Colors escrita por IVY


Capítulo 6
Chapter six: The sunset


Notas iniciais do capítulo

"If I die young bury me in satin; Lay me down on a bed of roses; Sink me in the river at dawn; Send me away with the words of a love song" - If I die young, the band perry.



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Meus joelhos cederam, fazendo com que eu me desequilibrasse e caísse no chão de costas. Meu corpo se mantinha parado, petrificado como uma estatua. Minha mente estava tão assustada que mal conseguia pensar. Talvez, só talvez, o certo a se fazer era chorar e gritar por ajuda. Certamente havia um demônio-branco no casarão, ou pior: naquela mesma sala. Eu estava apavorada, meu corpo tremia e eu só conseguia encarar os olhos vazios de Grace. Oh, Grace. Ela nunca fora o meu tipo preferido de pessoa, e não começaria a ser apenas por conta de sua morte, porém, nunca desejei que isto acontecesse a ela. A culpa crescia em mim, mas eu a afastava. Minhas pálpebras estavam mais do que pesadas, respirando com dificuldade, tudo estava se tornando preto, apenas escuridão.

Eu não sentia nenhum cheiro além de uma fragrância extremamente doce e enjoativa. Fechei meus olhos e parei de tentar lutar, meu corpo inteiro se suavizou e eu me deixei levar. Logo não sentia mais nada.

...

Minha consciência retornou quando uma mão quente tocou minha mão direita, meus olhos ainda se mantinham fechados, mas senti que minha respiração estava equilibrada. Vozes conversavam no fundo, e eu, por mais fraca que estivesse, tentei ouvir o que elas diziam. Uma das vozes eu reconheci como a do Senhor Franco, seu tom calmo me tranquilizou no mesmo instante. Ele sempre foi a minha figura paterna, apesar de eu tentar não me apagar a ele como um pai, pois eu sabia que ele jamais me aceitaria como filha, afinal, nunca tinha o feito. A segunda voz era do antigo diabo-branco, Caleb Hunter, sua voz era mais forte e no momento parecia rouca.

— Deveríamos caçá-lo, você deve saber um jeito de pegá-lo, é... Era um deles – disse o Senhor Franco calmamente, tomando controle da situação.

— Deveríamos mantê-las seguras, nunca deixá-las sozinhas! – era Caleb Hunter, autoritário como sempre – não tem como pegá-los, recomendo que retirem todos os espelhos da casa ou os banhe com sal, é o único jeito.

Um silencio tenebroso seguiu-se por alguns segundos, longos segundos. – Leve-as para a sua casa, eles não o perturbarão – o Senhor Franco parecia estar decidido, a mão que tocava a minha me apertou com força, fazendo meu corpo tremer levemente. E então meus olhos se abriram e eu vi o rosto da garota que eu ainda não sabia o nome. Ela sorria para mim, obviamente para me confortar e não porque ela queria. Senti uma dor no estomago ao tentar me levantar rapidamente, fazendo com que os dois homens parados em frente aonde deveria estar Grace me encarassem, ambos com o cenho franzido. A garota colocou a mão em meu peito, sugerindo que eu fosse com calma e me ajudou a levantar.

A sala estava a mesma coisa, com exceção do corpo de Grace que provavelmente fora retirado dali. Pensei em sua sogra, Amora, chorando por ter sido Grace e não eu. Eu concordaria com ela, preferia ter morrido. Antes eu do que Grace. Pensei em Lucian. Oh, Lucian. Como ele deveria estar se sentindo? Ela era sua noiva, por mais que ele dissesse que não a amava amorosamente, tinha certeza de que a considerava e gostava dela, por mais que não admitisse. Queria correr para encontrá-lo e pedir desculpas, mas estava cansada de bancar a coitada. Não ajudaria em nada agora, não agora...

— Você está bem? – a garota me olhava como se eu fosse o próprio espelho rachado – Você ficou desacordada por horas.

Suspirei, e ela me guiou até um sofá, onde eu sentei e ela sentou ao meu lado. Sentia-me bem, apesar do estomago doer, porém, era como dormir na pedra. Eu estava úmida e cansada. Minhas pálpebras foram abertas tão de repente e já queriam fechar novamente, mas eu não queria. – Estou bem, como Lucian está? Avisaram a família dela? – precisava me focar em Grace, não seria mesquinha em esquecê-la – Temos que fazer o funeral, antes de qualquer coisa. – Olhei para a garota, depois para o Senhor Franco e Caleb Hunter. Meu olhar implorava.

