In My Head escrita por IsabelNery


Capítulo 29
Rosa: Desativada




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P.O.V. Rosa

Estava um breu intenso, como se estivesse de olhos fechados. Porém, os fechando ou os abrindo, o escuro continuava o mesmo. E, em uma piscar de olhos, a claridade veio tão forte que me cegou durante um breve momento. Pisquei mais algumas vezes até conseguir enxergar ao meu redor, estava em minha cama, minha antiga cama de uma outra vida. Apenas sorri e me aconcheguei entre os lençóis. Voltei meus olhos para admirar meu quarto, até que vi a cadeira à minha frente e lembrei o que aconteceu na última vez que estivesse nesse cômodo. Minha melhor amiga Amanda estava amarrada nessa cadeira com os olhos vermelhos e inchados, meu ex-namorado Guilherme estava com uma faca ameaçando matá-la caso eu não dormisse com ele. Eu não aguentei e soltei um grito, não lembrava do que havia acontecido em seguida pois tudo havia ficado preto e quando acordei já estava no quarto cinza. Em questão de segundos meu pai entra pela porta correndo. Nunca em toda a minha vida, ele se deu ao trabalho de passar mais de dois minutos nesse quarto e tenho quase certeza que isso ocorreu apenas quando comprou nossa casa.

— Rosa, está bem? Algo aconteceu? Eu ouvi um grito – Ele falou e se aproximou para me abraçar, eu o correspondi, mas não me lembrava ao certo a última vez que ele havia me abraçado.

— O que aconteceu? Que dia é hoje? Eu não consigo me lembrar de nada. O senhor não deveria estar trabalhando? – Falei ainda um pouco atordoada.

— Bem, como eu poderia estar trabalhando depois de ontem? Preciso de um tempo para dar atenção a minha família. Você ainda deve estar confusa. Vamos lá, após o jantar alguns funcionários escutaram o barulho de gritos vindo do seu quarto, um deles olhou pela fechadura da porta e viu alguém amarrado em uma cadeira e correu para avisar a sua mãe e a mim. Nós chamamos a polícia imediatamente, em menos de dez minutos eles chegaram e entraram no seu quarto. Conseguiram imobilizar aquele filho da puta, ele passou a noite na prisão, no dia do seu julgamento eu vou fazê-lo pagar, não se preocupe. Soltaram sua amiga, a coitadinha, estava tremendo de tanto medo. Você estava desmaiada, aquele miserável apagou você com alguma substância, não se preocupe, o médico já veio te ver ontem mesmo e vai voltar hoje de tarde. Tudo vai ficar bem, não se preocupe, nada aconteceu, você está bem e isso é tudo que importa. Me perdoe por ter sido tão ausente na sua vida, poderia ter percebido que ele era um psicopata antes. – Quando menos esperava, meu pai havia retirado seus óculos com grossas lentes e estava enxugando uma lágrima. Fiquei chocada, nunca em toda minha vida o havia visto chorar, nem mesmo quando minha avó faleceu anos atrás. Não tive outra ação a não ser abraçá-lo bem forte. O mesmo abraço que estivera ausente na maioria dos meus aniversários, na minha formatura de jardim de infância, naquele dez em física que tirei uma única vez, quando fiz um bolo para ele no aniversário dele, entre outros. Em poucos segundos, estava chorando também, mas eram lágrimas estranhas que percorriam minhas bochechas róseas, eram lágrimas de uma felicidade cujo teor para mim era desconhecido.

Após o que pareceu horas, o abraço terminou, mas meu pai continuava lá, em pé, olhando e sorrindo para mim.

— Vou pedir para trazerem algo para você comer, precisa se alimentar bem. Vou ligar para sua amiga também. Eu te amo, filha, mesmo que nem sempre demonstre. – E com um beijo na minha testa ele saiu do quarto.

