Segredos Submersos escrita por lovegood


Capítulo 42
Sob ataque


Notas iniciais do capítulo

É, eu sei que acabei pulando uma semana de postagens, mas é que realmente não deu para escrever semana passada. Peço desculpas, mesmo! Tava super ocupada e também tive vestibular, então né... (mesmo sendo treineira, haha). Escrevi, portanto, um capítulo um pouquinho maior e já estou postando agora na sexta, considerando que amanhã e domingo vou passar as tardes inteiras fazendo o ENEM... :(



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/115076/chapter/42

Tudo começou a passar tão rapidamente ao meu redor que se tornou difícil distinguir o real do imaginário.

A princípio, tudo parecia haver parado: um momento congelado no tempo, no qual pude ver tudo com uma nitidez assustadora – os rostos do exército que corriam colina abaixo, em direção ao Acampamento. O modo como suas feições se contorciam com os bradares de guerra, a forma como as três cabeças da serpente laranja berrante com listras pretas pareciam sibilar, os rostos dos outros campistas, estáticos.

E então, esse último momento pareceu dissolver e era como se alguém houvesse repentinamente apertado algum botão de acelerar. Em um período menor do que consegui compreender, os homens que corriam pela colina e rodeavam a serpente nos atacaram, e o caos foi instaurado.

Primeiro, gritos. Tanto de guerra como do mais profundo desespero.

Segundo, o ambiente parecendo oscilar ao meu redor, conforme as pessoas passavam a se movimentar, fosse para defesa ou ataque.

Terceiro, um alarme sendo disparado dentro de minha cabeça e uma voz que dizia corra, sua idiota, ou você vai ser morta.

Então eu corri. Não em direção ao exército que avançava sobre nós, mas para trás, para dentro do Acampamento, como se de alguma forma fosse possível fugir.

Eu bradava tanto a varinha como a faca celestial e um escudo, mas ainda assim não senti-me capaz de atacar. Como eu atacaria aqueles homens quando eu ao menos nem sabia o que diabos estava acontecendo? Tudo aquilo era tão súbito que havia pegado a todos no Acampamento desprevenidos.

Corri para o centro do Acampamento, próximo ao ponto em que os chalés começavam a se enfileirar em formato de U.

– Mas que diabos está acontecendo? – um campista que eu não tivera a oportunidade de conhecer gritou, mais para o além do que para alguém em específico.

Não tive tempo de responder. A adrenalina que corria por meu sangue não permitiu, ao passo em que tive de me abaixar para evitar que uma flecha arrancasse minha cabeça do pescoço. Não soube dizer se ela vinha das mãos de um outro campista ou do exército que nos atacava.

Era fácil reconhecer quem nos atacava, porém, julgando que todos trajavam vestes pretas.

Matem todos! – uma voz masculina, mais alta e poderosa do que todas as vozes do exército juntas, bradou. Seu tom seco e autoritário pareceu ecoar por todos os arredores, secando todo o ar. O tom de voz grave e incrivelmente familiar pareceu congelar minha espinha. – Façam com que apenas a bruxa filha de Poseidon sobreviva, pois quem deverá tirar a vida dela sou eu.

Descendo os caminhos que o Acampamento traçava em direção à Casa Grande e o pavilhão de refeições, pude finalmente vê-lo. O homem que descia ao lado da serpente de três cabeças, obviamente o líder. Da distância em que eu estava, sua imagem não era muito nítida, mas ainda assim facilmente reconhecível. O cabelo preto, as feições angulosas, os olhos que – por mais que eu não os visse daqui – eu sabia que eram azuis.

Pallas finalmente montara seu ataque e a Morte Vermelha viera estender seus domínios.

Ao seu lado, havia um imponente lobo de pelagem branca que eu sabia ser William Wilson. Todas as memórias, desde o cemitério até a casa de madeira abandonada, fluíram por minha mente e fizeram com que a raiva dentro de mim se mesclasse ao mais puro terror.

Os súditos de Pallas – em quantidade muito maior dos que estavam na casa abandonada – avançavam, empunhando tanto espadas e lanças e flechas como varinhas. Os campistas resistiam bravamente, mas eu sabia que seria por pouco tempo. Havíamos sido pegos de surpresa e obviamente tínhamos de ficar em retaguarda.

Um dos súditos de Pallas tentou puxar-me pela gola da blusa, fazendo com que eu virasse-me de frente a ele. Suas unhas – muito compridas e definitivamente não humanas – arranharam o lado de meu pescoço e ombro.

