O Povo do Vento escrita por Gabrielle Erudessa


Capítulo 2
2 Cidade do Sol e da Lua


Notas iniciais do capítulo

Capítulo enorme D=
Talvez cansativo, dependendo do leitor...
Mas espero que gostem @_@



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Voaram para longe de Urû’baen, logo sobrevoando o deserto Hadarac. Quando a cidade não passava dum ponto distante do tamanho do polegar de Murtagh, Thorn levantou vôo do deserto onde os esperava, voando por cima do estranho dragão para ver o cavaleiro. Estranhamente, o dragão prateada não batia as asas com frequência, preferindo planar. Murtagh observou bem as asas prateadas com veias negras. Não era uma fina membrana como a de Saphira ou de Thorn, sem efeitos translúcidos, e, além disso, parecia impenetrável, como se uma flecha não fizesse mais do que um alfinete faria num braço dele.

Uniu sua mente à de Thorn, com alívio verificando que ele estava bem e, além disso, muito feliz com algo.

Como você está? Perguntou ao dragão, que deu uma pirueta acima de sua cabeça antes de responder.

Melhor impossível! Nós vamos realmente nos livrar de Galbatorix! Vamos ser livres! A primeira coisa que vou fazer como dragão livre é descobrir se os Varden nos perdoariam para que os ajudássemos a destruir aquele tirano!

Duvido que eles o façam. E, mesmo que nos perdoassem, os anões não perdoariam. Nós matamos Hrothgar, seu rei. E Eragon... Ele com certeza não perdoaria nossa traição.Vamos ter que nos virar e fugir, mesmo livres. Murtagh respondeu, sombrio. Ele concordava com Thorn, gostaria de ser perdoado, mas duvidava que o fizessem.

Então, vamos ficar na terra desses dois, a tal de Miën. Länie me mostrou algumas imagens de lá, é magnífico! A grama é verde, cervos, gazelas e diversos outros animais, grandes e pequenos, correm por cima da montanha, onde a capital foi construída, entalhada na rocha! É linda, reluz como a lua durante a noite e como o sol de dia! É um paraíso! Em seguida, Thorn repassou para Murtagh as imagens que o dragão prateado lhe mostrara. Realmente, como lembranças, memórias, o lugar era magnífico. E ao vivo, devia ser ainda mais belo.

- Quantos dias até sua terra? – perguntou ao ouvido de Mïhëan, para que sua voz superasse o barulho do vento.

- Chegaremos quando o sol estiver se pondo! – ela respondeu num grito rápido, rindo de alguma piada particular.

- Quando?! – gritou novamente, sentindo-a se encolher.

- Meus ouvidos são mais sensíveis que o seu, não precisa gritar tanto! E vamos chegar hoje! – Murtagh sentiu a cabeça girar com a declaração. Era, no mínimo, um dia de vôo de Urû’baen até Du Weldenvarden, e ela estava falando que atravessariam a floresta até o pôr-do-sol daquele mesmo dia. Sentiu Mïhëan abafar o riso pelo jeito como seu corpo se agitou.

Murtagh ficou em silêncio, preferindo conversar com Thorn, saber como fora a caçada.

Era por volta de meio-dia quando Länie e Thorn pousaram, depois de sair do deserto Hadarac.

- Onde estamos? – perguntou, observando algumas árvores, desmontando do dragão depois de Mïhëan.

- Na borda de Du Weldenvarden. Só pousamos para comer algo, e além disso, quero desfazer logo essa ilusão e voltar a ter minhas orelhas e patas de lobo e voltar a usar minhas roupas de seda de aranha! E assim, você também pode montar em Thorn. Sinceramente, não sei como vocês conseguem se equilibrar em pes tão fragéis! – pegou pão que ainda estava quente e queijo fresco nos alforjes da sela, jogando para Murtagh, em seguida pegou uma troca de roupa, correndo para o outro lado de Länie para se trocar. Como o pão estava quente e o queijo, fresco, ele não tinha idéia. Talvez algum feitiço.

O cavaleiro preparou alguns pães com pedaços de queijo, enquanto ouvia a Lupus, como ela dissera que chamavam os membros de seu povo, entoar um feitiço, provavelmente para desfazer a tal ilusão. Mas não era um feitiço na Língua Antiga, era uma língua de som suave, com poucas consoantes, predominando o som das vogais.

Depois de alguns minutos, ela voltou, terminando de fazer alguns dos laços da espécie de capa que vestira, o que se prendia em sua cintura, o quarto e último laço. Era como o robe que a vira usando em sua mente, mas com capuz, de um tom de negro avermelhado, mas ao invés de um vestido longo e branco por baixo, usava uma calça curta até o joelho branca e uma camisa que ia até a metade da coxa cinza-lunar. As mesmas orelhas de lobo se sobressaíam do cabelo, e no lugar dos pés sujos de antes, estavam patas de lobo, peludas e do mesmo tom do cabelo, e, olhando-se com mais atenção, seria possível perceber que seu corpo também mudara, sutilmente.

Murtagh sentara apoiando as costas contra o corpo escamoso e quente de Thorn comendo o almoço ralo, mas que era melhor do que passar fome. Mïhëan sentara meio ajoelhada próxima a ele, prendendo o cabelo com uma fita feita do mesmo tecido estranho de suas roupas num rabo de cavalo frouxo, logo começando a comer.

- Du Weldenvarden possui defesas. Nós vamos conseguir passar por esse caminho? – o cavaleiro perguntou à jovem, vendo-a terminar de comer o pão antes de responder.

- A magia dos elfos não pode com a minha, além disso, essas defesas estão enfraquecidas já que a guerra estourou definitivamente. – levantou-se, andando até o outro dragão, montando num salto. – Vamos, ainda temos seis horas de vôo! – falou algo com o dragão prateado, que saltou agilmente, logo estando numa alta altitude.

Murtagh suspirou, montando Thorn, terminando de comer rapidamente. O dragão vermelho saltou, batendo as asas vigorosamente para alcançar o outro dragão que já estava bem distante em alguns segundos.

O cavaleiro buscou a mente de Mïhëan, encontrando-a aberta.

O que foi, Murtagh? Ouviu-a perguntar assim que ele se aproximou de sua mente.

Como não tem ninguém atrás da gente? Nós voamos em plena Urû’baen! Além disso, como nós vamos atravessar Du Weldenvarden sem que nenhum elfo nos veja?! Permitiu que sua “voz” saísse com raiva. Ao invés de uma resposta “entre-dentes”, como esperava, ouviu uma risada suave.

Ninguém pode ver Länie se ele não quiser. Quanto à Thorn, joguei um feitiço suave para que ele também não seja visto. E quanto a atravessar Du Werldenvarden ainda hoje, como você  com certeza está se perguntando, eu simplesmente pedi ao vento que acelerasse nosso vôo! Disse essas coisas com naturalidade, como se estivesse acostumada a responder tal coisa.

Murtagh afastou sua mente da dela, perguntando-se o que ela queria dizer com essa de “Simplesmente pedi ao vento que acelerasse nosso vôo”. Que tipo de magia seria a dela? Thorn ligou sua mente à de Murtagh, e era possível perceber uma nota de sarcasmo em seus pensamentos.

O que você achou dela, Thorn? O cavaleiro perguntou ao dragão, vendo a floresta deslizar vários metros abaixo deles como se fosse um rio de águas velozes. Nunca voara numa velocidade como aquela.

