A Sakura Inglesa escrita por M Iashmine M


Capítulo 1
Capítulo 1 - Transferência


Notas iniciais do capítulo

Oi pessoal, essa é minha segunda história.
Sei que minha última está demorando para sair mais um capítulo, mas é questão de bloqueio criativo (torço para não acontecer com esta também)...
Enfim, espero que gostem e continuem acompanhando.
OBS: A nota final é para fins de curiosidade sobre a história em "bordinhas", por isso não precisam ler se não quiserem.
Beijão e não esqueçam do review!^^



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- Senhores e senhoritas, eu gostaria de lhes apresentar a nova aluna da Universidade. Apesar de ela estar sendo transferida em um período fora do habitual, ela foi legalmente aprovada para ingressar e também foi muito bem indicada pela Universidade de Tóquio e de suas escolas anteriores. Sei que todos já estão em uma fase de vida em que, acredito, não seja mais necessário pedir o que estou prestes a dizer, mas espero que todos sejam muito acolhedores com a senhorita. Classe, esta é Adhara Shitsune, ela veio de Tóquio, no Japão. Peço que ajudem-na a entrar no ritmo da turma e auxiliem em suas dúvidas.

Assim foram meus primeiros minutos após minha transferência para a Universidade de Oxford. Eu sentia como se estivesse em uma escola tipicamente japonesa e o professor estivesse pedindo para todos cuidarem bem de mim.

- Senhorita Shitsune, pode escolher uma carteira. Sinta-se a vontade, há muitas vagas. E bem-vinda a Oxford e à classe de História Natural.

Eu estava atrasada havia um semestre e acompanhar a turma era o mais importante naquele momento. Finalmente eu seguiria meu sonho, cursaria faculdade de Arqueologia e Paleontologia (faria inicialmente as cadeiras que ambos os campos tivessem em comum e depois partiria para as referentes a cada curso).

Mas eu partira para a Inglaterra, não apenas para seguir lá um sonho, mas para meu próprio bem. Eu queria buscar pela aceitação das pessoas, meu lugar na sociedade. Toda minha vida escolar até ali resumia-se em rejeição, mas nada muito justificável; certamente, eu não era a primeira japonesa mestiça a estudar naquelas escolas, mas tudo se devia pela minha aparência: o único traço que mostrava minha herança sanguínea oriental (por parte de pai) eram meus cabelos negros. Meus olhos eram como os de minha mãe inglesa e, não apenas pelos seus formato e contorno tipicamente ocidentais, mas também pelas suas cores atipicamente distintas dos outros mestiços, pois se eles tinham olhos claros, fossem verdes ou azuis, seria algo quase normal e aceitável pelos colegas de aula, mas alguém com heterocromia era realmente uma “anomalia” na sala de aula. Minha mãe tem olhos genuinamente azuis, mas eu tenho tanto um azul quanto um verde. Se ao menos eu fosse inteiramente estrangeira, eles não me tratariam tão indiferentemente. Eu acho.

Eu comecei com alguns poucos amiguinhos no primário, mas com o passar do tempo a brincadeira ficou séria e todos começam a pensar além, começam a formular hipóteses dos mais diversos tipos. Então as diferenças passaram a ter relevância e as hipóteses se tornaram maus tratos e aversão. E eu não conseguia entender o porquê de tudo aquilo, afinal eu era apenas uma criança nascida de dois países, como outros mestiços além de mim. Ainda assim, eu era diferente deles porque os genes que predominaram sobre minhas feições foram os de minha mãe e meus olhos nem ao menos eram puxados.

Não conseguia entender, mas os maus tratos perduraram por muito tempo. A única pessoa que sempre permanecera ao meu lado foi minha amada prima, filha do irmão de minha mãe, Sophia Andrielly Burke-Roche. Não importava qual fosse o desafio, ela sempre estava lá me protegendo (os outros alunos eram geralmente agressivos) e ninguém levantava um só dedo contra ela ou sequer dirigiam-lhe uma palavra rude, afinal ela era da linhagem real inglesa, sangue nobre, filha do 6º Barão de Fermoy.

Mas Sophia não poderia me proteger para sempre e quando ela se foi, voltou para a Inglaterra para lá cursar o ensino médio, minha situação voltou a se tornar fria e cruel. Ao menos eu não era mais agredida, bem, não tão seriamente como já fora, mas ainda havia pés escondidos nos corredores para que eu suavemente tropeçasse com meus materiais no chão ou algo do gênero. Em uma dessas, meus pais quase processaram a escola porque eu caí de uma escadaria de alto a baixo e fui internada no hospital com traumatismo craniano. Felizmente para a escola não fora um traumatismo cranioencefálico, mas quase entrei em coma, segundo os médicos, o que teria ocorrido se eu tivesse sido socorrida pouco mais tarde.