Ainda estava um pouco tonta, e todo aquele cinza? Belle, Filipe, Tyler, eles não passaram de um sonho? Não, não poderia ter sido só isso, na minha cabeça aquela experiência era mais que real, um sonho não poderia resumi-la tão facilmente. Lembrei-me que, antes do fim de tudo, trocamos contatos, havia um papel, onde eu coloquei esse papel? Estava usando meu velho pijama e havia posto o papel no bolso da roupa que nos havia sido entregue. Levantei-me de súbito apenas para encontrá-lo no meio do meu travesseiro onde minha cabeça repousava minutos atrás. Esse pequeno pedaço de papel nada mais era que uma prova de que tudo que havia acontecido era real, havia de fato ocorrido, mas como? Mesmo com todas as explicações que deram, ainda estava tudo embaralhado para mim. Foram dias lá e o ataque envolvendo Guilherme, de acordo com meu pai, ocorreu ontem. Argh, não aguento mais tanta confusão, é como se houvesse uma nuvem na minha cabeça, algo que parece fofo e leve, mas que me deixa extremamente tonta e sem a possibilidade de unir quaisquer raciocínios, uma espécie de blindagem.

Levantei-me e fui até o computador, havia uma chamada não atendida de Filipe no meu Skype e outra de Tyler. Filipe deixou uma mensagem se era possível que todos nós nos entrássemos no Skype às dez horas da noite no meu fusorário, respondi que estaria lá e tentei retomar a ligação de Tyler, mas ele não atendeu.

Escutei duas batidas na porta e minha mãe entrou com uma bandeja repleta de comida e Amanda estava logo atrás dela. Minha amiga correu para me abraçar e, pela segunda vez naquele dia, chorei. Minha mãe me deu um forte abraço e disse que Lorenzo ligou e que estaria a caminho daqui a uma hora. Ela disse que qualquer coisa que precisasse não hesitasse em chamá-la. Assenti com a cabeça e virei-me para Amanda.

— Você está bem? – Perguntei procurando algum ferimento, mas ela tinha apenas duas faixas brancas enroladas em seus pulsos, provavelmente por causa da corda que os amarrou.

— É tão bom te ver. Eu te amo, sabia? Eu estou bem sim, apenas estava morrendo de medo que aquele louco te machucasse. Eu estava vindo para a sua casa e ele me chantageou com uma faca, dizendo que se eu não fizesse exatamente o que ele mandava, ele iria te matar. Ele me fez escalar a árvore e entrar no seu quarto pela janela.  – Amanda começou a tremer e lágrimas escorriam de seus olhos à medida que ia falando.

— Shiu, shiu, já passou, o importante é que estamos todas bem agora. Você comeu algo hoje? – Ela negou com a cabeça – Pois venha me ajudar aqui, minha mãe trouxe comida suficiente para alimentar quatro pessoas.  – Ela sorriu e nós comemos juntas, até rimos um pouco como antes.

Depois ficamos apenas um tempo deitadas em minha cama, Amanda fazendo cafuné em mim, ambas apenas em silêncio externo, mas com um interno de intenso barulho. Minha mente trabalhava de modo ininterrupto, afinal, o que aconteceu, ou melhor, o que não aconteceu, ocorreu apenas em minha mente? Não tinha a menor ideia e, tenho uma certeza muito grande de que nunca vou saber a resposta exata. Eu posso muito bem ter sonhado com a explicação daquela mulher louca, mas, de certa forma, nada disso importa. Eu me sinto salva. Não salva no sentido de uma donzela que foi resgatada por um príncipe. Não sei explicar direito, mas é como se a única coisa que importasse no mundo nesse momento fosse a maneira às vezes leve, às vezes pesada com a qual as unhas de Amanda se enroscavam nos meus cabelos. Eu estava viva. Apenas isso. E, de alguma maneira, estava salva do mundo externo e de mim mesma.

Uma batida na porta.

