Sangue em Pó escrita por Mirian Rosa


Capítulo 9
Capítulo 8




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No dia seguinte, a turma voltou a fazer turismo em Barcelona à espera das passagens de volta. À tarde, quando voltaram ao hotel, receberam o envelope na recepção. Teriam que madrugar às três horas da manhã para pegar o primeiro trem de Barcelona para Paris o segundo sairia de Paris às sete da manhã e só estaria em Lyon após o meio dia.

— Carlson está de sacanagem com a gente. Sair às três da madruga-da? Ele pirou de vez.— disse Nikolas.

— Sem gracinhas, pessoal. O povo tá olhando feio pra nós... Tá todo mundo querendo dormir...— brincou Renato.

— É...— disse Nikolas.

Só chegaram às duas da tarde na cidade, Carlson os recebeu na esta-ção de trens e os dispensou, tal como fizera quando eles voltaram de Nápoles. Nikolas passou o resto do dia descansando no “Parc de la Tete’ D’Or” ao lado da Interpol. Tal parque era um local lindo, paradisíaco. O alemão sentou-se à beira do lago e ficou lá, ouvindo músicas em seu MP3 Player. Entretanto, não ouviu música por muito tempo, pois Renato, Dario e Jean também resolveram passar um tempo no parque e ficaram conversando, mas nada de Henry, Peter, Javier, narcotráfico, máfia ou cocaína na conversa do quarteto, o papo foi sobre esportes, Fórmula 1 e futebol, principalmente. Pablo trancou-se em casa. Sentia-se indisposto.

Já Santeri e Sofia resolveram aproveitar a folga que Carlson lhes dera de outro modo. Nada de Parc de la Tête’ D’or. O “cenário” da folga do casal foi o quarto do finlandês. Sem, claro que Nikolas os visse.

No dia seguinte, Carlson encontrou a turma na Interpol e pediu a Santeri o já esperado relatório. O finlandês assentiu e disse que o relatório já estava bastante adiantado. Pois, ao contrário de Nápoles, dessa vez levara o computador para Barcelona, não apenas um telefone celular. Ótimo, disse Carlson visivelmente satisfeito ao ouvir essa última notícia.

Santeri foi direto para sua mesa onde ligou o notebook e transferiu via blue tooth o arquivo para o computador da Interpol. De lá, mandou imprimir o arquivo. Nem esperou a tinta secar direito para levar as duas páginas para Carlson.

— Aqui está, Carlson. Tem pouca coisa.

— Tudo bem. Imaginei. O que vocês fizeram na folga? Assistiram a algum jogo do Barcelona?

— Não. Ficamos nos arredores do Parc de la Ciutadella mesmo. A-quário, Marina, Zoológico, Museu do Chocolate... Foi bacana esse “mo-mento turismo”.

— Ótimo. Até que não foi de todo ruim essa ida à Barcelona, foi?

— Claro que não.

— Bem, irei ler seu relatório, enquanto isso; volte para sua sala...

— Sim senhor.

De volta à sala, Santeri percebeu que Jean estava à procura do para-deiro de Peter, Javier e Lars. E parecia estar com progressos. Descobriu que Lars trabalhava como curador em uma galeria de arte/museu de Vincent Van Gogh e que havia também um alemão empregado na galeria.

— E, além disso, Javier foi visto em Amsterdã. O alemão que traba-lha com Lars é faxineiro...

— Pode ser uma coincidência, mas pior será se Mackintosh estiver trabalhando em um hospital. Antes fazendo faxina que cirurgias.— ponde-rou Dario.

— É. Tem razão, Dario. Algo a menos para nos preocupar. Agora temos que descobrir o nome desse alemão.— disse Renato.

— Basta enviarmos um ofício à polícia holandesa perguntando sobre a presença de Ralf Schneider ou de Peter Mackintosh por lá. Sem mencionar, claro, as trocas de identidade.— disse Santeri, meio sem vontade de palpitar quando Carlson entrou na sala agitado com um papel nas mãos.

— Parem as prensas! Parem as prensas! Mackintosh foi visto em Amsterdã, supostamente.

— Como assim “supostamente”, Carlson?— indagou Nikolas.

— Encontraram, no museu Van Gogh um alemão com as mesmas características físicas que ele e que, aparentemente, fala inglês com um sotaque alemão muito artificial. O nome com o qual a figura se apresenta é, um minuto de suspense.— brincou Carlson.

— Já passou o minuto, Carlson.— avisou Dario olhando para o relógio e rindo da brincadeira de Carlson.

— Onde eu estava mesmo? Ah, sim! O nome do suposto Peter Mac-kintosh encontrado em Amsterdã é Ralf Schneider. E vocês irão para lá daqui cinco dias.

— Pôxa, Carlson, acabamos de voltar de Barcelona. Estamos viajando mais que diplomatas!— reclamou Nikolas. Ainda não se recuperara da viagem.

— Nikolas, temos que avisar o Michael. Quando Peter o vir...— lembrou Jean.

— Verdade. Quando nossa partida for mais certa eu o aviso.

— Pode avisar já. Eu disse “vocês irão” e não “vocês poderão ir”. Ele tem só cinco dias para se preparar. Ah, aqui está o nome do hotel onde reservei quartos para vocês. Avise-o para encontrá-los lá... Ou se hospedar lá também, vai saber...— era Carlson.

— E quanto à esposa e filhos do Ralf original?— perguntou Nikolas já próximo ao telefone.

— Não diga nada. Michael é quem saberá se vale a pena ou não le-vá-los.

— Acho que abaixaria demais o nível. Mas Michael o assustaria.— era Renato.

— Também acho. Mas sabe-se lá o que pensa Michael...— concor-dou Carlson.

— É. Impossível dizer.— era Sofia.

Ao ouvir a voz da italiana, Carlson lembrou-se de um detalhe. Deci-diu saber de Nikolas se ele vira a “cena napolitana” outra vez. Pediu:

— Korhonen, avise Schweizer de que pretendo falar com ele depois que ele desligar o telefone.

— Sim senhor.— consentiu Santeri.

Nikolas conversava com Michael ao telefone, em alemão, ninguém naquela sala entendia uma só palavra da conversa. E, do outro lado da linha, o engenheiro alemão não parecia muito animado, embora estivesse esperando que a Interpol lhe desse a notícia.

— Acharam o cara que matou meu irmão? Aquele narcotraficante escocês?— perguntou Michael.

— O próprio.— respondeu Nikolas.— Iremos para Amsterdã em cinco dias, se quiser, encontre-se conosco no Hotel Van Gogh.— era Niko-las, ainda em alemão, fornecendo o endereço do hotel para Michael.

— Certo.— era Michael do outro lado anotando o endereço.— Mas vou sozinho.

— Tudo bem.— era Nikolas dando a conversa por encerrada.

Despediram-se e Nikolas desligou o telefone. Assim que viu que o alemão se desocupara, Santeri lhe passa o recado de Carlson.

— Carlson quer falar com você, Schweizer.

— Ok.— disse o alemão encaminhando-se para a sala do chefe.

Lá dentro, Carlson interrogou seu agente nativo de Frankfurt:

— E aí? Michael Schneider vai colaborar?

— Sim. Mas como imaginávamos, não vai levar a cunhada e os so-brinhos para a Holanda.

— Certo, tudo bem... Viu algo em Barcelona?

— Do que você está falando?

— Você sabe, Nikolas. Envolvendo dois dos nossos agentes...

— Ah, vi. Cenas bem picantes, se é que você me entende...

— Andou prestando atenção...

— E tem jeito de não olhar pra Sofia de lingerie vermelha? Por fa-vor, Carlson, não dá.

— Concordo. Vestida ela já é um espetáculo de mulher, imagine nua...— divagou Carlson.— Lingerie vermelha? Uau!

— Mas parou por aí. Quando percebi que a cena ia ficar mais, hã, quente, fui para meu quarto.

— Tudo bem. Os dois precisam de privacidade nesses momentos.— disse Carlson debochado.— E você não é obrigado a ver o que não quer. Se isso acontecer de novo na Holanda, não precisa sair do quarto para assistir à cena e me avisar. A vida sexual do Korhonen e da Rossini não me interessa.

— Se realmente eles quisessem privacidade teriam se lembrado de fechar a porta do quarto. Ah, não sei se outro agente viu a cena. E... Tudo bem.— disse Nikolas.

— Ok, Nikolas, pode voltar para sua sala e nada de tocar nesse as-sunto lá, ok?

