Verdade e Consequências escrita por Lara Boger


Capítulo 5
A Despedida


Notas iniciais do capítulo

Neste capítulo acontece o desdobramento da conversa em que Jin descobre a doença do filho.



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Foi como se uma bomba explodisse. Os olhos de Jin arregalaram-se de susto, e toda a fisionomia de tranqüilidade foi por terra.

- Mas... mas como?! – perguntou, incrédulo – Não pode ser, isto só pode estar errado. Vocês cometeram um erro.– disse, olhando em volta – Quero falar com meu filho. – quis levantar, mas Baxter não deixou. – Eu preciso falar com ele!

- Ele queria estar aqui, Sr. Park. Ele pediu, mas não deixei. O garoto estava preocupado com a sua reação, mas não achei conveniente que ele participasse disso. Ver o senhor assim, não vai fazer nenhum bem.

Sentou-se novamente, tentando se acalmar, acatando o pedido dos dois enquanto sentia os olhos marejando.

- Então, Adam sabe... como ele reagiu?

- Reagiu bem, de forma calma.

- E como ele está agora?

- Está driblando os sintomas, preocupado com a sua reação. Está de repouso, só assistindo os treinos, e quando quer. Não está tomando remédios, e o mantemos sob vigilância constante mas é imprescindível que o tratamento comece o quanto antes. – hesitou, por ser mais uma parte da notícia – Os médicos disseram que a doença está num estágio avançado.

Viram-no engasgar, mas logo tentando voltar a um tom de voz normal. A digestão de tantos problemas não era nada fácil, ainda mais envolvendo doenças. Baxter odiava demonstrações de emoção porque simplesmente não faziam parte do duro cotidiano daquele ginásio... mas não se importou com aquilo, não dessa vez. Era justo que fosse assim, afinal era filho dele, além da descoberta de uma doença grave. Não devia ser nada fácil. Lembrava de quando Jin Park viera pela primeira vez, preocupado em saber se a proposta de treinamento era séria, se o ginásio oferecia condições. Estava acostumado a este tipo de coisa apesar de achar inconveniente, mas era normal: era um pai preocupado, assim como agora só que com motivos muito maiores pra isso.

- Tudo bem, eu vou me acalmar. Depois quero vê-lo.

- Como quiser, Sr. Park. O que queremos é fazer com que isso seja o mais suave possível.

- Agradeço pela preocupação. – respirou fundo, aceitando um copo d´água com açúcar que lhe ofereceram, esforçando-se para estar calmo e fazer as perguntas adequadas – Que sintomas são esses que o senhor disse?

Fora do escritório. Área de treinamento.

Adam permanecia ali, nervoso. Sentia o corpo tremer levemente, mas não sabia se era frio ou nervosismo. Queria estar no escritório, tentar dar ele mesmo a notícia mas sabia que nunca lhe deixariam fazer isso. Era horrível ter de pensar no que estava acontecendo lá dentro e em porque estavam demorando tanto.

Sentiu algo escorrer pelo nariz. Nem precisou de muito esforço para saber o que era, pois já lidava com isso há algum tempo. Um tempo considerável, e algo que foi difícil esconder, mas que agora já não era mais necessário. Então, como os lenços de papel não estavam mais dando conta, resolveu ir ao vestiário.

Lavou o rosto, deixando que água fria tentasse reanimá-lo. Não imaginava que pudesse dar certo, mas era melhor que estar à mercê sem tentar o mínimo de reação.

Levantou a cabeça. Olhou para o espelho, mas sentiu que havia mais alguém ali. Vira um vulto, de relance: qualidades de ranger que ainda não perdera, e talvez nem perdesse pois no fim era útil onde estava... embora talvez não o fosse mais.

Olhou para o lado e quem viu foi o pai.

Não houve palavras. Um olhava para o outro num momento que pareceu longo e pesado. Um não sabia o que dizer ao outro. Talvez no fim nem houvesse o que dizer.

- Oi, pai. – disse, Adam, tomando a responsabilidade de quebrar o silêncio.

- Oi,como você está?

- Bem. – arrependeu-se depois, achando que não era a palavra mais adequada – Indo. Como foi a viagem?

- Rápida, viagem de avião, você sabe.

- Não pensei que viria tão rápido.

- Pediram que eu viesse o mais rápido possível e não vi razões para demorar mais. – fez uma pausa procurando mais a dizer. – Você emagreceu.

- Um pouco. O ritmo aqui é bastante puxado.

Poucas palavras, poucos assuntos. Jin pouco sabia o que dizer ao filho. Era uma situação muito embaraçosa. Adam percebeu, e tentou diminuir o constrangimento.

- Acho que o vestiário não é o melhor lugar pra uma conversa.

- Tem razão, mas ainda teremos muito tempo pra isso.

Adam concordou. Ambos saíram do vestiário, voltando a área de treinamento.

- Filho, você tem muita coisa pra arrumar?

