Depois daquela resposta basicamente perturbadora, ouvimos um grito vindo do prédio à nossa frente. Logan me soltou imediatamente, como se previsse o que eu ia fazer. Olhei na direção do som e vi um corpo caindo do quarto andar do prédio.

Meus ossos congelaram.

Corri até lá o mais rápido que pude, sabendo que se não chegasse a tempo, nunca me perdoaria. De uma forma estranha, aquilo me lembrava Ian, indo em direção da morte e eu não fazendo nada para ajudá-lo. Ouvi um baque surdo, e quase engasguei de pavor. Várias pessoas haviam se reunido em volta do que achei ser um corpo estatelado no chão, e era quase impossível passar por elas. 

Por isso foi uma surpresa quando, assim que cheguei ao centro, vi Collin segurando a garota que havia caído nos braços. Soltei um suspiro de alívio, mas ainda fiquei confusa. Confusa com a sua rapidez em pegá-la, e com a sua expressão. Ele agora estava sério; de uma  forma que eu nunca havia visto.

-Quem a empurrou? - Collin perguntou à garota. Ela era muito pequena. Devia ser do primeiro ano, e tinha um ar completamente infantil. Sua cabeça loira estava enterrada no peito de Collin, e ela tremia. 

-Eu... não sei - ela conseguiu gaguejar. - Algo... puxou meu tornozelo e me fez tropeçar.

-O quê? - ele pressionou. Ela levantou a cabeça e procurou seu rosto com os grandes olhos alarmados. 

-Uma sombra... - sua voz falhou e ela não conseguiu terminar. 

Parecia ser o suficiente para Collin. Ele a deixou no chão perto das amigas e começou a caminhar decididamente na minha direção. Meu coração acelerou. Mas então ele passou por mim sem nem mesmo me olhar, e continuou andando para longe de todos. O segui sem pensar no que estava fazendo. Ele estava estranho. Sua postura estava rígida, e ele dava passos longos e elegantes, como eu nunca havia visto Collin fazer.

Ele tinha apenas um simples objetivo.

Chegar até Logan.

Ele estava casualmente encostado no tronco de uma árvore, de braços cruzados, e percebi que foi o único aluno que não correu para ver o "acidente". Parecia muito satisfeito com alguma coisa, e tinha aquele sorrisinho maldoso nos lábios. Assim que enxergou Collin indo na sua direção, o sorriso desapareceu. Ele virou e saiu andando na direção do bosque mergulhado em escuridão. Mas não parecia estar fugindo. Apenas dava a impressão que esperava que Collin o seguisse. E foi o que aconteceu. Assim que Collin desapareceu no meio da floresta também, eu parei. 

Que diabos foi aquilo? 

Um calafrio passou pelo meu corpo quando considerei segui-los floresta adentro. Quem sabe que tipo de coisa se escondia no meio daquele bosque escuro? Era uma idéia paranóica, mas preferi dar meia volta e entrar no prédio das meninas. Segui direto até o meu quarto sem olhar para trás, tomando cuidado com sombras em lugares errados.  

-Que tipo de medrosa é você? - Meg me perguntou assim que chegou ao nosso quarto. - Saiu correndo de lá como se tivesse visto um fantasma!

-Foi mal - sussurrei encolhida na cama, que era como eu estava desde que havia chegado ao quarto. - Como aquela menina está?

-A que caiu? Ah, ela está mais do que bem. Está fazendo o maior drama pros garotos, se é o que quer saber. Totalmente desnecessário - ela sentou na cadeira da sua escrivaninha e começou a digitar algo no notebook vermelho.

-Meg? - chamei de repente.

-Sim?

-Você conhece Logan - não era uma pergunta.

-E daí? - ela se virou para mim, de repente cautelosa. 

-Bom... Há quanto tempo ele conhece Collin? - perguntei timidamente. Não sabia exatamente do que estava falando, mas continuei seguindo minha intuição.

-Ah, sinceramente não sei. Aqueles dois parecem ter uma história juntos; mas uma história de ódio. Eles se odeiam. Vivem brigando desde que Collin botou os pés aqui pela primeira vez.

Franzi a testa com uma idéia perturbadora se formando na minha mente.

-E quando foi isso? - sussurrei.

-Ah... lá pelo início do ano - ela deu de ombros e se voltou para o notebook. Eu fiquei em estado de choque.

-Como assim no início do ano?! - praticamente gritei.

-Ora, ele vem visitando o internato com os pais desde o início do ano. Sabe, os pais dele parecem robôs. Enfim, de vez em quando ele passava um final de semana inteiro aqui. Parecia estar esperando alguma coisa. Então ontem à tarde ele veio e se mudou de vez.

Deixei passar o fato de que Collin não morava com os pais. Não morava com ninguém, na verdade, apenas mantinha contato com os tios em outra cidade. A conversa já estava estranha o suficiente.

-Mas... Caramba... - eu estava sem palavras. - Por quê?

-Eu pesquisei um pouco - Meg admitiu. - Acho que a família dele é amiga do diretor, ou algo assim. Fizeram um belo desconto quando ele quis estudar aqui. 

-Não - balancei a cabeça impaciente. - Quis dizer, por que ele mentiu para mim então? Ele disse que não sabia que vinha até ontem, e agora... - me interrompi sem saber como terminar.

-Hum... - Meg refletiu. - Isso você deveria saber. Você é que é amiga dele, não é?

Não respondi. Estava confusa demais, assustada demais e cansada demais para responder. A verdade era que eu sempre pensara conhecer Collin mais do que qualquer outra pessoa, mais até que meu irmão, e pensava isso desde alguns anos atrás, quando o havia conhecido. Mas agora, neste lugar novo e estranho para mim, era como se ele fosse outra pessoa. Alguém que eu definitivamente não conhecia, apesar de ser tão familiar. 

Então percebi a mudança que eu não havia descoberto antes. Os olhos de Collin, antes castanhos, agora estavam azuis. Não me pergunte como não percebi isso na hora em que o vi; acho que eu estava tão feliz por encontrá-lo que nem me dei ao trabalho de olhar sua aparência. Mas pensando comigo mesma agora, e me lembrando dos detalhes daquela tarde estranha com ele e com Logan, lembrei dos seus olhos azuis como o céu.

Tão diferentes de antes. 

Ou talvez aquela escola fosse mesmo um buraco negro, e tivesse me levado para um universo alternativo. 

Mas eu estava prestes a descobrir que, no nosso próprio universo, coisas estranhas aconteciam com mais freqüência do que era necessário.