Minha cabeça se virou na cama e vi um Lorenzo de cabeça para baixo vindo em minha direção. Levantei-me em um pulo e fui correndo em sua direção para abraçá-lo.

— Oi. – Ele disse ainda me abraçando.

— Oi. – Eu disse e o abracei um pouco mais forte. – Senti sua falta.

— Está tudo bem agora. – Ele me soltou lentamente e foi abraçar Amanda. – Amanda, eu posso falar com Rosa por um momento? – Ele perguntou.

— Sim, claro, eu acho que já está na hora de ir para casa mesmo. Rosa, me ligue depois, ok? – Ela disse, eu apenas assenti, ela se levantou, pegou sua bolsa e foi embora. Após fechar a porta para Amanda me virei para trás e lá estava Lorenzo sentado na beirada da minha cama. Ele estava com os pés no chão, os cotovelos apoiados nas coxas, sendo que uma das mãos estava largada roçando de leve na outra perna e, a outra mão estava apoiando seu queixo. Seus olhos estavam fixos em mim e em todos os movimentos que fiz enquanto retornava até a cama para me sentar ao seu lado.

— Então.. – Ele disse.

— Então? – Falei com certa entonação de dúvida. Mas não sabia ao certo se saiu como uma pergunta ou uma afirmação.

— Rosa, você tem a menor noção do que eu senti nas últimas 24h? – Ele perguntou me olhando fixamente. Eu desviei o olhar e apenas neguei. Ele puxou meu queixo de volta para sua frente, de modo a estar novamente de frente a seus olhos, eles me davam a sensação de calma, tranquilidade, paz. – Rosa, em menos de um dia eu tive a maravilhosa oportunidade de ter o melhor beijo da minha vida e, logo em seguida, pensei que poderia te perder, eu achei que você estivesse em um estado grave ou morta durante 13 minutos e meio, e, acredite, foram os piores 13 minutos e meio da minha existência. Por isso eu defini que não quero mais perder a chance de ter você na minha vida, Rosa, eu te amo, sempre te amei. Sei que você é minha amiga, mas eu passei muitos anos não tentando algo a mais com medo de acabar sem nada, mas agora eu simplesmente não aguento mais. Então, o que me diz? – Ele falou tudo de uma vez e eu fiquei um certo tempo tentando assimilar todas as informações recebidas em tão pouco tempo. Acho que demorei tempo demais, pois ele deve ter entendido que eu estava o negando, se levantou e estava indo em direção à porta. O que aconteceu em seguida eu mesma não entendi.

Em questão de segundos me levantei e puxei Lorenzo, minha boca foi de encontro a dele. Aqueles lábios tão macios, tão molhados, tão perfeitos me fizeram sentir pena de mim mesma por ter beijado tantas outras bocas que não apenas aquela em minha vida. Ele enfiou a mão em meus cabelos e me puxou para mais perto. Em pouco tempo, minha língua estava explorando sua boca e estávamos deitados de novo na cama. Nos beijamos por algum tempo, mas depois apenas ficamos abraçados e, naquele momento, foi que eu percebi o real significado de estar além de salva, também segura.

Adormeci em seus braços e acordei horas depois com minha mãe nos chamando para jantar. Meus pais estavam felizes que eu, mesmo em tão pouco tempo, já estivesse tão melhor. Não me lembro a última vez que havia gostado de jantar com eles, Lorenzo estava lá e a conversa fluía normalmente. Após o jantar ele foi para sua casa, me deu um beijo demorado na testa, outro rápido na bochecha e disse que ia me ligar amanhã de manhã. Fiquei o observando andar na rua até desaparecer ao longe quando virou a esquina.

Passei alguns minutos em pé sozinha no meu quarto tentando absorver tudo o que estava acontecendo e apenas sorri. Liguei o computador e vi que havia uma chamada em grupo para mim, atendi e me deparei com aqueles três rostos tão similares e tão estranhos ao mesmo tempo e, pela segunda vez em pouco tempo, sorri.


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