Mas eu sobrevivi e o que restou depois daquilo foram apenas traumas. Felizmente nunca mais fui agredida, mas a rejeição sempre permaneceria. Houve pessoas que nunca estavam envolvidas e que se apiedaram, aproximando-se de mim, o que ajudou de certa forma à minha recuperação. Foram estas pessoas que me ajudaram também enquanto eu ainda estava no hospital. O mais incrível foi que todas estas coisas aconteceram em escolas particulares - afinal meus pais sempre tentaram me dar as melhores oportunidades de cultura e aprendizado (ainda mais sendo meu pai o sócio de uma multinacional, cuja matriz estava a seus cuidados exatamente em Tóquio, e mamãe sendo a curadora do Museu Nacional de Tóquio, o maior e mais antigo museu do Japão).

Todo esse tempo que passou, tudo o que poderia ser feito para eu suportar tudo dependia de mim, dependia de como eu encaixaria as “peças” (chances) que me fossem dadas, fosse por meus pais ou meus professores. Tornei, então, o Museu da mamãe em meu playground, onde aprendi sobre muitas coisas e onde me apaixonei por história antiga (obviamente raras coisas eram sobre o exterior, afinal o museu é japonês). Com isso meu sonho foi se formando e me permitiu estar onde estou hoje. Inicialmente, ingressei na Universidade de Tóquio, mas meus pais compreenderam quando eu disse que estava farta daquela rejeição (fiquei um semestre inteiro lá só para descobrir que muitos ex-colegas estariam no mesmo lugar e o tratamento seria o mesmo de antigamente) e pedi para vir para cá. Tanto como compreenderam, assim o aceitaram para meu bem. Apesar de serem a única fonte de carinho que eu possuía até então, não tentaram nada para evitar minha partida e tudo isso se reforçou pelo fato de que eu não ficaria sozinha aqui em Oxford. A partir de agora, até sair da Universidade provavelmente, irei morar com a família de meu tio, a família de Sophia.

Realmente, parece bom demais para ser verdade (por isso acredito que alguma coisa dará errada), pois quando entramos em contato com o titio Patrick para saber se seria possível minha longa estada em sua casa, a resposta que recebemos foi que eu já deveria ter decidido tal coisa desde que Sophia havia retornado de Tóquio para a Inglaterra, anos antes. Isso foi tanto um caloroso “SIM!” como também foi o encontro da felicidade para mim, afinal eu finalmente veria minha salvadora e melhor amiga, minha prima. Tio Patrick disse que Sophy também está em Oxford (provavelmente nos cruzaremos muitos pelo campus, já que ela está cursando Publicidade) e que também finalmente poderei conhecer um primo que nunca antes soubera sequer da existência. Aparentemente ele é mais velho que Sophy, mas nunca está em casa por causa da faculdade (sobre isso não me contaram muito), então ainda é provável que demore um pouco até conhecê-lo.

Depois de dois dias eu já havia gravado alguns nomes, mas logo no primeiro dia gravei o primeiro: Mathew Parsival Dantonn, aparentemente um francês. Louro de olhos caramelos, corpo atlético de mais ou menos 1,86m de altura, espírito de poeta. Assim como eu, parecia que o gosto pelas coisas antigas vinha dos pais: sua mãe era a “bibliotecária-chefe” de Oxford e seu pai era um dos principais responsáveis pelo arsenal do Louvre, em Paris (o que lembrou muito minha mãe). Mas o mais incrível era sua vocação para poesia, o que me fazia pensar o porquê de Dantonn ter escolhido Museologia (faríamos algumas cadeiras em comum por algum tempo): carregava sempre consigo um livro grosso e antigo de poesia romana e grega e uma caderneta, onde ora ou outra, sentado em algum banco do campus, escrevia alguns versos.

- Por que não escolheu cursar Letras ou algo parecido? – perguntei certa vez, quando sentamos juntos para um lanche. Já havia se passado uma semana e ele me proibira de chamá-lo pelo último nome, afinal éramos colegas de igual para igual. Na linguagem dele isso significava que éramos amigos, ou algo do gênero.

- Confesso que meu amor pela poesia é algo quase incalculável – começou ele, a voz suave como se estivesse recitando um poema – a ponto de prender minha atenção sempre que eu estiver com ou sem outra ocupação. No entanto, Adhara, não almejo isso para toda minha vida.

- O que quer dizer? – Ele me emprestara seu caderno de versos para ler por um momento naquela tarde e eu agora alisava sua capa de couro com a ponta dos dedos.

- Veja bem, eu posso fazer isso a qualquer momento, como um pássaro pode cantar a hora que quiser, mas o pássaro também precisa acima de tudo voar, também precisa comer e criar uma casa com uma família.

- Mas você não é um pássaro, Mathew – brinquei sem querer ofendê-lo, é claro.

- Eu sei, mas, como você deve ter entendido como acredito que tenha, eu também tenho outras coisas a desempenhar na vida e será a poesia que irá preencher o resto – disse, olhando para o céu por entre os galhos do plátano sob o qual estávamos sentados, - como um vôo.

- Entendo. Você quer escolher um caminho e seja ele qual for você irá preencher suas lacunas com poemas. Será seu ponto de fuga, assim como já o é; seu hobby.