- A mesma mala que eu trouxe.

- Se pudesse se organizar seria bom. A viagem vai ser longa e eu vou resolver algumas coisas com Baxter.

- Certo, posso me preparar agora.

Afastou-se, tomando o corredor em direção ao alojamentos, deixando seu pai com as pendências burocráticas. Ao chegar, abriu o pequeno armário e pegou sua mala, que estava dobrada em um canto, colocando-a sobre a cama. Pegou suas roupas e guardou-as de modo organizado. Depois foi a vez dos livros e dos CDs. Não era muita coisa: seus objetos pessoais eram os mesmos desde os quase seis meses antes: muito pouco fora acrescentado porque pouco saíra durante este tempo. As regras de Gregory Baxter eram inflexíveis e Adam nunca as tinha quebrado. Era disciplinado o suficiente para isso, não queria desperdiçar o futuro brilhante que lhe alardeavam... mas agora este futuro tinha mudado.

Não se lamentaria por causa disso, afinal fora o responsável, era sua culpa. Não tinha o direito de reclamar.

Fechou a mala, deixando assim seu armário vazio. Antes de sair deu uma boa olhada no seu pequeno alojamento.Um lugar estranho... talvez um dia se perguntasse como agüentou estar um lugar daqueles, com tantas regras e tão austero por tanto tempo. Tudo bem que soubesse de seu estoicismo, mas não o quanto seus limites poderiam ser flexíveis, mesmo que a maior prova de fogo ainda estivesse por vir.

Voltou ao corredor. Não tinha pressa mas seus poucos passos levaram-no rapidamente de volta ao ginásio. Encontrou Dovner no caminho, espiando o treino.

- Seu pai está com Baxter, acertando sua saída.

- Eu sei.– fez uma pausa, colocando a mala no chão – Como foi no escritório?

- Está perguntando como foi contar tudo? Difícil... nunca tive que dar uma notícia dessas antes.

- Como ele reagiu?

- Como um pai reagiria, creio eu. Dê um desconto a ele hoje ou pelo menos até que seu pai possa organizar as idéias.

Concordou. Já imaginava algo parecido, sabia que teria de relevar muita coisa pois percebera que a notícia ainda não fora digerida. Imaginava o quanto a viagem para Alameda dos Anjos seria tumultuada, mas infelizmente não poderia evitar que acontecesse.

- Pelo que estou vendo vai embora em questão de minutos. – referiu-se a mala.

- Ele pediu que eu me preparasse. Acho que fui rápido demais.

- Por que não aproveita pra se despedir dos seus amigos? Eles não sabem que você vai embora.

- Boa idéia. Ainda tem tempo.

E assim fez. Afastou-se indo em direção ao tatame. Sequer foi preciso entrar no assunto porque houve curiosidade geral quanto a sua mala.

- Pra onde vai, Park?

- Viajar? Vai dar um passeio?

- Por acaso desistiu? – perguntou um, irônico.

Respondeu as perguntas da forma mais paciente possível, controlando seu vocabulário para não dar uma má resposta.

- Vou voltar pra casa. Estou doente, preciso me tratar.

- Mas o que você tem?

- Leucemia.

Bastou aquilo para que certos tons mudassem. O espanto foi geralmas a reação era esperada. Falou muito pouco, apenas respondendo perguntas porque a ansiedade em falar e se despedir da parte deles foi tão forte que pouco poderia fazer. Sabia que alguns ali não eram sinceros, mas era uma minoria pois mesmo que ali todos estivessem numa competição acirrada por poucas vagas, ainda conseguira fazer amigos.

Quando seu pai e o treinador saíram do escritório ainda presenciaram um pouco da cena. Não muito, mas o suficiente. Nas mãos, vários envelopes com exames, documentos e outros papéis.

- Uma pena que as coisas tenham acontecido assim, Sr. Park. Seu filho é um dos meus melhores atletas.

Jin não respondeu, apenas continuou olhando para aquele grupo, se despedindo efusivamente. Quando finalmente saiu da roda, Adam deparou-se com os olhos inquisidores e cheios de expectativa. Um rápido aceno foi a última despedida para os amigos.

Baxter e Dovner levaram-nos até a saída. Ambos pareciam constrangidos. Sorte que seria a última vez que teriam de passar por isso.

- Se cuida, garoto. Depois que você se curar, e quiser voltar a treinar, o ginásio vai estar de portas abertas pra você. – disse Baxter, numa de suas palavras gentis. Eram poucas, e Adam soube reconhecê-las, sorrindo.

- Força aí, garoto. Você vai precisar. – disse Dovner, com alguma convicção.

Adam agradeceu. Trocaram ainda algumas poucas palavras, e enquanto isso viu seu pai guardar sua mala no banco traseiro. Despediram-se. Ainda acenou uma última vez, antes do carro sumir pela estrada.


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Notas finais do capítulo

Reviews... pleaseee!!!!



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