Quam superesse in paradiso escrita por Lara Coimbra


Capítulo 5
A única herdeira e o menino perdido


Notas iniciais do capítulo

Vamos voltar mais uma vez ao passado, quando Mono e Wander nasceram!



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Era a vontade do destino que o príncipe Idwal de Yath se casasse com Sybilla, filha de um marquês importante. Lorde Emon já era líder da Ordem dos Xamãs na época, e foi ele quem oficializou o casamento. Todas as decisões passavam pelo sábio homem, e ele usava de seus dons mediúnicos para garantir que as escolhas certas seriam feitas. É claro que nem tudo podia-se evitar, pois o ser humano é incapaz de controlar o futuro completamente. Já no início do matrimônio, a Rainha Sybilla foi acometida por uma doença, que a deixava muito fraca, na maior parte do tempo. Aconselharam-na a não ter filhos, pois poderia morrer. O Rei Idwal, junto ao lorde Emon, tentou de tudo para curar a esposa porém, sem sucesso. Ela não corria perigo iminente, mas caso engravidasse, seu fim seria certo, e ainda não havia garantias da sobrevivência da criança. 

Por vários anos o casal real viveu conformado com a ideia de não poder ter filhos, e evitavam ao máximo se consultar com os xamãs, para não terem mais más notícias. Entretanto, enquanto Idwal dispensava o aconselhamento da Ordem para assuntos pessoais, Lorde Emon era atormentado por sonhos e visões turvas acerca do soberano e sua companheira. Sybilla morreria dando à luz. O filho do rei traria desgraça à família. Emon sentia um aperto no peito. Algo muito ruim pairava sobre sua mente, impedindo que mais detalhes fossem adquiridos sobre o triste destino que aguardava aquela família e o povo de Yath. Ele deveria ser muito cuidadoso, e faria de tudo para impedir que a macabra profecia se realizasse. Ao menos duas coisas ele já sabia: que não poderia impedir a rainha de conceber, e que não seria capaz de salvá-la. 

A audiência com o rei para revelar as premonições foi muito dolorosa. Ao mesmo tempo em que estava feliz por ter um herdeiro, lamentava pelos dias contados de Sybilla. A mulher, porém, não temia a morte. Ela daria a vida pelo futuro de Yath e permitiu que o destino se cumprisse. Sua gravidez foi celebrada por todo o reino, e ela manteve-se sorridente até o fim. Enquanto todos esperavam um menino, veio a surpresa, Sybilla havia dado à luz a uma menina, e em seus últimos fracos suspiros deu-lhe o nome Mono. Idwal deu adeus à sua esposa, mas foi presenteado com a filha mais linda que alguém pudesse ter. Mono tinha todos os traços de sua mãe, mas os cabelos eram negros como os dele. O rei não teve tempo de chorar pela perda, pois Lorde Emon já o pressionava para tomar atitudes. Novas visões e vozes do além cantavam que o filho do rei viajaria à Terra Proibida, e invocaria uma entidade há muito tempo esquecida. 

Determinado a salvar sua única herdeira de uma cruel trajetória, o soberano ordenou que Mono nunca deixasse as dependências do castelo enquanto fosse viva. A princesa deveria estar sempre acompanhada, e nenhum estranho deveria ter contato com ela sem sua permissão. E no meio desse luto tão sofrido e de uma vontade tão forte de proteger a única coisa que lhe restava, um acontecimento inusitado chocou a corte e a Ordem dos Xamãs. Aproximadamente uma semana depois do nascimento de Mono, guardas do castelo real de Yath encontraram, em uma manhã fria, uma mulher moribunda, caída aos pés dos portões. Ela havia deixado um rastro de sangue, que pode ser investigado somente até uma floresta nas imediações. Assim que a alcançaram ela entregou um monte enrolado em panos velhos, também ensanguentados, aos guardas e a vida deixou seu corpo logo depois. A massa encoberta se mexia e gemia, como um gato raivoso. Este, na verdade, era um bebê, um recém nascido, assim como Mono, e talvez, apenas alguns dias mais novo.

