Colors escrita por IVY


Capítulo 4
Chapter four: Caleb Hunter


Notas iniciais do capítulo

Dedico este capitulo àquela pessoa que sempre esteve ao meu lado; Sabrina, a unica na minha vida, mas ela já sabe disso, vive lendo minha mente...



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Dois dias se passaram desde o dia em que Lucian e eu tivemos aquela conversa, seu pai – O Senhor Franco – finalmente voltara de viagem junto com aquela garota que eu podia jurar que havia saído do meu espelho, que ainda permanecia intacto na parede de meu quarto. Naquela mesma manhã, a chuva parecia ter esperado a chegada deles, pois quando eu ouvi suas vozes em outro cômodo, também senti o cheiro agradável e sufocante de terra molhada.

Eu estava limpa e bem arrumada, mas não esperava por eles, Lucian havia me ensinado a melhorar minha aparência e até me emprestou alguns adereços que me ajudariam, já que segundo ele eu não levava muito jeito. Por conta do frio que agora se instalava na região, abri meu pequeno armário e retirei um casaco fino e escuro e o vesti, me sentindo mais confortável e com menos frio. Sentei-me na cama em seguida, suspirando, passei a brincar com uma mecha de meu cabelo muito claro, me desligando de quanto tempo se passara ao meu redor. Uma batida forte na porta despertou-me de quaisquer pensamentos que rondavam em minha mente. Levantei minha cabeça lentamente e esperei a porta se abrir, ao invés disso, ouvi outra batida. Estranhei, normalmente o Senhor Franco entrava sempre depois da primeira batida e Lucian estava começando a seguir o exemplo do pai, as moças do casarão passavam longe de meu quarto... Seria a garota misteriosa? Engoli em seco e com um salto fiquei de pé descalço sob o chão de madeira, caminhei até a porta sem demora e a abri.

Em minha frente não havia a elegância do Senhor Franco, ou a juventude de Lucian, muito menos a beleza notável da garota estranha ou até mesmo de Amora ou Grace. Era um homem alto e robusto, era o que me parecia, era difícil dizer, ele usava muitos casacos e no momento parecia sentir calor, mas por algum motivo não retirou seus muitos agasalhos. Possuía uma barba não muito longa e com alguns fios brancos em meio aos negros que se assemelhavam com o de seu cabelo desajeitado. Seus olhos eram de um claro profundo, quase brancos, com pequenas e delicadas linhas de expressão ao redor, como se tivesse sorrido muito quando mais jovem. Suas roupas eram sujas e em tons não muito escuros, não chamando atenção em nenhum aspecto fora os olhos. Eu não o conhecia, mas mesmo assim, ele me parecia estranhamente familiar. O estranho não sorriu, apenas me observou dali. Dei um passo para trás, desconfiada.

— Posso ajudá-lo? – o questionei em meu tom mais tranquilo possível. Eu o encarava, tentando descobrir algo apenas ao olhar para ele, mas era impossível, era impenetrável. Seu rosto não se moveu, nenhuma linha de expressão lhe deu alguma luz ou sentimento. Senti um gosto amargo e agonizante em minha boca.

— Aqui não é um local apropriado para uma conversa séria, - ele disse com sua voz limpa, alta e autoritária - me encontre no jardim em meia hora. – E então ele me deu as costas e saiu pelo corredor afora.

— Mas... – "Está chovendo", mas não havia mais ninguém para ouvir o resto da frase.

...

Meia hora havia se passado quando o Senhor Franco me conduziu até os fundos do casarão, onde o jardim ficava. Após passar pelo longo corredor de vidro, ele sorriu timidamente para mim e voltou para dentro, me deixando sozinha em frente a uma porta comum não muito escura. Eu abri a porta sem bater e entrei sem pedir permissão, já que eu morava naquele local, não precisaria agir como uma estranha. Encontrei o homem logo em seguida que entrei, estava do mesmo jeito de antes, mas desta vez estava sentado a uma mesa cheia de quitutes intactos. Aproximei-me da mesa e puxei minha própria cadeira, sentando em seguida e encolhendo levemente os ombros, me sentindo um tanto desconfortável por estar completamente sozinha com aquele estranho homem. Eu o encarei e ele, após alguns segundos tentando ignorar minha presença, me encarou de volta.

Não sei por quanto tempo ficamos em silencio, mas então...

— O que você sabe sobre tudo isto que anda acontecendo com você? - ele começou, me encarando como se me testasse e, propositalmente torcesse para que eu não fosse bem. Soltei um suspiro discreto, reunindo a informação em minha mente.

— Não posso comer doces, não posso enxergar a intensidade das cores, ganhei um espelho e uma garota de brinde – E resolvi resumir tudo em uma frase simples. Ele arqueou suas sobrancelhas comuns e nunca aparadas na vida e empurrou sua cadeira para mais perto da mesa, logo se inclinando levemente sobre a mesma.

