In My Head escrita por IsabelNery


Capítulo 8
Uma Nova Terra


Notas iniciais do capítulo

Mil desculpas pela demora.



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Assim que entraram, o frio sumiu. Estava demasiadamente quente, ao menos comparado ao local anterior. Era um buraco sim. Com as mesmas cores, roxo claro misturado com azul escuro e ponto brilhantes. Não era apertado como aparentava. Era muito espaçoso. Mas os dois continuavam a cair. Não se podia esticar a mão para fora, se o tentassem, seus dedos tocariam uma superfície dura, fria e repleta de rachaduras. Seria pedra? Não sabiam dizer ao certo e não conseguiam se segurar nisso de qualquer forma, suas mãos escorregaram dentre as rachaduras ao redor, e alguns de seus dedos rosados foram levemente cortados. Essa estrutura não se quebrava. Até mesmo, porque despencavam rapidamente pelos seus próprios pesos e o “chão” não chegava. Já se passara alguns minutos desde que Isabelle e Filipe haviam mergulhado no chamado "buraco negro". Haviam soltado as mãos há muito tempo. Parecia fazer horas que estavam caindo. O vento no rosto balançava seus cabelos. Caso olhassem para baixo, só veriam escuridão. Estariam eles presos para sempre?

Ninguém falava. No começo até deram alguns gritos, mas se acostumaram. De certo modo, estavam felizes por não ter frio. Aquela temperatura era agradável, uns 20 graus Celsius, talvez menos. Contudo, outro problema perecera. A fome. Aquele vazio que corroía seus estômagos, as gargantas coçando por água.

Que horas seriam no mundo real? Isabelle se perguntava. Deveria ser de tarde. Era impossível saber a hora exata.

Para aqueles que querem ou praticam bungee jump, a sensação de queda é boa, é legal. Mas é rápida. Sorte para eles. Com a demora, ela começa a ficar enjoativo, toda a alegria do começo se vai. E, nesse caso, nem alegria no começo teve.

Não era perceptivo aos olhos humanos deles, mas a cada minuto, um centímetro de diâmetro de espaço no buraco era retirado. Caso fossem calcular: duas horas, 120 minutos. 120 centímetros a menos. Óbvio que a esse momento, eles já perceberam. No começo o buraco deveria ter cerca de dois metros e meio de diâmetro. Agora, pouco mais de um. Ocorreu a Filipe a ideia de um plano. Que talvez desse certo.

— Suba nas minhas costas. – Ele disse. Com a voz áspera. Apesar do sotaque, ela compreendeu.

— Por que? – Com os olhos arregalados.

— Apenas faça isso. – À contragosto ela se apoiou. Com as mãos no pescoço dele e cada joelho em um lado de seu quadril, pelo menos assim eles teriam menos chance de se cortar nas paredes. E, caso houvesse alguma saída, ela seria pequena demais para que os dois escapassem antes dela se “fechar”. Era um plano complexo, de acordo com ele, talvez os outros dois, Rosa e Tyler, conseguiram sair mais fácil, pois caíram sozinhos.

Ele apenas olhava para baixo, na esperança de ver algo além do escuro. Sentia que ia desmaiar de fome, todavia fazia o possível para continuar firme. Após alguns minutos, ela não conseguiria sair das costas dele mesmo que quisesse, pois o espaço se tornou pequeno demais para dois corpos lado a lado. Até que ele viu uma luz. Mesmo que distante, já era uma esperança.

Quando faltava poucos metros para ele ir de encontro com a luz. Filipe estendeu as mãos para frente e as plantas dos pés para a parede, em uma falha tentativa de parar, ou pelo menos diminuir o ritmo da queda. Entretanto, aquela força que os trazia para baixo era forte demais e cortes surgiram rapidamente nos dedos do garoto. Um pouco de sangue, devido às rachaduras. Será que outros além de nós já caíram aqui e racharam a parede? Ele se perguntou. Até mesmo se imaginou tocando numa parede lisa, como talvez deveria ter sido antes. Ou como ele pensava que poderia ter sido.

