In My Head escrita por IsabelNery


Capítulo 7
Buraco Negro


Notas iniciais do capítulo

Mil desculpas pela demora, eu tive alguns problemas para postar. Espero que gostem. Beijos.



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De repente, um sinal alto, como um alarme de carro, penetrou no quarto. Um PIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIII... Desagradável. Todos taparam os ouvidos. Era ensurdecedor.

E algo, um computador, ou até mesmo uma pessoa disse: PRIMEIRA PROVA EM QUINZE MINUTOS. PREPAREM-SE.

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O “Aviso” foi dito em todas as quatro línguas, com o sotaque de cada local. Primeiramente, no português brasileiro, depois no português de Portugal, seguido pelo espanhol e, por último, inglês. Na ordem crescente de idades. Com uma pausa de aproximadamente cinco segundos entre cada fala. Mas isso não importava naquele momento. Pois o quarteto não entendeu o recado. Permaneceram calados, com as mentes chegando a doer de pensar, de tentar descobrir o que era aquilo.

Filipe não sentia tanta dor, consequentemente, conseguiria aguentar a fome e o frio por um pouco mais de tempo, contudo, sentia medo. Isabelle já era bem mais fraca, estava com fome, e a essa altura já tinha pego dois edredons. O dela e o de Filipe. Já que Rosa havia pego os de todas as camas extras mais o dela. E, como estava sempre de regime, dizia que não estava com fome, mas seu estômago não acreditava. Tyler, era acostumado a duas refeições por dia: O jantar, já que acordava tarde e ia direto ao emprego. E de madrugada, alguns petiscos que acompanhavam a bebida. Para falar a verdade, ele ainda estava com sono.

Já se passaram dez minutos, mas, para Filipe parecia um tempo muito mais longo, ele estava concentrado em descobrir que tipo de prova seria essa, escrita? Oral? Ou seria física? Cada uma menos provável do que iria acontecer, e cada vez Rosa chorava mais e gritava alto. Isabelle já parara de chorar. Apenas teve a coragem de falar alguma coisa, na verdade, de perguntar alguma coisa.

— V-Vamos...morrer? – Filipe a olhou incrédulo, essa ideia não lhe havia passado pela cabeça.

— Não pense nisso, tudo vai ficar bem. – E na sua mente completou: "Eu espero". Seu coração batia cada vez mais rápido, como o de uma criança sem saber se a surpresa ia ser boa ou ruim. Voltou a cama que acordou na parte de cima do beliche do outro lado da parede. Apenas se sentou e decidiu esperar o que viesse. A opção estar morto e esse ser o “céu”, estava cada vez mais provável.

Isabelle foi para a cama de cima do beliche que estava. Tyler já estava na dele, com as pernas balançando. Rosa continuou na cama que acordou, na parte de baixo do beliche. Nessa hora, a insegurança era maior que o medo, o medo de morrer, ou já ter morrido.

Todos perdidos em pensamentos, ninguém percebeu que algo mudara no chão frio. No cruzamento do chão com a parede, entre as beliches de Tyler e Isabelle, uma camada violeta com pontos brilhantes, que pareciam estrelas se espalhava lentamente. Era como se um pedaço do universo estivesse no chão. Não tinha relevo. Esse fino pedaço, como uma cobra. Foi visto por um dos prisioneiros. Tyler.

Olhou curioso, esse pedaço foi formando uma circunferência. Ele não acabava, saiam mais e mais dele da parede, como uma pintura. Isabelle seguiu o olhar de Tyler. O pedaço ia girando igual a um caracol. Mas, um grito acordou Filipe de seus pensamentos. A espanhola. Subiu para a cama de cima com certa dificuldade mas em uma velocidade rápida assim que observou o chão. Ela continuava gritando, até que ficou sem ar, e o silêncio voltou. Contudo, não era ele que reinava naquele quarto, e sim, o pavor. O português seguiu o olhar dos outros até o chão. Não se assustou a princípio. Seu cérebro demorou um pouco para raciocinar. Não conseguia parar de olhar aquilo, nem ele, nem ninguém. Aquilo os atraía. Até que, entre os quatro beliches, aquele pedaço do céu terminou seu “caracol” no chão. Com isso, existia uma espécie de buraco negro em forma de círculo, com aspecto de roxo misturado com azul e pontos brilhantes.