Ela é confiável. É sábia, inteligente, e muito mais velha do que parece. É mais velha que Galbatorix. Respondeu o dragão, acompanhando Länie suavemente quando o outro virou em direção às distantes montanhas, que se aproximavam rapidamente. Não se comparavam em tamanho às Beor, mas não deixavam de serem impressionantes.

O que ele disse sobre ela?

Apenas coisas que eu não posso dizer a você, porque irá descobrir quando chegarmos em Miën.

Murtagh bufou, impaciente. Queria saber mais sobre ela e naquele instante. Ainda podia desistir e voltar caso ela não fosse confiável o bastante... Apesar de que, se Thorn confiava nela, provavelmente estava tudo bem. Insistiu para que o dragão lhe contasse mais, mas Thorn permaneceu irredutível: não disse nada.

O sol já seguira muito em sua jornada diária quando eles não viram mais Du Weldenvarden, e Murtagh viu uma alta montanha que poderia ser uma Beor, larga demais para se contorná-la em pouco tempo. Havia uma cachoeira que escorria por suas paredes rochosas violentamente. Länie aproximou-se, até que o som pudesse ser ouvido e abafasse completamente um sussurro.

Mïhëan levantou-se na sela, enquanto ligava com facilidade sua mente à de Murtagh.

Posso montar Thorn? Länie é muito grande para passar pela passagem, mas Thorn ainda consegue. Länie terá que dar a volta, e demora muito para passar pela Elemë contornando-a!

Murtagh repassou a mensagem para Thorn, que afirmou que seria um prazer. Mïhëan sorriu, voltando rapidamente para os alforjes da sela de Länie, pegando a mesma tiara que Murtagh vira-a usando em sua cabeça e colocando com cuidado sobre a cabeça. Murtagh já se preparava para pousar, mas levou um tremendo susto quando ela correu pelo corpo de Länie, saltando da ponta da cauda, sumindo no ar e aparecendo atrás de si, apertando sua cintura com o braço. Estava mais pálido que de costume, e ouvia Thorn rindo em sua cabeça e Mïhëan atrás de si, ao seu ouvido.

- Desculpe-me, esqueci de avisar como ia montar em Thorn! – enquanto tentava acalmar-se, ela escondeu o rosto no pescoço do rapaz, abafando o riso. Quando seu rosto estava novamente visível, havia resquicios de lágrimas em seus olhos, e Murtagh já havia se recuperado do susto, voltando a respirar normalmente. Ela acenou para Länie, que balançou a cabeça em sua direção e começou a contornar a montanha. – Sério, Murtagh, desculpe. Esqueci que você não está acostumado com as coisas incomuns que posso fazer – eu e todo o resto do meu povo... – ela suspirou, assoprando uma mexa do cabelo ondulado que caiu em seu rosto.

- Onde fica essa tal passagem? – ele perguntou, deixando o rosto de lado para que conseguisse visualizar a jovem. Ela sorriu-lhe misteriosa, em seguida olhando atentamente para a parede, apontando para a cachoeira alguns metros abaixo deles.

- Ali. Atravessando a água naquele ponto, há um enorme túnel por onde Thorn pode passar facilmente. Foi feito pela minha mãe, para quando os Cavaleiros de Dragão nos pedissem ajuda. – ela engoliu em seco ao dizê-lo. – Eles nunca pediram. Fomos esquecidos por aqueles além de Du Weldenvarden muito antes da Queda... – suspirou, enquanto Thorn baixava a altitude e voava velozmente em direção à cachoeira.

Murtagh inclinou-se contra o pescoço de Thorn, segurando com força um dos espinhos. Mïhëan apertou mais seus braços em torno dele, inclinando-se junto. Murtagh engoliu em seco, reparando que, até aquele momento, o juramento que ele e Thorn tinham feito à Galbatorix não os tinham afetado. Como, não tinha idéia.

Ele esperava ficar enxarcado, mas quando Thorn passou pela cachoeira, suas águas se dividiram, nenhuma gota molhando-os. Sentiu Mïhëan rir suavemente e algo como um ronrono sair do fundo de sua garganta.

- E essa agora? Além de orelhas, olhos e patas de lobo, ronrona feito um gato? – Ele provocou, levantando uma sobracelha. Thorn soltou um som que era algo como uma risada, e então Mïhëan mordeu seu ombro enquanto lutava contra o riso, fazendo um gemido de dor escapar do rapaz. Seus dentes também eram afiados como os de um lobo.

A passagem ela longa, larga e alta. Era simétrica como os corredores de Farten Dûr, e espaçosa o bastante para vários batalhões de homens andarem por ali. Mas infelizmente era pequena demais para um dragão como Länie, que provavelmente era da época do Juramento de Sangue, julgando por seu tamanho, talvez até antes. E provavelmente, um dragão selvagem também.

- Como seu povo faria para ir e vir entre os dois lados da montanha por essa passagem? É muito alta. – ele perguntou. Ela não fez nenhum som a príncipio, mas então respondeu.

- Essa passagem é encantada. É como se houvessem várias passagens. Ela aparece onde é necessária. Ela apareceu aqui em cima porque Thorn é um dragão e seria melhor assim. Para nossas tropas, apareceria lá em baixo. – sua voz era neutra.

- Mas e a cachoeira? – ele perguntou, achando fascinante saber que o túnel aparecia e desaparecia.

- Encantada também. Ela se abre e, dependendo do tamanho do batalhão, para de correr para nós passarmos. – Mïhëan fechou os olhos, apoiando o queixo no ombro do Cavaleiro. – Logo chegaremos à Miën. – ela sussurrou, um som de felicidade em sua voz.

Para Murtagh, o tempo para atravessar a passagem foi como horas, mas não passaram de alguns minutos. Quando saíram do outro lado na estranha terra de Mïhëan, Murtagh sentiu uma onda de vertigem. O ar era leve, diversos cheiros o adornavam, o país era formado de vales e montanhas cobertos de flores predominantemente vermelhas, azuis e verdes, era imenso, e ele via muitas cidades nas montanhas e colinas, a maioria em forma de torres. Ovelhas cobriam planícies e vacas pastavam próximo às torres. Cavalos selvagens diferentes de todos o que ele vira corriam livres, e lobos do tamanho de cavalos caçavam, funcionavam como cães de guarda ou cães de pastoreio, e tantos outros animais que era impossível contar. Via bandos de crianças brincando em meio a vários animais e em meio às árvores, apenas dois ou três adultos com elas, ou nem isso, sendo vigiadas pelos enormes lobos, e até mesmo montando-os.

- Melhor fechar a boca se não entra mosquito! – Mïhëan brincou enquanto empurrava o queixo do rapaz. – Thorn, você pode pousar ali. – e enviou uma imagem para o dragão de uma planície perto da única cidade que era esculpida em rocha ao invés de ser uma torre. Era a cidade que Thorn mostrara a Murtagh em sua mente. Como ele mesmo dissera, ao vivo era ainda mais bela do que em lembranças. Naquele momento de crespúsculo, a cidade brilhava de um jeito estranho, como um vermelho rubi, refletindo o céu avermelhado acima deles, mas com toques de safira da noite que vinha do leste. Linda de se observar.

- Qual o nome da cidade? – ele perguntou, ouvindo-a rir de forma estrondosa.

