Ode às Margaridas escrita por Ahelin


Capítulo 1
I


Notas iniciais do capítulo

Oi oi oi, este é o capítulo correspondente à Rodada 1 da competição, cujo tema é a seguinte frase da Clarisse Lispector: "Queria saber, depois que se é feliz, o que acontece?"

Boa leitura :3



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Seus braços, envolvidos pelo suave ressoar dos violinos, moviam-se com leveza. Seus pés, quase que por vontade própria, rodopiavam em sincronia com o gracioso martelar das teclas do piano.

Sob a luz, seus olhos lutavam para manter-se abertos, mas unicamente por estética; conhecia a coreografia de cor e o palco como se fosse uma extensão de seu corpo. 

Uma sequência de giros. Um salto perfeito.

O ruído áspero emitido pelas sapatilhas de ponta de Agatha durante sua última pirueta foi tão suave que mal chegou a seus ouvidos.

Expressão neutra, mãos relaxadas, en dehors. A pose final. 

Junto com seu movimento, cessou a música, e assim o teatro foi mergulhado em silêncio. Veio então o primeiro aplauso, que iniciou a tão esperada ovação. Cada hora de ensaio, cada compromisso perdido, cada lesão sofrida e cada dor suportada, todos convergiam naquele momento.

Ela agarrou-se a ele com todas as suas forças. Sentiu-o, em deleite, o quanto pôde. 

Logo, a respiração descompassada de Agatha acalmou-se. As luzes apagaram. A plateia silenciou. Como se nunca tivesse existido, a emoção se extinguiu de seu peito.

Enquanto saía depressa do palco, ela vislumbrou os rostos ansiosos no auditório, esperando pela próxima apresentação. No camarim, apenas calçou seus tênis e pegou a bolsa antes de sair, ainda vestindo o figurino, em direção à noite fria de julho. 

Não esperou a confraternização pós palco dos alunos da companhia. Sorrisos, abraços, congratulações. O que diria a eles? Estava ocupada demais lidando com o próprio vazio. 

Respirou fundo, sentindo a brisa gelada envolver sua pele. Houve um tempo em que apenas o ato de dançar bastava, mas este lhe parecia mais distante a cada recital. 

A caminhada até sua casa não era longa, o que a deixava com ares de eternidade era seu tormento solitário. Agatha ergueu os olhos ao céu nublado, procurando por uma lua que não conseguiu ver. 

— O que você esperava? — ralhou consigo mesma, ainda que sem pronunciá-lo em voz alta. As chaves tilintaram em seus dedos durante a busca pela correta.

Como não obteve uma resposta, entrou. O baque surdo da porta no batente não ocasionou reação alguma, e ela precisou lembrar-se de que não estava sozinha ali. 

As luzes apagadas evidenciavam o contrário, mas ela se arrependeu logo que pensou nisso. Já deveria ter se acostumado. 

Assim que sua visão adaptou-se ao breu, ela olhou a sala em busca de vestígios. Nada. Permitiu-se, então, desabar de joelhos no tapete e perguntar-se mais uma vez:

O que, afinal, ela esperava?

Algo que pudesse perpetuar o que ela sentia enquanto dançava. Algo que desse sentido ao depois, quando este chegasse — e sempre chegava. 

Porque Agatha não se sentia realmente viva a menos que estivesse dançando.

Vasculhou sua mente, procurando por qualquer sentimento. Um palpitar mais forte, tremores nas mãos, qualquer sinal da emoção que lhe preenchera tantos anos antes, na primeira vez em que vestira um par de sapatilhas. 

Com uma risada amarga, ela se desfez das roupas e da maquiagem. Sentia falta da época em que dançar era sua paixão, não seu vício. 


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Notas finais do capítulo

E aí? Diz aí o que achou e aproveita pra me desejar boa sorte pro concurso :3 beijão!