Amz escrita por MissBlackWolfie


Capítulo 3
Encontro


Notas iniciais do capítulo

Agora nós vamos embolar as historias... vms e vms....

brigada meninas pelo carinho... mesmo...



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Estamos na praia a mais de uma hora, ou mais tempo, as vezes perco a noção do tempo, isso ocorre quase sempre. Eu e Ernesto sentados na areia branca, na beira do mar, sentíamos água quente nos acariciando, o sol nos aquecendo de forma protetora e acolhedora.

Sempre que ficava a merce daquele ambiente, o meu preferido, sentia-me abraçada, talvez até amada por aquele calor todo. Esbocei um sorriso nos lábios a sensação é maravilhosa, deitei-me para sentir água por todo meu corpo, permitir usufruir todo aquele momento.

Concentre meus sentidos para capturar todos os mínimos detalhes sensoriais daquela manhã ensolarada. Quero registrar em minha mente a cor magnífica do céu, a posição onde estava o sol, como mar azul esta calmo, como eram os desenhos formados pelas conchas multicoloridas em contrate com a areia branca, o cheiro da maresia. Tudo deve ser memorizado, repetia para mim mesma, como uma ordem.

Sabia que devia guardar aquele momento único dentro do baú de minhas lembranças, já que era tão raro ter aquele sentimento de paz dentro de mim de maneira genuína. Sem dúvida será uma linda memória, guardada com muito carinho, ela para mim seria como uma joia, sendo rara e valiosa. Ninguém poderia roubá-la de mim.

Sempre tive uma relação muito intima com mar, desde primeiro dia que eu o encarei pela primeira vez aqui em Jilas. Lembro-me como fosse hoje a primeira vez que vi essa imensidão azul na minha frente.

Mesmo já morando dois anos com Fonsecas, eu ainda não tinha ido a praia. Estela dizia, a verdade esbravejava, que não tinha nada para nós vermos lá. A realidade era que ela tentava esconder nossa existência a todo custo para o restante da cidade.

Entretanto isso se mostrou impossível com passar do tempo, dessa forma inventou que éramos filhos de uma prima falecida distante, e que estava cuidando de nós, por pura caridade. Não a desmentíamos por temer o que ela poderia fazer conosco. Afinal as ameaças sobre o estado da nossa integridade física aconteciam com frequência, não temíamos por nós mesmo, mas sim um pelo outro.

Cada vez que eu ouvia a palavra mar, algo dentro de mim pedia para eu conhecê-lo, vinha uma inquietude, como algo vivo dentro de mim pulsava levemente. A minha curiosidade aumentava a cada dia, pois às vezes ouvia as pessoas que passavam próximo ao portão da casa comentando como era agradável e gostoso passar o dia na praia.

Ainda por cima, para me deixar mais desejosa por aquele encontro, há um quadro grande, não, na verdade é imenso, na sala de estar da mansão retratando uma praia. As cores fortes e vivas da pintura era maravilhosamente bem detalhada, parecia saltar da tela tamanha perfeição. O manto azul infinito, com suas ondas quebrando na areia, algumas gaivotas voando ao longe, era algo que me atraia, me convidava ficar ali admirando horas e horas.

Muitos foram os momentos, quando todos ainda estavam dormindo, que eu ia para lá sorrateiramente, caminhando nas pontas dos meus pés, quase como uma bailarina. Tentando fazer nenhum barulho sequer, sentava na frente da obra, perdia-me na minha imaginação, que me levava para dentro daquela pintura.

Durante todo processo intimo, sempre repetia em voz alta para mim mesma que um dia eu iria conhecer o mar. Nem que fosse esse meu ultimo ato em vida.

Em uma dessas manhãs solitárias que estava mergulhada dentro da pintura, imaginando como deveria ser refrescante mergulhar naquela água. Recordo-me de cada detalhe desse dia, eu tinha acabado de completar seis anos de idade. Eu usava um vestido lilás desbotado, que tinha um laço branco quase caindo, pela costura já desgastada.