- Nome?! Nossas cidades não têm nomes específicos! São conhecidas por sua aparência! Esta, onde a família real vive, é conhecida como a Cidade do Sol e da Lua, por causa de como ela brilha! – eles não falaram mais nada enquanto Thorn pousava em frente à cidade.

Crianças com orelhas e patas de lobo com os mesmo cabelos reluzentes e ondulados e as roupas de tecido estranho correram em direção de Thorn. O dragão abaixou a cabeça, permitindo que as crianças acariciassem suas escamas. Elas não tinham medo, sorriam e cantavam naquela língua estranha com mais vogais que consoantes. Suas vozes eram suaves e inocentes: vozes de criança, tão somente isso.

Mïhëan sorriu, desmotando num salto. Murtagh demorou um pouco mais para desmontar, não tinha a incrível agilidade que ela demonstrava. E então, uma pergunta lhe ocorreu: se ela realmente nada tinha haver com os Varden, não tinha motivos para lutar contra Galbatorix, por que tentara chegar até a sala das Eldunarí? Teria de lhe perguntar, mas visto que estavam cercados por lobos do tamanho de cavalos, crianças e outros adultos do povo de Mïhëan, melhor seria deixar para depois.

Uma jovem praticamente idêntica à Mïhëan aproximou-se. O que as diferenciava, além das roupas e que ela parecia mais velha, a outra não usava uma tiara, e sim uma pena branca de cisne presa numa das orelhas de lobo, eram seus cabelos, do mesmo tom, cortados na altura dos ombros. Usava um vestido branco e longo e um robe também branco com quatro laços. Sorria suave e plácida. Ela e Mïhëan abraçaram-se com força.

- Como as coisas ficaram durante minha ausência, Enäí? – a de cabelos compridos perguntou à outra, afastando-se e observando-a atentamente. Estava com uma aparência mais cansada do que quando saíra.

- Ficaram bem, irmã, mas os Lobos trouxeram batedores ontem à noite. Parece que há uma tropa de Lüen ao leste. Não sabemos o que eles pretendem, mas boa coisa não é. Se você se lembra bem, mamãe arranjou uma briga feia com os Djins pouco tempo depois que a Ordem dos Cavaleiros foi formada porque eles tentaram capturar a tia Nië. Talvez estejam tentando... – só então a mulher percebeu Murtagh um pouco mais atrás, parecendo assustar-se. – Há quanto tempo não vejo humanos... Tinha me esquecido como são parecidos conosco. – ela então uniu as mãos espalmadas com os dedos unidos e baixou a cabeça levemente, falando um cumprimento em sua língua estranha. Aparentemente, eles não a usavam em conversas normais. – Ämn Randë Rä’lanë lanë dië’o cäélë. – Murtagh inclinou levemente a cabeça para o lado, e antes que qualquer um falasse qualquer coisa, Mïhëan explicou.

- Irmã, eu ainda não pude explicar à Murtagh como nós costumamos cumprimentar Guerreiros e Cavaleiros. – em seguida, virou-se para o cavaleiro e avançou alguns passos. – Enäí disse, na língua do Vento, “Que Randë Curadora cure suas feridas”. Você apenas responderia “Úë ë dïe’o tíën”, que significa “ E as suas também”. Desculpe. Lënüá (1), Enäí, esqueci de avisar que não tinha ensinado-o. Não houve tempo. – curvou-se então levemente para Murtagh e depois para Enäí, que balançou a cabeça.

- Quinhentos e quinze anos e ainda age como se tivesse dez e ainda fosse irmã caçula, Mïhëan.

Murtagh sentiu o queixo cair levemente. Quinhentos... Quinhentos e quinze anos? Ele entendera certo ou seus ouvidos estavam lhe pregando peças?

Você entendeu direitinho, Murtagh.

O cavaleiro assustou-se quanto Thorn enviou-lhe o pensamento de repente. Olhou então para o dragão. As crianças ainda cantavam, mas deixaram de apenas acariciar-lhe a enorme face para subir na sela e escalar os espinhos do pescoço, sorrindo. Thorn não fazia nada, apenas ria. Parecia até feliz com aquilo. Murtagh deixou-se sorrir levemente. É, talvez tivesse sido bom eles irem para aquela terra.

Mïhëan apenas girou os olhos.

- Tecnicamente, eu sou a caçula, Enäí, você nasceu dois minutos antes de mim. Só sou considerada a mais velha porque a Däi’Sië(2) disse que de alma, eu era a mais velha. – a “jovem” então puxou Murtagh pelo braço. – Estou sendo uma péssima anfitriã... Murtagh, esta é a minha irmã gêmea Enäí. Fisicamente, eu nasci dois minutos após ela, mas sou considerada a mais velha de nós duas porque, segundo nossa sacerdotisa, minha alma chegou antes. Enäí, este é Murtagh, o Cavaleiro de quem tive visões quinhentos anos atrás. –Murtagh, em respeito à mulher que tinha séculos a mais que si, fez uma leve reverência, ao que ela imediatamente colocou-o com as costas retas.

- Não fazemos reverência a nenhum ser terrestre, nem mesmo a reis e rainhas. Apenas os deuses merecem reverência. – disse-lhe, virando-se para Mïhëan.

- Ainda lembra-se das minhas visões, não? – disse sorrindo. Enäí bufou levemente antes de responder.

- Como esquecer?! Você encheu meus ouvidos com elas por dez anos depois que assumiu o trono de mamãe, depois de sua morte! – jogou os braços para cima, parecendo enfadada.

Murtagh sentiu a cabeça rodar enquanto voltava a olhar para Mïhëan, que olhava para o lado, o rosto levemente avermelhado.

- É a rainha? – murmurou incrédulo. Enäí olhou irritada para a irmã.

- Acho que me esqueci de falar sobre esse pequeno detalhe... – murmurou, as orelhas de lobo mexendo-se inquietas.

- Pequeno? – Enäí ergueu uma sobrancelha, fitando Mïhëan de forma assassina. – Galbatorix poderia nos obrigar a lutar ao lado dele se conseguisse mantê-la presa! Não sei nem porque você resolveu ir para a toca do Djin! – usou a frase típica de seu povo para quando alguém ia para onde era perigoso. No caso deles, ao invés de lobo, era Djin. O que eram, o cavaleiro não tinha idéia.

Mïhëan vioru-se para a irmã, apontando o indicador para ela.

- Cuidado, Enäí! Você não tem idéia da energia triste e cheia de ódio que senti quando cheguei em Urû’Baen! Eu tinha que ver, tinha que encontrar! Os deuses não me permitiram ver, mas permitiram que eu encontrasse Murtagh quando ele ainda podia voltar! Lembre-se, irmã, que cabe às rainhas de nosso povo sacrificar-se pelo povo. Eu fui porque era necessário. – virou-se de costas então, pegando nos braços uma criança que veio correndo em sua direção. – Aïá. Ämn Länie säérö cë nuëdë (3). – cumprimentou, beijando o topo da testa da jovem, vendo um enorme sorriso se abrir no rosto da pequena.

- Úë cë nuëdë, Mä’Üué úë Hamei (4). – respondeu, tocando com o indicador a ponta do próprio nariz e o de Mïhëan em seguida. – Quem é ele, tia?! – perguntou, debatendo-se impaciente para ir para o chão. A rainha riu e permitiu que ela fosse para o chão. A sobrinha correu na direção de Murtagh, abraçando suas pernas e olhando para cima, sorrindo.

