Colors escrita por IVY


Capítulo 7
Chapter seven: White and blue




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/724820/chapter/7

O sol partiu em poucos minutos, deixando a brisa mais fria e úmida. Iria chover mais tarde, novamente, eu sentia isso ou queria que acontecesse, era difícil dizer. Abracei o Senhor Franco e me despedi de Lucian, que apenas assentia com minhas palavras. A garota fazia o mesmo logo atrás de mim, esperando eu dar espaço. Logo seguimos andando com Caleb Hunter, que nos guiou até alguns cavalos que ele mesmo havia escondido no meio da floresta que se seguia ao lado do rio. Eles estavam amarrados nas arvores, um era preto e transparecia ser bravo, outro era banco com algumas manchas pretas, como uma pintura abstrata. O terceiro era completamente cinza.

Caleb Hunter desamarrou as cordas das arvores e as colocou em nossas mãos, eu fiquei com as cordas do cinza e ela ficou com o manchado. Era óbvio que Caleb ficaria com preto, afinal, provavelmente era o único de nós que sabia montar e dominar um cavalo. Eu nunca havia sequer encostado em um, presumi que a garota também não, já que éramos quase a mesma pessoa... – Vamos a cavalo – ele disse, soando autoritário como sempre – carruagem atrairia mais atenção até de pessoas comuns, ladrões e coisa do tipo. Não quero lidar com humanos, não agora. – Juntando suas duas mãos, ele agachou e estendeu o degrau que ele havia feito com os próprios dedos e se aproximou de mim e do meu cavalo. Apoiei o pé no degrau e ele me impulsionou para cima, e eu subi no cavalo cinza. Ele sorriu discretamente, quase imperceptível. Caleb Hunter fez o mesmo com a garota e ela conseguiu subir.

Ele desamarrou o cavalo dele e subiu sem dificuldade alguma, fez um carinho no mesmo e olhou para nós com o cenho franzido. – sigam-me, não tão perto e não tão longe. Se cansarem: avisem, e se o cavalo sair da trilha: o puxe de volta, mas não maltrate o animal. – ele nos instruiu, fazendo um som estranho com a boca. O cavalo começou a andar no mesmo instante, eu e a garota trocamos um olhar preocupado e repetimos – ou tentamos repetir – o som.

...

Já estávamos na trilha há algumas horas, o céu parecia não querer chover, mas estava mais frio por isso. Por sorte, tínhamos levado casacos quentes para enfrentarmos a noite. Caleb Hunter não se movia em cima do cavalo negro, o que me deixava preocupada e ansiosa. O silencio me incomodava quando havia pessoas por perto. Olhei para a garota e a peguei olhando para mim. Nossos cavalos andavam lado a lado, em uma estranha sincronia. Sorri timidamente e, por mais escuro que estava, senti que seu rosto mudava o tom.

— Caleb mencionou que você não enxerga as cores, é verdade? – ela começou, sua voz estava rouca por ter ficado tanto tempo sem falar. Eu abri mais o sorriso.

— Caleb disse muita coisa, ahn? – olhei para ele de relance, mas ele continuava parado. Ou estava ouvindo ou muito concentrado na estrada. – É verdade – movi meu olhar para a garota – As cores que todo mundo diz... Não as conheço.

A garota franziu o cenho, tentando entender o meu suposto problema – Como descobriu isso?

— Contrataram um professor para me dar aulas quando eu era menor, para me ensinar a ler e essas coisas que a mulher do senhor Franco nunca cogitaria em me ensinar, então teve uma aula em que ele queria me ensinar as cores e ele disse que eu só acertei o preto, o branco e o cinza. Então para mim tudo é assim, porque tudo era dessas cores. Ele não entendia isso, eu era uma criança problemática para ele, sabe? – suspirei e voltei a sorrir ao notar que meu sorriso havia fugido do meu rosto – Como são as cores? – perguntei, animada.

Senti que ela também estava feliz por estar compartilhando coisas comigo, era como se ela fosse algo especial. Quero dizer, eu era especial por não enxergar as cores e ela era especial justamente por conseguir vê-las. – Hum, começamos pelo básico – ela estava pensativa e em um tom inteligente, falando como uma professora, como se soubesse de tudo – O azul é a cor do céu, a cor dos olhos de muita gente, é a cor do mar e acreditam que simboliza a amizade – esperou eu falar algo, mas ao perceber que eu só queria escutar, ela continuou – O vermelho é a cor do sangue, das maçãs, simboliza a paixão. O verde é as folhas das arvores, a grama, também uma cor de olho, simboliza a esperança. O amarelo é o sol, cor de ouro. O laranja é a mistura do vermelho com o amarelo, tem uma fruta de mesmo nome que possui esta mesma cor. O roxo é a mistura do azul com o vermelho, é a cor dos machucados, da uva. Tem também o rosa, que é a mistura do branco com o vermelho, ele é quase a cor da nossa pele. O marrom é a cor dos nossos olhos, a cor da pele do senhor Franco, também é a cor da madeira, da terra... Acho que não faltou mais nenhuma, basicamente é isso.

