Acordei na manhã seguinte com Ellie gritando desesperadamente. Olhei para o relógio, já estava na hora de eu acordar mesmo. Levantei, contrariada e fui para o quarto de Ellie.

    - Onde é o incêndio ? – olhei para ela, coçando a cabeça de leve.

    - O incêndio eu não sei, - esse é o problema da ironia. Quando não entendem, quem passa por idiota é você. Mas tudo bem. – mas uma coisa muito, muito ruim vai acontecer. Em breve. Bill disse. – ela olhava para todos no quarto, apavorada. Eu comecei a rir. Gargalhar de se engasgar.

    - Oh my god, é o fim do mundo, 2012 ! – enxuguei algumas lágrimas que teimavam para sair. – Alô, Ellie, Bill é uma fantasia da sua mente ! Um sonho, talvez. Por favor, não me mate de rir. – ela deu um passo à frente e olhou levemente para baixo, me encarando.

    - Claire, você vai se arrepender do que disse. – deu um passo para trás e arrumou o cabelo, olhando para o espelho que estava atrás de mim. – Você ainda vai dar razão à mim.

     - Tanto faz. – fui me aprontar para a escola.

    Ainda não tinha falado com meu pai sobre o cinema com Leon. E sabia que no café da manhã não era uma boa coisa, Ellie ia dar outro surto, dizendo que era só mentira minha. Para evitar mais confusões e possíveis socos na cara de loiras de olhos claros, eu falei com ele enquanto me dava uma carona para a escola – ele fez sua boa ação do dia.

    - Pai, eu vou sair com um amigo meu hoje, depois da aula ta ? – disse, já quase na escola.

    - Ta bom filha. Quem é, o Ronnie ? – ele me olhou, parecendo realmente interessado. Eu sorri.

    - Você não conhece não. – abri a porta e já estava saindo. – O nome dele é Leon Thompson. Hã, tchau pai. – bati a porta.

    - Falando de mim ? – Leon veio por trás, pegou na minha cintura e meu deu um beijo na bochecha. Senti ficar levemente corada, mas revirei os olhos.

    - Nem tudo é sobre você, meu queridinho – toquei a ponta do nariz dele. Ele revirou os olhos e sorriu.

    - Você vai hoje, né ?

    - Vou, vou sim. – eu sorri.

    - Então, tá, vou te pegar as duas. – eu assenti com a cabeça - Qual sua primeira aula ? – eu o encarei. Tinha que olhar um pouco para cima para isso. Obrigada, genética.

    - Biologia – revirei os olhos. – Por que ?

    - Vou te levar lá. Vamos. – ele botou o braço sobre os meus ombros e saiu andando, praticamente me arrastando, já que eu era mais baixa e mais fraca que ele. O que não era muito difícil, já que ele era bem alto e decididamente, mais forte que muitos na CTD.

    Percebi que algumas pessoas nos olhavam, meio chocadas. Leon parecia se divertir com isso. Revirei os olhos, como sempre.

    - Chegamos, obrigada, Leon Thompson – eu sorri, meio envergonhada.

    - De nada, Claire de Bellefort. Até mais tarde. – ele foi para a sala, mexendo no cabelo.

    - Vocês são amigos. – eu virei e dei de cara com Jane.

    - Acho que sim. – eu a encarei, meio desconfiada. Conhecia minha amiga, tinha alguma coisa errada. – Jane, o que foi amiga ?

    - Nada. – ela olhou para cima. Não me convenceu o que ela tinha dito. Continuei encarando-a. – Nada. To te dizendo.

    - Então ta. – eu sentei no meu lugar, pronta para dormir até o final da aula. – Quando quiser me contar porque você tá assim, me acorde, ok ? – ela riu. Era bom ver o sorriso de minha amiga. Era reconfortante.

    Dormi a aula toda. Conseqüência de ser acordada pelos gritos de Ellie. Meu organismo era realmente estranho, eu só passava bem o dia se eu acordasse sozinha ou se Keila me acordasse. Como isso não tinha acontecido, eu não fiquei acordada para as aulas. Como se eu ligasse. Como se os professores ligassem também.

    - Claire, Claire.  – Jane sussurrava, gargalhando, no meu ouvido. Eu comecei a rir também e dei um peteleco na testa dela. – Bom dia, bela adormecida.

    - Bom dia, você é meu príncipe encantado ? – olhei para ela, fingindo surpresa. – Uau, a qualidade de príncipes caiu assustadoramente, hein ?

    - Haha, você ta gamada, isso sim. – ela me deu a mão para me ajudar a levantar. – Vamos, dorminhoca, o ônibus já vai sair.