- Ele é Murtagh, Aïá, Cavaleiro de Dragão. O nome de seu dragão é Thorn e de sua espada é Zar’roc. Ele é filho de Morzan. – a garotinha soltou suas pernas, ainda sorrindo. Usava um vestido longo daquele estranho tecido, branco com bordados dourados, com fitas vermelhas numa das patas de lobo. Murtagh sentiu um leve aperto ao ouvir que era filho de Morzan. Não gostava de lembrar-se desse fato.

Mïhëan aproximou-se, colocando uma mão em seu ombro.

- Não se lembre de Morzan por seu lado traidor. Meu povo tem uma filosofia para quando nossos pais não são dos mais honrosos, o que não acontece com freqüência entre nós... Lembrar-nos que todos, sem exceção, um dia foram crianças inocentes, e tentar entender como em algum ponto essa pessoa se perdeu da inocência de ser uma criança e tornou-se alguém sem honra. Então, apenas tente entender onde ele se perdeu do caminho simples e inocente de uma criança, porque todos somos crianças. – disse, segurando então a mão de Aïá, sorrindo-lhe. Murtagh observou-a, olhando então para Enäí, que suspirou, sua face voltando então a ser plácida e serena. Ela aproximou-se, pegando a criança no colo.

- Como você sabe tanto? – ele perguntou, fitando-a nos olhos.

- Vivi muito, minha mãe me ensinou muito... – sorriu com ar distante. – Irmã, por favor, peça para Véäio providenciar roupas limpas e um quarto para Murtagh e para Súëi mostrar à Thorn onde pode caçar. Vou para o meu quarto, e no caminho irei pedir para as Däi’Sië prepararem uma Cerimônia de Cantos para depois do jantar. – com isso, virou-se e correu em direção à cidade.

Murtagh viu-a se afastar, parando apenas para cumprimentar dois rapazes com cabelos trançados que andaram na direção deles.

Sabia que ela era uma rainha, Thorn? Perguntou ao dragão, que tinha saído de onde estava quando os pais começaram a chamar as crianças para jantarem.

Sabia, mas Länie me pediu para não contar até que chegássemos. Você poderia ter deduzido isso por causa da tiara que é o mesmo que uma coroa, de Länie acompanhá-la e do livro na cabeça dela. Não viu porque não queria ver. Thorn bocejou, suas poderosas mandíbulas abrindo-se.

O que Länie acompanhá-la tem haver?

Ele jurou, muito tempo atrás, que protegeria todas as rainhas do Povo do Vento. É o que vem fazendo. Por isso estava no Império. Respondeu o dragão, vendo um dos rapazes aproximar-se. Usava um robe azul-marinho com apenas um laço e roupas brancas. Ele sorriu ao dragão, tocando com o indicador a testa e então a ponta do nariz.

- Olá, dragão. Creio que esteja com fome... – sorriu, tocando com a mão o rosto de Thorn, que balançou a cabeça em corcondância. – Venha, vou mostrar onde pode caçar. Meu nome é Súëi. – Começou a andar na direção de uma das planícies. Enquanto acompanhava o Lupus, trocou mais algumas frases com Murtagh.

Vai ficar bem, Murtagh?

Vou, Thorn. Pode ir, você está cansado e faminto. E eu, preciso de um banho. Desde a batalha em Gil’ead que não vejo água. Respondeu enquanto o outro rapaz aproximava-se, unindo as mãos espalmadas.

- Ämn Randë Rä’Lanë lanë dië’o cäélë, Murtagh. – disse o cumprimento, e dessa vez Murtagh sabia o que dizer, embora tenha enrolado um pouco a língua para pronunciar a frase.

- Úë ë dïe’o tíën. – o Lupus sorriu para o Cavaleiro, enquanto sinalizava para ser seguido. Suas roupas também eram brancas, mas o robe que usava era verde-água. Acenou levemente para Enäí que sorriu-lhe e começou a andar em direção à cidade.

- Meu nome é Véäio, sou o irmão mais velho de Mïhëan. Venha, vou arranjar-lhe vestes típicas de nosso povo e mostrar-lhe seu quarto! – antes que entrassem, ouviram o som de poderosas asas batendo. Olharam para o alto e viram Länie aproximando-se e pousando na beira da floresta, acenando a cabeça na direção de Murtagh e Véäio, ao que o Lupus tocou a testa e a ponta do nariz com o indicador.

Quando entraram na cidade, o Cavaleiro percebeu que o movimento era intenso. Diversos suportes com chamas estáticas e esféricas com leves ondulações como se fossem feitas de água estavam espalhadas pelas paredes, suas chamas em certos momentos variando de uma intensa luz branca para uma suave luz prata. Em diversos locais haviam escadas que levavam para outros andares, mas ele não as subiram. O teto era alto e as ruas, largas, o que indicava que dragões transitaram por ali num tempo longínquo.

- Aqui é onde ocorre todo o comércio da cidade. Nós comerciamos com as outras cidades de Miën e com outros países, exceto Luën, o Império e Surda. Sabe, não somos amigos do Djins e ninguém além de Du Weldenvarden sabe de nossa existência, quem sabia morreu não faz muito tempo e não podia contar a ninguém... Djins, sabe, eles gostam de caçar nossas crianças para devorá-las... – fez uma careta ao lembrar-se desse fato. Murtagh fez uma expressão de assombro. Como seriam esses tais Djins para gostarem de comerem... Crianças? – Por isso, sempre que elas saem, os lobos às acompanham. Eles os assustam. – em seguida, voltou a  falar sobre a cidade. – Acima, ficam nossos templos e salões, apesar de a maioria das festas ocorrerem nas planícies, apenas cerimônias formais ocorrem lá em cima, com exceções, é claro. Os outros andares, exceto o último, são as casas do nosso povo. No último andar, é onde os dragões, como Thorn, podem dormir. Se você quiser, poderá dormir lá com ele, ao invés do quarto onde ousamos chamar de palácio real. – riu de um jeito estranho ao falar isso. – Mas antes, venha, vamos falar com Helena, é a melhor costureira de Miën! – entraram por uma rua relativamente mais calma que as outras, onde todos paravam para ver Murtagh. Ele, mesmo assim, não sentia-se odiado ou até mesmo um estranho. Aquela gente, aquele povo, o aceitava, mesmo ele sendo de uma raça diferente da deles. E ser filho do traidor também não influenciava em nada o julgamento deles. Todos eles uniam as mãos espalmadas e inclinavam levemente a cabeça no cumprimento usado com Cavaleiros e Guerreiros, sempre com um discreto sorriso e um olhar fascinado. As poucas crianças que vira olhavam para ele com encanto, enquanto colocavam as mãos por cima do rosto e as levavam para trás da cabeça. O cumprimento devia er diferente para adultos e crianças. Mas ele afirmava: poderia viver lá para sempre.

- Véäio, até agora estou vendo as roupas que todos vocês usam, mas não tenho idéia de que tecido é esse. Estou muito curioso. – ele não resisitiu em perguntar antes que chegassem à loja. O Lupus apenas sorriu.

- Nem poderia conhecer. Esse tecido só existe em nosso país. É seda, mas não a seda que você conhece. É seda da teia de aranhas viúva-negra, a mais resistente, confortável e bela que existe. Um tecido élfico não se compara aos nossos! – riu, orgulhoso por saber que os elfos não os superavam naquilo, ou melhor, em praticamente nada. – A única coisa em que nos superam, e apenas uma elfa, a única que admiramos, Rhünon, é a arte de forjar espadas! Essa sua espada, Zar’roc, foi forjada por ela. – apontou para a espada, em seguida entrando por uma porta dourado-fosco. O rapaz entrou logo atrás.

