O Anjo Perdido escrita por VanNessinha Mikaelson


Capítulo 7
Capítulo 7. A Amizade e a união




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Capítulo 7 – A amizade e a união

Os ares de um maravilhoso crepúsculo inundavam o planeta azul. Era um espetáculo lindo, bem diferente das armadilhas, da lama, do fogo, da obscuridade e da dor que sentia. Ainda que o Vale dos Caídos fosse sua morada, ela gostava da Terra, porque podia experimentar as sensações que tinha ao vislumbrar tão majestosa obra divina. Mesmo sendo uma demônia que cometera vários e terríveis crimes, eram coisas das quais gostava: de assistir a alvorada e ao pôr-do-sol. Talvez se recordasse do tempo em que viveu por aqui.

– Não. Por mais que seja bonito, não posso permanecer neste lugar – pensava, enquanto encostava-se a uma árvore de um parque próximo ao seu lar terrestre. – Devo ir até o fim, mesmo que Adirael venha atrás de mim. E devo prosseguir porque, antes de tudo, sei que faço a coisa certa.

A moça continuava em sua caminhada. Vez por outra, se detinha em estancar o sangue que brotava do ferimento. Ao entrar na residência, Leviatã lhe informou que o anjo se encontrava no pátio meditando. Passados longos minutos, nos quais a mulher experimentou sensações amargas e melancólicas – provenientes da violenta batalha contra Mephisto –, a garota deu uma ordem secreta a Leviatã, que teria de ir à casa dos pais de Samuel Wolkmmer a fim de cumpri-la e, depois, mandou que o principal ferreiro do abismo procurasse Kasbeel, para que, juntos, capturassem os fugitivos do local sombrio.

  Agora sozinha no quarto, ela estancava, com maior cuidado devido à dor que a dificultava, a enorme quantia de sangue da perna ferida. Após, concluiu que seria necessário suturar o local machucado. E, com uma simples agulha encontrada em seus pertences, a demônia iniciou o procedimento ali mesmo. Costurar a pele de maneira tão temerária lhe doía muito. Mas era, também, um modo eficaz de tortura ao qual se submetia. Isso a fazia recordar quão intensos e dolorosos eram os sentimentos que guardava dentro de si – tanto por Samael, quanto pelos sucessivos fracassos em sua existência. Assim, o teste para verificar qual dor – entre a interna e a externa , era a mais aguda, prosseguia de maneira lânguida. E suturar um ferimento que ia do tornozelo ao joelho lhe era custoso demais.

Castiel, por outro lado, nem escutava os sons que vinham da rua; concentrava-se em descobrir mais alguma relevante informação que o levasse às pistas para que regressasse à casa de Deus. Nada, porém, vinha à mente dele. Frustrado por não obter respostas precisas, o anjo rumou para o interior da residência, a fim de conversar um pouco mais com Leviatã, pois percebeu se tratar de alguém propenso a longos e agradáveis diálogos, embora ostentasse uma armadura negra e procurasse manter uma postura rígida. Entretanto, Castiel não o encontrou em nenhum dos cômodos que pôde adentrar. Aquilo era um claro sinal de que a amiga já tinha retornado para casa.

– Mas por quais motivos não me avisou de que voltou do Vale? O que está acontecendo? Perguntou-se. De repente, o anjo teve uma sensação estranha – sua intuição lhe dizia que algo estava errado –, e tal sentimento se tornou mais intenso quando viu a porta de um dos quartos, que se mantinha fechada – era o único local da casa que ele não entrara até então.

  Após pensar, por um rápido momento, se a abria ou não, Castiel bateu à porta; perguntou se havia alguém ali. Como não obteve resposta, tomou uma atitude; a intuição angelical o alertava, e ele resolveu por bem atendê-la. O anjo abriu a porta do quarto.

– O que é isso? O que fizeram com você? – perguntou, apavorado, assim que a viu costurar o machucado com uma agulha e sem nenhum auxílio de anestesia.

  – É um dos ferimentos que não cicatrizaram. Foi na luta contra Mephisto – Respondeu, atirando o objeto de sutura ao chão.

A garota não conseguia fechar por completo o machucado; ele era enorme; não teria como suportar a dor sem ao menos um pouco de anestesia no local. Mas a insistência para que continuasse a senti-la ainda se fazia presente. E foi por esse motivo que buscou outra agulha na mochila que sempre trazia consigo.

  – Deixe-me ajudar – pediu, segurando-a pelos ombros.

  – Já estou no fim; não vejo como você possa me...

  – No fim! Tem certeza disso? – ele apontou para a perna dela e prosseguiu, em baixo tom. – Não é o que visualizo aqui. Acha mesmo que costurará o ferimento dessa forma tão tribal?