Assim que encarei-o nos olhos, pude perceber que ele de fato não tinha nada de humano. Por mais que fosse bípede e seu corpo tivesse um aspecto humanoide, protuberantes chifres saltavam de seus lábios e testa. Puxei minha varinha e gritei:

­– Estupefaça! – ele foi logo mandado para trás.

Voltei a correr, sem uma direção específica, desviando quando podia e revidando quando conseguia. No meio do tumulto, esbarrei com Annabeth, que agarrou meu pulso e começou a puxar-me pela multidão de campistas e seguidores de Pallas que se atacavam.

Nem eu ou Annabeth dissemos qualquer coisa; sabíamos que não havia tempo nem oportunidade. Precisávamos, antes de tudo, encontrar um lugar seguro para pensar e de alguma forma planejar. Ficar revidando desesperadamente de nada serviria, muito menos daria-nos oportunidade de vencê-los. O exército de Pallas estava em óbvia vantagem.

Até então eu estivera praticamente no centro do caos e percebi que Annabeth puxava-me para as extremidades, para que saíssemos do epicentro do conflito. Tivemos de lutar rapidamente com alguns dos quase-humanos, mas nada que houvesse sido muito difícil.

– Quíron está montando uma retaguarda na Casa Grande – disse Annabeth, assim que se tornou possível dizer alguma coisa. – Thalia está ajudando na resistência do local, precisamos ir até lá.

Não respondi, pois logo entendi o que ela dizia. Estávamos saindo do centro das lutas para pegarmos uma rota alternativa à Casa Grande, já que não seria possível entrar lá se seguíssemos pela entrada principal.

Fomos em passos rápidos em direção ao lago em cuja beirada eu me sentara e beijara Percy pela segunda vez, havia apenas nove dias. A partir das margens do lago era possível adentrar uma pequena e esparsa mata, que contornava o Acampamento e fazia com que conseguíssemos entrar na Casa Grande por trás.

Diminuímos o passo ao perceber que estávamos sozinhas. O exército de Pallas ainda não tivera tempo de descobrir o que havia mais adentro dos terrenos do Acampamento, mas logo iriam. Não podíamos perder tempo.

– Hermione – disse Annabeth, recuperando o fôlego. Assim como eu, ela estava suja e suada. Um corte em sua testa fazia com que o sangue escorresse pelo lado do rosto. – Pelo amor dos deuses, diga-me que você sabe o que é aquele bicho.

Eu estava tão cansada como ela, e minha cabeça latejava tanto que fiquei em silêncio por alguns momentos, tentando lembrar onde já o tinha visto. Se Annie não sabia, obviamente não era olimpiano.

– É um Farosutil – falei, ao me lembrar das incontáveis vezes em que eu havia lido “Animais Fantásticos e Onde Habitam”. – A serpente de três cabeças. Altamente venenosa.

Annabeth apenas suspirou.

O ambiente estava extremamente silencioso e tudo parecia calmo em demasiado para estarmos no meio de uma batalha. Dentre as árvores, ainda era possível ouvir o ataque que acontecia no centro do Acampamento, mas já soava abafado e distante. Senti aos poucos os batimentos cardíacos começarem a acalmar, por mais que minhas mãos ainda tremessem.

– Pallas está perseguindo-a, Hermione – comentou Annabeth, como se eu não soubesse e também como se ela estivesse tentando puxar conversa, no meio de todo esse nervosismo. – Acha que o despistamos, agora?

Abri a boca para responder, mas o uivo que veio de trás de mim acabou fazendo tal serviço em meu lugar.

Os pelos de minha nuca imediatamente se arrepiaram e senti meu corpo congelar no local em que eu estava. Os olhos de Annabeth se dirigiam ao que estava às minhas costas e eu pude ver o medo palpitando em suas íris cinzentas.

Assim que consegui me virar, dei de cara com o lobo de pelagem branca que, quando em forma humana, se denominava William Wilson.

Wilson preferiu não fazer todas as encenações e enrolações que quase sempre fez comigo ao ter sido sequestrada. Talvez já me considerasse uma “amiga próxima” e portanto nos atacou, sem mais delongas. Seu rugido gelou minha espinha e, com um salto, o lobo pulou em nossa direção.

Automaticamente empurrei Annabeth para o lado, em seguida agitando rapidamente a varinha:

Protego! – o ataque de Wilson foi brevemente repelido por meu escudo. – Estupefaça!

