From Me To You escrita por Estel


Capítulo 9
Capítulo 9 - Desgraçado.




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/101328/chapter/9

Não vou bancar o forte e dizer que depois da conversa com a Yamamoto-san me recobrei totalmente. Na verdade, nunca pensei que fosse tão difícil lidar com dor de cotovelo. Às vezes tinha recaídas e ficava completamente alheio ao que acontecia à minha volta, absorto em alguma lembrança com Sakura que há muito estava esquecida em alguma gaveta obscura dos meus arquivos mentais. Mas em geral eu agia como o de costume. Trabalhava, comia, até mesmo ia algumas vezes ao Black Soul. O problema é que depois de algumas doses o Harada acabava sendo o meu ouvinte involuntário, com desabafos entrecortados por soluços e choros. Passei a dever-lhe não algumas, mas muitas.

                Nem como playboy eu servia mais.

                Passei a evitar bancas de jornal. O Midnight Sun estava realmente fazendo sucesso e o rosto do vocalista estava estampado em todas aquelas revistas de adolescentes, e só o vislumbre do olhar azul atiçava a minha mente a imaginar meio desgostoso aquela mão que não era a minha roçar na pele macia que eu lembrava remotamente da adolescência. Era a pior tortura que eu poderia um dia imaginar.

                Eu sinceramente pensei que depois da minha monumental derrota o Destino ia me deixar um pouco em paz e assim eu poderia finalmente seguir com a minha vidinha medíocre. Estava me preparando mentalmente para seguir adiante, me casar com alguma filhinha e administrar a herança da minha família. Viveria numa casa grande e moderna, mesmo não precisando de tanto espaço. Teria dois ou três filhos, não necessariamente correndo pela casa, porque crianças ricas são um saco e cruéis, mas estudariam na escola mais cara e teriam tudo o que queriam. Já podia até mesmo me ver um senhor de meia-idade, com a minha mulher elegante, mas temperamental ao lado, se gabando da prosperidade da família Li.

                É óbvio que não foi bem assim. O Destino é um cara cruel, gosta de chutar o inimigo já caído no chão. Acertou onde bem mais dói. Filho da puta.

                Como fazia parte da minha rotina, fui tomar café na esquina. Estava infernalmente cheio para uma quarta-feira. Para qualquer dia da semana, aliás. Mas por algum intermédio divino consegui achar uma mesa vazia, então segui em sua direção.

                Mas por castigo desse mesmo divino (ou demoníaco), Sakura também teve a mesma idéia. Sabe-se lá o que ela fazia justamente na minha área.

                O que eu posso dizer? Era claramente uma provocação do Destino, quase uma ofensa à minha pessoa. Juro que o processo qualquer dia desses por danos morais. Que ele se prepare, meus advogados são realmente muito bons.

                - Ah. Você. – adoro esse carinho latente com o qual ela se refere a mim.

                - Hum, é, sou eu – silêncio sepulcral. O choque não me permitiu formular uma resposta melhor, ou no mínimo decente. Tentei consertar com um certo cavalheirismo – Olha, pode se sentar. Eu tomo meu café no caminho – e me virei para ir embora. Não queria me prolongar muito naquela situação desagradável.

                - Er, espera! Não precisa ir – me virei em meio ao choque – pode se sentar comigo. Na verdade, queria já há algum tempo falar com você.

                Congelei, olhando atônito para aquele rosto desconfortável. Ela, que antes não queria nem ver a minha cara, agora quer falar comigo? Estranho era pouco, se quer saber a minha opinião.

                - Certo...? – e me sentei à sua frente.

                Era perturbador. Eu nem conseguia entender como eu me metera naquilo. Não era eu quem há algum tempo atrás tentava a qualquer custo falar com ela? E no momento, quando finalmente consegui o que queria, não tinha a menor idéia do que fazer ou falar. Nem Sakura, que provavelmente também amaldiçoava o momento em que atravessou a porta da cafeteria.

                - Então... – qualquer coisa para quebrar o gelo – tudo bem com você?

                - Quê? Ah, sim. Tudo beleza – Sakura pareceu acordar de seus devaneios.