De qualquer forma, a luz branca ofuscava seus olhos, e tomou parte de cada espaço ao seu redor. Só viam o escuro se olharem para cima. Mesmo assim, a escuridão se parecia uma lembrança distante. E pouco tempo depois, uma fraca memória, quase esquecida.

As paredes os esmagariam daqui a pouco se continuassem parados. E aos seus pés, podiam sentir uma fina camada fria. Por uma brecha ele viu que o único lugar que podiam cair se aproximava cada vez mais: a luz branca. Isabelle ficou em pé nas costas do menino. E algo diminui a velocidade de seu ritmo de queda.

Só viram branco, todo esse claro ofuscava seus olhos, era como olhar para o sol num dia quente de verão. Sem outra escolha, fecharam os olhos. A temperatura ainda era agradável. Antes de abrirem os olhos, passaram por mais um choque térmico. Seguido por uma queda. Sim, finalmente seus corpos encontraram o chão. Ou melhor, a neve. Uma fina camada dela. O impacto não foi tão forte quanto parecia. Devem ter despencado no máximo de poucos metros, talvez nem isso. Ele caiu de bruços e ela com as costas no chão. Cada um a mais ou menos um metro distância do outro no chão. Uma mistura de cheiros invadia suas narinas, a maioria não eram muito agradáveis. Ela foi a primeira a abrir os olhos. Tomou um susto logo de vez. Levantou-se rapidamente. Estavam no topo de uma colina. Pode ver tudo mais claramente. Mas não gostou do que viu. Um rebanho de porcos em um cercado com plantações do que parecia ser trigo e algodão próximas. Viu também uma casa bastante simples e pequena. Nada moderna, nem se parecia com qualquer casa de fazenda que já tinha visto. Não era da sua época. Avistou alguns homens de chapéu de palha. E roupas incomuns. Macacões em geral. Frouxos e velhos. Achava que era uma família, pois havia um homem de cabelos grisalhos junto com outros quatro que deveriam ser seus filhos. Ela olhou para o lado e viu o português em estado de choque.

Com a boca aberta e fazendo o máximo de esforço para não chorar. Filipe não conseguia raciocinar o que ocorreu. Até agora, os “fazendeiros” não perceberam duas figuras na colina. Ele podia ver pequenos flocos de neve caindo ao seu redor, mas no momento não estava absorto demais para prestar atenção em sua beleza. Absorto o suficiente para nem sequer perceber que Isabelle havia desmaiado ao seu lado.

O português sabia que não conseguiria se mover caso passasse mais alguns minutos em plena neve com as roupas finas que haviam lhe colocado. E aquelas companheiras indesejadas voltaram, na verdade uma nunca foi embora. Fome e frio, que quando somados, resultam numa catástrofe.

O mais jovem dos que trabalhavam, aquele que alimentava os animais, por acaso olhou de relance para a colina quando um dos porcos tentava fugir. Uma criança de oito anos.

— Père! (Pai) – Gritou apontando para a colina, onde havia um garoto de joelhos e uma figura no chão. Seria outra pessoa? Eles não estão com frio? Pensou o pequeno Marcus. 

— Oh, mon Dieu! Joseph, Adam et Pierre, les amener à l'intérieur. (Oh, Meu Deus! Joseph, Adam e Pierre, os tragam para dentro.) – E assim, os três mais velhos à comando do pai, subiram a ladeira. No final, Joseph trouxe Isabelle nos braços. Enquanto Pierre e Adam ajudavam Filipe a andar. Uma senhora de aparentemente 30 anos abriu a porta da casa, era na verdade uma pequena e acolhedora cabanal, cujo chão de madeira rangia à medida que se movimentavam sobre ele.

Dentro da pequena casa, o frio estava menos presente devido a uma pequena lareira. Colocaram Filipe em um banco de madeira com um pouco de feno em cima. O homem mais velho tocou com a parte de fora da mão a testa do menino, ao ver que estava gelada começou a dar ordens. Todos estavam encolhidos na sala. E Joseph estava com Isabelle no colo, ainda desmaiada.