— Certo, chefe.— disse Nikolas saindo da sala. O alemão pensava se Carlson também era daquele jeito no FBI, onde trabalhou até ir para a Interpol. “Será que ele galanteava as agentes mais ‘boazudas’ do FBI?” pensou o alemão. Nikolas também se sentia aliviado por não ter que ver mais nada. “Na próxima vez vou ficar na minha, aconteça o que acontecer.” Decidiu.

•••••

Cinco dias depois, às oito horas da manhã, Carlson estava com seus agentes no aeroporto em Lyon. Os agentes iriam para Amsterdã participar de uma rocambolesca missão: desmascarar Peter Mackintosh, o mais ardi-loso traficante de cocaína da Europa Ocidental. Nikolas, Jean, Renato e Dario já tentavam imaginar a cara de susto que Mackintosh faria ao rever sua vítima, viva, em carne e osso.

— Concentrem-se em desmascarar Mackintosh, do resto cuidamos depois... Preguem um belo susto no escocês... Será divertido ver o que a-contecerá...— ordenou Carlson.

— Certo. E quanto a Javier e Lars?— perguntou o objetivo Santeri, que no fundo, também estava doido para ver a cara de Peter quando Michael surgisse.

— Cuidamos da dupla depois... Vamos nos concentrar em Mackintosh, primeiramente.— decidiu Carlson.

— Depois que o Mackintosh já estiver devidamente desmascarado, nós pensaremos no que fazer com o Lars e com o Javier?— perguntou Pa-blo que estava meio afastado da investigação por conta de uma gripe e também de suas infundadas teorias.

— Exato, Ortega.— respondeu Carlson.

Meia hora depois, os agentes estavam dentro do avião a caminho da capital holandesa. Mais uma hora e meia de viagem e eles se viram na re-cepção do hotel Van Gogh em Amsterdã, fazendo seus cadastros. Preencheram suas fichas e subiram para seus quartos. Nikolas disse que desceria para falar com o pessoal da recepção sobre Michael, para avisá-los que quando ele chegasse. Santeri e os demais agentes consentem sabendo que o irmão gêmeo de Ralf era uma peça crucial para o desmascaramento de Peter. Assim que Schweizer desceu encontrou Schneider realizando o seu check in. E para um quarto no mesmo andar em que se encontravam as suítes dos agentes. Subiram juntos conversando sobre algum assunto em alemão. Lá em cima, ao se encontraram, Santeri, contrariando ordens expressas de Carlson decidiu pegar o trio de uma só vez, mas para isso seriam necessários alguns dias pesquisando a rotina dos mesmos, se é que existia alguma. Ver todos os passos do trio desde a hora em que saíam da cama até quando voltassem a ela. Enquanto Santeri expunha suas ideias Pablo, de celular em punho, retirou-se à francesa do recinto.

À tarde, Santeri, Michael, Jean e Sofia foram ao museu/galeria de arte examinar o terreno do desmascaramento. Michael queria desmascarar Peter em público. Enquanto o quarteto estudava o museu, Nikolas, Renato, Dario e Pablo foram, seguindo ordens de Santeri, para a delegacia mais próxima saber se Lars tinha muita coisa na ficha. Logo souberam que o rapaz estava em suspensão condicional de direitos desde que fora pego na fronteira com a Bélgica com dois quilos e meio da “Diamond Blue” de Ja-vier. Estava cumprindo a “sursis” há quase dois anos, e a mesma acabaria dentro de dois meses. Apesar de estar em liberdade condicional, Lars ainda era investigado por tráfico de cocaína. Frequentemente era visto numa estação de trem abandonada conhecido ponto de venda de drogas de Amsterdã nas últimas vezes, acompanhado de um sujeito que a polícia holandesa não soube identificar (e mostrou fotos para os agentes e logo Nikolas reconheceu Mackintosh), e ficavam lá horas vendendo pequenas ampolas de cocaína, mas fazia tempo que não apareciam.

No museu, Michael passeava tranquilamente pelo espaço olhando atentamente os quadros lá expostos. Enquanto observava, era observado por um funcionário que o encarava detidamente enquanto torcia um pano num balde de plástico. Michael percebeu e Jean, também por perto, disse-lhe que tinha quase certeza que aquele sujeito era Mackintosh. “Que degradação! De um renomado cardiologista meu irmão virou um reles faxineiro de museu.” Pensou Michael aborrecido. Mas logo entendeu que seria bem melhor assim. Se Peter descobrisse que matara um médico, e resolvesse trabalhar em algum hospital, o tamanho da encrenca seria incalculavelmente maior. “Antes limpando um museu que pondo a vida de terceiros em risco.” Concluiu Michael.

Mais tarde, naquele dia, os agentes e Michael se reuniram no hotel para traçar uma estratégia para o desmascaramento. E contar o que desco-briram. Nikolas contou o que pegaram na delegacia e logo o assunto voltou a ser o desmascaramento de Peter. Pablo estava apreensivo. Michael também, mas eram duas versões diferentes do mesmo sentimento. O alemão estava na expectativa de desmascarar o assassino de seu irmão, provar na frente de várias pessoas do museu que aquele faxineiro não era Ralf Schneider coisa nenhuma e sim um traficante de cocaína procurado pela Interpol. Já a apreensão de Pablo estava mais ligada ao medo. Ele estava apreensivo por achar que logo seria descoberto, embora estivesse do lado da polícia, pelo menos até àquela hora. Irritado consigo mesmo por não conseguir disfarçar sua apreensão, o espanhol saiu do quarto de Santeri que mesmo percebendo o fato, fez vista grossa.

Nikolas e Michael logo começaram a planejar um jeito de pegar Pe-ter de surpresa e o que fariam para desmascará-lo. Falem em alemão com ele, como ele não deve saber o idioma, vai se atrapalhar muito e se enroscar no meio da conversa. Aí vai ficar evidente que ele não é alemão coisa nenhuma. Era Renato sugerindo um meio de pegar o escocês.

— Boa, Renato. Acho que isso vai ser bem legal, e... Michael, fale sobre coisas bem pessoais entre vocês dois, aventuras de infância, coisas assim, que só o Ralf verdadeiro saberia. Quando ele se enroscar de vez, você me apresenta como um novo amigo, eu também entro na conversa em alemão e quando ele se sentir mais desorientado que cego em tiroteio eu solto na frente dele que sei que ele é Peter Mackintosh. Korhonen, valeria a pena me identificar nesse momento como um agente da Interpol ou deixa quieto?

— Deixe quieto, Schweizer. Em momento algum diga que é da In-terpol, conhecemos Mackintosh o suficiente pra sabermos o que aquele cara seria capaz de fazer...

— Ok. Sendo assim, nada de Interpol.— disse Nikolas.

— Certo, Nikolas, eu te apresento como um novo amigo... E aí?— era Michael.

— Hum... Seu irmão era cardiologista, não?

— Era.

— Fala que nos conhecemos na empresa e que eu tenho algum pro-blema cardíaco sério. Angina, qualquer coisa assim. Ele vai ficar totalmente perdido.

— Boa, cara, boa.— disse Santeri encerrando a reunião.

Santeri encerrou a reunião, mas dúvidas continuaram. Por que Pablo saíra precipitadamente de seu quarto quando Nikolas começou a falar em como desmascararia Mackintosh? E... Era muita estupidez achar que Peter não descobriria que seu “desmascarador” era um agente da polícia criminal internacional. O escocês era bem mais esperto que a média... O simples fato de ele ter destruído as impressões digitais e o rosto de Ralf Schneider já era uma prova concreta de sua esperteza... Caso contrário, logo seria provado que não era ele o cadáver. E foram necessários dois meses e meio para que descobrissem que Peter ainda estava vivo. Mas por culpa do próprio que apareceu em um aeroporto de intenso movimento para recepcionar outro traficante. “Pensando bem, Mackintosh não é tão esperto assim...” Pensou Santeri. Com a mente cheia de questões, Santeri deitou-se de calça Jeans, mas sem camisa na cama à espera de Sofia. A italiana viria a seu quarto para o que faziam toda vez que Carlson os despachava para fora de Lyon? O finlandês nunca estivera tão apaixonado em toda sua vida. Sofia virara sua cabeça pelo avesso. O frio e calculista especialista em entorpecentes tornara-se um outro homem desde quando conheceu a italiana. Logo pulou na cama. A ironia de Nikolas em Nápoles fazia sentido: teria o disciplinado alemão visto algo? Ainda pensava nisso quando Sofia entrou no quarto. Toda e qualquer preocupação que estava com o finlandês sumiram ao ver a italiana deitando-se sobre seu corpo. A partir daquele momento, o hotel poderia até desabar, a única coisa que importava para o mesmo era a mulher que estava ao seu lado.