— Grace não tinha família, eles morreram em um Incêndio quando ela tinha apenas doze anos – o Senhor Franco esclareceu, de cabeça baixa – Eu a criei como criei você, a diferença foi que ela morava em outro lugar. Quando cresceu, a apresentei para o meu filho e eles ficaram noivos, como você já sabe. – ele parou de falar por um longo tempo, enquanto isso, minha mente lutava para não cair na culpa – Faremos o funeral dela hoje ao por do sol, à noite vocês seguirão junto ao Caleb para o chalé dele, garanto que ficarão seguras por lá.

E essas foram as ordens.

...

Logo após aquilo, eu e a garota fomos para o meu... Nosso quarto. Ao abrir a porta, vi uma bandeja com alguns biscoitos e leite. Comi um pouco para ter forças mais tarde, pois eu iria precisar. A garota também comeu, mas senti que era apenas para me acompanhar, afinal, mal havia tocado na comida. Ambas sentamos na cama, por cima dos lençóis brancos e nos encaramos antes de encararmos o espelho. Respirei fundo.

— Emilia, - ela começou a dizer – vamos dar um jeito, o homem me contou tudo e eu compreendo o que está sentindo, você não está sozinha. – parou, provavelmente esperando que eu dissesse algo. Mas eu não disse. Ela apertou sua mão na minha e eu olhei para ela, que me olhava de volta – foi um acidente, não deixaremos outra morte acontecer, ouviu? Não deixaremos! Eu e você, estamos juntas nisso.

Ela sorriu para mim, um sorriso triste, mas ainda sim um sorriso encorajador. Eu tentei imitá-lo, sem sucesso algum. Olhei para as nossas mãos e apertei a minha contra a dela e isso me fez sentir aquela mesma sensação de antes, quando ela tocou em minha mão pela primeira vez.

Movi meu olhar para o seu rosto, tinha uma aparência tão serena, apenas de ter os olhos tão doloridos. – Estou aqui por você – respondi – Obrigada por tudo. – e ao dizer isso, eu soltei a minha mão da dela e a abracei, fazendo com que ela hesitasse no começo, mas retribuísse o abraço, por fim. – Acho que podemos ser amigas, sim? – de certa forma, oficializar isso me deixava mais tranquila.

Ela voltou a sorrir tranquilamente. – Já somos, teremos muito tempo juntas ainda, temos muito que conviver.

Porém, algo dentro de mim dizia que não, que nada será assim. Que o meu fim chegaria.

...

O por do sol estava para chegar, antes da sua chegada, estávamos longe do casarão. Era uma hora de viagem de acordo com o sol, e estávamos todos em nossas carruagens, prontos para se despedir de Grace. Não sabia se conseguiria olhar para ela sem chorar, ou sem entrar em pânico, sem desmaiar. Porém, eu devia isso a ela. Era o mínimo que eu podia fazer. Fui a ultima pessoa que teve algum contato com ela, justo eu, a pessoa que ela menos gostava. Eu lamentava por isso, ela não ouviu um “eu te amo” antes de partir, nem mesmo teve uma vida longa. Era tarde demais quando descobri que sua vida fora uma desgraça, ela perdeu os pais quando nova e morou de favor como eu, e ficou noiva de um homem que não a amava. Alguém tinha de amá-la! Ela não poderia ir e não deixar nada para trás, nenhum coração partido. Nenhuma memória que valesse a pena recordar. Bom, eu não tinha nenhuma.

Descemos das carruagens, todos não muito elegantes, trajando branco para que ela tivesse paz em sua ida. Estava frio, mas por sorte não estava chovendo. Até mesmo os céus não conseguiam chorar de tão abalados que estavam. A canoa cinzenta estava na beirada do rio, movimentando-se lentamente com o balançar das águas, porém amarrada em uma estaca de madeira. Flores a decoravam, pétalas de rosas em cetim a forravam como se fosse uma cama, onde Grace dormiria para sempre.

Posicionamos-nos em frente a canoa, todos de olhos cabisbaixos, lamentando a morte de uma jovem garota que não merecia aquele destino. Cada um tinha levado algo para ela, cada um tinha suas palavras finais presas em suas gargantas. Ninguém encarava ninguém. Este momento era apenas dela e eu entendia isso.