                - Que bom...

                Silêncio de novo. Estava virando a nossa especialidade.

                Sakura tomou um gole de seu café e limpou a garganta. Me preparei para o que viria a seguir.

                - É engraçado como temos nos esbarrado tanto ultimamente – pois é, né – Parece até que tem alguém planejando tudo – mais um gole no café. Por alguma razão, fiquei um pouco irritado com a risada nervosa que ela soltou, enquanto colocava uma mecha de cabelo atrás da orelha.

                - Sakura, vamos acabar logo com isso. Nós dois sabemos o quanto você me detesta. Não precisa tentar ser agradável.

                Me arrependi no momento em que vi o rosto ligeiramente magoado dela. Mas me lembrei de quem na verdade estava ferido ali. Consegui então controlar a minha expressão facial, sem deixar transparecer nada.

                - Bem, não é exatamente verdade. Eu não te detesto – falou baixinho. Foi a minha vez de rir, mas de sarcasmo.

                - Aham. Dá pra ver.

                - Syaoran, você pode não acreditar, mas eu realmente não te odeio. Na verdade, eu queria te pedir desculpas. Eu tenho agido muito mal com você.

                Certo. Isso realmente me irritou. Muito mesmo. Para ela era muito fácil me tratar feito lixo sem nenhuma explicação e depois pedir desculpas, como se isso fosse o suficiente para apagar os momentos em que eu tentava desesperadamente entender o porquê daquilo, revendo cada momento da minha vida, procurando algum erro que pudesse tê-la ofendido tanto. Ela simplesmente não tinha noção do que estava me pedindo. Mesmo se eu esquecesse tudo e a perdoasse, de que adiantaria? Isso não a faria largar seu namoradinho rockstar, não mesmo. Não, eu seria apenas um figurante inexpressivo na vida dela e que tinha benevolentemente tirado um peso de sua consciência. Que ao menos ela se lembrasse de mim com culpa, não como um amiguinho legal e atencioso sem importância. Pelo menos sentiria uma fraçãozinha da dor que eu senti.

                E pela primeira vez eu a odiei de todo o coração, e tudo o que ela representava. E amaldiçoei cada respiração sua. Minha vida seria infinitamente mais fácil e feliz se ela nunca tivesse existido.

                Queria ter falado tudo o que passou pela minha cabeça naquele momento e expurgá-la da minha vida para sempre, dos meus pensamentos, do meu coração.  De sua maldita influência sobre mim, mesmo depois de anos de frieza cruel.

                Mas não. Minha covardia falou mais alto. E me odiei ainda mais, pois se ela tinha poder sobre mim, a culpa era minha, não dela, e meu ódio por ela se abrandou.

                Olhei para ela. E meu ódio desapareceu. Seu rosto estava vermelho, e eu sabia muito bem que ela estava segurando o choro. A maldita me fez amá-la ainda mais.

                Respirei fundo. Não queria que ela chorasse, então controlei a minha voz. 

                - Por que eu faria isso?

                - Eu sei que não existe nenhum motivo pra você me perdoar. Mas eu tenho pensado muito. Foi totalmente infantil a forma como eu tenho te tratado, e eu nem quero e posso continuar agindo assim. Eu errei feio, e por motivos idiotas. E justamente com você – a voz de Sakura nessa hora ficou embargada – Você foi o meu melhor amigo!

                - Não é verdade – respondi baixinho – você tem a Daidouji.

                Sakura sacudia a cabeça freneticamente, enquanto lágrimas escorriam pelo seu rosto. Eu sentia o meu coração ficar cada vez menor e mais pesado.

                - Não, é diferente! Ela é minha prima. Mas você foi o melhor amigo que eu já fiz. Mas eu agi que nem uma vaca, e você nem sabia o porquê.

                Minha mente era uma espessa névoa cinzenta, impenetrável. Eu não raciocinava mais. Meu café já estava mais frio que gelo. E Sakura tinha o rosto vermelho e inchado. Só uma coisa passava pela minha cabeça:

                - Então, por que?