– Como não tenho anestesia em casa, faço o que posso.

  – E se eu estivesse com um grave machucado, faria o mesmo? O suturaria desse modo?

– Não – falou, surpresa com a questão feita. – Com você não.

  – Então venha cá – dizia, enquanto tirava a agulha das mãos dela.

Castiel a auxiliou; pôs a mão direita próxima ao ferimento na perna da amiga. Após se concentrar por poucos instantes, começou a curá-la. A moça não sentia dor alguma, porque a energia que ele emanava fazia, também, o efeito anestésico necessário.

Enquanto a ajudava, o anjo refletia; considerava detestável deixá-la sozinha, pois a mulher se arriscava por ele; o machucado tinha sido por causa dele, porque não era capaz de se lembrar de nada que o conduzisse de volta ao Céu.

  – Desculpe-me – falou, assim que terminou o processo de cura do ferimento.

– Por que me pede desculpas, Castiel?

– Porque passa por tudo isso por culpa minha. Se eu não estivesse aqui, você não enfrentaria todos esses perigos; não teria problemas no local onde vive; eu devia ter ficado quieto quando me ofertou ajuda. E tudo estaria bem agora. Você estaria bem... – Ele fez uma pausa e baixou os olhos. – Sabe, amiga, eu queria ser bom e correto. Anjos não destroem a vida de alguém como faço...

– Escute – comentou, abraçando-o. – Tudo irá se resolver; decidiu-se por aceitar meu auxílio? Então é porque sentiu que precisava dele. Não fique assim; tudo dará certo, confie em mim.

  Longos minutos se passaram. A inseparável amiga esperou, sempre próxima a ele, que se centrasse. Às vezes, ela segurava a mão dele em sinal de irrestrito apoio. Assim que Castiel melhorou, a garota disse:

– Siga-me – a mulher foi à cozinha, pegou dois copos, colocou água neles, foi à sala e os pôs em cima da mesa. – Sente-se – pediu.

A demônia o observava com visível interesse. Tentava compreender os motivos que o levavam a agir de maneira tão amável. E, ao mesmo tempo, procurava entender os conflitos e as confusões pelas quais ele passava, a fim de que, finalmente, pudesse aplacar ou esquecer os problemas e as dores que a afligiam. Mas, ainda assim, ela continuava intrigada. Por mais que soubesse que, por se tratar de um ser celestial ele teria tais atitudes, lhe era difícil acreditar que fazia parte desse ciclo agora... Tinha alguém que se importava com o que pensava, com o que sentia... E mesmo com tamanha atenção e carinho, Castiel não considerava o suficiente – ele desejava ser ainda melhor –, o que a surpreendia cada vez mais.

  – Obrigada por tudo – falou, emocionada

– De nada. Conte comigo sempre.

– Será que agora podemos conversar sobre o que Uriel e eu dialogamos? Ou teremos outra interrupção inconveniente?

  – Acho que não haverá problemas – respondeu ele sorrindo.

  A moça lhe contou todo o diálogo que manteve com o Arcanjo. E relatou, também, que Uriel demonstrou boa vontade para auxiliá-los. Após beber um gole d’água, tornou a falar:

            – Mas fiquei surpresa quando fui informada por ele de que quem cuida dos registros no Céu é Ediel, que inclusive fez constar que você está em uma missão em Plutão.

  – Por que Plutão, se praticamente todas as minhas missões se restringiam a Saturno?

– Talvez seja pelo simples fato de ter que registrar alguma coisa. Entende?

– Sim. É... Pode ser. E que faremos agora?

  – Colocaremos em prática o plano b, se essa for a sua vontade.

– Preciso voltar para casa – falou, consultando o relógio. – Felipe e Heloísa devem estar revirando a cidade a minha procura.

– Não estão não – Comentou, sorrindo. – Pedi a Leviatã que tomasse a forma física de Samuel e fosse para lá por alguns minutos ou horas, até que o feitiço colocado na sala da residência deles fizesse efeito; os pais de Wolkmmer dormirão até amanhã. E quando estiverem a ponto de despertar, Leviatã nos avisará a tempo, para que eu possa levar você para casa deles sem trazer transtornos.

  – Que mente aguçada você tem! Pensou em tudo antes!

  – Por isso sou um demônio – respondeu sorrindo.

  – É, faz sentido.

A garota tirou de uma das gavetas de um grande armário, que ficava na sala, tipos diversos de ervas. Após, fez um chá e lhe cortou um fio do cabelo. Ao observar a interrogação no rosto do rapaz, explicou:

  – Essa é uma porção que conectará nossos campos energéticos. Assim saberei com quem está sua arma de guerra e entrarei em seu sonho para ver o que houve.

