A primavera acabou. Já faz quase um mês desde de que o Kei chegou lá em casa. Não que isto seja ruim, ao contrario, é bom ter alguém para conversar às vezes.

Eu nem acredito! Depois de seis meses de provas, provas e mais provas, terei um pouco de descanso. Ah, o verão, a época do ano em que todos ficam mais alegres, e sem preocupações. 

Calor. Meu Deus, como está quente hoje! E pra completar, está faltando água no bairro todo. Dá pra acreditar que resolveram arrumar a porcaria do encanamento, justamente no dia mais quente do ano? Pois é. Acredite. Eu já estava quase mergulhando no aquário da sala. Quase não, eu mergulhei, ou melhor, tentei. Meu pai não deixou, disse que aqueles peixes eram criaturas sagradas e milenares e tinham sido um presente. 

Bah. Eram apenas peixes. 

E pior que tudo isso, só as reclamações de um certo garoto.

- Eu quero voltar pro meu mundo, eu to morrendo! 

- Para de falar, não é só você que ta assim. Isso já ta irritando! 

- Hei, meninos. Tenho uma ótima noticia para vocês. Acho que vão adorar! - Eu irei adorar qualquer coisa que envolva acabar com esse maldito calor
.- Vejam isso!

Oh, eu não acredito no que meus olhos vêem, não...Não pode ser...É...

- A chave da casa de praia que seu pai alugou! - Ela disse, balançando a salvação da minha vida.

Sim. Era o que eu estava pensando. Férias na praia. Existe coisa melhor ? 

Meus olhos brilhavam como os de um cachorro que vê seu dono chegar de viagem depois de duas semanhas. Serio.

- Ei....E o que significa isso? - Kei, seu estraga prazeres. Acaba de cortar o clima entre mim e a chave. 

- Não interessa! Eu te explico no caminho. Mamãe, onde estão as malas? Papai já está no carro? Não podemos demorar. Preciso arrumas minhas...

- Calma Yukari-Chan. Pra que tanta pressa ? Nós só vamos amanha bem cedo. 

- "Só”? - Ah, não, nós vamos agora! 

Nada feito. Não preciso dizer que aquela noite foi a pior noite da minha vida. A lua cheia parecia querer entrar dentro do meu quarto, e sem um pingo de sono, minha única alternativa foi tentar conversar com um grilo. 

Peguei um copo e cuidadosamente coloquei-o em cima do simpático animal. Não iria correr o risco de ser mordida por ele. Não sou tão burra quanto pensam!

- Hei... - Eu bati de leve no vidro. Fazendo ele se agitar. Eu definitivamente cheguei ao cumulo da solidão. - Você deve ser feliz sendo um grilo. Há, eu sou mesmo uma idiota não acha? 

Cri...Cri...Cri...

Eu não acredito que estou conversando com um inseto. E isto se tornou mais humilhante a partir do momento em que percebi que estava sendo observada. Pelo Kei.

Ele bocejou e disse com uma cara de sono:

- Que...Que você ta fazendo acordada? Vai dormir. 

- Hei, da licença que eu estou contando sobre meu problema para alguém que me escute.

Cri...Cri...Cri...

- Um grilo? Ah, sim. Acho que você tomou sol na cabeça demais hoje de tarde. 

- Vai dormir Kei . 

Cri...Cri...Cri...

- Cala a boca! - Gritei baixo (?) para não acordar mais ninguém. Aquele cri, cri, cri já tava irritando.

Silêncio.
...

Na manhã seguinte, levantei cedo. Eram cinco horas da manhã, e o sol nem tinha saído direito. Mas existia um motivo pra me fazer acordar naquela hora. E, pra variar, se chamava Keisuke. Chamei uma, duas, TRÊS vezes. Caramba, ele era mais preguiçoso que eu ! Paciência, Yukari, paciência... Fiquei apenas observando-o dormindo. Era tão...Bonitinho. 

- ...Yuu-Chan... - Como ? Ta legal, além de tudo, essa criatura ainda fala dormindo. Espera ai. Ele ta sorrindo!  

Ai ele parou e virou para o outro lado. Não posso negar que fiquei morrendo de curiosidade de saber o que estava sonhando. Não demorou muito para ele finalmente acordar. Ficou olhando pra minha cara por uns instantes, como se tivesse voltado de marte.

- Nossa finalmente né? Achei que ia ter que te dar uma panelada pra ver se acordava. - Falei rindo. 

Tive que me conter para não lhe perguntar sobre o sonho. Afinal, não é todo dia que alguém sorri sonhando com você. 

Depois disso, não demorou muito para sairmos de casa. O tempo parecia que iria colaborar conosco desta vez. A viagem até o litoral durava mais ou menos uma hora. Tempo suficiente para matar o Kei de tédio. Sorte que eu tinha levado o meu dvd portátil que ganhei de natal ano passado e ficamos assistindo um filme. 

A casa era simplesmente espetacular! Três quartos, dois banheiros e até uma piscina enorme. Eu e mamãe preparamos o almoço e de tarde fomos conhecer a praia. A melhor parte era que estava quase vazia, isto era ótimo, pois nunca me esquecerei do que passei naquele maldito supermercado no mês passado. 

- Hei Kei, o que acha de entrarmos no mar agora ? - Perguntei. Ele aceitou sem nem pensar duas vezes. No começo, ficamos apenas onde a água não passava do nosso joelho, brincando de pular as ondas.

- Você me disse que nunca tinha visto o mar não foi? E ai, gostou?

- È incrivel Yuu. Nunca tinha visto tanta água assim...Acho que dá pra matar a sede de mais de mil vilarejos! 

- Kei, não dá pra beber dessa água não.Olha só. - Eu falei rindo. Molhei o dedo indicador e coloquei na boca dele, ele fez uma careta engraçada. - Ta vendo! È salgada!

- Argh. Que desperdício! - Ele falou.

- Vem! Vamos pro fundo.  

Eu realmente adoro o mar, sinto como se flutuando naquelas águas eu pudesse voar. Eu e o Keisuke conversávamos sobre coisas inúteis e brincávamos de jogar água um na cara do outro. Onde estávamos, ainda dava para por os pés no chão. Destraídos, não percebemos quando aquela onda passou por nós. Devo ter engolido pelo menos uns dois litros. Quando abri os olhos novamente, notei que não alcançava mais o chão e entrei em desespero. Eu não sei nadar muito bem. 

Eu podia ouvir os gritos do Kei me chamando, mas aos poucos eles foram ficando abafados e distantes. Depois disso, eu não vi mais nada.

...

- Yukari-Chan, você está bem? Yukari-Chan! 

- Kei...hãn...O que aconteceu? - Perguntei, meio zonza ainda. 

- Yuu-Chan! - Ele me abraçou com força - Eu fiquei preocupado, você está bem? 

- Acho...Acho que estou sim. Ai, como foi que eu cheguei aqui? 

- Vi que você não tava conseguindo nadar e te salvei. Eu falei para não irmos pra muito longe, e por que não me disse que não sabia nadar? Podia ter morrido.

- Me...Perdoe, Kei.  

Foi a primeira vez que vi ele falar comigo daquele jeito. Ficamos só mais um pouco na praia e resolvemos ir embora. Decidimos jantar numa lanchonete ali perto. Estava tão cansada que mal cheguei em casa, só tive tempo de tomar um banho e cair na cama. 

. . .