                Ela soluçou. Achei que não fosse responder, mas ela começou a falar.

                - Porque eu estava morrendo de ciúmes da Miku Tokumori! Na época ela me ameaçava, falando para eu me afastar de você, que eu estava atrapalhando os planos dela. E eu não podia fazer nada! Você não tem noção de como as garotas podem ser cruéis. Então quando você disse que não via problema em ficar com ela eu pirei, não conseguia acreditar que você nem descartou a possibilidade. E depois você realmente começou a sair com ela...

                Não acreditei. Acabei a cortando.

                - Você tá de brincadeira, né?

                Sakura olhou pra mim assustada, sem entender o que eu disse.

                - O q-que?

                - Por que você não me disse? Eu te perguntei milhares de vezes o que estava acontecendo e você nunca respondia!

                - Claro! O que você poderia fazer? – respondeu com certo desdém.

                - Ia falar pra ela desistir e parar de mexer com você, sei lá! Qualquer coisa, desde que ela parasse! – eu estava muito agitado. Aquilo era ridículo demais para eu entender.

                - Todo mundo ia achar que a gente estava namorando...

                - E daí? Como se isso fosse um problema...

                Sakura parou de chorar. Na verdade, passou a olhar fixamente para mim, com um ar de descrença. Fiquei na defensiva.

                - O quê?

                - É sério isso?

                - Isso o quê?

                - Que você não ligava pro que os outros diriam? – perguntou meio impaciente.

                - Claro que não!

                Sakura soltou um risinho. Parecia mais relaxada enquanto ria para si mesma. Então eu também relaxei e comecei a rir também, sem motivo nenhum.

                - Que bobagem a minha! – ela disse finalmente – Então eu poderia ter evitado essa situação toda!

                - Tem que aprender a confiar mais nos amigos – respondi descontraidamente. Na verdade, eu estava mesmo era meio bobo com o que ela disse. Que tinha ciúmes de mim. Nada mais importava.

                - Verdade, vou anotar isso.

                Ficamos um tempo sem nos falar, rindo de nossas bobagens. Até o ar parecia mais leve. E eu ainda não conseguia acreditar que paramos de nos falar por um motivo besta daqueles, tão juvenil, no sentido ruim da palavra.

                - Então, você me perdoa? – Sakura perguntou de novo, dessa vez sorrindo.

                A resposta era óbvia. Eu não poderia, nem conseguiria responder algo além de um “Claro!”. Sakura enxugou o rosto e disse que não queria mais perder o contato, então trocamos números e depois ela foi embora.

                Enquanto eu seguia com o olhar a sua silhueta sumindo no meio da multidão eu não conseguia acreditar no que tinha acontecido. Era bom demais pra ser verdade. Eu me sentia leve como há tempos não me sentia e parecia que eu era capaz de fazer qualquer coisa, que ninguém me abalaria. Afinal, Sakura sentia ciúmes de mim. O que mais eu poderia querer?

                Mas como tudo que é bom dura pouco, a consciência voltou e eu lembrei de uma coisinha, algo que a Yamamoto-san havia me dito. “Acho que ao invés de “seguir adiante” seria melhor “tentou seguir adiante”. Uma pessoa que conseguiu se desvencilhar de outra completamente não tem receios em vê-la de novo.”

                E eu quase chorei ali mesmo. Porque o ciúme dela era passado, e eu mesmo, o idiota, tinha acabado de fazê-la se desvencilhar de mim. Ela definitivamente tinha seguido adiante.

               Que ela me odiasse para sempre.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Olá, queridos, belê? Tudo suave? HAHA
Desculpe não ter respondi todos os reviews, mas com essa mudança toda no Nyah! acabei me perdendo
Quando a função "reviews não respondidos" voltar eu respondo a todos, inclusive aos reviews seguidos da leitora Lulu2 :B

Quanto à história...
HAHA, eu disse que faria o Syao sofrer (6)
Bem, tá aí. Até fiz a Sakura voltar a falar com ele, olha só.
Ainda bem que eu sei que tenho uma passagem só de ida pro inferno me esperando

Reviews? Hãããã?!