Era o meu melhor vestido, o que eu havia chegado no orfanato, ele já estava um pouco apertado e curto, pois tinha crescido nos últimos dois anos que o tinha. Mas que eu sempre o usava para ter o meu “momento na praia”.

Nessa manhã em especial Ernesto me chamou, eu, de má vontade sai do meu paraíso particular e o encarei raivosa.

Seus olhos faiscavam uma alegria contagiante, era inevitável não sorri com ele, afinal ele estava praticamente quicando de felicidade. Aquilo me deixou curiosa, até minha raiva dele ter me perturbado de dissipou, obvio que é difícil eu ficar muito tempo com algum sentimento ruim em relação ao meu irmão.   

Não falando palavra alguma, ele estendeu a mão para mim, pegando a minha com firmeza, quando fiquei finalmente em pé a sua frente, ele anunciou que naquele dia iríamos conhecer finalmente o mar. Foi então o meu momento de ficar agitada igual a ele, comecei a dar pequenos pulinhos de alegrias.

Ele me contou que os Fonsecas tinham ido viajar logo cedo, antes de eu acordar naquela manhã, ainda de madrugada. Pelo o que foi contado para meu irmão eles foram visitar um parente distante, mas que ele desconfiava seriamente que era para se aplicar algum novo golpe. O motivo da ausência deles não importava para nós , e sim que estávamos sozinhos assim finalmente iríamos conhecer a praia.

Saímos correndo da casa, deixando ela com todas as janelas e portas aberta. Estávamos tão focados em encontrar o mar, que corríamos como loucos pelas ruas, as pessoas chegavam apontar para nós, entretanto aquilo não nos incomodava, achávamos até graça.

A felicidade pulsava dentro de nós. Eles não entenderiam a nossa pressa, estávamos afoitos e também porque não sabíamos quanto tempo demoraria até a volta dos Fonsecas.

Quando avistamos ao longe aquele horizonte infinito, corremos mais e mais. Investi toda minha força na corrida, exigindo em demasiado dos músculos da minha perna, minha barriga já doía pelo meu esforço, mas nada faria eu parar até chegar praia.

Ao sentir areia tocando a pele do solado do meu pé, fui invadida por uma sensação de familiaridade por mim nunca vivida. Aquele som das ondas quebrando era como uma musica amada por mim a muito tempo, tinha certeza já conhecida cada detalhe daquele local. Meu primeiro momento verdadeiro de felicidade foi aquele, sempre me lembro com muito carinho, minha primeira joia.

A partir desse dia o mar se tornou o meu lugar secreto no mundo, sempre estava aqui calmo e sereno para me acolher, para me abraçar quando necessário. Mesmo ele revolto, de ressaca, com as ondas ferozes, eu o amo, pois mostrava que ele era como eu, havia dia de dor e revolta. Contudo diferente dele não posso externar essa minha insatisfação

Quando estou sem esperança alguma sobre minha vida, pensando em desistir dela, venho aqui e me permito ser abraçada pelas suas ondas. Ernesto sabia dessa minha ligação, quase que familiar com aquelas águas salgadas, por isso sempre me trazia aqui.

- Você consegue ser feliz aqui não é? – Perguntou Ernesto sentado ao meu lado, enquanto eu estava estirada ao seu lado perdida nas minha lembranças.

- É, consigo. - confessei. -  Acho estar aqui é como ter um momento único de felicidade. – Disse abrindo os olhos, nem tinha percebido que tinha os fechados, eles encontraram rapidamente os do meu irmão, vi ainda aquela sombra de tristeza em seu olhar. - O que foi? Parece ainda chateado. – Perguntei um pouco confusa.

- Queria que tudo fosse bem diferente nas nossas vidas – disse ele de forma quase como se estivesse sentindo dor. - Gostaria que você tivesse uma vida diferente, que fosse feliz.

Desviou seu olhar do meu, encarou areia e começou fazer círculos nela com os pés. Sei que seus olhos devem estar marejados, o conhecia muito bem. Sempre evitava olhar para mim quando isso acontecia, pois deixaria sua tristeza mostrar sua face através de lágrimas.

- Acho que sou feliz do meu jeito. – Falei pensativa, nunca tinha refletido sobre aquilo.