•••••

Muito embora já soubesse que isso ia acontecer de novo, Nikolas nem liga. Decide, dessa vez, deixar o casal em paz, nem se mexe quando ouve os passos de Sofia no corredor em direção ao quarto de Santeri. (Ou seria o finlandês indo ao quarto da italiana, só pra variar?) Se assistisse à cena como já era “comum”, o alemão certamente ficaria extremamente agitado ou excitado. Sofia colocara lingerie roxo para essa noite. Bem mais sensual que a vermelha que usara em Barcelona. O alemão desencanou da ideia. “Não sou obrigado a ver isso” lembrou. Mas ainda assim teve um sono agitado. Pensou o tempo todo em como iria arranjar coragem para enfrentar Mackintosh. “Como é que eu vou fazer pra soltar na cara dele que sei quem ele é? E o pior: sem deixar transparecer que sou um agente da Interpol?” Pensava o alemão enquanto tentava dormir. A “briga” com o sono durou até as duas horas da manhã, quando o sono ganhou, mas às oito horas, o celular de Nikolas o despertou. “Droga! Parece que não dormi nada!” reclamou assim que abriu os olhos. Desceu para o restaurante do hotel para tomar café, encontrou Dario e Renato.

— E aí, Nikolas, preparado pra botar Mackintosh contra a parede?— perguntou Dario.

— Mais ou menos. Peter é um tipo perigoso, sabe-se lá o que ele será capaz de fazer...— concluiu o alemão, um tanto quanto nervoso.

— É, mas nós estaremos por perto. Pra dar um apoio moral.— brin-cou Renato.

— Engraçadinho... Cadê o resto da turma?

— Sei lá, devem estar dormindo ainda. Ah, retiro o que disse. Olhem eles ali.— disse Renato ao ver Santeri, Sofia, Jean e Michael descendo.

— E aí, Schweizer, preparado?— perguntou Santeri.

— Se eu disser que sim, estaria mentindo. Estou morrendo de medo. Mackintosh um é bicho perigoso...— era Nikolas justificando seu temor.

— Compreensível, Schweizer. Estamos todos nervosos só de imagi-nar. Sabemos que Mackintosh é um cara perigoso, e pode ter reações im-previstas. Por essa razão, só vamos ao museu desmascará-lo à tarde. Agora iremos à polícia local contarmos o que sabemos a respeito do caso. Quem sabe o delegado não nos empresta alguns agentes?— era Santeri.

— Acho bom não alimentarmos muitas esperanças... As chances de conseguirmos um reforço eu creio que sejam pequenas.— era o pessimista Renato.

— Depende. Mas pensando bem eu acho que não vai acontecer nada demais lá. O máximo que Peter vai fazer será dar umas vassouradas no Schweizer. Não acredito que ele ande com arma de fogo lá dentro.— disse Santeri enquanto Dario ria da ideia de ver Nikolas sendo perseguido por Peter com uma vassoura em mãos.

— É... Não é você quem vai levar vassouradas na cabeça.— recla-mou Nikolas.— E ele pode sair correndo de lá.

— É por isso que quero passar em uma delegacia antes. A polícia holandesa precisa saber que tem um criminoso de alta periculosidade em seu território e que pode fugir a qualquer momento.— justificou o finlan-dês.

— Sendo assim, faz bastante sentido o que você quer. Ué? Cadê o Ortega?— era Dario dando falta do Espanhol.

— Boa pergunta.— disse Renato.

— Deve estar dormindo ainda.— deduziu Nikolas.

— Vou lá conferir.— ofereceu-se o recém-chegado Jean levantando-se e voltando para o andar. Vasculhou o quarto que Pablo ocupava com atenção e gritou, várias vezes, as palavras “Pablo” e “Ortega”, mas nem sinal do espanhol. Antes de voltar ao restaurante, vai à recepção perguntar pelo hóspede do apartamento 415. A recepcionista disse que ele saíra às seis horas da manhã.

— Caramba!— disse Jean, nervoso, correndo de volta para o restaurante. “Korhonen precisa saber disso.” Pensou.

— Laffite, cadê a figura?— perguntou Santeri se levantando da me-sa.

— Segundo a recepção, saiu do hotel as seis e pouco da manhã.— respondeu o francês.

— Miséria!— disse Santeri jogando a cadeira para trás e subindo. Instintivamente os demais agentes levantaram-se e seguiram o finlandês. Santeri entrou em seu quarto e ligou o notebook. Conectou-se na internet e entrou em contato com Carlson.

O chefe; pego desprevenido na sede da Interpol, assustou-se com o contato.

— O que houve, meus caros?— perguntou Carlson, intrigado.

— Ortega sumiu do hotel, Carlson. E, aliás, abandonou ontem à noi-te uma reunião no meio. O que fazemos?

— Quando ele voltar lhe dê uma advertência, Korhonen. Depois me comuniquem.

— Ok.

— Ah, outra coisa, vigiem-no de perto, a partir de agora.— pediu o chefe se desconectando da conversa.

— Se soubéssemos onde ele se encontra... Era só o que me falta-va!— reclamou Nikolas.

— Eu sempre desconfiei desse cara. Ele nunca me pareceu muito, normal.— disse Renato.— Aquela história do ETA... Aí tem coisa.

— Deve ter mesmo, Renato. Eu também o achava esquisito, mas nunca pensei que ele fosse tão estranho assim. Isso não vai terminar bem. Ele pode ter algum envolvimento nesse caso.— especulou Dario.

— Será? Como ele entraria na Interpol se tivesse relações com nar-cotraficantes?— questionou Nikolas.

— É, eu sei. Mas acho que só isso pode explicar tudo o que está acontecendo. A história do ETA, como bem lembrou o Renato, esse sumiço, a as saídas dele das reuniões. E pra ser bem sincero, acho que ele até forjou aquela gripe pra se afastar das investigações.

— Fraschetti, agora eu acho que você já foi longe demais. Tudo bem, até concordo que o Ortega é esquisito, mas achar que ele tem partici-pação no narcotráfico aí você já exagerou. Acho que a coisa não é tão crítica assim.— rebateu Santeri.

— Será?— devolveu Dario.

Com essa preocupação em mente, os agentes foram à delegacia, não para avisar do sumiço de Pablo, mas para contar a história de Mackintosh. Era aconselhável que ao menos alguma autoridade policial holandesa sou-besse que o traficante escocês estava perambulando em seu território.

A manhã se passou com Sofia, Nikolas, Santeri, Renato, Jean e Da-rio gastando todos os argumentos para convencer o delegado que Ralf Schneider não era apenas um “sósia” de Peter Mackintosh era o próprio Mackintosh.

— Quer ver só? Esse sujeito aqui é irmão gêmeo idêntico de Ralf Schneider. Michael, mostre as provas, por favor.

— Bem aqui está.— disse Michael desorientado mostrando fotos recentes sua e de seu irmão.

O delegado examinou-as e devolveu-as sem dizer nada:

— Veremos o que fazer.— disse depois.

Chateados, os agentes saíram da delegacia e voltaram ao Hotel. Al-moçaram por lá, descansaram alguns minutos e foram para a galeria. E nada de Pablo, nesse meio tempo. Santeri já estava preocupado com o espanhol. O que deu nele pra sumir desse jeito? Perguntou.

— Fucei nas coisas dele e achei um número de celular. Liguei pra esse número, mas não consegui nada. Diz que o número não existe.— con-fessou Nikolas.

— Tudo bem, Schweizer. Sem problemas. Mas ele vai enfrentar muitos quando reaparecer.

Furioso, Santeri tentou se acalmar antes de irem à galeria desmasca-rar Mackintosh. Aproveitou que só iriam à galeria mais tarde, dentro de duas horas para relaxar. E foi pedir ajuda à Sofia. A italiana sabia muito bem que espécie de ajuda Santeri queria. Entrou no quarto do finlandês já o jogando na cama, desabotoando sua camisa e beijando-o.

Algum tempo depois, já bem mais calmo, Santeri decidiu. Vai ser agora! Disse para Sofia que ainda estava em seu quarto. Vamos? Chamou a italiana que se recompôs rapidamente.

— Claro, temos que botar o Mackintosh contra a parede.

— Exato. Vamos nessa. Chame o Schweizer.— decidiu Santeri indo para a porta do quarto de Jean.— Laffite, vamos pro museu agora, desmas-carar Mackintosh.