O feitiço estuporante acertou Wilson raspando, o que fez com que eu e Annabeth ganhássemos alguns milésimos de segundo de vantagem. Ela compreendeu quando viu-o cambalear por um único instante e nós duas logo começamos a correr.

Wilson, porém, recompôs-se rapidamente e foi atrás de nós.

Era claro que ele era muito rápido e que nós de forma alguma conseguiríamos simplesmente fugir, então tínhamos de atrasá-lo. Por sorte, Annabeth carregava com si um jogo de arco e flechas. Lançou uma, duas, três, ao passo em que corríamos. Faltava menos de 100 metros até a Casa Grande.

Por azar, Wilson desviou-se de todas. Ele se aproximava cada vez mais.

– Quíron! – gritei o mais alto que pude, a aflição sufocando meu peito e fazendo meus pulmões doerem. Por Merlin, Quíron, esteja aí na porta e deixe-nos entrar, pensei. Não iria ser derrotada pelo maldito William Wilson, não quando faltava tão pouco para chegar aonde eu queria, não depois de tudo que tive de passar.

Eu sabia que Wilson não me mataria – afinal, isso estava destinado a Pallas e apenas ele –, mas eu não podia correr o risco de ter Annabeth morta, não depois de já ter perdido Harry e Ron para Tânatos.

Meus pés doíam, meus músculos gritavam, e Wilson nem estava correndo realmente. Talvez se divertisse vendo o modo como até mesmo respirar fazia eu e Annabeth sofrer com a dor da fadiga.

Talvez, porém, Wilson deva ter reparado que estávamos chegando perto de escaparmos dele, caso conseguíssemos entrar na Casa Grande. Acelerou o passo e deu outro salto. Ao aterrissar, suas patas agarraram Annabeth e prenderam-na no chão, da mesma forma em que havia feito comigo ao lado do túmulo de Benjamin Franklin na Filadélfia.

– Hermione! – o grito de Annabeth soou um tanto desesperado, algo nada típico de sua índole.

– Impedimenta! – bradei. Wilson facilmente se desviou.

Lancei outra infinidade de feitiços, nenhuma parecendo dar certo. Wilson parecia se divertir com minhas falhas e com a dor que infligia em Annabeth.

– QUÍRON! THALIA! – berrei, desta vez não conseguindo me conter. Não parei para pensar que talvez eles estivessem em extrema dificuldade para se defender a partir da porta principal da Casa Grande.

Corri em direção a onde Wilson comprimia Annabeth no chão. Sabia que não daria certo, mas tinha de tirá-la de lá. Tirei a faca de bronze celestial do bolso e tentei esfaqueá-lo. Wilson apenas me jogou para o lado, como se eu fosse um inseto, mas esse único segundo foi o suficiente para distrai-lo. Annabeth rolou para o lado no exato momento em que Wilson afrouxara o aperto contra seu peito.

Ainda sem me levantar – eu não podia perder nenhum segundo – rolei também para o lado, ignorando a dor do impacto que Wilson me fizera ter com o chão, ainda de varinha na mão.

Sectumsempra! – por sorte, o feitiço acertou-o e o fez cambalear. Sorri comigo mesma, com o pensamento que esta já era a segunda vez em que Wilson caía na mesma azaração, mas não perdi tempo pensando em tais bobagens. Foco era o principal.

Levantamos-nos rapidamente – Annabeth segurando o braço e em óbvia dor – e voltamos a correr, na velocidade em que nossos corpos permitiam.

A porta dos fundos da Casa Grande se escancarou no exato instante em que Wilson conseguiu se recompor. Fui capaz de ver Thalia acenando para nós, erguendo o arco e flecha elétricos e lançando em direção de Wilson.

Ele uivou de dor, mas não parei para olhar para trás e ver se ele morreria ou não.

Desta vez fui eu quem agarrei Annabeth pelo pulso, fazendo-a correr mais rápido, até finalmente alcançarmos a porta.


– Por acaso Wilson morreu? – perguntei para Thalia assim que adentramos a Casa Grande e ela ter fechado a porta. Suas sobrancelhas se ergueram em dúvida. – O lobo, quero dizer. Ele se chama William Wilson.

Sua expressão demonstrou entendimento. Deu de ombros e inflou as bochechas, em aparente frustração.

– Duvido muito – disse. Conduzimos Annabeth até um banco, onde um filho de Apolo logo se apressou para trazer um kit contendo curativos e néctar. – A flecha só passou raspando. O suficiente para machucá-lo consideravelmente, mas ainda assim...

