Chrona estava deitada na praia, com as costas apoiadas numa rocha com formato semicircular, observando o mar sem vida, como de costume. Seus olhos originalmente azuis já estavam enjoados daquela paisagem morta, mas Chrona sentia preguiça demais para sair dali. A esperança de rever seus amigos se esvaia um pouco mais a cada dia, depois de procurar por tantas horas atrás de um jeito de sair daquele imenso lugar dentro de sua alma, depois de vasculhar todos os cantos daquela vasta paisagem sem cores e não achar nada que pudesse tirá-la de lá. O único lugar que ela não ousou entrar foi um local afastado que ela apelidou de Floresta de Sangue, onde ela tinha certeza que seus maiores medos a esperavam, apesar de que a floresta fosse muito bonita vista de fora.

Não havia mais o que fazer, era o que Chrona estava vendo-se forçada a acreditar. Tudo ao seu redor era tão acolhedor e aconchegante que parecia dizer a ela que lá ela ficaria até o resto de sua vida. A menina então sorriu serena, como se tentasse consolar a si própria, quando ela ouviu seu nome sendo chamado ao longe. Não pode ter certeza de quem exatamente a chamava, mas sabia ser amigo.

Ela então se levantou e começou a correr na direção de onde o chamado vinha.

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Kid abriu seus olhos. A primeira coisa que viu foi a grama que havia bem debaixo de seu nariz. O que era muito estranho, porque a última coisa que se lembrava era que estava no quarto de Chrona, tentando sentir a alma da menina, e de ter sentido certa tontura ao encontrá-la antes de tudo ficar preto. Ele teria desmaiado? Kid não sabia, mas aquele lugar não era algo real, com toda certeza.

Death the Kid se ergueu do chão, tirando os pedaços de grama de sua calça que lhe pareceu diferente de primeira vista, mas ingorou. Olhou ao redor e haviam árvores até onde sua vista alcançava, no chão, haviam algumas flores e nas árvores haviam vários passarinhos pousados nos galhos, com um céu azul simetricamente alinhado com o Sol e uma bela cascata de água cristalina à sua direita para completar a bela visão que o jovem Shinigami estava desfrutando.

-Subarashii ~ - Disse Kid, com um sorriso no rosto, as bochechas rosadas e os olhos brilhantes mirando o céu, totalmente distraído.

Mas, quando o garoto se lembrou de que tinha que buscar Chrona e baixou seus olhos para a linha do horizonte, ele se assustou ao ver a paisagem totalmente mudada. As folhas e troncos das árvores haviam se tornado negras, no chão só se via terra chamuscada, grama queimada e vários pedaços de ossos estilhaçados desconhecidos, o céu havia ficado vermelho e um cheiro horrível de chamas misturada com material decomposto circulava pelo ar. Death the Kid então passou da alegria ao desespero quando viu que a cascata de água havia se tornado uma cascata de sangue. Ele então decidiu seguir sua busca, enojado com tudo ao seu redor, quando ele sentiu algo atrás dele. Kid se virou rapidamente, começando a se sentir ameaçado, mas não havia nada atrás dele.

-Eu devo estar imaginando coisas, hehehe... -Ele disse para si, dando um riso aflito e colocando uma das mãos sobre sua testa, que suava.

Death the Kid seguiu com passos calmos o caminho da trilha de terra chamuscada, cujo Kid acreditava que o levaria para fora daquele lugar horrível. O jovem Shinigami tentava se acalmar, pensando em coisas simétricas e bonitas, porém o silêncio aterrador e o cheiro tenebroso só o deixavam mais e mais tensionado.  Já estava na hora dele sair dali.

Ele andava rápido, com os punhos fechados e os olhos exageradamente abertos fixados no horizonte. Nem olhar para o chão Death the Kid ousava. Mas houve um momento em que ele foi forçado à ver um pouco da terra entrar em seus olhos, quando ele tropeçou em alguma coisa. Ele levantou-se um pouco e virou seu rosto para trás. Ele havia tropeçado em um crânio humano. E então, ele pôde sentir uma brisa bater em seu rosto e levar as palavras "você vai morrer" aos seus ouvidos. Foi quando o medo tomou-o e ele começou a correr em desespero para a saída daquele lugar tenebroso.