— Oba! Demorou...— disse o francês chamando o italiano.— Dario, vamos pro museu! Korhonen, o que faremos com o Pablo?

— Sei lá. Depois a gente pensa nisso.— decidiu Santeri desencana-do.— Quando ele aparecer... Acertamos as contas.

— Sendo assim...— disse o francês.

— Renato, museu!— grita Nikolas.

— Beleza. Vamos nessa.— era o brasileiro.

— Michael, vamos pro museu puxar o tapete do Peter!— disse Nikolas avisando a “peça chave” do caso.

— Opa... Vamos nessa. Não vejo a hora de acabar com a raça desse desgraçado.— disse Michael saindo de seu quarto e “pondo pilha” nos agentes.

Alguns minutos mais tarde estavam no museu, que tinha sua movi-mentação normal. Foram recepcionados por um homem de meia idade, alto e magro, que se apresentou com Karl van Dorff. Curador-chefe do museu. Santeri perguntou sobre Ralf Schneider.

— Ah, sim, trabalha conosco há uns três, quatro meses... Mas se arrependimento matasse... Eu estou quase o demitindo, vive falhando.

— Como ele veio parar aqui?— perguntou Michael.

— Ele é amigo do Lars van Gogh, um dos curadores. O Lars pediu para que eu o empregasse, pois ele queria passar uma temporada fazendo algo diferente. Mas tenho lá minhas desconfianças.

Ao ouvir isso, Jean decidiu testar Karl para ver até que ponto ele conhecia o funcionário:

— Karl, o senhor soube que o Lars já foi condenado por tráfico de drogas?

— Sei sim, que está cumprindo condicional ou coisa assim. Por quê?— perguntou Karl estranhando o teor da questão.

— Já ouviu falar de Peter Mackintosh?— era Jean ainda testando os conhecimentos e a paciência de Karl.

— Acho que sim.— respondeu o curador-chefe ainda estranhando o rumo que a conversa com aquele grupo de estrangeiros tomava. “Que papo mais bizarro!” pensou.

— Pois então, o seu empregado Ralf Schneider é Peter Mackintosh. O Ralf Schneider de verdade é irmão desse cara aqui. Ralf foi assassinado por Peter para escapar da polícia, mas deu bobeira.— contou Santeri.

— Quem são vocês?— perguntou Karl recuando.

— Agentes Santeri Korhonen, Sofia Rossini, Dario Fraschetti, Niko-las Schweizer, Jean Laffite e Renato Almeida. Somos da Interpol.— disse o primeiro da lista mostrando sua insígnia para Karl.

O chefe de Lars e Peter retirou a insígnia das mãos de seu dono e a examinou. Devolveu alguns minutos depois.

— Mackintosh, digo Schneider, digo sei lá qual dos dois está naquele corredor... Exposição de Monet...— disse Karl com a voz abobalhada. Fora pego totalmente despreparado.

— Obrigado.

A turma foi para o dito corredor e lá viram Peter ou Ralf agachado torcendo um pano num balde com um rodo apoiado no ombro. Jean foi o único que teve “cara-de-pau” o suficiente para chamá-lo. E aí começou a parte mais pitoresca da ida dos agentes à Holanda.

•••••

Peter virou-se lentamente ao ser chamado. Quando terminou o giro, Michael estava em seu primeiro plano de visão. Assustou-se tanto que se desequilibrou e caiu sentado.

— Algum problema, Ralf? Você está assustado... Feito aquele dia, lembra? Inverno... Tínhamos uns dez anos e o que foi que a gente fez mes-mo?— perguntou Michael seguindo à risca as instruções de Nikolas.— Foi guerra de bolas de neve ou do quê? Lembra que quebramos a vidraça do vizinho? Depois você correu para se esconder no porão!

— O que você está falando? Não entendi nada.— disse Peter já de pé.

— Estou lembrando um episódio de nossa vida. Como você não está entendendo?— era Michael provando ser um excelente ator.

— Como assim?— era Peter de novo. E o pior: não estava fingin-do.— Quem é você?— perguntou estranhando. Talvez algum cliente velho dos tempos em que eu traficava perto de Frankfurt, pensou o escocês que mesmo tendo “trabalhado” na Alemanha por cinco anos não aprendera muito o idioma local.

— Caramba, Ralf, sou o Michael! Não está me reconhecendo? Sou seu irmão, cara!

— Como?— Peter a essa altura do campeonato já estava tremen-do.— Que conversa é essa de irmão?

Michael percebeu que Peter caíra com perfeição em seu golpe. Mostrou uma foto de sua cunhada para Peter.

— Lembra-se dela?

— Como vou me lembrar de alguém que não conheço?

— Caramba, Ralf! Sua amnésia está pior do que imaginei! Não re-conhece a Ingrid?

— Quem é Ingrid?

— Sua mulher, mãe de seus dois filhos. Aliás, mudando de assunto, meu amigo ali está com um problema sério...— começou Michael chaman-do Nikolas para perto.— conheci esse cara aqui lá em Munique ele é de... Frankfurt ou Stuttgart?

— Frankfurt.

— Ok. Bem, como eu ia dizendo conheci esse cara lá na minha em-presa e descobri que ele tem um problema cardíaco meio complicado. Ar-ritmia. O que você acha que ele deve fazer?

— Quê?— Peter continuava sem entender nada. Nessa hora Lars apareceu por lá. Ficou estarrecido ao ver o que acontecia com seu “amigo” e “sócio”.— Que conversinha esquisita é essa?

— Fala sério! Você é o melhor cardiologista de toda a região de Munique! Como não pode fazer nada?— era Michael.— Que tal implante de marca-passo?— sugeriu Michael lembrando-se de algumas conversas que tinha sobre o trabalho do irmão com o verdadeiro.

— Do que você está falando?

— De você!— Michael já estava quase gritando.

— Desde quando eu sou isso?— era Peter sem querer dando a deixa que Nikolas precisava.

— Nunca foi mesmo. Ralf Schneider foi morto, não é verdade, Peter Mackintosh?— disse Nikolas.

Peter não disse mais nada saiu correndo da galeria de arte derruban-do o balde no chão e logo ganhou a rua, entretanto ele não viu que Nikolas, Michael, Santeri e Karl foram atrás. Tudo sob olhares atônitos dos visitantes do museu. Enquanto eles corriam, Dario, Renato, Jean e Sofia ficaram na galeria vigiando Lars que pensou em fugir da galeria também, mas foi detido por Dario.

— Aonde você pensa que vai Lars van Gogh?— perguntou o italiano segurando-o pela gola da camisa.— Acha que vai sair ileso dessa, é?

— Mas... Mas... Mas...— Lars tentava dizer alguma coisa, mas as palavras falharam.

— Mas o quê? Você achava que ele podia enganar qualquer um por aí? Prepare-se para conhecer o portal do inferno, van Gogh!

— Mas eu não tenho nada a ver com essa maluquice que o Pete co-meçou. Aliás, nem sei pra que ele fez isso.— era Lars nervoso.

— Matar o Ralf?— Dario perguntou.

— É. Queria se livrar de uns problemas... Matou esse tal de Ralf e veio pra minha casa.

— Sei... E o que mais aconteceu?— mais uma pergunta de Dario.

— Bom... Ele disse que Don Fiorella provavelmente o mataria quan-do soubesse das mulas mortas, ele já estava desconfiado do Henry quando graças a vocês soubemos da verdade. Aí o Jav foi atrás dele, tomar satisfa-ções...

— E aí?— Dario dava uma de “machão”.

— Vocês sabem, ele matou Henry. Mas não disse que faria isso ex-pressamente aqui pra nós. Aliás, ele nos disse que iria para o leste Europeu. Já o Henry contou claramente que ia para Barcelona.

— E o que mais?— Dario continuava a “prensa”.

— Quando percebi, os jornais noticiavam a morte de Henry sem dizer quem era de fato o autor do Homicídio.

— Lars, onde está Javier?— era a vez de Jean começar outra parte do interrogatório.

— Se eu soubesse.— disse Lars chateado, ainda imobilizado por Dario, Renato e Jean. Sofia apenas assistia a cena, quieta. Pouco antes a italiana ligara para a polícia de Amsterdã, avisando que Mackintosh fora visto no museu Van Gogh. E que pegaram um comparsa do escocês no tráfico. E que também era testemunha do homicídio consumado que o escocês cometera há cinco meses.