    - Vai de ônibus hoje ? – eu sorri, realmente feliz.

    - O que eu não faço por você, amiga ? – eu dei um abraço nela. - Mas diz, vai fazer o que hoje ? – corei. Jane me olhou, um pouco assustada e riu. – O que foi ?

    - Nada, eu vou... – mexi no cabelo. Ele estava incrivelmente macio hoje. – Sair com o Leon.

    - Sair com aquela coisa maravilhosa ? – ela olhou para cima, depois para mim. – Quanto pagou para ele ? – eu revirei os olhos, e nós duas gargalhamos.

    - Baratinho, pode ficar tranqüila. – vi que as pessoas olhavam para mim, desconfiadas. Quase nunca me viam conversando com ninguém, acho que era normal que reagissem assim. Reprimi uma gargalhada.

    - O que vai usar ? – ela estava abrindo uma barrinha de chocolate. Me deu a metade e comeu a outra.

    - Ah, não sei. Calça jeans e blusa ? – eu olhei-a, sugestivamente.

    - Calça jeans e blusa ? Calça jeans e blusa, só isso ? – a tendência ao exagero de Jane era divertida. – Faz o seguinte: Bota a blusa que eu te dei no seu aniversário, que é super in. Aquela calça jeans skinny que eu amo e pega um sapato da Ellie, por favor. – ela olhou para mim. Estava achando muita graça nisso. – Não passa muita maquiagem. Só um gloss e um lápis de olho. Meu ponto. Tenho que ir, amiga. – ela me abraçou. – Boa sorte. – Jane cruzou os dedos, em sinal de sorte. Eu imitei-a.

    - Obrigada, amiga. – eu sorri.

    Achei muita graça nas dicas de Jane. Mas, confesso, segui-as à risca. Minha amiga tinha muito bom gosto, sempre teve. E eu até fiquei razoável.

    Às duas em ponto, estava lá Leon, tocando minha campainha. Fiquei um pouco nervosa.

    - Você ta... – fiquei apreensiva. Pela cara de Leon, não ia ser boa coisa. – Maravilhosa. – eu corei um pouco.

    - Obrigada. – mexi no cabelo, envergonhada. – Você também está incrível – eu não mentia, nem um pouco. Incrível talvez fosse pouco. Leon era extremamente bonito, tudo lhe caía bem.

    - Vamos ? – ele botou o braço sobre meus ombros, assim como naquela manhã. – Hã, eu chamei um táxi. Decidiu que filme vamos assistir ? – Leon abriu a porta do táxi para mim. Eu entrei e ele fez o mesmo.

    - Pensei em assistirmos aquele do Brad Pitt. Pode ser ? – ele olhou para baixo, para olhar nos meus olhos. Mesmo sentada, eu era bem mais baixa que ele.

    - Por mim está ótimo. –

    Conversamos durante a viagem inteira. Leon era muito divertido, fazia graça de tudo. Era muito agradável conversar com ele. Rimos muito, fizemos até o taxista rir.

     Tive uma baita surpresa quando cheguei no shopping e vi Ellie e seu novo namorado, Oliver, comprando ingressos para o cinema. Acho que a surpresa dela foi maior, pela cara que fazia, quando me viu abraçada com Leon. Me segurei para não rir, e ele fez o mesmo, pelo que pude perceber.

    - Sua irmã, ta com ciúmes ? – seus olhos castanhos claro mostravam uma diversão. Eu apenas assenti com a cabeça e rimos. – Por que ?

    - Talvez porque você ignore-a e a mim, não. Ela não suporta que alguém como você não fale com ela. Muito menos que seja meu amigo. – eu olhei para cima, encarando-o.

    - Como assim alguém como eu ? – eu revirei os olhos. Ele viu que eu não ia responder - Vou comprar os ingressos, me espera aqui ?

    - Hã, vou no banheiro. Te encontro aqui, ok ? – ele assentiu com a cabeça. Fui ao banheiro e quase morri de susto quando saí de lá. – Hã, desculpa – eu tinha esbarrado com Oliver. Ele fez uma cara que não me agradou muito. Era meio... Maldosa, não sei.

    - Claire. – ele me avaliou de cima a baixo – Claire de Bellefort. Eu estava mesmo querendo falar com você. – eu engoli em seco. Ele percebeu o meu receio e sorriu. – Não se assuste, meu amor. Eu não vou te machucar. Assim espero, é claro. Você é muito bonita, seria uma pena te machucar. – ele tocou meu queixo e eu desviei - É só você ser um pouquinho inteligente e fazer o que eu te pedir.

    - O que você quer ? – finalmente falei alguma coisa. Eu estava começando a me irritar com aquele jeitinho superior. Estava me segurando para não dar um soco na cara dele. – Tem alguém me esperando e...