A tal Helena não era uma Lupus. Ela não era nada que Murtagh poderia imaginar. O cabelo era dourado e cacheado até a altura da cintura, preso num rabo de cavalo, expondo orelhas normais, mas logo abaixo, no pescoço, possuía fendas, três de cada lado, guelras de peixe. O rosto era longo e meio amassado, o nariz sendo duas fendas paralelas, o rosto praticamente de um único plano, dando-lhe a aparência de uma cobra. Os olhos eram totalmente brancos, nenhuma outra cor, apenas a cor do globo ocular. A pele era azulada, e seus dedos eram ligados por uma fina membrana. Estava descalça e era possível ver que, ao invés de pés, possuía nadadeiras.

- Véäio! – levantou-se num pulo ágil, abraçando o rapaz. – O que aconteceu, seu pestinha?! Não me diga que conseguiu rasgar suas roupas de luta de novo! Um dia eu descubro o mistério por trás de uma roupa resistente à espada de Cavaleiros aparecer rasgada toda semana! – sua voz era estranha, como o vento nas folhas das árvores ou pedras que são atingidas por uma cachoeira. Oscilava do grave para o agudo para o suave em questão de segundos.

O Lupus riu, soltando Helena.  Só então os olhos brancos viraram-se para Murtagh, e o rapaz teve uma estranha sensação de desespero percorrendo-lhe ao ver aqueles olhos brancos observando-o.

- Helena, esse é Murtagh... – antes que pudesse falar qualquer outra coisa, Helena ergueu uma mão, silenciando-o.

- Eu sei quem ele é. – disse, ofegando. – Vocês estariam condenados se ele não tivesse vindo. Imagino que Mïhëan saiba disso. Ela teve visões com ele quinhentos anos atrás, antes mesmo de Morzan saber que conheceria Selena. Ou melhor, antes mesmo de Selena nascer. – virou brevemente para o Lupus, suspirando ao vê-lo pasmo. Murtagh simplesmente entrara em parafuso. Como aquelas pessoas sabiam tanto sobre ele? Que história era aquela de que a rainha tivera visões sobre ele quinhentos anos atrás? Será que chegaria a descobrir? Não ousava perguntar, pois não sabia como eles reagiriam, mas, chegaria a descobrir?

- Como sabe tanto sobre mim? – deixou sua voz sair, mas Helena não disse mais nada relacionado àquilo.

- Bem, Murtagh, eu prefiro tirar as medidas das pessoas e costurar sua roupa, mas isso levaria muito tempo e você precisa de uma roupa típica dos Lupus para depois do jantar, mas mesmo assim tirarei suas medidas para fazer roupas na sua cor, o vermelho-sangue... Enquanto isso, creio que um negro avermelhado ficaria bem em você... – sumiu por um corredor por alguns minutos. Enquanto isso, o Lupus virou-se para Murtagh.

- Tudo bem com você? – perguntou, soltando a respiração.

- Tudo... Eu acho. – respondeu, piscando os olhos tentando entender o que acontecera.

- Por favor, não se preocupe com isso. Helena às vezes tem visões, não pode controlá-las, e nem se lembra do que viu depois. Às vezes ela conta o que vê, às vezes não. Ser uma elemë’randë tem algumas desvantagens. – olhou atentamente para Murtagh, que já tinha se recuperado do susto. Elemë’randë... O que significaria em sua língua?

Helena retornou, carregando algumas roupas. Entregou-as à Murtagh e apontou para uma porta no outro lado da loja.

- Vá ali experimentar e depois saia! Rápido! Véäio, fique perto caso ele precise de ajuda com os laços! – empurrou os dois na direção da porta, voltando a sentar na poltrona onde estava antes, recomeçando a costurar o vestido onde trabalhava.

Murtagh entrou numa sala minúscula com um balcão e um espelho. Deixou as roupas no balcão, começando a despir-se das que estava usando.

Helena tinha lhe dado um conjunto de uma calça e uma túnica branca com bordados vermelhos nas mangas e nas barras e um robe negro avermelhado com bordados dourados na mangas e na gola. Ele atrapalhou-se todo com os laços do robe, simplesmente eram fitas demais! Abriu a porta; Véäio estava apoiado na parede ao lado com os braços cruzados e virou-se imediatamente para Murtagh quando a porta abriu-se. Sorriu ao ver a bagunça de nós que foram feitos com as fitas.

- Ajuda? – disse simplesmente, ao que Murtagh apenas murmurou um sim. – Olha, sempre comece pelos laços de cima. E tome cuidado de deixar o robe alinhado! – em seguida, habilmente desfez os nós, como se estivesse acostumado a fazer aquilo. – Você deve apertar o laço de forma que a roupa não fique larga nem apertada e nem que ele se desfaça com facilidade. – mostrou então como o laço que eles faziam terminava diferente dos mais comuns. Depois do laço, faziam dois nós: primeiro  um por cima do laço e depois passavam as fitas em volta do laço para depois fazer o outro nó. – Depois que se acostuma, nem percebe a facilidade com que os faz! Agora, tenta você! – desfez o laço e deixou que Murtagh tentasse se acertar com as fitas. Ele demorou um pouco nos dois primeiros, mas logo conseguiu dar os laços com mais facilidade. Logo, os quatro laços estavam feitos.

Véäio ainda acertou o robe mais um pouco, alinhando as mangas nos ombros do rapaz. Em seguida, abriu espaço para que ele pudesse andar para que Helena o visse.

Ela levantou-se e aproximou-se, andou em volta do cavaleiro, balançando a cabeça afirmativamente algumas vezes.

- É, ficou muito bom, mas não é a cor certa para você... Anda, vai experimentar as outras roupas! – empurrou o Cavaleiro para dentro da saleta novamente, voltando a costurar.

Trocou a roupa que usava por uma túnica longa, negro-avermelhada com bordados dourados com uma fita branca para amarrar na cintura, sem nada demais, e uma calça preta.

Quando saiu, Helena já estava esperando-o de pé. Ela olhou-o de cima a baixo, com um sorriso misterioso e a impressão de estar segurando a respiração.

- Excelente! Vai, ainda tem mais roupa! – não voltou a sentar-se, ficou esperando de pé.

A outra roupa, as últimas, eram parecidas com as que Mïhëan colocara quando pousaram na borda de Du Weldenvarden: uma camisa longa e uma calça, ambos negros com bordados vermelhos e a capa do mesmo estilo, negro-avermelhada com bordados dourados. Dessa vez ele não se embaralhou nos laços.

Quando saiu,  Helena tinha o mesmo sorriso misterioso e o olhava de um jeito estranho. Olhou atentamente para ele, estendendo os braços para cima.

- Perfeito! E quando usar as que forem da sua cor... – aproximou-se, balançando a cabeça afirmativamente e deixando o resto da frase no ar.

- Qual a diferença de uma roupa pra outra? Quer dizer, qual é pra qual ocasião? – ele perguntou enquanto ia à sala pegar as roupas que estavam lá. Helena impediu-lhe de pegar as com que ele chegara.