Imagine-se esticar os dois braços para as laterais e girar. Seria aproximadamente este o tamanho do buraco no chão.

O americano se curvou tanto na beira da cama para observar melhor, que caiu, devia ter sido uma bela queda de cabeça, de quase dois metros de altura. Porém, Tyler mergulhou no buraco negro e desapareceu. Foi engolido pela escuridão, sem gritos, sem choros, sem palavras. Simplesmente foi embora. Morreu? Quem saberia?

Assustados e mudos continuaram ali. Seria uma escolha nossa morrer?

Entre o pavor e o silêncio, o frio e a fome eram constantes. Inimigos que não os largavam. Presentes por todo o tempo. Perguntas se formavam nas cabecinhas pensantes dos jovens. Seria este lugar quente? Ou menos frio?

Seria o céu?

O inferno?

Novamente aquela sensação do ar esfriar mais, como se fosse possível. Os dedos das mãos paralisavam vez ou outra. Os dos pés nem se mexiam. As cabeças olhavam para um canto fixo. E os olhos piscavam devagar, como se estivessem em câmera lenta. Olhos vazios, sem esperanças, opacos. Bocas? Quem daria um sorriso nessa hora? Um masoquista?

Isabelle não estava suportando, seu limite havia chegado. Mas, Rosa já tinha ultrapassado o seu há tempos. Sentia que ia desmaiar a qualquer segundo. Os lençóis não a esquentavam, ia ter uma hipotermia mais cedo ou mais tarde. Já estava desesperada, mas surtou quando quis passar a mão no cabelo e não conseguiu movê-la. Seria uma morte rápida. Um suicídio. Pensou.

E sem mais delongas, deu uma última olhada no quarto, agarrou um dos edredons, deixou algumas lágrimas escorrerem pela face. De modo curioso, elas lhe esquentavam o rosto. Desceu da cama de cima, e ficou em pé no chão cinza e frio. Essa reação assustou aos outros. Pulou dentro do local onde Tyler caíra. Dois já foram, faltam mais dois.

Filipe ficou em pé na cama de cima, o teto era tão alto que ainda faltava bastante para a cabeça do menino bater nele. A brasileira ficou assustada, pensou que ele iria pular no buraco negro. Ela arregalou os olhos assustada. Tinha medo de ficar sozinha. Ele colocou uma das pernas mais para trás, para pegar mais impulso no salto. Apoiou-se no pé direito que estava na frente, pegou impulso no de trás e saltou. Não para o buraco, e sim para a cama de cima do beliche em que Rosa acordara. Parecia cansado, as olheiras que sempre lhe acompanhavam estavam mais escuras, um pouco roxas. Mas não estavam profundas.

Chegando na cama de cima do outro lado do quarto quase caiu, mas se segurou na grade de metal. Isabelle olhava-o incrédula. Não conseguia acreditar que aquele garoto de aparência calma fosse tão estúpido. Ela queria gritar com ele, repreendê-lo. Mas não tinha autoridade sobre ele. Ele sorria como um bobo. Adorava o perigo e tinha aprendido a viver com o medo. Simplesmente, pulou a grade e sentou com Isabelle na cama de cima do outro beliche. Ela não aguentou mais e perguntou com certa raiva em seu tom de voz.

— Por que diabos você fez isso? – Ele a olhou calmo. A roupa que colocaram neles era praticamente igual: uma camiseta de manga longa e calças cinzas. Ela estava com o cabelo preso em um rabo-de-cavalo.

— Não dava para pular quando a outra estava aqui. Ela podia se desequilibrar e cair naquilo. – Falou bem devagar para não ter que repetir. Ela ficou com mais raiva ainda. Que garoto burro.

— Sabe o que é isso?- Apontou para o chão, estava encostada na parede com medo de cair. Ele balançou a cabeça em negativa. Incrível como as emoções mudam rápido, a raiva dela já havia passado completamente, sendo substituída por um misto de medo e tristeza.

— Para onde eles foram?- Lágrimas nos olhos. Sua voz parecia mais alta no silêncio. – Filipe, para onde eles foram?

