Silêncio do Olhar escrita por Dumpling


Capítulo 13
Mais perto de ti




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Eu nem tempo tenho a perder. Tenho de perder tempo; Para pôr tudo em ordem e tirar tanto que não entendo da cabeça… há algo que bate mais forte que os martelos da construção da casa ao lado. Mas não é o juízo, não é a impaciência…

É algo que há muito teimo em não querer entender. Chama-se Compaixão. Alvoroço que vem aqui, dentro desta cabeça, ao tentar entender porque não existe em mim mais amor… por mim mesma. Pelos anos perdidos, escassos a tentar infundamente não perder o juízo… A tentar encontrar o X no mapa do tesouro…. O mapa que nos guia à felicidade. Será que ele existe? Será que se perdeu à anos atrás nas minhas mãos, que outrora agarravam a vida, e agora só agarram a cabeça nos balanceios inesperados, a pensar neste parque?

Assumi-me numa presença única da Natureza… e ainda mais… nos risos felizes do ser mais puro do Universo. Naquele parque. Era a melodia mais agradável possível, e os pensamentos ressoavam mais positivos. Afastavam-me da casa que não era um lar. Do Mundo horrível. Das mãos dele, mal lavadas pela inveja, pelo ciúme.

Já havia um mês que eu ficava ali naquele parque infantil apenas a pensar. Eram sentimentos negativos a libertar-se no vento e a ir para longe… bem longe. O Seiya continuava a insistir. Falava todos os dias do mesmo, até em momentos que me magoada. Queria um bebé que eu não desejava… não assim. Todos os dias olho as crianças e sinto-me triste… não consigo, não suporto a ideia de que um dia vou ter de lhe ceder ainda que não seja fácil…

Então ele surgiu de novo na minha cabeça. Darien. Não havia dia em que eu não pensasse nele e, muitas vezes, eu via-o passar ali perto, a casa dele era na rua ao lado.

Uma criança que se distinguia das demais pelo cabelo raro (cor-de-rosa) aproximou-se de mim e sentou-se. Aparentava uns 4 anos, mas assim que começou a falar comigo, mudei de ideias quanto à sua idade.

- Não achas que está na hora de parares de vir aqui chorar? Porque não enfrentas a real?

Comecei a rir. Afinal, parecia a minha consciência a falar e não uma criança que ostentava estar mais do que na flor da idade. Mas cedi. Apesar de que eu não querer acreditar que era a criança a falar mas sim a minha cabeça, a minha consciência a querer anuir à minha loucura.

- Eu venho porque me sinto miserável. E para absorver esses sentimentos bem no fundo da minha mente… ao ouvir esta melodia, sinto-me com forças para continuar a viver, e não a ir-me abaixo como tem sido sempre.

- Mas mã- Serena. Tu sabes que a única maneira de te sentires tu mesma é com ele.

- Com ele? – Confundi-me no momento… então mas ele quem? Se era a minha consciência a falar, porque não tinha noção desse ele? – De quem estás a falar?

- Duh… Às vezes és um pouco lenta. Do Darien!

- Ora o Darien faz parte do passado. – Virei a cabeça para o lado oposto a ela – já nada faz sentido com ele como há anos atrás. Seria loucura… E se é como o Seiya diz, que ele é que desistiu de mim… E os sentimentos desaparecem depois de muitos anos. É impossível ele sentir o mesmo, certo?

Mas não recebi resposta. Voltei-me e ela já ali não estava. Afinal, era mesmo fruto da minha imaginação… mesmo assim, levantei-me e procurei com a cabeça. Mas nada da menina dos cabelos rosa e olhos vermelhos. Sentei-me de novo, esfreguei os olhos e ri-me. Estava a perder o juízo que há muito tentava manter.

- Olá Rena… – Era ele. Levantei a cabeça e confirmei. – Posso-me sentar?

- C-c-claro!

Ficou mais perto e os olhos ainda mais azuis com a luz do pôr-do-sol fluíam com o vento, eram ainda mais atraentes quando me encaravam… Eram… enternecedores. Entravam por mim adentro e enchiam-me de coisas maravilhosas e surpreendentes, jamais experimentadas. Uma espécie de calor… de emoção… de energia… num estado único.