A criança foi levada ao castelo para receber cuidados emergenciais. Idwal não pensou duas vezes: como o pai que acabara de ser, ele não recusaria tratar um ser tão indefeso. O rei sensibilizou-se com a situação do menino. Ele acabara de perder a mãe, e pior que isso - este não tinha pai, não tinha uma casa, não tinha nada. Suas origens eram misteriosas. De onde veio a mulher, deixada para morrer? A pedido do rei, Lorde Emon foi designado para investigar o caso. Nos últimos meses, a Ordem estava tão ocupada com as previsões catastróficas acerca da família do soberano que mal havia se atentado a qualquer outra coisa. A realeza era prioridade, afinal. Antes de ser enterrada em uma vala comum, o xamã passou por todas as casas que pode, perguntando se alguém reconhecia aquela mulher. Ninguém se manifestou. Algo incomodava Lorde Emon, mas ele não sabia exatamente o que era.

Assim que se livrou do corpo, o sábio dirigiu-se ao templo principal da Ordem dos Xamãs e nada o faria esquecer o que vira numa das câmaras. Enforcado por uma corda pendurada no teto da sala de estudos, estava Dom Fahris, fiel discípulo de Emon. Este era membro da ordem desde a adolescência, e tinha muito potencial. Sua sensibilidade para visões era altamente apurada. Emon adotou-o como discípulo há pouco menos de um ano, e pensava em passar sua posição para ele depois de morrer. O que mais pesava entre os outros xamãs era o fato de nenhum ter desconfiado de seu desespero e desejo de morte. Se perguntou se a mente de Fahris era tão poderosa ao ponto de mascarar seus pensamentos de outros xamãs ainda mais experientes. Em seu dormitório foi encontrado um diário. Emon o leu com cautela e pesar. As escrituras diziam: “Dormin há de se levantar novamente!”, “Ele o acordará!”, “A Espada Ancestral existe, e ela está aqui!”.

Lorde Emon chegou a ficar tonto. Seu antecedente direto, Gargal, havia se esforçado tanto para apagar a memória de Dormin e da Espada Ancestral, e de repente, após várias gerações, um segredo confiado apenas aos líderes da Ordem dos Xamãs estava se espalhando entre pessoas que não deveriam saber de nada. Tanto a entidade quanto a espada se transformaram em folclore, qualquer mudança na crença popular poderia desencadear o caos. Pessoas arriscariam suas vidas para encontrar a lâmina, ou se aventurariam em busca das Terras Proibidas, apenas para cometer os erros de um antigo rei ambicioso. Dormin ainda representava um perigo para a paz, e Emon tomaria as atitudes necessárias. Para começar, ele passou várias noites lançando encantamentos e feitiços para proteger seus pensamentos e conhecimentos de xamãs menores. Poucos lordes como ele foram chamados para auxiliar na tarefa de vigiar pessoas ligadas a Dom Fahris, para ter certeza de que estavam seguros. 

Enquanto isso, no castelo de Yath, o Rei Idwal tomava providências para as duas crianças. Mono tinha uma ama de leite, uma senhora larga, que havia acabado de desmamar seu filho mais novo, chamada Hege. Preocupado, ele perguntou se Hege seria capaz de amamentar dois bebês. A mulher aceitou a proposta do rei, que havia decidido adotar o menino. Sua falecida esposa havia lhe dado uma menina, a mais bela de todas. Mesmo assim, Idwal não podia negar que ansiava por um filho varão. Um bebê de origens duvidosas nunca poderia ser nobre sem provas de genealogia. Contudo, nada o impedia de transformá-lo em um futuramente, dando-lhe algum título. Fazer planos para as duas crianças o salvou de cair em desespero e depressão. Mono foi batizada no dia seguinte, em uma celebração xamânica grandiosa. Ele ordenou que Mono herdasse o título de rainha quando morresse, e mesmo ao se casar, no futuro, seu poder seria absoluto e maior que o de seu marido. Uma semana depois, em uma cerimônia mais discreta, o menino encontrado foi abençoado por religiosos menos importantes, e eles lhe deram o nome de Wander.


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Notas finais do capítulo

Queria agradecer muito pelos comentários que recebi esta semana, vocês são demais!



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