— Eu... Eu não sei. – Odiava não saber nenhuma resposta. Sentia que estava perdendo um jogo. Odiava perder. Cresceu com cinco irmãos mais velhos, nunca gostou de ser o mais burro. Aquele que não sabia de nada. Tinha esse rancor desde muito pequeno.

A brasileira desabou, se encolheu, colocou os braços em cima dos joelhos e chorou com a cabeça baixa. A típica posição fetal. Passou-se um tempo assim, ela chorando e ele observando, também estava com fome, cansado, com frio e, com saudades. Deixava algumas lágrimas escorrerem pela face. Queria consola-lá, só assim consolaria a si mesmo. Era bom em dar conselhos a todos, com exceção dele próprio. Já pensara em ser psicólogo, mas não estava na curta lista dos poucos trabalhos aprovados pelos seus pais. Umedeceu os lábios secos e abriu a boca, uma corrente de ar gélido penetrou-lhe, suspirou e pegou alguns lençóis que Rosa havia deixado.

— Tente não pensar nisso – Ele puxava bastante o S no seu sotaque. Apesar disso, Isabelle entendeu.

— Por que não? – Uma frase simples, mas se fosse outro português, talvez não entenderia, entretanto Filipe estava acostumado com idiomas diferentes, com sotaques diferentes, já havia viajado para quase todos os países da Europa, com exceção da Suíça. Sabia falar um pouco de cada língua. Apesar de suas viagens serem em maioria solitárias, com um monte de empregados e com seus irmãos que sempre traziam companhia para ficar ocupados. Seus pais? Nem pensar, tinham coisas mais importantes para fazer. E Elisa era pequena demais para aguentar longas caminhadas apenas para ver uma estátua. Ele passava a maior parte dos finais de semana e feriados nos portos, gostava de nadar, velejar, sentia-se livre com vento batendo no rosto. E era nisso que pensava para tentar afastar os problemas que ele batizou de FFS. Frio, fome e saudade.

— Para tentar esquecê-los, mesmo que seja por um tempo. – Ele disse enquanto se enrolava em um dos cobertores.

— Você acha que devo pular? Qualquer mundo seria melhor que esse lugar. – Ele a encarou por alguns segundos. As lágrimas ainda desciam, com menos freqüência do rosto da pequena.

— Isabelle, você não consegue aguentar mais? – Ela suspirou e levou um tempo pensando antes de responder.

— A-acho que por mais duas ou três horas. – Murmurou. Era seu máximo. Somente aqueles que têm uma doença sem cura pensariam no que ela pensava. “Vou morrer daqui a pouco, esse é o tempo que resta da minha vida. O que deverei fazer?” Mas, no fundo, ela tinha uma esperança, uma espécie de fé, que iria conseguir escapar, mesmo que não quisesse acreditar. Tinha que tentar de tudo. Faltava apenas o buraco, o portal, aquele troço maldito no meio da sala. Já haviam batido as paredes. Estava enjoada de todo esse cinza. – Eu não quero morrer. – Voltaram as lágrimas, seu rosto começara a ficar vermelho em algumas partes, devido ao choro. Numa tentativa de consolo, o garoto colocou seu braço esquerdo pelos ombros dela.

— Shhh, calma, você quer pular? – Balançou a cabeça para cima e para baixo. – Sabe que pode se arrepender disso mais tarde, não sabe? – Era incrível que por esse diálogo, não havia a menor dificuldade em compreender o outro. Isso foi curioso.

Ela inspirou bem fundo e disse com clareza, sem murmúrios e susurros – Também sei que vou me arrepender mais tarde se não tiver tentado de tudo.

— Tudo bem. Eu pulo com você.

— Por quê?

—Tenho medo de ficar só. – A coisa mais estranha era que ele apenas estava a salvo sozinho por grande parte de sua vida. Nessa situação, ele se colocou como sendo masoquista, coisa que não era de jeito nenhum. Filipe se levantou, ajudou Isabelle a levantar. Segurou sua mão. – Pronta?

— Sim – “O que eu não daria pra estar com a peste agora” Pensou.

Segurava com força a mão do garoto, com medo de cair. Com medo de soltar. Até que saltaram. Com medo, tinham que acreditar na dúvida. Mas como confiar em algo totalmente desconhecido? Só com coragem. E, se mesmo assim, ela não for o suficiente para salvar sua vida?


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Notas finais do capítulo

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