Caleb Hunter apareceu com Grace nos braços após alguns minutos, aproximando-se da canoa e colocando o corpo pálido da garota sobre o tecido macio. Ele também havia trocado suas roupas, vestia branco como todos e parecia tão comovido com sua morte quanto o resto de nós. Caleb Hunter arrumou o cabelo claro dela antes de beijar a testa da garota e afastar-se, juntando-se a nós.

O Senhor Franco deu um passo para frente. – Grace era como minha filha, eu a vi crescer, eu atendia suas necessidades e ouvia suas palavras sempre que podia. Ela era especial para mim. Sua personalidade era intensa, ela era um doce de menina – sua voz ficou abafada por conta do choro que se seguia – Eu a amava, ainda amo e sempre a amarei. – ele engoliu o choro, encarando o rosto fúnebre dentro da canoa – Grace, se conseguir me ouvir, seja de outro mundo, seja com sua alma ou o seu coração, saiba que você jamais será esquecida. – o Senhor Franco aproximou-se da canoa e colocou um pano velho na mão direita dela – ela usava isso quando pequena, adorava a textura do tecido e o seu cheiro. Nunca tive coragem de colocá-lo fora, pois seria como colocar a sua graça no lixo.

Após justificar-se, o Senhor Franco voltou para o seu lugar de antes e calou-se, dando tempo para outra pessoa falar. Ele chorava baixinho, fungava em uma tentativa frustrada de esconder o choro. Ninguém se moveu por alguns minutos, o sol ainda estava alto no céu.

Amora já estava chorando quando deu um passo a frente. – Ela era minha única amiga, como uma filha, não teve um dia em que eu odiei Grace, pois ela era o que eu era quando jovem. Eu a compreendia e ela retribuía isso com carinho. Ela era perfeita. – Amora começou a soluçar alto – Eu só queria que ela tivesse uma vida boa, depois de tudo o que ela passou... – enterrou as próprias mãos em seu rosto enquanto chorava, sem vergonha alguma – não haverá alguém neste mundo que substituirá o bem que ela fez para mim, nunca, pois ela era única. – suas mãos saíram de seu rosto e encaminharam-se para a sua bolsa – este era sua fragrância preferida – ela retirou um vidrinho transparente que estava cheio pela metade com um liquido leve e claro e o abriu, despejando o liquido ao redor da garota como se o liquido fosse um escudo protetor.

A mulher se afastou da canoa e eu senti que o pior momento havia chegado: era a vez de Lucian. O filho do Senhor Franco e deu um passo a frente, sua mão estava em seu peito, em cima do coração. – Tudo o que eu poderia dizer eu já disse a ela em vida, agora só me resta sentir, e espero que, aonde quer que ela esteja, esteja sentindo isso também. – Lucian andou até a canoa e abaixou-se, acariciando o rosto sem vida de Grace. Logo se afastou, e eu compreendi que não havia bem material que poderia recompensar o que ele sentia.

Ele me confessou que nunca fora apaixonado por ela, e eu sabia o porquê.  Ela não era o motivo, mas sim ele. Portanto, imaginei o quão duro isto era para Lucian. Sentia-se tão culpado quanto eu.

A garota e eu fomos juntas até a canoa de Grace. Ela nunca fora tão bela quanto em morte, o que era tragicamente triste e irônico. Vestia uma roupa simples, sem um pingo de maquiagem no rosto, estava pura. A garota de cabelos escuros ao meu lado segurava uma rosa branca e eu uma vela, como não tínhamos nada para dizer, apenas ficamos ali, deixando algumas lagrimas deslizarem pelos nossos rostos. Ela pôs a flor na mão desocupada de Grace e eu, com minha vela, pus fogo no tecido. Ele não queimou depressa, foi justamente no momento certo. O pôr do sol havia chegado e eu sabia que não duraria muito.

Ela havia desamarrado a canoa e eu, fechando meus olhos, empurrei de leve para que fosse levada pela correnteza. – Sinto muito – sussurrei, essas eram minhas palavras finais para Grace, ela ouvindo ou não.

O por do sol já estava indo embora, e Grace já tinha ido. Ambos belos, ambos morreram jovens.


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