Talvez por que o era o único modo de vida que eu conhecia, mas não compartilhei dessa conclusão com meu irmão, não queria deprimi-lo mais, e sim deixá-lo animado, então o chamei:

- Ei? Você não disse que esse ano seria nosso. - Tentei dar um tom de descontração na minha voz enquanto me sentava ao seu lado.
- Espero que sim, que finalmente a gente saia daquela prisão. – Ernesto pigarreou, parecia estar tirando algum tipo de nó na garganta. – Vamos fugir para bem longe. O que você acha?
- Teremos então que roubar um banco, porque não temos dinheiro para nada.
- Ah, trocaremos uma prisão pela outra. - Respondeu rindo com seu característica ironia – Acho que a outra prisão seja mais divertida, hein?
- Acho que qualquer lugar deve ser melhor do que casa da família Fonseca. – Falei com tom descontraído.
- Sem duvida a comida e roupas devem ser bem melhores – Falou enfiando o dedo em um dos buracos da sua blusa velha, que havia pertencido a Carlos há alguns anos atrás.

Tive que rir da careta que acompanhou o movimento teatral de Ernesto, que riu do meu divertimento. Pronto o sorriso surgiu, isso já deixa meu coração menos aflito.

Nós dois desenvolvemos esse tipo de humor negro, riamos da nossa própria desgraça, tentando de alguma maneira suavizar aquela nossa vida dentro daquele inferno que era a casa do Fonseca. Sempre nos divertíamos fazendo piadas da nossa vida tão sem sentido.

- Bem acho que devemos ir – disse me pondo de pé. - Tenho muita coisa para fazer. Vamos?

Estendi a mão para ele, que aceitou o meu convite e se colocou de pé com a minha ajuda. Claro que a força usada por mim para levantá-lo do chão, quase me derrubou, desequilibrei alguns passos para trás, imediatamente ele me ajudou a retomar meu equilíbrio. Rimos da minha possível queda.

Saímos da praia de braços dados, sentíamos revigorados por dentro, de alma lavada. Parecia que a maresia tinha nos trazido novo ares, nos limpado de qualquer impureza que estava anteriormente em nossas mentes.

Estávamos nos sentindo leves, relaxados e sorriamos um para outro, realmente estávamos nos divertindo. Acho que isso pode se chamar de momento de felicidade. Porém eu sabia que toda aquela maravilhosa sensação não ia durar muito, então tenho que saborear esses minutos de alegria.

Brincávamos de um empurrar o outro, junto implicávamos mutuamente com os defeitos um do outro, riamos muito das conclusões feitas sobre como solucionar nossas imperfeições.

Quando finalmente, depois de varias observações sobre meus defeitos, em resposta aquilo eu propus a Ernesto em nascer de novo, pois era única opção para resolver o seu problema de chatice cronica por implicar tanto comigo. Ele riu, parou e me encarou com extremo deboche.

- Acho que já sei o que você pode pedir para sua próxima vida – Apontou para mim. – Um nariz novo – Apertando-o com força, quase me machucando.
- Ah ta! Você acha que é perfeito, já olhou no espelho para ver o tamanho do seu? – Perguntei encarando com o seu mesmo tom de ironia.

Ernesto sabia que nunca gostei do meu nariz, achava ele desproporcional para o meu rosto,  quando comecei com essa ideia ele dizia que era besteira minha, contudo com tempo resolveu usar isso em nossas implicâncias. Sempre usava isso nas nossas brincadeiras, sabia que não ficava chateada com ele, que até me divertia.

- Pelo menos o meu nariz é lindo. – disse com sarcasmo. – E você sabe que homem de nariz grande significa outra coisa. – Riu maliciosamente, de imediato dei um tapa estalado em seu braço – Não me bate, essa informação eu li em uma revista de mulher.
- Você não existe – Disse fingindo horror.
- Eu não tenho bico de papagaio como certa pessoa – Me encarou de forma travessa.
- Vem cá que vou mostrar do que esse papagaio é capaz. - Levantei minha mão para lhe dar outro tapa, mas ele conseguiu desviar de minha investida, dando um pulo para o lado.
- Você acha que um tapinha vai me machucar, talvez se você me desse uma bicada com esse nariz, que é praticamente uma arma, ai eu me feriria gravemente – Encarou-me com pura diversão. 

