Mutação Oculta escrita por Athenaie


Capítulo 26
Capítulo 26




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Com as confusões da minha vida nem reparei no natal e nem na passagem de ano. Ano novo vida nova pensei eu e havia assuntos que deviam ser resolvidos.

Uma delas era o meu estado de desempregada. Estava a pensar se havia de tentar recuperar o meu antigo trabalho ou arranjar um novo quando o Eric me propõe aquilo que eu andei a vender aos meus amigos, quando eles se mostraram preocupados com o meu despedimento. Gerir uma parte dos seus negócios.

A ideia não era má de todo. Eu era bastante boa nisso e podia ajuda-lo em algumas coisas que ele não estava tão à vontade quanto eu. O facto de ser um animal diurno também era uma maior valia no campo da gestão.

Por outro lado cada vez parecia mais que a minha vida girava apenas à volta do Eric e não gostava dessa sensação. O meu lado independente gritava um bocado. Tinha medo de deixar de ter vida própria e de me relacionar com humanos.

O Eric chamou-me à razão. Eu queria trabalhar, ele precisava de ajuda. Eu era uma boa gestora, ele tinha imensos negócios. Se o que eu queria era independência, ele dava-me carta-branca para dirigir os assuntos como bem entendesse.

Pensei uns dias sobre o assunto e acabei por chegar à conclusão que era uma boa oportunidade de trabalho e racional e pragmático como ele é, se me estava a oferecer semelhante cargo é porque confiava nas minhas capacidades e não porque dormia comigo.

Assim sendo, aceitei. Nos dias que se seguiram ele mostrou-me todos os seus negócios e empresas onde era sócio maioritário e outras onde era o administrador geral para que eu pudesse escolher a área que mais me agradava.

A sua área de acção era vasta e eu acabei por me interessar numa empresa de consultoria que andava realmente a precisar de alguém que tomasse as rédeas aos assuntos.

Era uma boa sensação voltar a ter trabalho e sentir-me ocupada sem estar a pensar todas as horas em que estou acordada no que já me aconteceu e no que ainda me poderá acontecer.

Não é que seja ingrata, o amor do Eric é muito importante na minha vida mas não pode ser a minha única alegria na vida. Preciso sentir que sou mais do que a namorada dele. Preciso sentir-me útil. Preciso de socializar com humanos.

Uma vez esse assunto resolvido podia concentrar-me em outra parte da minha vida. O saber conviver com as minhas recentes capacidades. Desde o ataque do SC estava cada vez mais difícil passar por uma humana vulgar. Não que no fundo não o fosse mas havia situações que podiam levantar dúvidas na cabeça dos que me rodeiam. Se calhasse a me cortar à frente de alguém, seria difícil explicar porque iria sarar instantaneamente. Quando corria tinha que abrandar para mascarar a minha velocidade e tinha que me controlar para não levantar pesos impossíveis à frente de outros. Já não era os humanos que me preocupavam, mas sim os vampiros.

Se não me contivesse, mais tarde ou mais cedo alguém repararia que eu era humana mas com capacidades de vampiros e isso podia despoletar uma série de situações pelas quais não queria passar.

Verdade que cometi um erro ao exibir a minha capacidade de sarar, naquela noite na igreja do SC perante a polícia e os meus inimigos mas que raio, estava com dores, a perder sangue, estava enraivecida por terem tentado matar-me e não controlei a minha fúria e o meu desejo de lhes mostrar que tinham falhado.

Quando mais tarde tive que ir à polícia prestar depoimentos, essa questão veio à baila. O que era eu, era uma questão importante na investigação. Era fácil de comprovar que tinha um coração que batia mas os humanos não saram assim.

Recusei-me a responder, alegando que não era importante para a investigação. Fui atacada e sobrevivi, era só o que interessava. As autoridades não ficaram muito satisfeitas mas acabaram por não querer saber. Devem ter pensado que já era suficientemente mau saber-se da existência de vampiros para se descobrir agora que havia humanos-vampiros ou qualquer coisa que o valha.