- Vou me livrar dessas roupas, não são ideais para esse país! Além disso, as cores, a costura, tudo, não combinam com você. – disse, pegando as roupas, sumindo pelo mesmo corredor de antes. Voltou poucos segundos depois. – A primeira que você vestiu é para andar por aí, a roupa que você mais vai usar. A segunda é para cerimônias, festas e celebrações, você também vai usá-la bastante. Essa aí é a que você vai usar para montar em Thorn, e, se quiser, para aprender a montar nossos lobos. É mais resistente que muita armadura por aí. Somente uma espada de cavaleiro consegue cortar essa roupa. E algumas armas e feitiços daqueles malditos Djins... – torceu a boca ao dizê-lo, mas logo voltou à imparcialidade não tão imparcial.

Ela afastou-se, pegando um pergaminho, uma pena de pavão e tinta. Acenou com a mão para uma linha de lã longa em cima da mesa, cheia de marcações, que mexeu-se e foi na direção de Murtagh. Sem virar-se, escrevendo algo no pergaminho, Helena disse para ele estender os braços. A linha começou, sozinha, a tirar as medidas do rapaz, enquanto um pedaço de carvão anotava-as sozinho num papel com símbolos ainda mais estranhos que os que ele lembrava como sendo o título do livro que Mïhëan mostrara quando ele invadira sua mente. Eram como linhas curvas que se entrelaçam de um jeito intrigante. Em poucos minutos, a linha e o carvão aquietaram-se e Helena se levantou. Véäio não tinha falado nada, apenas observava com um discreto sorriso, como se achasse graça em tudo aquilo.

- Daqui há duas semanas suas roupas ficarão prontas. Irei enviá-las para seu quarto no palácio quando isso acontecer. – sorriu, sumindo pelo corredor, enquanto todo o resto que se encontrava na loja seguia-a como animais de estimação obedientes. Tirando uma das chamas ondulantes que iluminava a área ao redor da porta com uma suave luz prata, todas as outras chamas apenas brilhavam fracamente como madeira incandescente depois de apagado o fogo quando ela sumiu pelo corredor.

Véäio dirigiu-se para a porta; Murtagh o seguiu, saindo antes da loja. Quando se encontravam na rua, a maior parte dos Lupus já tinha subido para os andares superiores, apenas alguns poucos terminavam de comprar alguma coisa. O Lupus guiou o rapaz para o fim da rua, onde uma escada larga se abria. Muitos subiam as escadarias.

- Quando as coisas da loja a seguem e as luzes enfraquecem, é sinal de que Helena está nos dispensando. – o outro explicou vendo o olhar intrigado de Murtagh em relação à como ele sabia que era hora deles saírem da loja de Helena. – Se importa se eu usar o jeito que meu povo tem de ir de um lugar ao outro mais rápido? Se formos ir nesse ritmo, chegaríamos muito tarde para que você pudesse banhar-se antes do jantar... – o Lupus perguntou, parando de andar.

- Significa desaparecer num lugar e aparecer em outro? – ele ergueu uma sobrancelha. Véäio sorriu, intrigado.

- Exato... Não me diga que minha irmã o assustou fazendo isso de repente... – Murtagh apenas bufou levemente, enquanto o outro ria. – Vamos, segure no meu ombro e não solte! – o Cavaleiro engoliu em seco, incerto quanto à qual seria a sensação, mas, afinal, colocou a mão no ombro de Véäio.

A sensação foi a mais estranha possível. Se estivesse de estômago cheio provavelmente ficaria com ele vazio assim que aquela sensação passasse. A impressão era que tudo girava ao seu redor, como se um vórtice de água o tivesse engolido. Mas ao invés de água, era um vórtice de vento, um furacão. Ele quase podia ver o vento se movimentando. E então, tudo parou.

Sua visão ondulou, como se tivesse subido em terra firme após um longo tempo num navio. Seus pés sentiam o chão, mas era como se ele estivesse formando pequenas ondas. Sentiu que estava prestes a cair, mas Véäio segurou-o de pé pelos dois ombros.

- Escolha qualquer coisa à sua frente e concentre-se nela. Logo essa sensação vai passar... – suspirou então, enquanto Murtagh sentia o mundo parar de ondular lentamente após escolher a porta de uma casa. – Eu me esqueço que humanos, mesmo os Cavaleiros, não são feitos para nossa magia... – balançou a cabeça, xingando a si mesmo em pensamento.

Logo o Cavaleiro endireitou os ombros e Véäio soltou-o. Murtagh respirou fundo, aliviado por tudo ter ficado parado novamente. Olhou então ao seu redor. As ruas eram como as do andar onde estava, porém bem menos movimentadas. Corria um riacho cavado na pedra no meio de cada uma das ruas, encontrando-se nos cruzamentos e dirigindo-se para algum lugar. Aquele riacho exalava um peculiar cheiro de lavanda e passava por baixo de duas portas duplas de carvalho que selavam o que parecia ser apenas mais uma casa, mas percebia-se por seu tamanho que era “algo mais”. As casas eram simples por fora, sem janelas, diversas daquelas chamas ondulantes espalhadas por dentro e por fora. Entretanto, o espaço entre uma porta e outra era grande, o que indicava que as casas podiam ser simples, mas eram grandes.

Véäio apertou levemente um de seus ombros, apontando para as portas por onde escorria o riacho perfumado. O Lupus apenas empurrou uma das portas, exibindo um lugar encantador de se olhar. O teto era alto, com diversas estalactites apontando para abaixo com as chamas estáticas e ondulantes espalhadas por elas em saliências naturais. Havia duas escadarias paralelas e espiraladas em colunas que subiam pelas laterais de algo que ele poderia considerar uma cachoeira interna, fina e que desaguava num pequeno lago de onde vinha a água perfumada do riacho nas ruas. Lá no alto, via-se que elas davam para um longo corredor com paredes de um vidro fosco com desenhos coloridos. As paredes eram prateadas e reluziam fracamente com a luz das chamas, com tapeçarias bordadas naquele estranho tecido de diversas mulheres, aproximadamente onze ou doze tapeçarias, a última sendo de Mïhëan. Todas, sem exceção, pareciam ter quinze anos. Era um salão de entrada, provavelmente, com diversas portas, corredores e arcos.

Véäio guiou-o para uma das duas escadarias, passando por cima do fino riacho, subindo pela da direita, enquanto explicava.

- Nessas tapeçarias estão todas as nossas rainhas quando assumiram o trono, quando tinham quinze anos. – Murtagh centrou-se na penúltima, antes de Mïhëan. Os cabelos eram da mesma cor, as mesmas orelhas, os mesmos olhos, tudo como era característico de seu povo, mas havia algo que ele não sabia definir direito que indicava que não eram a mesma pessoa. Mesmo assim, nenhum dizia qual era mãe e qual era filha. Apenas a ordem das tapeçarias indicava. Olhou então para a primeira e se surpreendeu. A mulher tinha uma aparência completamente humana. Os olhos eram castanhos, mas os cabelos eram ondas refulgentes de ouro e não de prata, e seu rosto era longo e afilado. Poderia se passar por uma elfa facilmente. – Essa água escorre do centro da montanha, onde está o Jardim da Rainha. Pode ser que Mïhëan o leve para conhecê-lo se confiar em você o bastante para tal... – Começaram a andar pelo corredor onde de um lado era pedra com diversas portas e do outro era daquele vidro fosco, a tapeçaria da jovem de cabelos dourados não lhe saía da cabeça. – Naquele lago estão as memórias de todas as rainhas anteriores, e apenas as rainhas podem tocá-lo, caso precisem da experiência que elas tiveram. – sorriu levemente e agora ambos os lados do corredor eram de pedra.