Não podia deixar aquela implicância passar em branco, então o olhei com extrema petulância, dei um sorriso torto, tentando ser ameaçadora. Ele riu da minha tentativa de ser perigosa, até fingiu de forma teatral sentir um tremor de medo.

A partir daquela cena do meu irmão, resolvi fechar meus punhos, não seriam mais tapas, e sim socos, talvez assim ele levasse mais a sério os meus alertas de perigo.

Acredito que ele percebeu uma ponta de ira em meu olhar, começou a correr de mim, entre as pessoas que se encontravam no meio da rua. Afinal naqueles dias de festividades Jilas recebia inúmeros turistas, aumentando o número da população  naquele período.

O durante sua fuga seu rosto estava virado para mim, para certificar se eu continuava minha caçada e também para rir de mim. Divertia-se da minha pequena fúria, parecia ser um tipo de entretenimento para ele.

Aquele deboche evidente estava começando a me irritar verdadeiramente, então dei um pulo para frente, chegando bem próximo a ele. Então aproveitei o seu segundo de incredulidade dele com minha reação e lhe dei um soco no peito.

Tudo aconteceu muito rápido. Ernesto cambaleou para trás, não sei se foi pela surpresa do meu ato ou se foi a força que eu apliquei o golpe. Pensando melhor, definitivamente era primeira opção.
Então ele esbarrou em uma pessoa, o impacto o fez cair de frente para o chão da rua, era como ele tivesse encontrado uma parede. Corri para ver como ele estava, será que estava ferido?

- Ernesto. Você ta bem? - Perguntei já de joelho ao seu lado.
- Isso que eu chamo de um soco bem dado - Respondeu virando-se, gemendo fraco entre risos, deitando de barriga para cima - Pode começar a pensar em disputar uma vaga como boxeadora nas próximas olimpíadas. – Tentando se colocar de pé coma minha auxilio, entretanto ele sentou-se.

Foi nesse momento que lembrei havia outra pessoa envolvida nessa colisão. Em uma fração de segundo, me perguntei qual seria o estado do outro individuo, já que Ernesto é suficientemente grande e forte, para fazer um belo estrago em uma porta de madeira, imagina uma pessoa o resultado.

Nesse exato segundo ouvimos uma voz feminina, melódica e agradável, ao mesmo tempo juntos eu e meu irmão viramos nossos rostos e a encaramos incrédulos. Havia uma linda mulher morena, na nossa frente, parecia estar se divertindo com a nossa reação assombrada.

-Você esta bem meu jovem? – Perguntou a mulher parecendo agora estar um pouco preocupada com o Ernesto.

Olhamos um para outro, parecia que precisávamos de um tempo para absorver como aquela mulher parecia estar em ótimo estado. Incrível como ela estava bem, não havia nenhum vestígio do atrito dela com Ernesto. Como se nada e ninguém tivesse colidido com ela.

- Estou bem. E a senhora? – Ernesto respondeu perfeitamente educado, enquanto ajeitava suas roupas, essas pareciam ter sofrido um pouco com o impacto.
- Sempre estou muito bem. Obrigada por perguntar. – Parecia diverti com a pergunta. – Desculpa se lhe derrubei.
- Não! A culpa não foi da senhora. Eu que tenho que me desculpar – Respondeu Ernesto. - Minha maninha aqui tem uma direita poderosa – Piscou para mim.

Eu ri levemente da ideia de ter força suficiente para derrubar meu irmão ou qualquer outra pessoa. Realmente estava começando achar que ele tinha batido a cabeça durante a queda, tendo como sequela a insanidade, porque ele só poderia estar confuso mentalmente para fazer tal suposição. Ou na verdade ele estava caçoando de mim, sim isso seria o mais provável.

- Bem fico feliz que você esteja tudo bem – A mulher respondeu gentilmente olhando para Ernesto – Parece que você é uma guerreira nata. - Repousou seu olhar atento agora em mim, ela estava analisando alguma coisa em mim, em seguida surgiu um grande interesse em algo bem especifico ao me observar.

