você, monstro, é que vocês não são bem-vindos. — a mesma luz de momentos atrás voltou a envolver seu corpo e a arma. O ponto de onde mais luz emanava era em seu peito, logo abaixo do pescoço, como se algo, mesmo debaixo dos tecidos, pudesse brilhar sem obstrução.

— Tenho certeza que pode apreciar a ironia de suas palavras. Saiba, Alteza, que ajo não em resposta à sua hipocrisia, mas em cumprimento ao dever que me cabe.

Da manga direita do ser flutuante surgiu uma lâmina amarelo brilhante e foi com esta arma que ele iniciou os ataques a Elear. Após três golpes abertos, mas ligeiríssimos, que a fizeram recuar três vezes, um abano e outro das asas o fizeram virar-se para Sieghart e impulsionar-se em sua direção.

O Kriewalt reagiu de duas formas, ambas reflexo: desembainhou a espada da cintura, pretendendo desviar a lâmina que tentava furá-lo em uma estocada, e saltou para a direita, levemente para trás. O salto foi sua salvação: mesmo sem olhar, conseguia sentir a mudança no peso e sabia que perdera pelo menos metade do metal de sua espada. A lâmina amarela cortara sua espada. O próximo ataque foi um corte horizontal, contra o qual Sieghart recuou com um salto, e outro salto para a esquerda, e mais outro para trás, e outro. Cada vez, a distância entre os dois diminuía, mas a Erudon se interpôs entre os dois e, erguendo seu escudo contra a lâmina, defletiu a arma. Quando ela se reposicionou, Sieghart pôde ver o brasão dos Erudon no escudo, brilhando, além de o próprio material envolto por uma membrana ciano transparente. Tanto o brasão quanto a membrana logo desapareceram, e ela se aprontara para defender-se de outro ataque, mas não foi necessário. Aproveitando-se do desequilíbrio proporcionado pelo bloqueio do ataque, a kwaeli cortara o adversário.

Assim como o resto do corpo, juntamente com a parte equivalente da cabeça, metade do capuz do inimigo jazia no chão. Onde o corte fora feito, sangue jorrava, do mesmo modo que se esperaria de uma pessoa. Mas podia aquilo ser uma pessoa? A parte inferior da cabeça, aquela ainda presa ao corpo, agora estava exposta à luz, e tudo o que era visível era a forma geral do que seria uma face. Sem nariz, sem boca. Sem pele. Aquilo não tinha textura. Era o mesmo preto daquele que Sieghart lembrava ter visto na Colônia de Gosmas.

— Creio que você tem dúvidas, Sieghart. — disse Elear Eleea. — Poderei saná-las, mas não aqui.

— O que quer dizer com “não aqui”?

— Preciso partir imediatamente. Ainda há traços da magia que os trouxe aqui, e pretendo utilizá-la para seguir para o meu destino. Sei que um de seus outros companheiros carregava um aparelho mecânico retangular. Megegig, aquilo de onde as luzes nascem. Não entendo o porquê da sua confusão, mas estou certa que pelo menos parte de suas questões eu poderei responder.

— Está dizendo que vai utilizar aquela mesma forma de transporte do outro kwaeli? Você conhece ele, então?

— Tenho pouco tempo. Responda se virá ou não, homem. Se desejar, fique e volte para Canaban. Estou certa de que não será incomodado.

Alguns segundos se passaram. Amaldiçoando a si mesmo enquanto se enfiava cada vez mais fundo no buraco, respondeu:

— Vou junto.

— E você? — perguntou a mulher para a Erudon. Esta arregalou os olhos, como se não esperasse a pergunta, e olhou fixamente para os olhos da outra. Abriu a boca uma vez, fechou, e somente então a resposta pareceu ter conseguido fazer seu caminho para fora da garganta.

— Acompanharei o senhor Sieghart.

Assim que Trea terminou a frase os três sumiram do campo esverdeado. Sob o céu azul populado por nuvens, uma só figura manchava aquele cenário idílico. Ainda vazava, embora menos do que antes. Na terra e grama já úmidas uma poça se formava. Um vermelho que combinava na mais bonita das formas com o branco, rosa e amarelo.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Imagino se não estou deixando as coisas na história complicadas demais. Ou se não estou explicando as coisas o suficiente...

Ou se todos esses teletransportes e poderes dos personagens parecem forçados demais...

Bem, como espero que você tenha lido no capítulo, em breve Sieghart vai ter algumas respostas. Aguente até lá!



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Crônicas de Sieghart" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.