— Marie, lait chaud! (Marie, leite quente!) – A mulher se levantou, abriu um armário e retirou duas garrafas de vidro com um conteúdo branco, aparentemente viscoso. Despejou em dois copos feitos de madeira.

— Joseph, apportez les couvertures qui sont dans la salle! (Joseph, traga as cobertas que estão no quarto!) – O mais velho deixou Isabelle em cima de um banco, saiu andando apressado e entrou num cômodo sem portas. Todos ouviram o barulho de algo caindo, mas parecia natural Joseph ser desastrado, pois ninguém foi até lá. Isabelle ainda dormia, e Filipe bebericava o copo que a mulher colocou na sua frente enquanto se esforçava para não encarar às pessoas à sua frente e tentar lembrar o básico das lições de francês que teve em outra vida. Seus lábios estavam tremendo, ele analisava o local com um pouco de perspicácia. Contudo, não ousava erguer a cabeça. 

Finalmente, Joseph regressou, com grossos cobertores amarelos nos braços. Colocou-os em cima da mesa e foi falar com os irmãos mais velhos. O homem da casa pegou um dos cobertores e colocou entre os ombros de Filipe, o português sorriu um pouco em forma de agradecimento. Colocaram Isabelle numa das cadeiras, equilibrando-a para não cair para os lados. E a enrolaram no cobertor. O menino tinha que admitir, eles estavam sendo bons com quem nunca viram, podíamos ser inimigos, e, de fato, não deixávamos de ser invasores. Ele estendeu o copo e a mulher colocou um pouco mais de leite. O grupo de três irmãos estava mais distante da situação. Conversavam em sussurros, até que decidiram voltar para seus afazeres. Somente o mais jovem continuou na sala, o mesmo que identificou os estranhos na colina há algum tempo. Ele ficou ao lado da garota, com medo que ela caísse. Checou sua temperatura repetidas vezes como o pai fez com Filipe e observava sua beleza exótica com tamanha curiosidade. Segurou o copo que a mãe encheu em frente a boca da estranha. Virou alguns milímetros, o suficiente para cair um pouco do leite dentro dela. Isabelle acordou em meio a tossidas. Olhou para todos assustada, teve um pouco de alívio ao ver o conhecido, mas este alívio foi bastante fugaz em comparação ao turbilhão de sentimentos que percorriam sua mente no momento. Ouviu-se um barulho vindo do estômago da garota. E a mulher foi correndo para a cozinha.

Aquele garotinho continuava a encarar os visitantes. Dividia o tempo entre um e outro. Seu pai não parava quieto, tentava falar com eles, mas Isabelle não falava francês e Filipe, que sabia o básico da língua, estava em um estado de choque tão grande que era incapaz de emitir um som. Nenhum dos integrantes daquela família havia visto estrangeiros, ou escutado outra língua em toda sua vida. A mulher continuava a fazer alguma coisa na cozinha, não só para os intrusos como para o resto de seus familiares.

Isabelle queria falar alguma, ela se incomodava facilmente em manter a boca fechada. Podiam ver pequenos flocos de neve cair pela janela. Viu neve poucas vezes em sua vida e amava o calor. Ela sabia que não se acostumaria com isso.

Há quanto tempo estariam ali? O português se perguntava. Tinha raiva de si por não ter a mínima ideia. Apesar de ainda esperar que fosse um sonho, mas ele mesmo sabia que não era sortudo o suficiente para tal.

A brasileira finalmente tomou coragem e perguntou em sussurro: Por quanto tempo eu desmaiei? – Levou certo tempo até que ele entendesse.

— Pouco. No máximo trinta minutos. – Sussurrou tentando falar devagar, mas ela não compreendeu. Todos na sala os observavam como se estivessem assistindo a uma peça. Os olhos vidrados. As bocas abertas. Até os irmãos que estavam trabalhando voltaram para o ambiente.

Por quanto tempo continuariam ali? Essa pergunta espantava os dois. Sabiam que a família era atenciosa, era muito melhor que o quarto cinza, mas queriam voltar para suas casas, para suas vidas.


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Notas finais do capítulo

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