Algo dentro de mim começou a pulsar, como houvesse outro ser dentro de mim, bem vivo. Não sei como descrever esse novo sentimento, era como uma inquietude.

Acenei timidamente com a cabeça agradecendo seu elogio. Realmente ela era muito simpática, parecia estar tentando entrar no clima de descontração que meu irmão tinha proposto. Ou não?

Seus traços perfeitos pareciam bem sérios quando disse que eu era uma guerreira nata. Não é possível. Ela realmente estava tentando ser agradável e também não me conhecia muito bem. Havia uma emoção impregnada em sua voz, algo a emocionou. Mas o que seria?

Quando foi a minha vez de encarar para analisar suas reais intenções comigo, através do seu rosto, observei como aquela mulher era realmente bonita, uma beleza exótica, havia algo selvagem no seu rosto, algo pouco se visto por aqui.

A beleza que havia em seus olhos era fascinante, possuía uma cor que eu nunca tinha visto em ninguém, eram lilás. Nesse momento nossos olhares se encontraram e uma coisa esquisita dentro de mim se mexeu: aquela inquietação pulsante.

Aquele agente novo dentro de mim me assustou, suspendendo minha respiração, o notei tinha algo haver com aquela mulher de olhos lilás, eles fitavam a mim com carinho, haviam encontrado algo importante.

Para me preservar desviei meu olhar do dela, contudo continuei a minha analise daquela figura: aparentava ter mais de quarenta anos, o que denunciava sua idade eram as leves e delicadas rugas que desenhava em seu rosto moreno, com alguns poucos fios brancos que apareciam em meio de seu cabelo negro. Havia somente uns cinco fios, acho que só consegui vê-los porque olhei muito atentamente aquela estranha. Nunca tinha visto uma pessoa tão bela na minha frente.

Acredito que Ernesto percebeu que eu estava absorta em meus pensamentos, meu rosto sempre me denunciava e ele sabia ler minhas expressões muito bem. Portanto ele tinha noção que as suposições daquela mulher eram absurdas para mim.

- Esta tudo bem com você? –Sussurrou ele em meu ouvindo e passando o braço pelo meu ombro puxando para ficar próximo a ele.
- Sim. Acho que sim. - Respondi também sussurrando. Não conseguia achar a minha voz.

Parecia que meu cérebro estava reorganizando os sentimentos inquietantes que estavam dançando dentro de mim. Aquela estranha gerou em mim algumas coisas novas, nunca por mim experimentadas, como um carinho, sim, ela me olhava com cuidado e zelo, isso fez ficar tocada de alguma maneira, sentia que a conhecia de algum lugar, mas isso é impossível.

Ainda havia aquela pulsação inquietante dentro de mim, como se tivesse sido despertado após as duas pedras lilás me fitarem intensamente. Tudo muito estranho e confuso.

Nesse mesmo momento ouvimos uma voz feminina gritando bem distante de nós, chamando atenção da mulher que estava a nossa frente. Não conseguíamos ver quem a chamava porque a rua estava cheia de pessoas que estavam a caminho da praia e também fazendo compras.

- Lisa. Cadê você? - ouvimos ao longe.
-Já estou indo – Respondeu com o rosto virado em direção a nós num tom baixo de voz capaz de ser ouvido somente ali, mas não conseguíamos ver quem a chamava, havia muita gente ao redor.

Em seguida ela nos lançou um olhar de duvida, como se deliberasse alguma coisa. Parou para me avaliar mais uma vez, seus olhos eram doces e compenetrados em vasculhar algo em mim.

Alguma questão íntima ela estava resolvendo, mas subitamente pareceu que lhe veio algum tipo de reposta para seu questionamento.

- Acredito que nos veremos em breve, muito mais cedo do que possam imaginar. – um sorriso magnífico emoldurou seus lábios. – Feliz ano novo Ernesto e Clair.

Ela virou-se e caminhou com leveza entre as pessoas, não esbarrou em nenhuma em seu percurso, algo notável naquela multidão apertada.