Na rua, Mackintosh correu por algumas quadras mostrando ter con-dicionamento físico de um maratonista até alcançar um ponto de ônibus e entrou no primeiro que passou, poucos segundos depois, e viu a turma do museu que o perseguira estancar ofegante na esquina ao vê-lo dentro do veículo.

—Perdemos o cara de vista.— decretou Nikolas soltando um punhado de palavrões em alemão.

— Paciência. Se aquele delegado de araque tivesse nos ajudado... Aliás, cadê o Almeida, o Laffite, o Fraschetti e a Rossini?— perguntou Santeri.

— Devem ter ficado no Museu.— respondeu Nikolas mais cansado por ter falado diversos palavrões em sequência do que pela corrida de quase trezentos metros.— Aliás, o Lars está lá dentro ainda, espero. Só falta ele ter conseguido sair correndo também e eles o perseguiram. Desencontro total.

— Espero que não. Em todo caso, tenho o celular da agente Rossini. Era só ligar.

“Agente Rossini, é? Sei...” pensou Nikolas cético.

— Desculpem por não ter confiado em vocês antes... Isso tudo não teria acontecido. Sinto muito mesmo... É que eu não sou muito afeito a ler o noticiário de polícia. Meu foco é a área cultural.— era Karl também sem fôlego pela correria e para piorar ele era o único que vestia um terno preto, o que piorava o caso. Os agentes e Michael usavam roupas mais claras e mais esportivas. E a Europa estava no auge do verão de início de setembro.

— Para onde aquele ônibus foi?— perguntou Michael apontando para a rua em que o ônibus entrou e sumiu da vista da turma.

— Se não me falha a memória, pra...— Karl lembrou-se assusta-do.— Estação central de trens! Sai trem pra tudo quanto é canto do conti-nente de lá.

— Agora a coisa encrencou de vez. O cara pode ir para qualquer canto da Europa.— lembrou Santeri chateado sentando-se na calçada. Nikolas se segurou na ideia de perguntar-lhe se ele queria ser consolado pela Sofia.

— E a gente ainda tem o Ortega pra achar...— lembrou Nikolas.

— Ai! Por favor! Schweizer, não mencione o nome dessa criatura dos infernos perto de mim!— pediu Santeri mal-humorado.

— Tá bom, desculpa. O que vamos fazer?— Nikolas.

— Voltar para o museu. E contar pro Carlson o que aconteceu a-qui.— disse Santeri já prevendo o tamanho da bronca que tomariam do chefe.

— Certo.

O quarteto retomou a caminhada e apesar do acontecido tomaram por positivo o saldo. Principalmente Michael.

— Valeu a pena, a cara de susto dele foi impagável.— disse o enge-nheiro.

— É. Agora só Deus sabe onde é que ele vai se enfiar.— disse San-teri.— Aliás, Michael, você estava ótimo! Foi bem melhor do que eu ima-ginava.

— Leste Europeu. Muito provavelmente, ou então, sei lá, Nápoles, talvez.— era Nikolas.— Verdade, Michael, você estava ótimo. Tom Hanks não faria melhor.

— Obrigado. Tive aulas de teatro na escola... Mas nunca pensei que fosse precisar delas.

— Nápoles?— perguntou Karl.

— Ele tem ligações com mafiosos de lá. Já ouviu falar em Don Fio-rella?— perguntou Santeri.

— Por cima.

— Pois então, Mackintosh, Lars, Javier e Henry são alguns dos traficantes da rede desse sujeito.— explicou Santeri

— Caramba! Estava cercado de bandidos!

— Karl, Javier apareceu lá na galeria?— perguntou Nikolas.— Juan Alonso também serve.

— Javier? Juan? Não. Nenhum dos dois.

— Tudo bem.— disse Nikolas ocultando do distraído Holandês que Javier Marquez e Juan Alonso eram, na verdade, a mesma pessoa.

Chegaram de volta ao museu e viram Lars sendo conduzido para uma delegacia, algemado. Jean, Dario, Renato e Sofia vinham atrás.

— O que aconteceu aqui?—perguntou Karl.— Sou o gerente do mu-seu.— disse depois para justificar a pergunta.

— O rapaz aqui é cúmplice de um homicídio ocorrido na França há uns cinco meses.— respondeu um dos agentes policiais que seguravam Lars pelo braço.

— Como se ele não sai da Holanda há dois anos?— perguntou Karl de novo, ao ver seu funcionário ser levado preso.

— Ele não ajudou na execução do crime, mas abrigou o assassino aqui na Holanda para que ele saísse impune. Felizmente esses turistas aí reconheceram o homicida que fugiu daqui. Mas conseguiram segurar o comparsa.— respondeu o agente, triunfante.

— Turistas uma ova!— protestou Renato.— Estamos aqui a serviço.

— Que espécie de serviço é esse seus? Visitar museus?— o agente holandês era sarcástico.

Renato não disse absolutamente nada. Apenas olhou para Santeri que se encarregou de mostrar a insígnia da Interpol que trazia no bolso.

— Somos da Interpol e viemos procurar esses carinhas aí.— disse Santeri referindo-se ao preso Lars e ao fugitivo Mackintosh.

— Isso é verdade.— garantiu Karl.

— Ai meu Deus! Vocês são da Interpol? Da polícia internacional mesmo?— perguntou o agente surpreso.

— Não, é a banda Interpol. Aquela de Nova Iorque.— respondeu Nikolas irritado.— Sou o Paul Banks.— o alemão continuou ironizando.

Santeri riu da brincadeira de Nikolas. Conhecia o grupo e sabia que Nikolas não se parecia nem um pouco com o vocalista da banda em ques-tão. O integrante que o alemão mencionara. E voltou ao assunto de forma séria.

— Vocês precisam vigiar as estações de trem. Mackintosh foi pra estação central. De lá saem trens pra toda a Europa.— disse o finlandês.

— Acha que não sabemos?— perguntou o delegado.

— Que ele foi pra lá, tenho certeza que não. Já deve estar embarcando uma hora dessas.— respondeu Santeri com a mesma rispidez do delegado.

— Acho que ainda não. Temos esperanças.— era Karl.— A estação central é um bocado longe daqui e essa linha que o Mackintosh pegou é a que faz o caminho mais longo. Acho que temos meia hora ainda.

— Bom saber. Delegado, comunique-se com a delegacia mais pró-xima da estação.— ordenou Santeri.

— Vou ver.

— Temos pouco tempo.

— E daí?

— E daí? O fugitivo é um assassino! Quer que a Interpol espalhe que vocês deram bobeira e deixaram um homicida escapar? Quer?— provocou Santeri.

— Está bem, vou fazer isso agora.— disse o delegado 

— Chantagista!— brincou Nikolas.

— Às vezes é só isso que me resta. Tenho que bancar o durão.— disse Santeri fazendo pose.

— Tá.— disse Nikolas saindo de perto da cena pra rir.

Enquanto isso, Peter tranquilo comprava uma passagem para Paris. Tinha já claro em mente o que faria. De lá seguiria direto para a Inglaterra e por fim para a Escócia. E não voltaria tão cedo para o continente. Pegou o trem no mesmo momento em que Santeri chantageava o delegado para ajudar na operação. Quando finalmente começaram a procurá-lo, ele já estava cruzando a fronteira da Bélgica com a França. E por fim, quando a notícia se espalhou pela Europa já estava chegando a Londres. Lá na Grã-Bretanha, foi tranquilo para Edimburgo e se esconderia num vilarejo rural próximo. E poucos dias depois:

— Nem a sombra do Mackintosh foi encontrada na Alemanha, Paí-ses Baixos, Dinamarca ou Escandinávia.— contou Nikolas chateado.— E o canalha do Pablo que não aparece?

Os agentes ainda estavam na Holanda e de lá só sairiam depois de desbaratar a bagunça.

— Caramba! Até me esqueci dele. Faz quanto tempo que ele su-miu?— perguntou Santeri.

— Três dias. O gerente do hotel já veio me azucrinar por conta disso. E o pior que não adiantou nada eu dizer que não tenho nem ideia do que aconteceu com o cara. Se ele saiu da cidade, bateu a cabeça e perdeu a memória, foi atropelado, assassinado, abduzido...— numerou Nikolas.

— Schweizer, você é uma figura! Abduzido? Essa foi boa...— co-mentou o finlandês que agora não parava de conversar com Carlson num comunicador instantâneo.— Nem o Carlson está ligando mais pro fato. Acabei de avisá-lo e ele me devolve com um seco “e daí?”.

— Sério? O Carlson desencanou?