  – Mas isso não nos prejudicará? – questionou, pondo-se de pé.

  – Não. Por que acha isso?

  – Não sei, só não quero que algo de ruim ocorra com você. Preciso que entenda que não tenho mais ninguém. Muitos me caçam e me querem longe da casa de meu Pai; apenas você me auxilia – comentou, enquanto se sentava novamente.

– Ouça – ela se agachou, o abraçou por trás e o segurou pelo braço. – Não tema. Ficarei bem. Só preciso que se prepare depois. Se vai me defender e se proteger, treine bastante; a coisa vai ficar feia a partir de agora.

  – Como assim?

  A demônia parou de falar. Analisou, por breves instantes, enquanto o olhava nos olhos, se o colocava a par das situações que viriam depois. Ela não queria, com suas palavras realistas, estragar o sentimento angelical que habitava o nobre coração de Castiel. Como, porém, precisava pô-lo a par de tudo, pois não achava justo deixá-lo a margem dos fatos, a amiga lhe explicou:

– Monitorarei o sonho que tem, a fim de descobrir com quem está sua espada. Após isso, irei buscá-la.

– Por que não me deixa pegá-la ao invés de você correr tamanho risco?

– Não o vejo em condições no momento. E, francamente, não acha que é exatamente isso que eles esperam, que vá até lá?

– Não sei... Sabe, querida, vim de um tempo em que todos nós éramos irmãos. E de fato nos considerávamos desse modo. Todos nós formávamos uma família. E é complicado saber que essa estrutura ruiu no exato instante em que quiseram me manter longe do Senhor. Não sei se compreende bem...

  – Compreendo sim. Fique calmo. Você voltará para casa.

– Sinto que retornarei, o problema não é esse. É que não sei se terei a coragem necessária de levantar a mão para matar um irmão.

  – Olhe – a moça se levantou e se sentou ao lado dele. – É difícil a sua situação, por que ainda os considera assim. Mas será que alguns anjos também têm você como irmão? – a garota bebeu outro gole d’água e prosseguiu: – Não peço que deixe de amá-los; não é minha missão interferir em sua essência bondosa, porque é o que de mais lindo há aí dentro – ela apontou para o coração dele. – Inclusive, voltando a falar nos anjos, sugiro que sinta muito quando tiver de tomar uma drástica atitude, porque essa é sua essência: pura e divina. Mas, por favor, necessito que entenda que estamos em guerra. É uma triste realidade, eu sei, mas é a pura verdade. Então coloque seu espírito guerreiro para fora, Castiel, pois sinto que possui tais virtudes. Ame seus irmãos, mas lute com toda gana, acima de tudo, pelos que o consideram desse modo. E continue a amar os que irá derrotar no campo de batalha, porque, repito, é um Arauto de Deus, que está mais próximo dEle do que pensa.

  O anjo se calou por alguns minutos. Ele pensava em sua situação, e concluía que a amiga tinha razão. Assim que a espada fosse recuperada, ambos seriam caçados implacavelmente. E o preparo que deveria ter para encarar tais hostilidades estava no sangue. O Arcanjo Miguel já lhe dissera isso em certa ocasião. Agora, porém, era uma entidade maligna que lhe falava quase que a mesma coisa; só que ela foi mais direta, tocou em questões que eram confusas para ele. No entanto, as palavras que foram ditas pela demônia o deixavam mais calmo, mais seguro de si. Castiel ainda se perguntava: – Como alguém que me fala tudo isso pode morar em um local tão horrendo e hostil? – Mas ainda não ousara lhe fazer essa questão, pois não sabia se mexeria com assuntos ligados ao passado dela. E tudo que ele não gostaria era de causar conflitos internos em alguém tão paciente e adorável consigo.

  – Então, o que preciso fazer é tomar esse chá e dormir? – perguntou.

– É isso aí. Se tudo der certo, assim que eu resgatar sua arma de guerra acordarei você, mas se for preciso, o chamarei antes de ir buscá-la; terá de tomar outra bebida, a fim de separarmos nossos campos energéticos. Certo?

  – Sim, certo.

– Ah, mais uma coisa: não se preocupe; não será contaminado nem por meu sangue e nem por minha energia.

– Jamais me preocupei com isso.

– Mesmo assim esclareço tudo a você.

Castiel bebeu o líquido com rapidez. E em poucos minutos se deitou; tudo que queria, devido à hipnose provocada pelo chá, era dormir.

– Sonhe com os anjos, literalmente – a moça deu um beijo na testa dele, que riu do comentário feito e adormeceu logo depois.


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