Levantei-me apressadamente, deixando Ernesto ainda no chão, não queria perder de vista aquela mulher. Seus passos eram apressados, deslizava facilmente entre as pessoas. Estiquei-me mais um pouco nas pontas dos pés para ver se conseguia ver que caminho ela tomaria ou quem havia lhe chamado. Mas a perdi de vista no meio daquele mar de gente.

Notei também como ela era elegante no andar e na sua postura. Definitivamente nunca a tinha visto anteriormente pela cidade, pois logicamente me lembraria de alguém com a beleza tamanha como aquela, era do tipo que você vê só nas atrizes e modelos da televisão. 

Olhei para o lado em busca das impressões de Ernesto sobre aquele evento, que no mínimo fora incomum. Havia mexido muito comigo, minha pulsação latejava desde então.

Ainda no chão sentado, agora com os joelhos dobrados e os segurando com os braços Ernesto me encarava com uma expressão estranha, como se tivesse impressionado.

Aquilo me assustou um pouco, ele parecia perplexo com algo, a boca dele estava um pouco entreaberta, como estivesse preste a dizer alguma ideia.

Estava alheio a tudo que estava acontecendo a sua volta, a multidão quase o pisando, ele parecia hipnotizado por aquela estranha. Nunca tinha o visto daquele jeito, me deixou apreensiva.

- Ei? Você esta ai? – Passei a palma da mão na frente do seu rosto – Você esta ai? Tem alguém ai dentro? Alo? Você foi abduzido ou alguma coisa parecida?
- Como ela sabia os nossos nomes?- virando seu rosto vagarosamente para mim, com olhos arregalados de surpresa.

Fui tomada por choque da surpresa pelas palavras ditas por ele. Meu corpo ficou paralisado no lugar, meus pés pareciam ter colado ao chão, as pessoas esbarravam em mim, devido sua presa, nada fazia eu mexer um músculo sequer. Fiquei atenta na informação dita pelo meu irmão, que ecoava dentro da minha cabeça.

Não tinha percebido que ela falara os nossos nomes claramente, estava tão ocupada analisando todos os outros fatos daquele encontro que não tinha pensado sobre o seu final.

Realmente ela tinha dito nossos nomes ao se despedir de nós, com clareza ainda. Como ela poderia saber? Tenho certeza que não conheço aquela mulher, nunca tinha visto pelas ruas de Jilas. Sem duvida era um tipo de beleza que chamaria minha atenção, como de varias pessoas.

Então comecei a repassar toda a cena, examinando cada detalhe e cada palavra dita por nós, para talvez encontrar algum momento em que falamos nossos nomes. Não encontrei nada. Voltei mais ainda, para antes da colisão, talvez ali a gente pudesse ter falado alguma coisa, durante nossa brincadeira, mais uma vez não disse nenhum momento o nome de Ernesto e nem ele o meu. Definitivamente não dissemos nada a esse respeito.

- Não sei te responder – Respondi sinceramente ao meu irmão.
- Isso tudo foi muito estranho – Ernesto parecia arrepiar ao completar sua fala. Em seguida balançou a cabeça, tentando afastar alguma coisa dentro dela. Para em seguida dizer. – Bem, temos que ir. Talvez se demorarmos mais um pouco Estela arranque todos os fios de cabelo da minha cabeça. Afinal estamos mais que atrasados. – Ajudei ele colocar-se de pé enquanto falava.

Aquilo era tão típico do meu irmão, tentar aliviar a tensão do momento, isso era algo natural dele.

- Você ficaria horroroso, não era uma cena que eu gostaria de ver. - tentei expressar algum humor em minha voz, mas foi falho, na verdade eu estava muito assustada.

Ernesto conseguiu perceber como eu estava perturbada com aquilo tudo, minha expressão deve ter me denunciado. Então para aliviar um pouco da minha preocupação ele virou para mim e disse carinhosamente.

- Mas antes de ir, vamos passar em lugar que você adora. Quero lhe dar um presente de ano novo.
- Você não precisa fazer isso – Respondi tímida, não queria que ele se preocupasse comigo.
- Vamos comprar um novo companheiro para você. – Abrindo um sorriso de extrema confiança.
- Vamos a livraria de livros usados. – Dissemos juntos. 