Véäio parou diante de uma porta vermelha e a abriu. O quarto não era nada comparado ao salão de entrada, mas era muito bonito. Num dos cantos havia uma escada, e havia uma porta numa outra parede. A cama era circular, com travesseiros e cobertores de tons de prata com desenhos em negro. Havia uma escrivaninha e uma cadeira numa das paredes com uma prateleira com pergaminhos e livros e outra com penas de corvo e de cisne, tintas, carvão e pergaminhos e papeis para escrever.

- Pra que aquela escada? – ele perguntou e o Lupus sorriu.

- Aquela escada leva para o último andar. Se a subir, verá o céu. É uma forma de você poder ver Thorn com mais facilidade. – apontou então para a porta antes que Murtagh perguntasse. – Ali é a sala de banho. Tome um banho e se arrume, logo volto para chamá-lo para o jantar. Ah sim, vista a túnica. O jantar de hoje é... Especial – sorriu levemente com ar de mistério, retirando-se do quarto.

Murtagh deixou as roupas em cima da cama e então se sentou nela. Era macia, e os cobertores eram daquela seda de teia de aranha, mas tecida de uma forma que era mais grossa e quente. Suspirou, levantando-se. Separou a túnica e a calça e dirigiu-se para a sala de banho. Havia uma suave nuvem de névoa cobrindo a água da banheira cavada na pedra. Havia uma pequena mesa ligeiramente longa paralela à banheira, onde havia uma toalha de algodão e um sabonete de aparência rústica e avermelhado que exalava um estranho cheiro de eucalipto queimando. Olhou mais um pouco, mas a sala de banho era feita totalmente de pedra, com desenhos vermelhos ao longo da parede que lhe lembrava a asa de um dragão. Havia apenas uma daquelas chamas esféricas ondulantes, iluminando o lugar com um suave vermelho.

Colocou a túnica e a calça num canto da mesa, despiu-se, pegou o sabonete e entrou na banheira, a nuvem de névoa começando a dissipar-se lentamente. A água estava quente, apesar de tudo. Algum truque daquele povo. Deitou na banheira, submergindo todo o corpo e segurando a respiração, deixando-se relaxar por alguns segundos todos os músculos tensos de seu corpo. Sentou-se então, lavando-se completamente, tirando o pó e sangue acumulados da batalha em Gil’ead e do longo vôo até aquele lugar. Ele simplesmente não decorara ainda o nome do país.

Seu banho não demorou mais do que alguns minutos, mas ainda assim, esses poucos minutos foram um grande alívio para o rapaz. Secou-se com a toalha de algodão, vestindo com cuidado as roupas para que não as derrubasse na água. Não estava a fim de usar algum feitiço para secá-las.

Mal fechou a porta da sala de banho, ouviu baterem à porta do quarto. Deixou as outras roupas em cima da cama e falou para quem quer que fosse entrar. Era Mïhëan, junto de Véäio. A rainha usava a mesma tiara que indicava quem ela era, os cabelos estavam soltos com algumas tranças meio à esmo com fios de prata entrelaçados. Havia uma fina linha negra em suas pálpebras e abaixo dos olhos. Usava um vestido carmim longo com uma fita negra na cintura com bordados prateados espalhados ao longo do busto e das mangas que se alargavam à partir do cotovelo. Ela sorriu-lhe suavemente e usou o cumprimento destinado à Cavaleiros e Guerreiros.

- Úë ë dïe’o tíën. – Ele respondeu e o sorriso dela se alargou enquanto se aproximava. Véäio ficou esperando na porta.

- A túnica ficou ótima, mas eu concordo com Helena: não é a cor certa para você. – balançou levemente a cabeça enquanto ajeitava a túnica nos ombros de Murtagh. Este, por sua vez, sentiu a face esquentar, não sabia direito o por que.

- Mïhëan, temos que ir... Você é quem abre o jantar, enquanto você não chegar, ninguém come... – Véäio ergueu uma das sobrancelhas, sorrindo de canto para a irmã quando esta virou o rosto para trás.

- Tem razão. – virou-se novamente para Murtagh. – Vamos? – a pergunta saiu em tom de ordem, uma pergunta retórica. Murtagh sorriu-lhe, balançando a cabeça em afirmativa.

Os três saíram do quarto, fechando a porta e seguindo pelo corredor, pela mesma direção da qual o rapaz viera. Murtagh observava, curioso, a quantidade de portas. Realmente eram todos quartos que estavam ocupados?

Notando sua curiosidade, Mïhëan pôs-se a falar.

- Nem todas essas portas são quartos. Muitas são salas de estudos, para nossas crianças e adolescente, salas de tecelagem, pintura, bibliotecas, salas de mapas... Já em relação aos quartos, estão ocupados por mim, meus irmãos, seus companheiros, meus sobrinhos e alguns que trabalham na manutenção do palácio. Os demais estão desocupados, mas em épocas de guerra contra os Djins para defender as fronteiras, apenas um ou dois ficam desocupados por causa dos reis e líderes dos outros países aliados nossos e líderes de tribos isoladas na Elemë, os Geifan. Daqui a dois meses você vai ver todos eles por causa do Congresso, todos os líderes dos países além da floresta, exceto Luën. – sorriu enquanto desciam a escadaria lateral à cachoeira interna. O cheiro de Lavanda havia sido substituído pelo cheiro de Camomila e alguma erva desconhecida. As chamas esféricas emitiam um suave prata, mas algumas um vermelho vivo, deixando o lugar com a iluminação alternada de um jeito interessante – prata, vermelho, prata, vermelho, vermelho, prata, prata...

- Congresso? Para uma guerra? – a pergunta saiu antes que o Cavaleiro pudesse impedir.

- Os Djins estão se organizando, provavelmente para nos atacar. Além disso, Mïhëan quer descobrir que energia cheia de tristeza e ódio havia naquela sala que ela tentou alcançar. Podemos acabar encontrando um motivo para lutar contra Galbatorix... Existem coisas que são imperdoáveis para nosso povo. – Foi Véäio quem respondeu, passando à frente e abrindo a porta.

Saíram do palácio, e diversas pessoas andavam pelas ruas, e vendo os três, principalmente Mïhëan, usavam um cumprimento que Murtagh não tinha visto: cruzavam os braços sobre o peito com as mãos fechadas, em seguida tocando a fronte e depois os lábios com o indicador. A rainha respondia com o mesmo gesto.

Depois de corredores e escadarias intermináveis e que se cruzavam num eterno labirinto, estavam fora da cidade. Já anoitecera e a cidade brilhava como a lua, no alto, plácida e cheia, iluminando levemente a planície.