— Tudo indica que sim.

— Vou ver com o Renato como andam as investigações dele.

— Ok. Schweizer, você poderia pedir pra Rossini vir aqui?

— Claro. Ô Sofia! Korhonen está te chamando.— gritou da porta do quarto de Santeri. “Se fosse pra gritar, eu mesmo o faria” pensou Santeri, mas achou melhor ficar quieto.

— Pois não, Korhonen?— a italiana perguntou entrando no quarto.

— Como estão as pesquisas da Itália? Algum sinal do Mackintosh em Nápoles?

— Até agora nada. Acho que ele não foi pra lá não, San. Korho-nen.— corrigiu a italiana rapidamente ao perceber que Nikolas estava por perto.— Temos que ver com o Fraschetti também.

— Bem, acho que eu vou falar com o Renato.— disse Nikolas sem graça. “Quer dizer que nas 'horas vagas' ela chama o Korhonen de ‘San’. Era só o que me faltava”.

O Brasileiro também não tinha sucesso em suas pesquisas. Nenhum sinal do Mackintosh na Espanha nem em Portugal. Resmungou Renato quando Nikolas lhe perguntou se conseguira alguma coisa. Tudo bem, res-ponde o alemão, vou ver como anda o Jean.

O francês também não obtinha sucesso. Sua missão era contatar autoridades policiais no leste europeu pra perguntar sobre a presença de Peter Mackintosh e/ou Ralf Schneider em seus territórios. Um trabalho nada fácil mesmo para um sujeito astuto como ele.

— Nada, Nik. Está mais complicado do que eu imaginei. O nome dele simplesmente não dá resultado nenhum! Ele pode ter uma terceira identidade que todos desconhecemos e está usando-a!— disse Jean criando mais uma teoria.

— Aí, pronto, acabou, não tem mais jeito, só se o acaso ajudar. E ele não anda muito a fim de colaborar...

— Quem?

— O acaso. Sei que ele deu várias canjas durante a investigação, mas não podemos ter confiança tão cega assim nele.— filosofou Nikolas.

— É, eu sei.— disse Jean pensativo. Recostou-se na cabeceira da cama quando Nikolas saiu. Pra onde mais que Mackintosh poderia ter ido? Não estava em nenhum dos locais onde era previsível ou faltara algum? Cansado, o francês abandonou as pesquisas para tomar uma chuveirada. Debaixo d’água... Um estalo. Enxugou-se, vestiu uma calça e correu atrás de Nikolas. Chamando-o desesperadamente.

— Que foi, cara? Achou Mackintosh?— perguntou o alemão estra-nhando a euforia do francês.

— Não, mas... Quem está rastreando as Ilhas Britânicas?

— Ninguém. Ai caramba, o mais óbvio! Pura Lei de Murphy! O cara está lá.—disse Nikolas dando um forte tapa na própria testa.— Korhonen, temos que rastrear a Inglaterra e a Escócia.

— Por quê?— perguntou o finlandês.

— Ele pode ter ido pra lá. É a “casa” dele no fim das contas. Quando a coisa aperta pro nosso lado, vamos pra onde? Pra casa! Lei de Murphy, meu caro.

— Tem razão. Vou tentar. Ver se o chefão deixa.— disse Santeri apontando para seu notebook, mas referindo-se a Carlson.— Vamos nes-sa.— disse quando Carlson permitiu as pesquisas.— Eu faço isso, Schwei-zer, pode deixar.

— Certo.

Por mais dois dias não houve qualquer resultado que os agentes pudessem aproveitar. Entretanto no segundo dia à tarde a tão esperada ajuda do acaso ocorreu. Cansados de tantas buscas infrutíferas, os agentes resolvem sair à toa em Amsterdã para se divertiram. Santeri estava tão descontraído que beijou Sofia na frente dos colegas e nem deu importância. Sofia correspondeu ao beijo do finlandês para a completa decepção de Dario (que ainda alimentava uma paixão secreta pela conterrânea) e surpresa de Nikolas (que jamais imaginaria que os dois fariam aquilo em público) Renato e Jean embora tivessem visto o beijo também o encararam com naturalidade, sem qualquer reação adversa. Não era nada demais, pensaram eles invejando Santeri. (Sofia era objeto de desejo de todos os agentes do sexo masculino da Equipe) Continuaram o passeio enquanto Nikolas e Dario se refaziam da cena, o que não demorou muito tempo. Nem mesmo o casal em tela se tocou de que haviam quebrado a promessa feita quando iniciaram o relacionamento. Andaram por mais alguns quarteirões, quando Nikolas, distraído com as piadas de Renato, olhou para a calçada oposta a que eles circulavam e reconheceu, surpreso, dois sujeitos sentados no Hard Rock Café. “Empaca” na calçada. Jean e Santeri deram pela falta do alemão.

— Nikolas! Anda!— gritou Santeri voltando para o ponto onde Ni-kolas parara.—O que aconteceu?

— Korhonen, veja só quem está ali.— disse Nikolas em câmera lenta apontando para a mesa onde seus “reconhecidos” estavam. O finlandês olhou na direção que o alemão apontava. O rosto do especialista em entorpecentes enrubesceu violentamente. Dava até para ver uma veia pulsando em sua têmpora. Sacou o celular do bolso, fotografou o encontro, conectou-se à internet e enviou a fotografia recém-tirada para Carlson.

Dormiram todos preocupados com o que viram lá no Hard Rock Café. Algo muito complicado acabara de começar e a descoberta de Nikolas poderia por a perder todo o trabalho dos agentes.

Dois dias se passaram da cena. Pablo Ortega reapareceu no hotel, dera uma fraca desculpa de seu sumiço, que não convencera nem a ele mesmo. Santeri encarregou Nikolas e Jean de o vigiarem, principalmente após as últimas descobertas dos agentes. Já quanto a Mackintosh, o grupo continuava na estaca zero. Desde quando fora desmascarado o escocês sumira. E não se sabia do paradeiro do mesmo. Pablo, por sua vez, era mantido em “liberdade vigiada” Nikolas e Jean se revezavam na vigilância do Espanhol: trocavam a “guarda” a cada três horas na porta do quarto do mesmo e quando Pablo resolvia sair era seguido de perto pelo responsável do momento ou por ambos. E, todo o tempo, na rua, anotavam o que o es-panhol fazia. Santeri estava sendo rigoroso. E todos imaginavam o tamanho da fúria de Carlson. O caso de Pablo era sério.

•••••

Seis dias após o reaparecimento do espanhol, dois homens furiosos desembarcaram em Amsterdã. Ambos portavam seus “objetos de fúria” em mãos. Um deles um enorme embrulho com aproximadamente um metro de largura por um pouco menos que isso de altura. O outro um envelope bran-co padrão “A4”. Do aeroporto, dirigem-se ambos à região onde está situado o museu Van Gogh. O do embrulho entra no Museu indo direto para a sala do simpático Karl. O outro foi para uma delegacia nas proximidades e, depois, ao hotel que levava o nome do pintor. Dirigiu-se ao quarto andar depois de perguntar algumas coisas na recepção. Quando lá chegou, deu um susto no rapaz sentado à porta do quarto número 415.

— O que o senhor veio fazer aqui?— perguntou o rapaz pondo-se de pé.

— Acertar as contas com o hóspede desse quarto. Por favor, reúna seus colegas.— ordenou o portador do envelope.

— Sim, claro.— respondeu o rapaz ainda em choque. Bate na porta do quarto de um de seus colegas avisando-o.— Jean, o Carlson está aqui.

— Como? O Carlson?— era o francês assustado abrindo a porta do quarto de supetão.— Você está de brincadeira, Nikolas?

— Quem me dera. Ele está no quarto do Pablo arrancando o couro do mesmo. Me ajuda a chamar o pessoal? Acho que não precisamos mais ficar vigiando a figura...

— É, tem razão. Ajudo sim.

Nikolas dirigiu-se ao quarto de Santeri enquanto Jean avisava Dario. Nikolas ia bater na porta do finlandês quando o mesmo abre a porta. Algum problema? Perguntou.

— Carlson está aqui. Pediu-me para chamar vocês. Faltam o Renato e a Sofia.

— Ok. Chame o Almeida que eu me encarrego de chamar a Rossini.

— Tudo bem.

— Schweizer, cadê ele?— perguntou Santeri.

— Está “matando” o Pablo, no quarto dele.

Rapidamente o sexteto de agentes se amontoou na porta do quarto do sétimo integrante da equipe. Enquanto isso, lá dentro, Carlson acabava com Pablo.