Enquanto caminhávamos entre as ruas, desviando dos corpos das pessoas que andavam freneticamente, estávamos mergulhados na lembrança do encontro com Lisa. Podia ver que Ernesto também estava absorto em seus pensamentos. O que será que ele estava pensando?

Então outras perguntas apareceram na minha mente, elas dançavam loucamente em meu campo mental, rodopiando cada vez mais. Como aquela mulher sabia nossos nomes? Como ela poderia dizer que sou uma guerreira nata? Por que ela parecia me olhar com tamanho interesse? Como ela não se machucou ao se chocar com Ernesto? Como era possível alguém ter aquela cor de olhos?

Nesse momento senti um estranho esbarrar em mim, me arrancando dentro da minha confusão mental. Sacudi a cabeça tentando organizar aquele turbilhão de especulação.

Ernesto me perguntou se eu estava bem, respondi positivamente com a cabeça. Mas acho que sua pergunta se aplicava a meu estado físico, porque ele viu nos meus olhos que eu estava confusa.

Anseio por respostas, toda aquela situação tinha me deixado muito confusa e angustiada, nunca gostei de ficar com perguntas sem respostas em minha mente.

Eu tinha que encontrar aquela mulher novamente, isso era uma certeza. Então passei a procurar aqueles olhos lilás que havia me encantado, nas pessoas que passavam por mim.

Olhei para Ernesto, parecia que tinha o mesmo objetivo meu. Seu rosto olhava para um lado e para outro rapidamente, em uma busca quase que frenética. Vi uma ruga de irritação formar em sua testa, parecia frustrado, por não encontrar o seu objetivo.

- Você não tem impressão que toda cidade resolveu sair na rua nesse momento? – Disse Ernesto visivelmente irritado – Nunca vi Jilas tão cheia assim.

Achei graça de sua frustração. Nunca tinha o visto assim com tamanho mau humor, nem as implicâncias e desaforos de Alex e Carlos o deixavam daquela maneira. Será que Lisa tinha alguma coisa haver com esse estado de espírito? Essa idéia me arrancou um sorriso meio a minha frustração, me distraiu momentaneamente.

- Você esta procurando por alguém em especial? – disse em tom de zombaria.
- Por que pergunta. - Respondeu Ernesto ainda olhando para os lados em sua procura, alheio a minha intenção.
- Você não para de olhar para os lados, parece estar em busca de algo.
- Estou muito curioso para entender o que aconteceu conosco. – De repente os olhos de meu irmão pousaram em mim – E você não esta?
- Acho que alguém está bastante interessado na Lisa? – Eu tinha que aproveitar e caçoar dele.
- Lógico que não – Parecia bravo com minha constatação. - Odeio não entender o que está acontecendo. Você também é igual a mim, disso eu sei.
- Realmente estou agoniada. Mas não negue para mim, você não ficou todo encantado com a beleza dela?
- Como assim? O que você esta insinuando verdadeiramente?- Ele nos parou e colocou-se na minha frente.
- Ernesto. Você sabe exatamente o que quero dizer.

Ele me encarou com extrema duvida, parecia que ele não sabia o que eu estava dizendo, realmente ele estava muito alheio. Bufei e completei.

- Acho que você está apaixonado. Sofreu de amor a primeira vista. – Lancei um olhar bem presunçoso, eu tinha certeza sobre minhas palavras. Mas ele pareceu se divertir, com certo humor negro, com essa minha idéia.
- Ela não faz meu tipo. – Ele respondeu com um sorriso de zombaria, e recomeçou andar, puxando a minha mão para acompanhá-lo.

Eu o segui sem resistência, achando muito graça sobre a idéia de que Ernesto ter seu “tipo de mulher” preferido. Não pude contar meu riso e de perguntar.

-Desde quando você tem um “tipo de mulher”? – minha voz era bem irônica, não agüentei explodi uma gargalhada.