    - Leon ? Leon Thompson ? – ele riu – Não sei se você realmente preferiria ficar com ele. Somos muito parecidos – Oliver me olhou de um jeito que me fez arrepiar. Eles realmente eram parecidos. Mas acho que a frase tinha um outro sentido, talvez. – Claire, você tem uma coisa que eu quero. – eu o encarei.

    - Não, não tenho. Você está me confundindo. – continuei encarando-o. Ele sorriu do mesmo jeito malicioso de sempre.

    - Não estou não, querida. Você tem uma coisa que eu quero e sabe muito bem o que é. – ele me encarou, com o mesmo sorriso. Fiquei pensando, tentando saber o que ele queria. Um relampejo passou em minha mente. Será que... – É exatamente isso o que você está pensando. – ele se aproximou e sussurrou no meu ouvido: - Me dê a pedra, Claire. – Ele saiu em seguida, me deixando sozinha com minha respiração acelerada.

     A pedra. Aquela droga daquela pedra. Eu sabia, ela tinha alguma coisa que não era boa. E a pessoa de meu sonho. Oliver era o dono daquele par de olhos azuis que me seguiam. Minha intuição estava certa. Mas... O que Oliver queria com aquela pedra ? Eu arrepio passou por mim e uma lágrima caiu pelo meu rosto. Eu sequei-a e sai andando, com raiva.

    - Ei, Claire, to aqui. – Leon acenava na fila. Eu olhei, tristemente, revirei os olhos e continuei andando. – Claire. Claire ! – senti ele vindo atrás de mim. Ele segurou meu braço e eu olhei para cima, tentando segurar as lágrimas. – O que foi, Claire ? Ta indo embora por que ?

    - Eu... Preciso ir. – ele viu que eu estava tremendo.

    - O que aconteceu ? – eu olhei para ele e olhei para cima, como forma de dizer que não ia falar. – Claire, vou te levar para casa e lá você me conta, ok ? – eu assenti com a cabeça e me segurei para não chorar.

    O trajeto foi silencioso. Fiquei olhando pela janela, segurando minhas lágrimas e bolando teorias. Leon só falava o necessário com o taxista. Isso era agradável nele, sabia quando eu não queria falar.

    Chegamos na minha casa em silêncio absoluto. Eu parei em frente à porta e o encarei.

    - Obrigada, Leon. Até segunda, na escola. – Ele sorriu.

    - Nada disso. Cumpri minha parte, agora você vai me contar o que aconteceu. – eu revirei os olhos.

    - Tem certeza ?

    - Absoluta. – ele mexeu no cabelo. – Eu posso ser uma boa pessoa, se quiser. Sabia ?

    - Nem podia imaginar – eu sorri e abri a porta. – Hã, por aqui, vamos conversar no meu quarto. Não tem ninguém em casa. Vamos. – ele estava observando a casa e me seguiu, meio envergonhado. Subimos rapidamente e entramos no meu quarto. – Droga, ele veio aqui de novo. – Aquele barulho perturbador voltou. Que saco.

    - Ele ? Ele quem ? – ele me olhou, meio receoso.

    - Leon, vou te contar o que aconteceu e você vai entender. – Contei exatamente o que tinha acontecido hoje e ontem, quando Oliver estava no meu quarto. Ele ouvia atentamente. – Entende ?

    - Sim, entendo. Mas você não. – eu o encarei, confusa. – Claire, Oliver não é o que ele parece ser. E essa pedra... – ele me pareceu arrepiar. Leon sacudiu a cabeça. – Claire, está na hora de eu te explicar.

    - Leon, como ass.. – ele botou o dedo na minha boca, em sinal de que eu tinha que parar de falar. Eu parei e corei, levemente.

    - Sente-se. É melhor. – eu sentei, desconfiada. – Eu não devia... mas você está envolvida nisso. Claire, me prometa. Me prometa que nunca irá contar isso para ninguém. – ele me pareceu muito impaciente e nervoso.

    - Eu prometo, Leon. Prometo, fica tranqüilo. – eu segurei sua mão. Ele sorriu, um pouco mais tranqüilo.

    - Claire, existe um mundo que vocês, mortais, não tem conhecimento. – ele avaliou minha reação. Olhava-o, um tanto receosa. - Um mundo além de tudo o que você imagina.

    Leon mexeu no cabelo, como sempre fazia quando estava nervoso, eu tinha reparado. O barulho estava me irritando, mas me segurei, esperando Leon dizer alguma coisa a mais. O jeito que ele estava me preocupava. Afinal, que mundo é esse ?