— Você, seu verme desprezível, manchou a reputação da instituição. Isso é uma verdadeira vergonha para a Interpol. Dê-me sua insígnia, Ortega.— era Carlson oficialmente expulsando Pablo da Interpol. E, dirigindo-se aos espectadores da cena.— Quanto a vocês... Estão realizando um ótimo trabalho. Mas viram que perderam um colega.

— É. Depois do que vimos...— disse Renato. O espanhol congelou.

— O que vocês viram?— perguntou Pablo assustado.

— Quem se habilita a contar?— perguntou Carlson.

— Pode ser o senhor mesmo.— decidiu Santeri.

O americano concordou com a ideia e retirou a foto de dentro do envelope. E apresentou-a a Pablo. Ela é meio auto-explicativa, disse Carl-son. A foto era a tirada seis dias antes por Santeri, mostrava Pablo conver-sando amigavelmente com Javier Marquez. E aí? O que tem a dizer? Per-guntou Carlson tendo um sepulcral silêncio como resposta.

— Ele não vai falar nada, Carlson, sinto muito.— disse Dario.— Esse tipo de criminoso age assim. Enquanto ninguém descobre nada ok, agem normalmente, mas quando são pegos simplesmente não falam nada.

— Eu bem que devia ter desconfiado!— esbravejou Carlson.— Meus agentes me alertaram mas fiz vista grossa achando que tudo não pas-sava de um mal entendido. Enganei-me completamente. Espero que vocês me compreendam. Almeida, a partir de agora suas colocações serão estudadas com mais atenção.

— Como?

— Você que começou a ficar desconfiado de Pablo. Logo no início, com aquela história do ETA. Estava querendo acobertar o amiguinho, é?— perguntou Carlson provocando Pablo.

— Nem desconfiava que a coisa fosse tão longe.— disse Renato se justificando.

— Tudo bem, Almeida, graças à sua intuição, seus colegas ficaram alerta quanto à possibilidade de algo bizarro acontecer.

— Imaginei que ele tivesse culpa no cartório, mas nunca poderia imaginar que fosse tanta. A triagem da Interpol falhou ao recrutá-lo.— era Nikolas.

— Isso já foi resolvido, Schweizer, esse sujeitinho desprezível aqui nunca mais conseguirá entrar em uma organização policial, nem mesmo no ETA, IRA, Al Qaeda ou na Máfia.— exagerou Carlson.

— Bom saber.— disse Nikolas sem entrar na questão de que ETA, IRA, Al Qaeda e Máfia não eram organizações policiais e sim criminosas.

•••••

No museu, o sujeito do embrulho sequer cumprimentou Karl quando esse lhe deu um “bom dia”, eram dez e meia da manhã quando o sujeito lá chegou. Ele já foi perguntando sobre um sobrinho neto de van Gogh que trabalhava na galeria. Demoraram-se alguns minutos para que Karl percebesse que era de Lars que o nervoso sujeito falava. Disse que sabia quem era, mas que o sujeito procurado ainda não havia chegado ao museu Lars só viria trabalhar à tarde. E pediu que o sujeito expusesse os motivos que o fizeram ir até lá e que embrulho era aquele.

Falando atropeladamente, o sujeito contou a história: seis meses antes comprara de um sobrinho-neto de van Gogh, uma tela que o mesmo dizia pertencer ao acervo da família. Pagou quatro milhões de euros pela mesma. Entretanto, decidiu doá-la, poucas semanas depois, para um instituto de arte da cidade. Logo, um especialista em obras de arte analisou o quadro e disse que apesar de o estilo da obra ser similar ao de van Gogh, aquela tela não fora pintada por ele. Mas sim por qualquer outra pessoa. Karl recostou-se assustado na cadeira.

— Como?— perguntou ao sujeito.

— Esse tal de Lars me vendeu uma tela falsificada! Aqui está a pro-va.— disse o sujeito exibindo um parecer técnico emitido por um perito em artes que assim como Karl, era curador de um museu. O parecer dizia ser falsa a tela em questão.

— Ah, meu Deus! O Lars só me dá dor de cabeça... Semana passada foi uma história de tráfico e agora isso... Ah, meu Deus! O que faço?— lamentou-se o curador.

— Tráfico?— era o iludido resmungão surpreso.

— Eu tinha uma vaga ideia de que ele tinha algo com venda de cocaína, e ele está sendo investigado, mas como acredito que até prova contrária a pessoa é inocente, eu não quis fazer nada. Mas o Lars está pendurado na forca... Mais um vacilo, e vai pra rua...

— O senhor vai tolerar mais um vacilo?

— Não. Assim que aquele encrenqueiro aparecer aqui vamos ter uma séria conversa e eu o demito.

— Acho bom.— disse o sujeito saindo da sala de Karl e largando o quadro e o papel lá dentro. Não sem antes avisar que iria se hospedar no hotel Van Gogh.

Karl recostou-se na cadeira enquanto pensava no que fazer com Lars. O curador já lhe causara muitos problemas. E aproveitava-se do sobrenome. Aquilo era uma verdadeira vergonha.

— Esse Lars ainda me mata. Sobrinho-neto do van Gogh? Ah, essa foi boa!— disse Karl rindo convulsivamente de nervoso após a saída do iludido colecionador de artes. Curioso, desembrulhou o quadro que o sujeito largou lá. Assustou-se. De fato lembrava muito o estilo de van Gogh e chegou a pensar que fosse um quadro original. Entretanto Karl era um “expert” em van Gogh e logo começou a ver detalhes na obra que passariam despercebidos para um leigo. “O Van Gogh ‘de verdade’ está se revirando na sepultura”. Pensou. Foi até a entrada do museu pedindo que alguém avisasse Lars de que ele deveria ir até sua sala assim que chegasse. E passou a pensar no que mais deveria fazer com a recém-adquirida informação. Ligou para um de seus amigos advogado. Contou-lhe as últimas informações e recebeu a resposta. Desligou o telefone e tomou as providências.

•••••

No hotel, Carlson depois de expulsar Pablo da Interpol fez uma reu-nião de emergência com os agentes remanescentes, mas com Pablo ainda no local.

— Nossa meta agora é pegar os demais integrantes da rede, Javier, principalmente. Mas precisamos de cautela e paciência.— disse Carlson enquanto Pablo era mantido no quarto. Fora enxotado da Interpol, mas ficaria sob custódia da mesma e seria entregue à polícia judiciária espanhola assim que os agentes dessem por concluída a missão em Amsterdã. Mas em uma cela da carceragem da delegacia local para onde logo seria enviado.

— Sim senhor.— disse Jean encarando Pablo.— Carlson, tive uma ideia.

— Diga, Laffite.

— Cheguem mais perto.— pediu. Carlson e os agentes se agruparam perto de Jean que expôs sua ideia.

— Brilhante, Jean, brilhante. Você é um gênio.— enalteceu-o Carl-son.

— Menos, chefe.— brincou o agente em tela.

— Ok.— disse Carlson.— Vou parar de te bajular.

Os agentes riram, mas precisariam colocar o plano em prática. Jean voltou a falar:

— Temos que seguir o Lars provavelmente Javier vive com ele.

— Vive sim.— disse Pablo.— Desde que veio pra Europa ele está lá. Só saiu pra matar o Henry e voltou duas semanas depois. Já o Peter foi embora. Mas não sei pra onde, não manteve contato.

— Ok. Agora, não nos atrapalhe.— Santeri disse, ríspido.— E de-pois disso, Jean, o que vamos fazer?

— Temos que nos aproveitar do Pablo. Quantas vezes será que ele não pôs os traficantes na nossa frente por que ouvia nossos planos?

— Como assim? O que você está querendo aprontar, Jean?— per-guntou Nikolas.  Quer usar o “Pablito” de isca?

— Pablito é a sua avó.— disse Pablo irritado com o apelido que Ni-kolas lhe dera. Muito embora fosse assim chamado pelos colegas trafican-tes.

— Muito simples. Vamos simular uma troca de favores. Se ele nos contar o que queremos, liberamos o Pablo. Só que antes de pedirmos nossas condições ele já estará com a prisão decretada.

— Interessante... Gostei disso, Jean.— disse Renato.— Vai ser mais ou menos como simular um sequestro?

— Por aí.— disse Jean sem deixar de vigiar Pablo.

— Vamos pedir ajuda da polícia holandesa?— pergunto Nikolas.