Tirando esse erro de discernimento da minha parte estava decidida a manter-me a mim mesma sob controlo para não despertar a atenção de ninguém.

No que toca ao assunto do SC, estava aparentemente resolvido. Como previ o Luís Alecrim foi julgado rapidamente e enfrenta agora uma longa pena de prisão por pedofilia e homicídio de dois jovens que foram encontrados enterrados nas traseiras da igreja.

O namorado da Ana também foi condenado a vários anos de prisão por me ter tentado matar mesmo nas barbas da polícia.

A Ana e restante congregação acabaram por ser considerados inocentes das suas acusações, como eu previra.

Todos declararam em tribunal desconhecer quaisquer práticas sexuais com crianças e que não tiveram nenhuma participação no meu rapto ou conspiração para a minha morte.

Estavam enraivecidos mas tentaram salvar a pele. Seria já suficientemente difícil enfrentar diariamente a opinião pública que os via agora como monstros.

A ‘’Soldados de Cristo’’ estava desacreditada perante a opinião pública e não havia hipótese de reabilita-la.

Cruzei-me com a Ana no julgamento do Paulo, o namorado dela. Quando ele foi levado para a prisão, ela não aguentou e encarou-me de frente com um olhar que me dizia que a guerra não tinha acabado, que eu apenas tinha ganho a primeira batalha.

Sorri provocadoramente como quem diz: ‘’Vá, tenta!’’. Podiam acusar-me de estar a ser cruel, mas não fui eu que comecei, nem fui eu que tentei matar alguém numa fogueira sagrada. Por isso o meu lado negro rejubilava com a sensação de vitória.

Após resolver os dois assuntos mais urgentes, o trabalho e o controlo das minhas capacidades, veio a terceira decisão que devia ser tomada.

Onde viveria eu a partir de agora? Desde Novembro que vivia com o Eric mas agora que o perigo tinha passado deveria continuar com ele ou deveria voltar à minha casa?

Eu gosto de estar com ele todos os dias mas no fundo mudei-me para lá para estar segura e não porque ele me tivesse perguntado se queria viver com ele. Não havendo agora perigo, talvez a decisão lógica fosse fazer as malas e voltar à minha casa, mantendo a nossa relação como ela estava antes de todo o imbróglio do SC.

Resolvi falar com ele sobre o assunto, abertamente, como sempre fiz.

 - Queres ir-te embora? – Perguntou ele com um ar surpreso

 - Não! Não é bem isso, quero saber a tua opinião sobre o assunto. Eu vim para cá porque estava em perigo e agora já não estou. Sinto-me que me estou a impor na tua casa, tu não me pediste para viver contigo.

Ele sorriu

 - Desde quando é preciso dizer-te o que eu sinto? Tu não sabes isso diariamente?

 - Sei, Eric mas isso não invalida que há coisas que eu queira ouvir e não apenas senti-las.

Ele tinha permanecido de pé e veio sentar-se no sofá ao meu lado. Pegou no meu queixo, encostou os lábios aos meus e falou assim encostado a mim.

 - ÉS a minha mulher, seja isso permitido por lei ou não, vivamos juntos ou não.

Tremi.

Ele continuou

 - Gostaria muito, muito mesmo que não te fosses embora. Mesmo que o motivo que te trouxe para cá não tenha sido um convite meu, reafirmo que gostaria que ficasses aqui, comigo. Como um homem e uma mulher que se amam.

Senti-me iluminada por dentro. Todas as moléculas do meu corpo estavam subitamente mergulhadas numa alegria imensa.

Como podia eu ter ainda dúvidas sobre a nossa relação? Ele é meu e eu sou dele e assim foi desde o dia em que nos conhecemos. Não pensei mais em questões meramente relacionadas com relações humanas, se era cedo para ir viver junto ou se nos conhecíamos suficientemente bem. Entre nós a questão temporal não se colocava. Era quase como se tivesse sido uma relação destinada deste sempre. Até o meu ADN estranho colaborava na nossa aproximação. Havia maior prova que o nosso amor era certo do que essa?


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