Diversos suportes altos estavam espalhados com as chamas esféricas iluminando mais ainda o lugar com seu tom de prata, além do brilho que a cidade emitia. O resultado era uma iluminação de um tom surreal. Mesas retangulares e baixas estavam arrumadas num círculo em torno de uma única mesa circular. Ao invés de cadeiras, almofadas coloridas estavam espalhadas ao redor das mesas, onde o povo estava acomodado, e ele reparou que não haviam crianças – deviam estar dormindo – além disso, muitos não eram Lupuas. Na mesa circular, ele reconheceu Enäí com um vestido do mesmo modelo do da irmã, branco e com bordados prateados, ao lado de um rapaz com o cabelo refulgente feito prata entrelaçado com fios de ouro e usava uma túnica azul-céu; Helena também estava lá, usando um belo vestido de modelo atípico aos que ele via as outras jovens usando: era largo, sem mangas e com gola alta, azul lago com faixas prateadas, e os cabelos dourados estavam soltos e enfeitados com estrelas de prata; o rapaz ao seu lado era quem ele vira guiando Thorn; era parecido com Véäio, talvez mais velho em aparência, o cabelo preso numa longa trança e usando uma túnica azul-marinho com bordados dourados.

Sentiu Thorn unir sua mente à dele, fazendo o Cavaleiro sentir um alívio ao ter certeza que não estava sozinho que até ele estranhou; não tinha idéia que estava tão nervoso.

Calma, Murtagh. Eles são um bom povo, não acontecera nada indesejado. O dragão procurou transmitir-lhe segurança, mas o Cavaleiro percebia que o dragão estava achando a situação engraçada.

Eu estou calmo. Respondeu enquanto acompanhava Véäio e Mïhëan para a mesa circular.

E eu sou o rei da Alagaësia... Devolveu Thorn, sarcástico. Murtagh bufou levemente, acomodando-se nas almofadas entre Véäio e Mïhëan, que ficara de pé. As almofadas eram mas confortáveis do que qualquer banco ou cadeira, mesmo as acolchoadas.

Onde você está, afinal? Perguntou, dando o assunto se estava ou não nervoso por encerrado. Thorn riu levemente antes de responder.

No topo da cidade. Acabei de voltar da caçada. Os veados são gordos e muito saborosos, além de rápidos... Pelo tom de voz, o Cavaleiro quase pode ver o dragão lambendo os beiços ao lembrar-se da refeição de pouco tempo atrás. Esse pensamento fez surgir um sorriso leve nos lábios do rapaz. Agora, aproveite, relaxe e descubra mais sobre esse povo... Thorn retirou-se da mente do Cavaleiro com um longo bocejo, deixando o rapaz a observar melhor a situação.

Os pratos eram de cerâmica, prateados com delicadas flores vermelhas com uma fina teia de amarelo ouro nas pétalas desenhadas nas bordas, brilhantes como prata. Havia cálices de prata com fios de ouro e rubis enfeitando-os, e os talheres também eram de prata, com os cabos finamente decorados. Flores vermelhas como fogo com finas teias de dourado e de pétalas longas e apontadas para cima, em tamanhos diferentes, formando um cone, num vaso pequeno. A impressão era que se tratava de uma chama viva, e o cheiro que exalavam era como o de eucalipto queimando. Todas as mesas estavam arrumadas daquele jeito.

Mïhëan serviu uma estranha bebida de coloração de um vermelho vívido misturado com um prata reluzente num dos cálices. Pegou-os entre as mãos e sorriu para seu povo, erguendo o cálice no alto.

- Hoje é uma ocasião especial! Resgatamos um Cavaleiro de Dragão, um Cavaleiro de nossos queridos e velhos amigos Dragões! – todos soltaram uma espécie de grunhido de aprovação, enquanto Helena expandia suas guelras. – Não sei o que Galbatorix pretendia, nem sei tudo o que ele fez, mas sei que existe muito ódio e muita tristeza em seu palácio e em seu reino, e, principalmente: todos nós somos livres para decidirmos à quem devemos juramentos e à quem não devemos! Ninguém nesse mundo, principalmente Dragões, nascidos para serem criaturas livres e predadoras, não cativos e mansos como o filhote de gato ou cachorro que brincam com as crianças humanas, deveria jurar lealdade à alguém contra sua vontade! – dessa vez, a manifestação do povo foi maior. As mulheres soltaram um som uníssono que era como um ronrono, e os homens expuseram os dentes afiados num gesto um tanto animalesco. – Nós vamos comemorar, meu povo! Deve ser comemorado! Ambrósia foi preparada, Povo do Vento! Que nosso pai Länie continue à nos proteger e nossa mãe Miën à nos abençoar! – bebeu um gole da bebida, soltando uma espécie de uivo em direção ao vento que foi seguido por todo o Povo do Vento e inclusive Helena, ato que assustou um pouco o Cavaleiro.

Em seguida, a rainha acomodou-se nas almofadas e todos começaram a servir-se da bebida. Não demorou, crianças de cerca doze anos surgiram no espaço aberto e serviram à todos, primeiro os que estavam nas mesas retangulares, depois a circular, todas com um sorriso encantador, trajando túnicas pratas com medalhões com um rubi cada e um véu prateado cobrindo os cabelos. Achou um costume interessante, as crianças servirem os adultos. Todas sorriam quando serviram travessas de um estranho prato. Era uma espécie de massa em fios longos com um estranho molho vermelho com carne aparentemente moída. Havia ainda travessas de saladas coloridas com os mais diversos legumes e verduras e carne de cervo, javali e outras assadas.

Imediatamente serviu-se da estranha massa. Parecia um prato muito apreciado considerando a quantidade de pessoas que serviram-se dela. Logo em seguida serviu a bebida num cálice. Pegaria a carne depois.

Provou a comida, e achou deliciosa. A massa era salgada, e o molho com carne dava um sabor à mais.

- Como é o nome dessa comida? – perguntou à Mïhëan, curioso. Ela sorriu antes de responder, terminando de mastigar e engolir.

- Os Geifan chamam de “hoile”, não conseguimos traduzir para a nossa língua. É uma criação deles, sabe. Como a caça é excassa na Elemë e o solo não é muito fértil, eles tinham que fazer a comida render. Hoje, é um dos pratos mais apreciados desse lado de Du Werldenvarden por praticamente todos os países. – comeu mais um pouco, diante de um pensativo Murtagh.

Em seguida, esperimentou a bebida que eles chamavam de Ambrósia.

O sabor era estranho. Tocava os lábios, fresca como prata, e descia pela garganta, quente como fogo. Enquanto na boca, o sabor alternava entre um doce e suave mel, um azedo levemente adoçado de frutas e alguma outra fruta doce que ele não identificou. Sentiu, imediatamente, um enorme calor e uma grande energia invadindo-o e o aquecendo. Sua face se avermelhou com o efeito da bebida, e então sentiu Mïhëan segurar seu braço. Ela sorria suavemente, as bochechas do rosto também levemente avermelhadas com a bebida, com carne de cervo no prato.

- O que achou da bebida? – Ela perguntou, inclinando-se em sua direção para que conseguissem se ouvir, devido ao alto barulho das conversas do povo e canções que as crianças cantavam depois de servirem o jantar, sentadas num grupo reunido à frente da mesa circular.

- Deliciosa... Do que é feita? – expressou sua curiosidade, também se inclinando em direção à rainha.

- Flor de Fogo, flor de Gelo, mel, frutas cítricas e um pouco de magia... – sorriu ao explicar, parecendo estranhamente bêbada. – É típica de nosso país e usada em meio à batalhas porque dá energia e força à meu povo. – voltou à posição inicial, recomeçando à comer.

Murtagh também voltou a comer, perguntando-se quais seriam essas flores, Flor de Fogo e Flor de Gelo. Nunca vira ou ouvira falar sobre tais flores.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado *-*
Deixem um review sincero sobre o que acharam ;D
Beijos



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