Eu apenas a olhava, admirada, imaginando como seria... De fato, eu não fazia ideia de como era, mas era como um sonho distante. Era bom sonhar, por mais que a realidade seja completamente diferente. Ouvi-la explicar o assunto também era importante, ela se sentia importante, como se só ela soubesse das cores e das suas funções. Talvez porque ninguém perguntou para ela como era algo, talvez...  – Eu queria poder enxergar as cores, você tem tanta sorte. – isso a fez sorrir ainda mais. – Agora, como é viver dentro do espelho?

Ela me explicou que dentro do espelho é como pensar algo e fazer outra coisa, mas no caso dela não era tão radical assim, já que, segundo ela, nós pensávamos quase as mesmas coisas. – Não era tão ruim – finalizou ela. Eu assenti, compreendendo o que ela quis dizer e não o que ela sentiu.

— Qual é a sua cor favorita? – eu perguntei, voltando ao assunto anterior.

— Azul, e a sua? – percebi que ela se desculpou com o olhar após fazer a pergunta, ela baixou a cabeça, que se virou para frente em seguida, ficando em silencio como se esperasse o sermão.

— Branco – eu respondi, olhando-a. Ela sorriu.

...

Amanhecia quando finalmente chegamos à casa de Caleb Hunter, que não havia nem sequer olhado para trás durante a noite passada. Ao longe a casa parecia velha e abandonada, uma cabana de madeira escondida por plantas trepadeiras, apenas com a porta e as janelas a mostra. Ela era pequena demais para o homem, que era bem alto, mas parecia simples e o bastante para a sua sobrevivência. De perto, ela parecia ainda mais velha, porém um tanto acolhedor. Possuía uma pequena varanda, onde havia um banquinho feito a mão, onde provavelmente Caleb Hunter sentava quando se sentia sufocado dentro da casinha ou quando precisava desfiar ou retirar a pele de algum animal... Descemos de nossos cavalos – eu praticamente cai do meu – e quando eu e a garota fomos amarrá-los nas arvores próximas, Caleb interveio:

— Solte-os.

— Eles não vão voltar, e se precisarmos voltar para o casarão? – eu o questionei.

— Não vamos, e, de qualquer modo, eles sabem a hora de retornar.

Olhei para a garota e ela retribuiu o meu olhar de “tudo bem, você que manda” e soltamos os cavalos. Observamos eles correrem para longe, como em uma corrida. Isso me fez lembrar o quanto eu queria ser livre, escapar daquele quarto e ver o mundo. Naquele momento eu só queria voltar para aquele quarto, mas ao mesmo tempo eu não queria desejar não ter conhecido a garota.

Caleb Hunter nos chamou, desviando a nossa atenção. – Andem logo, vocês tem que descansar.

Mas eu não me sentia cansada, nem a garota parecia estar. De qualquer modo, o seguimos para dentro da pequena casa. Por dentro ela era mais aconchegante, cheia de almofadas pelo chão – ele pediu para tirarmos nossos sapatos na porta -, havia três cômodos: o da entrada que parecia uma sala/cozinha onde havia um colchão grande no chão e uma poltrona velha numa parede, na outra havia um fogão a lenha e um balcão obviamente feito por ele, onde havia pequenas portas e gavetas em baixo, onde provavelmente ficavam seus utensílios de cozinha.  Na outra parede havia um espelho enorme, bem maior do que o que eu havia ganhado de aniversário. Ele era deslumbrante, com detalhes perfeitos de galhos como se o espelho fosse retirado de uma arvore gigante. O outro cômodo era um banheiro pequeno, mas extremamente limpo, a porta deste ficava a direita e na esquerda estava o quarto dele. A porta estava trancada. – O que tem aqui? – a garota, que havia tentado abrir a porta, perguntou.

— Meu quarto, não tem nada pra vocês ai – ele respondeu secamente – mais tarde vocês podem se lavar no rio, mas agora precisam descansar. – Caleb Hunter se aproximou do colchão no chão e o arrumou, batendo os lençóis e estendendo um cobertor. Pegou umas almofadas e colocou como travesseiros. – Aqui – ele apontou – vocês dormem aqui – eu olhei diretamente para o espelho, esperando que ele notasse minha preocupação – O espelho é meu, vocês não conseguem atravessar e nem ninguém, só eu. Agora durmam.

Eu tinha muitas duvidas, pensamentos sobre ele e algo me segurava para não falar. Não queria magoar o senhor, muito menos ser grossa. Sentia que minha curiosidade era absurdamente infeliz e irritante, eu não queria irritá-lo. Mesmo assim, eu, involuntariamente, corri para frente da porta do quarto dele e disse: - Eu preciso saber. – engoli em seco, percebendo o meu erro, mas não havia motivo para parar agora que comecei – Preciso confiar em você completamente. – olhei para a garota e voltei a olhar para os olhos claros do homem.

— Conte-me a sua história, Caleb Hunter


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Colors" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.