Não conseguia parar de rir, os músculos da minha bochecha e da minha barriga doeram. A maneira que ele falou “Ela não faz meu tipo”, foi hilário, até parecia ser um homem de vasta experiência com as mulheres. Entretanto eu sabia muito bem de sua inexperiência nesse campo feminino, e por isso que era tão engraçada a fala dele.

Pois ele só havia beijado algumas garotas durante sua vida, contudo nunca alimentou nenhum sentimento real de amor por nenhuma delas. Sempre foram os famosos casos de verão.

Ele dizia que esperaria o seu verdadeiro amor, para entregar-se totalmente a sua escolhida, achava aquilo incrível, algo incomum para um homem. Sempre falava que a primeira vez que a visse ele saberia que ela era dele. E ele seria completamente dela. Mesmo sendo algo impensado nos dias de hoje, esse era o meu irmão e sua convicção no amor.

- Primeiro ela é muito velha para mim – Eu não aguentei o seu olhar de raiva para mim, coloquei a mão na minha barriga que já dói de tanto que eu ria – Ela tem idade para ser nossa mãe.
- Sei. – Eu tentava achar o ar para continuar a falar, finalmente meu acesso de riso estava passando. – Só falei porque você ficou com uma cara de bobo. Você vai me dizer que ela não é bonita?
- Não disse isso. Ela realmente é linda, bem diferente do que a gente esta acostumado a ver por aqui. - Ele apontou com a mão para uma mulher que passava ao nosso lado, que era bastante feia. Voltei a rir, nesse momento ele se juntou a mim e começou a rir também. Sempre fazíamos assim saiamos da tristeza e para alegria muito rápido, era algo nosso.

- Desculpe – Disse por fim tentando me controlar novamente – e o que você perguntaria caso a encontra-se novamente?

Assustei com seu olhar, tinha um tom de tristeza e frustração. Ele parou de rir na mesma hora, fazendo seu rosto se contorceu num tipo de careta. Nunca tinha visto Ernesto daquele jeito, realmente aquele encontro com Lisa não o tinha só incomodado a mim, meu irmão também se afetou profundamente.

Senti uma pontada no meu peito, passei a mão em seu ombro, o confortando. Então ele respirou fundo e fechou os olhos, começou a falar sem parar para respirar.

- Ela sabe de alguma coisa que me interessa. Eu sinto aqui. – apontou para seu peito. Sei o quanto ele confia na voz do seu coração. Então continuou sua fala. – Não sei o que é. Porem sei que é algo que pertence a mim. Senti um arrepio diferente quando percebi que ela tinha algo que me interessava. Algo sobre meu futuro, não, o nosso futuro. Não sei muito bem. Está tudo tão confuso. Entretanto é tão real. – O ar lhe faltou, parecia que as palavras também, a emoção lhe dominou.

Eu o abracei fortemente, queria poder tirar aquele sofrimento com minhas mãos, arrancá-lo do seu peito. Queria colocá-lo no meu, que já está acostumado com o sofrimento da vida. Já Ernesto era minha alegria, a tristeza não podia lhe pertencer, odiava vê-lo daquele jeito. Ele arfava em meus braços.

-Ernesto respira. Calma. Não estou te reconhecendo – Eu disse assustada.
-Estou muito angustiado Clair – Ele saiu dos meus braços e voltou a olhar a multidão – Ela sabe algo que me pertence. Ou que vai me pertencer algum dia.
- Relaxa. Ela não falou que vamos nos ver novamente?- Eu disse querendo ver se conseguia tirar aquele sofrimento do seu rosto. - Então você pergunta tudo que esta te angustiando.

Ele bufou impaciente, parecia estar aliviado por ter colocado para fora toda aquela confusão mental. Ernesto fechou os olhos aparentemente organizando seus pensamentos. Abriu os olhos e me encarou com um sorriso, tinha sumido a dor do seu olhar, pelo menos superficialmente.

- Vamos à livraria. – Disse pegando a minha mão e caminhando em meio a correnteza de gente.

 
     
                    
       


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Notas finais do capítulo

Mas eu num jah li uma mulher de olho lilas tb???? hahahahah


agora a vida de Clair vai sair do marasmo hein????

bjs