Ode às Margaridas escrita por Ahelin


Capítulo 2
II


Notas iniciais do capítulo

Este capítulo pertence à Rodada 2, cujo tema é "Borbulhante".

Boa leitura!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/763517/chapter/2

O aspecto quebradiço das batatinhas da porção não afastou de Agatha a vontade insana que tinha de comê-las. Sob o olhar atento do balconista, ela devorou uma a uma, parando periodicamente para tomar um gole da cerveja logo ao lado.

Após pagar, virou-se e saiu. Sua pele encontrou outra vez o ar frio do pôr-do-sol, um bom refúgio para suas caminhadas vazias. Ali, sozinha, deixou-se levar pelo ritmo dos próprios passos, caminhando quase que a esmo pelas ruas.

Relutava em admitir para si mesma que não queria chegar em casa.

Sem aviso, algo além dela mesma começou a comandar seu trajeto: o gentil arranhar de um violino. O que lhe chamava a atenção, porém, mais do que o som melodioso, era a sensação estranha que este trazia consigo.

Seguiu-o cegamente, com calma, por faixas de pedestre e fachadas de lojas. Pouco lhe importava que estivesse desviando seu caminho, aquela sensação... Agatha tinha uma palavra para ela, mas não conseguia lembrar.

Conforme se aproximava, o som ficava mais claro. Conseguiu distinguir seu emissor no final do quarteirão. Um homem, sentado em seu banco, tocava de olhos fechados. Era um violoncelo, não um violino, como ela pôde confundir?

As notas elevavam-se até os ouvidos da moça e ela podia identificar a alma do homem em cada uma delas. Banhado pelos últimos raios de luz do dia, ele tocava com tanto afinco que comovia um grupo de pessoas a ponto de todas pararem ali para assisti-lo.

Contagiante. O amor dele pelo que tocava era palpável, disperso pelo ar. Paulatinamente, um sorriso se abriu no rosto dela. Contra qualquer expectativa, a paixão do instrumentista tocava-lhe como nada mais conseguia àquela altura.

Moedas choveram em seu estojo aberto, de início numa ruidosa desordem, depois depositadas devagarinho para não perturbar a música.

Para a própria surpresa, Agatha sentia-se bem. A emoção familiar que costumava preencher-lhe o peito voltara como se nunca houvesse desaparecido. Estava completa. Exultante.

Borbulhante. De felicidade, de paixão, de paz.

Ela poderia ter começado a dançar ali mesmo. Deixaria a bolsa no chão, tiraria as sandálias desconfortáveis e rodopiaria sem o menor pudor na calçada. Permitiria que o vestido se esvoaçasse sobre suas pernas, que seu cabelo seguisse o ritmo da brisa fresca do crepúsculo.

As pessoas ali admirariam sua alegria, bateriam palmas para o sorridente rosto sem nome e atirariam suas moedas ao chão.

Mas ela não o fez. Em vez disso, preferiu guardar para si toda aquela euforia, esperando que durasse um pouco mais.

Sabia, agora, do que precisava. Não era de mais tempo na companhia, de mais recitais ou de outra apresentação só sua. Desconfiava, ainda, que sempre soubera.

Enquanto novas pessoas chegavam, ela segurou contra o ombro a alça da bolsa e lançou um sorriso ao músico. Ele, então de olhos abertos, agradeceu com um leve menear de sua cabeça, para logo em seguida perder-se outra vez em seu mundo de melodias.

Sem que a momentânea felicidade lhe deixasse, uma estranha determinação tomou forma em meio a um mar de sentimentos confusos. Sob a influência desta nova força, ela partiu a passos firmes, rumo a um presente que não tentaria mais evitar.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

E aí? Ficou bom?
Eu particularmente gostei desse fjskld
Beijão!