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Chrona conseguia ouvir com clareza passos altos e rápidos vindos de dentro da Floresta de Sangue. Algo vinha ao seu encontro, com certeza. Ela então segurou com força seu braço direito, quando pela primeira vez em dias ela conseguiu sentir vento em seu rosto. Logo em seguida, os olhos de Chrona puderam ter um pequeno vislumbre de um garoto de olhos dourados assustados, cabelos negros com faixas brancas, que usava uma calça preta, uma blusa social branca e o que parecia ser um suéter de lã num tom suave de creme vir ao seu encontro, seguido por uma onda de cores, com os braços estendidos para frente. E depois disso, as coisas foram acontecendo em câmera lenta. Pelo menos, aos olhos de Chrona. Ela e ele foram caindo lentamente no chão, o menino a olhava com pavor enquanto caía por cima dela e ela o olhava perplexa.

-K-Kiddo-kun...? -Disse Chrona, confusa, ao sentir seu corpo bater no chão com certa força, sem saber o motivo da agitação de Kid.

Death the Kid mal conseguia responder. As palavras estavam entaladas em sua garganta e ele só conseguia revezar o olhar entre o rosto da menina embaixo dele e da floresta, com pavor. Seus braços tremiam enquanto ele erguia seu tronco, os joelhos estavam quase que fincados na grama e ele não conseguia se levantar por completo, antes de conseguir processar todas as informações. E então, como um relâmpago, ele se afastou e se ajoelhou na frente de Chrona, com o rosto vermelho abaixado, só conseguindo pedir desculpas.

Chrona se ajoelhou também. Seus batimentos cardíacos aumentaram repentinamente e as lágrimas não paravam de rolar por seu rosto. Ver algum de seus amigos bem à sua frente fez com que ela não conseguisse mais conter a tristeza que havia dentro dela. E então, ela agarrou-se ao pescoço de Kid com força, enquanto abavafa seus gemidos e derramava suas lágrimas no ombro dele, tremendo muito.

E, surpreendentemente, Kid passou seus braços por trás das costas de Chrona, abraçando-a.

- Está tudo bem agora. -Disse Kid, num tom calmante, soltando-se do abraço e segurando com força as mãos da menina - Vamos, respire fundo. Não precisa chorar. Eu vou tirar você daqui, custe o que custar. Ok? Pode acreditar em mim.

~

Já estava de noite no Shibusen, mas não houveram grandes mudanças no "mundo de Chrona". O Sol estava se pondo lentamente, enquanto Kid e Chrona andavam por um vasto campo de flores, conversando sobre o que havia acontecido com eles depois que o Kishin fora derrotado enquanto admiravam algumas estrelas cadentes brilhantes e coloridas caindo sobre o tapete de flores pelo qual andavam.

-Este lugar é muito bonito, Chrona. -Disse Kid, olhando Chrona com um sorriso.

-É mesmo... -Chrona respondeu, um pouco desanimada. - Mas ficar sozinha aqui foi... foi...

-Péssimo. Eu entendo.

-Hm...

-Mas você não vai ficar muito tempo aqui, eu prometo.

Chrona sorriu. Tudo que Death the Kid havia lhe dito até aquela hora só ajudava a renovar suas esperanças de escapar daquele mundo dentro de sua alma. Renovava sua esperança de voltar ao Shibusen, de voltar a escrever poemas com Maka e de poder voltar a ver os sorrisos de seus colegas.

Mas foi nesse momento que Kid começou a desaparecer. Suas mãos começaram a ficar transparente, possibilitando que até o próprio pudesse ver através da mão. O mesmo foi acontecendo com seu pé, até que ele foi ficando inteiro transparente. Chrona entrou em pânico.

-K-Kiddo-kun! -Ela gritou, tentando segurar a mão do amigo, mas sem conseguir nada - O que está acontecendo com você?

-Acho que já deu minha hora aqui! - Ele respondeu

-Não me deixe aqui sozinha de novo! - Ela disse, já com os olhos cheios de lágrimas e com as mãos juntas ao peito, com os dedos entrelaçados.

-Eu não te deixarei sozinha por muito tempo! E, da próxima vez que eu vier, você vai embora comigo, eu prometo!

Foram as últimas palavras de Kid antes deste sumir por completo, deixando apenas o colorido das flores e um céu escuro e sem estrelas, com somente a lua brilhando ao centro, com seu sorriso sádico e sangrento. Chrona caiu no chão, de joelhos, com lágrimas caindo incessantemente. Nunca tinha passado pela cabeça dela que Kid lhe faria tanta falta. Mas, depois de um tempo, ela esfregou seus olhos com as mãos, tirando as lágrimas de seu rosto, e então disse aos céus:

-Eu vou ficar esperando você voltar, Kiddo-kun! 

E então, ela correu de volta para a praia, onde ela ao menos poderia observar o mar tocar seus pés e não se sentir totalmente sozinha.

Mas, ao menos, agora ela tinha esperança novamente.