- A ideia ficou até mais graciosa com as palavras, digo, do jeito como você a colocou – agora ele me olhou de lado, com a cabeça ainda inclinada para trás de antes, sorrindo com ares satisfeitos. – Agrada-me a companhia de pessoas que me entendam.

- Certo, certo, – olhei-lhe de lado também, sorrindo cautelosamente – só não fique inspirado para um poema por causa disso. Eu ficaria um pouco constrangida.

- Isso seria realmente lindo e eu ficaria mais inspirado – riu ele.

- Nem brinca Mathew! – falei, já corando.

– Aliás, Pode me chamar apenas de Matt, sempre preferi ser chamado assim pelos meus amigos, apesar de não ter tido muitos até hoje.

- Ahm, entendo. Não somos muito diferentes neste aspecto então – meu rosto deve ter empalidecido.

Ele endireitou-se e olhou mais atenciosamente para mim, parecendo preocupado. Devia ser pela minha expressão, afinal aquilo me trouxera rápidas lembranças.

- Quer falar sobre isso? Eu posso ouvir se quiser desabafar.

- Não, Matt, obrigada. Mas só de saber disso, meu coração já fica mais leve. Obrigada mesmo.

Ficamos em silêncio por um momento, apenas olhando as pessoas passando. Estava ventando, mas o ar era quente de certa forma. A brisa sacudia a barra do meu vestido, mas não fazia nem cócegas nos jeans de Matt. Apenas olhando para ele, para suas roupas, você o julgaria justamente pelo oposto do que é: usava jeans escuros, camisa curta semi-social verde-musgo risca giz, “sapatênis” brancos e, a única coisa que lhe dava o ar de poeta, um cachecol de linho em cor trigo. Parecia mais um rebelde rico, ainda mais com seu cabelo levemente comprido e repicado. Mas os óculos de leitura (que só usava para ler e escrever) entregaram-no logo na primeira vez que o vi escrevendo solitariamente embaixo daquele mesmo plátano onde estávamos agora.

- Tudo bem, Adhara. Mas sempre estarei pronto para ouvi-la, independente de lugar e hora. Quando precisar conversar, venha até mim. Sabe que pode...

- Sim, sei que posso confiar em você – completei sua frase. – Obrigada mesmo, farei isso.

Esperamos mais um pouco.

- Preparada para sua recepção?

- O que? – Eu não sabia onde minha cabeça estava, mas naquele momento Matt a trouxe de volta com sua pergunta.

- A recepção interna que a Direção fará para você sábado à noite. Como você perdeu as boas-vindas tradicionais aos calouros no início do semestre, agora haverá sua festa particular, lembra-se?

De fato, eu recebera uma carta do Heitor da universidade na saída de uma das aulas naquela semana. Informava sobre uma festa de recepção particular, que ocorreria naquele sábado, entre os superiores – a direção da escola, é claro – e alguns poucos e mais ilustres alunos veteranos para me darem as boas-vindas pelo meu ingresso em Oxford. Como PS, o Heitor informava que eu estava autorizada a levar de um a dois acompanhantes de minha escolha. Obviamente eu já tinha pelo menos um em mente.

- Preparada não seria a palavra certa, mas curiosa devo admitir que esteja. Nunca passei por algo assim na vida, por isso acho que estou um pouco empolgada.

- Isso é ótimo – disse Mathew. – Quero dizer, será sua festa afinal.

- Mas estou insegura ainda e gostaria de uma companhia – olhei para ele insinuativamente. – Irei se fores comigo.

Ele me olhou como se estivesse pensando “Não me envolva em algo tão sério” ou “Você está planejando alguma coisa, não está?”. Por fim suspirou e disse:

- Desde que eu não seja barrado na porta principal ou vire motivo de fofocas, aceito ser seu acompanhante. Mas isto é só porque simpatizo com você e porque você me entende.

- Matt, não enrole tanto...

- Está bem, está bem. Farei isso porque somos amigos – suspirou novamente.

- Matt, você é um cara incrível – dei-lhe um tapinha no ombro.


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Notas finais do capítulo

[NOTA sobre a Família Fermoy: não necessário ler, é só a título de curiosidade mesmo]• Edmund Maurice Burke-Roche, 4.° Barão Fermoy (15 de maio de 1885 — 8 de julho de 1955) foi um nobre britânico, político do conservador e avô materno da Diana, Princesa de Gales.• O filho de Edmund Burke-Roche, 5° barão Fermoy, e de sua esposa, Lavinia Pitman,o primo-irmão da Princesa Diana, Patrick Burke-Roche, torno-se o 6º Barão Fermoy (Irlanda).[O Barão Patrick Burke-Roche de fato existe, mas a família do Barão de Fermoy por parte da mãe de Adhara é completamente fictícia]Sobre Tokyo National Museum (Museu Nacional de Tóquio), quem estiver curioso pode espiar no site do museu propriamente dito:http://www.tnm.go.jp/en/servlet/Con?pageId=X00&processId=00Desculpe a longa nota final, gente.Por favor, não esqueçam do review! Com carinho!Vampi-chan



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