— Não temos outra saída. Como a legislação sobre drogas é bem mais flexível teremos que usar a mesma tática quando o assunto foi o Peter: o homicídio. Diremos que estamos atrás de um homicida. E que o crime foi queima de arquivo e pra piorar tanto o criminoso quanto a vítima estão envolvidos com o narcotráfico. Contamos toda a história se preciso for. Deve haver alguma parte tipificada na legislação daqui como crime.— disse Jean.

— Bem observado, Laffite.— elogiou-o Carlson.

— E então, começamos quando?— perguntou Dario.

— Agora, que tal?— propôs Jean.

— Korhonen, por favor, desça até a recepção e chame os dois ho-mens que lá estão.— disse Carlson sem responder à pergunta de Jean. Estava mais preocupado com a presença de Pablo.

— Sim.— disse Santeri logo voltando com a dupla que levou Pablo para a carceragem da delegacia do bairro. O espanhol ficaria lá enquanto a Interpol permanecesse em território holandês. Depois disso seria enviado à Espanha.

No dia seguinte, enquanto tomavam café, Carlson pegou um exem-plar do jornal local. Quase se engasgou com a comida quando leu a notícia que estampava a primeira página.

— Lars foi preso!— disse o americano em um tom alto e surpreso.

— Como é que é?— perguntou Nikolas.— O Lars em questão é o mesmo que nós estamos investigando?

— Sim, Schweizer, é o mesmo. Olhe. Lars van Gogh, foi preso por uso indevido do nome do pintor Vincent van Gogh ao vender quadros de acervo particular. Quem fez a denúncia foram Karl van Dorff e Kevin An-drew Smith. O primeiro é curador do museu Van Gogh, onde Lars trabalha-va até a tarde de ontem. E o segundo, um colecionador de artes de Chicago que comprou o quadro em questão pela bagatela de quatro milhões de eu-ros.

— Caramba! E agora?— perguntou Nikolas.

— Sei lá.— disse Jean.— Acho que poderemos manter as condições. Pablo ainda está conosco. Ainda serve de moeda de troca. O negócio e pegar o Javier.

— Apesar do susto que tomamos, acho que esse fato não nos atrapalha.— decretou Carlson.

— Carlson, é difícil saber. Só executando esse plano do Laffite.— disse Santeri.

— Pois bem... Então, arregacemos as mangas e mãos à obra!— disse o chefe. Renato a pedido do mesmo confiscou o celular de Pablo e desco-briu para quem foram as ligações feitas nas “fugas” das reuniões: Javier!

— Ai, meu Deus!— diz Carlson ao saber.— Javier estava muito bem informado sobre nosso caso.

— Achei estranho Peter e Lars não descobrirem nossos planos do desmascaramento. Vocês têm ideia do que houve?— perguntou Nikolas.

— Talvez “Pablito” não tenha contado a eles.— supôs Jean.— Pode ter achado que o plano não daria certo e achou que seria uma tremenda bobagem conter pros dois.

— Verdade.— concordou Nikolas.

— Bem, chega de enrolar. Vamos arrumar o que for preciso para executar o plano de Laffite.— disse Carlson.

Saíram do hotel e foram até a delegacia onde Pablo estava preso ver se o delegado de lá os ajudaria a pegar Javier. O delegado, bem mais jovem que o que negara ajuda a Santeri no dia do desmascaramento de Mackinto-sh, tinha vontade de ingressar na Interpol e colaborar com a mesma facilitaria sua entrada na instituição. Jean tratou de escrever um bilhete que seria a isca para Javier. Um falso sequestro de Pablo para examinar o quão amigo do espanhol o colombiano era.

— Acho que até a prisão do Lars pode ajudar... Serviria de pretexto para trazê-lo. Fiança.— disse Nikolas.

— É... Boa cara. Mas vamos usar o “Pablito” mesmo...— disse Dario incorporando o apelido que Nikolas dera ao agente duas caras.

— Temos que ter um “plano ‘B’” caso o “A” não funcione...— disse Jean dando a entender que Lars poderia servir de isca também.— Vou até a casa de Lars entregar isso pro Javier. Não pessoalmente, claro.

O Colombiano, por sua vez, estava estranhando o repentino sumiço de Lars e Peter. Sabia que Pablo não poderia aparecer toda hora por conta de seu segundo trabalho. Compreendia a necessidade.

Dois dias depois, o caso da prisão de Lars só fora notícia em jornais holandeses e Javier, que ao contrário de Carlson não falava o idioma, não ficou sabendo. Continuava no apartamento de Lars, voltara lá duas semanas após assassinar Henry em Barcelona, mas nem o curador nem Peter comentaram o fato. Saiu por algumas horas do apartamento, talvez a procura de pistas sobre o paradeiro da dupla. Passara os últimos dias com “Pablito” Ortega em outra área da cidade. Ao voltar encontrou um bilhete debaixo da porta. Curioso, pegou-o. Estava endereçado a Javier Marquez ou Juan Alonso. Gelou. “Quem sabe que eu estou aqui? E o pior: Quem sabe minha real identidade?” Pensou Javier aflito. Abriu o envelope e leu a carta. “Pablo sequestrado? Como? O cara trabalha na Interpol!” Javier estava cada vez mais surpreso com o que lhe acontecia.

— Jesus Cristo! Como isso pode acontecer com o Pablito?— mur-murou Javier. Decidiu seguir as instruções da carta à risca. Javier não sabia que a Interpol ainda estava na Holanda e que Lars estava preso.

•••••

Dois dias depois, Javier apareceu no Vondelpark perto do museu do filme. Lá encontrou o suposto sequestrador de Pablo: Jean. O agente começou a falar com o colombiano num misto de francês espanhol e inglês. Disse que só libertaria Pablo se Javier lhe fornecesse informações sobre Peter Mackintosh.

— Não sei onde ele está.— disse Javier.

— Não minta!— era Jean usando voz firme.

— Não estou mentindo!

— Se você não falar nada, Pablo morrerá, Javier!— mentiu Jean.— Ou você prefere Juan?

— Tanto faz. Só usei o Juan pra me livrar do enrosco da Interpol. Aqueles agentes me pagarão!

— Ah, é? Bem, acho que a dívida vai aumentar!— disse Jean cha-mando policiais holandeses, cedidos pelo delegado, para a captura. Só que Javier não era nem um pouco bobo e começou a estranhar a movimentação saiu correndo.

Jean não perdeu tempo e foi atrás do colombiano logo ganhando a companhia dos colegas. Nikolas e Renato que, com fôlego extra, empare-lharam-se com Javier depois de alguns metros de corrida. Entretanto Javier acelerou. O alemão e o brasileiro bem que tentaram acompanhá-lo, mas não aguentaram o ritmo do colombiano. Entretanto, o clima de “já ganhou” que pegou Javier ao ver que deixara dois agentes pra trás o traiu. Virou-se de costas para ver Nikolas e Renato ofegantes, riu da tentativa exacerbada de ambos de recuperarem o fôlego, e quando voltou a olhar na direção em que corria, tropeçou e caiu de cara no chão. Era a vez dos agentes rirem. Nikolas se controlava para não ter um ataque de risos. Logo os agentes cedidos pela polícia holandesa cercaram o traficante e o prenderam.

Quando estes conseguiram imobilizar Javier o francês mostrou sua insígnia da Interpol:

— Foi rir da gente, levou.— provocou o agente segurando o riso. O tombo de Javier fora digno de um filme pastelão.— Quem acabou rindo fomos nós!

Depois que Javier foi levado do Vondelpark, Carlson que assistiu a cena montada pela turma, deu por encerrada a missão da turma na Holanda e foi com os agentes para o Hotel. Lá disse que iriam embora, na tarde do dia seguinte, de volta a Lyon. Sei que esse período aqui foi bacana, mas temos que voltar para a sede. Essas saídas não são algo muito regular.

— Regulares? Não entendi.— era Renato.

— Não são muito habituais. Acho que não usei a palavra correta.— disse Carlson.— Normalmente jogamos a “batata quente” nas mãos da polícia federal do país em tela. E apenas fazemos monitoramento à distância.

— Ah, bom.

No dia seguinte, os agentes se ocuparam em preparar as malas para voltarem pra casa, e lá, duas semanas depois, descobrem que a justiça holandesa entregou Javier as autoridades espanholas por conta do crime de homicídio cometido pelo colombiano em seu território. E que a justiça da Espanha decidira deportar o mesmo. Mandariam Javier de volta para Co-lômbia.

— Legal.— ironizou Nikolas.— De volta pra “casa” pra cuidar da produção de cocaína.— debochou o alemão.


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