- O que fazes aqui sozinha?

- Nem eu mesma sei se queres que te diga… Ahh… Sinto raiva de mim mesma. Queria estar a pensar, mas por muito que o faça, não chego a conclusão nenhuma. E odeio-me por isso.

- Então mas, tens amigas Serena. Sempre contaste com elas, porque não o fazes agora? É escusado sentires tudo isso e guardares só para ti. Sofres mais.

- Se tinha amigas não me lembro – suspirei longamente por ser algo que também não memorava e isso fazia-me desesperar – ainda não recuperei algumas recordações. Além disso, não poderia passar muito tempo com elas…

Tapei a boca no momento em que percebi o que tinha dito e não devia. Ele saberia que eu não poderia por causa do Seiya.

- Não entendo como continuas a viver nesse inferno. Nenhuma mulher merece, muito menos tu Rena.

Suspirei longamente. E fizemos silêncio durante um curto tempo mas que a mim me pareceu uma eternidade. Parecia, no entanto, que aquele silêncio dizia tudo um pouco sobre nós; que havia um feitiço escondido debaixo das nossas pálpebras e que ao nos enxergármos, sabíamos que havia algo mais forte além das palavras, reinava um sentimento estranho, que mudava de quente para frio e causava arrepios além da derme, e bem mais além do bater forte do coração.

- Tu sabes… - ele continuou. – Foste a única na minha vida. Tentei, admito, tentei ter outra pessoa. Mas nenhuma me fazia esquecer-te. És simplesmente única. E estares com um homem assim...

- Darien – tentei interromper.

- Não. Deixa-me terminar. Estás sempre a fugir de mim e das minhas palavras. Ouve, nós temos um passado em comum demasiado forte, eu sei que não te recordas, mas é um passado bem além dos teus 16 anos. Eras a última pessoa do Mundo a merecer um homem que te trate mal, e ele é um idiota e tu uma princesa escondida no muro que ele te obriga a fazer à tua volta. Deixa-me destruir esse muro… Rena…

Começou a chover intensamente enquanto escurecia, entrando em sincronia com as minhas lágrimas. Tentei fugir dali, do que queria evitar. Os passos descompassados e sem certezas do que realmente queria… e então a terra batida agora molhada fez-me cair.

Senti os braços dele em meu torno a levantarem-me.

- Anda comigo.

E levou-me em silêncio para o apartamento dele. Ao abrir a porta, observei melhor que da última vez em que fugira dali. A decoração perfeitamente composta, nem um único lugar desarrumado, aquela fragrância que lhe pertencia e me era familiar.

Levou-me para o quarto, indicando-me a casa de banho e dizendo-me para tirar a roupa que tinha suja, tomar um banho e usar a que tinha na segunda gaveta de um armário perto da janela do quarto e depois saiu.

Após o banho, coloquei a roupa no chão embrulhada, dirigi-me ao quarto e observei-o. Ao virar-me para trás, quase levei um susto óbvio. Sob um sofá oposto da cama havia um retrato enorme… nosso. Abraçava-me por trás e contornava a sua face pelo meu ombro, as mãos enlaçadas, o sorriso…

Não… não queria pensar naquilo.

Desviei o olhar e abanei a cabeça em tom de esquecimento, suspirando. Não sabia o porquê de ele manter aquilo ali… Depois fui até à gaveta que ele me havia indicado.

Roupas… minhas. Uma gaveta enorme, cheia de camisolas, calças, vestidos, … perfeitamente arrumados. Coloquei um dos vestidos de Inverno e, ao ver-me no espelho, parecia ver o reflexo de uma menina de 16 anos com dois odangos os quais nunca mais usara. Abstraí-me dos meus pensamentos quando ele bateu à porta, e disse-lhe que podia entrar.

Quando me olhou, eu sabia que ele tinha visto o mesmo que eu tinha acabado de ver no espelho. Notei um sorriso distraído nele.

- Estás linda, aliás, estás sempre…

Raio de coração descompassado.

- Obrigada – senti as bochechas a ferver e sorri de volta, olhei então de novo para o retrato, apontando – eu tinha que idade?