– E como estão as coisas por aqui? – perguntei, agora olhando ao redor.

A sala da Casa Grande aparentava estar maior e mais vazia. Todos os móveis – cadeiras, pequenas mesas e armários, escrivaninhas, sofás – haviam sido empurrados para bloquear a porta principal.

– Estamos, bem, indo – disse Thalia. – Tivemos de construir esse forte às pressas, para que pudéssemos pelo menos traçar um plano, sabe como é. Só como prevenção.

Levantei as sobrancelhas, silenciosamente perguntando-lhe qual era o progresso até agora.

– Então – disse, encolhendo os ombros outra vez –, obviamente, não poderemos ficar muito na ofensiva, julgando que realmente não esperávamos que tudo isso ia acontecer hoje e que o próprio Pallas viria, com uma coisa junto dele...

– Farosutil – interrompi. Thalia abanou o ar, como se não importasse.

– ... esperávamos que a princípio, sei lá, pudesse haver uma ofensiva de seus seguidores, mas não que Pallas mesmo viria. Os filhos de Ares, Hermes e Hefesto são os principais no combate. Os de Atena também, mas logo alguns virão para cá também para nos ajudar aqui dentro.

Havia uns oito campistas ali, com exceção de nós, Quíron e o Sr. D. Até Rachel estava presente.

– Consegui contatar Ártemis, também – Thalia voltou a dizer. – Você sabe, eu estava ausente das tarefas das Caçadoras por causa da missão, mas consegui recrutá-las para vir até aqui. Esperamos que elas consigam atacar o exército de Pallas por trás.

Apenas assenti, olhando ao redor e começando a sentir a inquietação formigar meus dedos. Eu deveria voltar para o campo de batalha, pensei. Pallas apenas desejava me capturar. Quem sabe se eu pudesse voltar para entrar em combate, ou até mesmo me oferecer para sacrifício... nada disso soou como uma má ideia para mim.

Se aquele exército era composto também pelos súditos de Pallas que estiveram na casa abandonada no período em que estive presa lá, talvez (talvez) houvesse uma chance. Eu só haveria de encontrar as duas pessoas que – junto de Annabel Lee – mais haviam me ajudado, no meio de toda aquela multidão.

Um estrondo vindo da porta de trás da Casa Grande sobressaltou-me. Ela ainda estava fechada, trancada com correntes, mas agora começava a balançar, como se alguém se jogasse em cima da madeira para tentar arrombá-la.

– Pelo visto o tal de Wilson se recuperou – disse Rachel, que estivera próxima de nós até então.

BLAM! A porta chacoalhou com o impacto.

Respirei fundo, controlando a tremedeira que logo voltaria às minhas mãos.

Outro estrondo, e fiz minha decisão.

Levantei-me subitamente. Thalia franziu as sobrancelhas.

– Tenho de voltar para o campo de batalha – falei, decidida. Os olhos azuis elétricos de Thalia se arregalaram de incredulidade.

– Hermione, você enlouqueceu? – exclamou.

– Talvez. Só deixe-me voltar, Thalia, por favor.

– Hermione, você por acaso não está entendendo o que está pondo em risco? Você não pode sair desse jeito, é o que eles querem! Pallas quer justamente você. Se ele a vir, a primeira coisa que ele vai fazer é assegurar que consiga arrancar sua cabeça com as próprias mãos!

Eu sei que ele quer me matar, Thalia. E sei que ele quer que isso ocorra por suas mãos, mas acredite em mim. Eu não posso arriscar a vida dos outros em uma questão que é essencialmente minha.

– Você não pode simplesmente sair por essa porta da frente e dizer “eu me rendo”! Pallas a fuzilaria agora mesmo!

– E quem disse que eu vou fazer isso?

O cenho de Thalia franziu e ela se calou.

– E mesmo se eu fizesse, duvido que Pallas me mataria agora – prossegui. – Ele é muito orgulhoso para isso, tenho certeza que a princípio me manteria refém por um bom tempo ou me levaria a outro lugar para, antes de tudo, me manter como troféu. Mas enfim, não é isso que importa agora. A questão, Thalia, não é de eu me render. Tenho que sair da Casa Grande de modo discreto e não posso ser capturada por Pallas ou William Wilson. A questão é de eu ser capturada pelas pessoas certas.

Thalia ainda não havia entendido, mas eu não podia perder mais um único segundo de todo esse tempo, portanto eu haveria de explicar-lhe propriamente mais tarde. Suspirei.