- 15. Tirámo-la no dia dos namorados, não te lembras da tua prenda nesse dia?

- Desculpa… lembro pouca coisa.

- Não peças desculpa, não é fácil. Só pensei que por a teres vestida tivesses recordado.

O vestido… não lembrei que o tinha recebido dele e numa época especial. Segui os seus passos com o olhar enquanto ele apanhava a roupa que eu esquecera distraidamente no chão, e depois olhou a foto de novo.

- O teu olhar mudou. Ele brilhava a todo o momento, e não era por lágrimas… eras sempre alegre. Quando estavas mais em baixo, confusa, irritada… fosse o que fosse… Eu reconhecia-o no teu olhar, foi sempre a minha maneira de entender as tuas expressões. Agora não consigo. – Depois apenas olhou para mim uns 5 segundos - Bem… esquece… Fiz café, vai acabar por arrefecer.

Sentámo-nos na sala em silêncio. Só conseguia pensar no que ele tinha dito. Pensava que nunca ninguém me entendera, ninguém cuidava e se lembrava de mim… E afinal, ele até pelo meu olhar distinguia os meus sentimentos.

Sentia que era estranho depois de anos a imaginar-me só num Mundo descabido e inquieto. Havia verdades inconvenientes, mas eu tinha-me certificado que a realidade que eu sentia era inegável: ninguém queria saber, e eu tinha de lidar com tudo com o meu próprio ritmo.

Depois de um tempo, levantou-se, tirou algo de uma gaveta e voltou a sentar-se. Abriu um álbum e foi-me mostrando fotos de quando estávamos juntos.

Era um álbum só com fotos nossas.

Parei então numa página. E ficámos os dois em silêncio, mesmo ele que falava de cada foto que ia passando.

Era num parque, estávamos debaixo de uma árvore abraçados.

- Ah… Foi no dia em que te pedi em casamento. O Andrew ia-me buscar, tínhamos uma urgência, mas antes de irmos ele fotografou, apanhou-nos assim e ficou escondido. Nunca te cheguei a puder dizer…

Baixou a cabeça triste e olhei-o durante um tempo e depois olhou bem no fundo dos meus olhos. Parecia querer chorar. Não sabia o que fazer, então abracei-o numa tentativa de o acalmar e ele abraçou-me ainda mais forte. Escutava as batidas aceleradas do seu coração em compasso com o meu.

Ergueu a cabeça e olhou me com mais intensidade que anteriormente… e beijou-me. Não resisti ao acariciar-lhe os cabelos e a render-me à necessidade que tinha de sentir amor... Mas depois veio o Seiya à minha mente e afastei-me, não dele, mas apenas do beijo, encostando a minha testa com a dele, surgiam lágrimas sem perceber bem o porquê.

- Eu não posso Darien… não posso…

- Podes Rena. Sinto tanto a tua falta… Amo-te tanto. Sem ti não consigo ser feliz. Não te posso perder de novo... Contigo aqui, vai doer mais do que na primeira vez…

Continuámos assim. Com a respiração a dar encontrões no intervalo das nossas bocas, sentia-o quente. Com os olhos a brilhar mais que antes. Desesperada, voltámos ao beijo. Sem aguentar mais a falta um do outro, e neste turno sem pensar em nada…

Pegou-me ao colo pelos quadris e levou-me nos braços sem parar o beijo até ao quarto. Sabia que me tinha já sentido assim… mas nunca com o Seiya. Raios… não conseguia parar de pensar… Ele era bruto, o Darien pegava-me com carinho.

Deitou-me, acariciando-me os cabelos. E aí fui eu que não suportei mais aquele desejo entre nós. Fui despindo-o com uma pontinha de loucura e ele fazia o mesmo, com o rosto molhado de lágrimas, que sentia serem da falta de nós.

Dizia o meu nome num sussurro enquanto passava os lábios por todo o meu corpo. E logo envolvemo-nos com aquele misto de sensações novamente. Estranho, suave e brevemente fugaz.

O cheiro dele era extasiante e fazia-me sentir única... Sentia o amor e a calma que ele me transmitia.

Depois, fez-me deitar sob o seu peito dando-me festas no cabelo até adormecer.

Continua


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