– Thalia, é sério, confie em mim.

Agora foi ela quem suspirou. Pôs as mãos na cintura e seu olhar desviou para o chão.

– Eu confio – ela disse finalmente. Sorri e não pude me impedir de dar-lhe um abraço apertado.

– Mas eu gostaria de não ir sozinha. Queria que todo o grupo fosse.

Seus lábios se comprimiram em uma tênue linha. Olhamos em direção a Annabeth, ainda sob cuidados do filho de Apolo. Ela estava pálida e aparentava sentir muita dor.

– Não sei se Annabeth estaria pronta o suficiente – murmurou Thalia. – E eu tenho de ficar aqui para esperar as Caçadoras de Ártemis. Hermione... – ela engoliu em seco, e nesse instante eu podia jurar que nunca havia me sentido tão próxima da humanidade da filha de Zeus – esse Acampamento, as Caçadoras... minha vida se resume a isso, entende? Minha realidade está toda ligada a isso. Eu... não acho que vou poder ir, não agora que tenho de esperá-las. Tenho de defender o Acampamento com as minhas próprias mãos, entende?

Assenti e abracei-a novamente.

– Vá com Percy e Nico – falou. Fiz que sim com a cabeça, outra vez. Os olhos de Thalia, reparei, pareciam ter se enchido de lágrimas. Ou talvez fosse apenas a coloração azulada de suas íris; percebi que até aquele instante eu nunca havia de fato reparado em seus olhos. – Se quiser sair da Casa Grande de modo discreto, não vá pela porta de entrada ou a dos fundos. Acho que se deparar com o tal de Wilson não seria uma boa ideia, não é? Vá pela janela do banheiro, ela dá para o lado oposto e Wilson não poderá vê-la.


O caos continuava.

Saí correndo em disparada dentre todas as lutas que ocorriam por ali. Eu rezava para que minhas predições estivessem corretas e eu encontrasse as pessoas que eu realmente desejava que me “capturassem”. E, caso eles estivessem ali, também rezava para que eles tivessem um plano que envolvesse me resgatar com a desculpa de quererem me matar.

(– Mas como estão Dupin e Marie? – eu havia perguntado, conforme o Fogomaldito avançava pelas ripas de madeira daquela casa decrépita.

– Bem. Tentando se livrar do fogo e dos seguidores de Pallas em seus encalços, mas eles nos alcançarão, eu prometo. Sairemos deste lugar nojento e encontraremos seus amigos novamente, Hermione.

Era o que Annabel Lee havia dito, minutos antes de ser morta por Pallas e consumida pelo fogo. Eu só esperava que, desta vez, eu conseguisse fazer jus a suas palavras.)

Encontrei Nico, antes de tudo, acabando com três homens de uma vez só com sua espada negra. Agarrei seu braço e comecei a puxá-lo pelo Acampamento. Ele não protestou nem perguntou qualquer coisa.

Minutos mais tarde, encontramos Percy também em campo. Puxei-o pelo pulso, trazendo-os também para fora do epicentro da batalha. Expliquei-lhes o que eu havia pensado. A princípio ficaram em dúvida, mas depois concordaram.

A única coisa que restava era o destino estar com a sorte virada para nós. Adentramos novamente o campo de batalha e passei a analisar os rostos de todos que conseguia ver, no ritmo possível.

Meu coração pareceu dar um salto ao ver, de relance, uma negra bonita e de cabelos curtos com as vestes dos seguidores de Pallas passar por mim. Era Marie Roget, uma das bruxas espiãs infiltradas com os titãs, e eu tive certeza. No instante em que nossos olhares se encontraram – por um único segundo, no máximo – percebi a forma como suas pálpebras foram levemente repuxadas para trás, em sinal de reconhecimento.

Não tive como gritar para ela alguma mensagem ou cumprimentá-la; o tempo era curto e eu obviamente não poderia entregar o disfarce que queria montar – eu e ela em lados opostos, inimigos.

Nossos olhares logo foram forçados a se desviarem, mas em menos de dez segundos eles voltaram a se reencontrar. Talvez fora ela que forçara o olhar a voltar para mim, como se quisesse reafirmar a si mesma que sim, era eu que estava lá. Não havia como saber.

Nessa segunda troca de olhares, não emiti qualquer som, mas minha boca se movimentou. Esperava que Marie Roget soubesse ler lábios.

(Ela sabia)

Capture-me.

E foi o que ela fez.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Segredos Submersos" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.