— Bom, você não sabe de muita coisa, mas preciso passar o meu legado adiante, então lhe direi o que sei, o que também não é muito, afinal, o mundo é um mistério e não há como desvendar todos os segredos com apenas uma vida, não... Não, precisa-se de muito tempo. – Ele esperou um momento antes de continuar – Você é o que eu particularmente chamo de reflexo, você desequilibrou a ordem natural de sua espécie, você deveria viver dentro do espelho e aquela garota deveria estar no seu lugar, porém, por um motivo que eu ainda não sei qual, vocês estão ao contrário. E então você me pergunta: "Dentro do espelho?". Eu lhe respondo: O espelho não serve apenas para você verificar sua aparência, o mundo em volta aparece diante de um espelho, não importa qual ângulo olhar, o espelho irá refletir, a partir disto eu posso dizer que o espelho é a realidade de nosso mundo. Ele nos vê do jeito que somos e não do jeito que queremos, ele nos reflete e nos conhece mais do que nós mesmos, ele nos segue e nos imita para aprendermos com nós mesmos. Acredito que a conexão entre reflexo e pessoa é extremamente rara, os narcisistas provam isso, vivem se encarando no espelho, você já se perguntou o porquê? – Ele me encarou, esperando por uma resposta. Apenas assenti. Para ele foi o suficiente. – Porque existem diabos-brancos, eles sugam sua atenção e, quando não conseguem fazê-lo... – E parou de falar, desviando o olhar para suas próprias mãos.

Não consegui não ficar inquieta, era, sem duvida alguma, muita informação. Duvidas inundavam minha mente e meus lábios coçava para perguntá-las, toda aquela situação estava me deixando desconfortável e confusa. – O que eles fazem? – perguntei, curiosa e sem medo de ouvir a resposta que, de certa forma, a atingiria, afinal, eu mesma vira um diabo-branco. – O que acontecerá comigo e com a garota? – engoli em seco, novamente temendo a resposta. Pensando na garota, senti uma irritação profunda na garganta, que vida ela teve, afinal? Eu estava no lugar dela e ela no meu... Eu deveria não ter uma vida como a que eu tive.

— Eles perseguem a pessoa, nunca se sentiu vigiada? Como se houvesse olhos por toda parte? – Ele sorriu, um sorriso terrivelmente obscuro e sem felicidade alguma – São eles. E, quanto a vocês, eu não sei o que pode acontecer, mas uma de vocês deve voltar.

Assenti triste pelo nosso destino e principalmente pelo meu. Eu voltaria para o espelho, era o que eu deveria ser desde sempre. Eu aceitaria o meu destino e desta vez era a minha vez. Eu já tive uma vida boa, nunca tive problemas em casa e acreditei que ela seria bem cuidada assim como eu fui. O estranho era que eu nem sequer a conhecia, mas ainda assim queria que ela fosse feliz. Foi o sentimento mais puro que já senti.

— Ela sabe sobre isso? – perguntei, já elaborando o que iria fazer assim que saísse daquele jardim úmido pela chuva que caia no vidro que nos protegia. Ao redor havia alguns vasos de flor, porém, possuía mais mesas e cadeiras, era aqui que passavam as tardes enquanto eu mofava em meu quarto. Era incrível como o contraste com a luz no vidro nos dava uma visão maravilhosa e aconchegante. – Como você sabe sobre isso?

— Não, ela não sabe. – ele me respondeu e passou sua mão pelo próprio rosto, demonstrando o esforço que exigia responder a segunda pergunta – Eu sei por que eu já fui um diabo-branco. – revelou ele – Sou Caleb Hunter, eu fui o diabo-branco que deveria levar sua...

Mas ele não completou a frase, não naquele momento. Pois a porta abriu-se com força e Lucian apareceu diante dela, mas não entrou no cômodo. Ele estava suando e ofegante, deduzi que havia corrido até o jardim. Mas por quê? – A garota, ela estava tentando voltar para o espelho – ele engoliu em seco enquanto eu e Caleb Hunter nos levantamos rapidamente – Meu pai está tentando impedi-la, mas ela é forte demais.

Assenti para ele e corri até o meu quarto, não me importando com meus pés descalços batendo forte na madeira enquanto eu me movimentava cada vez mais depressa ou com os objetos que eram derrubados ou com qualquer criado em meu caminho, eu só enxerguei o meu destino: Ela. O pânico invadia minha mente e meu ar estava ficando mais pesado, no entanto, parar não era uma opção.

Avistei a porta de meu quarto e me aproximei da mesma, notando que já estava aberta, entrei e após ver o Senhor Franco segurando os pés da garota com toda força que possuía, a mesma parecia determinada a não desistir de voltar para o espelho. Ela segurava nas bordas do mesmo e fazia uma careta que denunciava seu esforço. Aproximei-me da cena calmamente e toquei no braço dela, o que a fez virar a cabeça em minha direção com o cenho franzido e um olhar um tanto cruel. Ela me olhou nos olhos e eu e a olhei também. – Escute, eu não sei por que você quer voltar, mas... Eu preciso que você fique aqui, por favor, solte o espelho. Talvez essa seja a única chance que temos de acertar as coisas, porque elas estão completamente erradas. Por favor, fique.

Ela não se moveu. – Fique.

Apertei o braço dela amigavelmente e ela cedeu, soltando o espelho e caindo em meus braços, me abraçando com força em seguida. Ela fazia uns sons estranhos, deduzi que estava chorando, portanto fiz a única coisa que me veio na mente: a abracei também. Não sei explicar a sensação de seu abraço, era reconfortante e novo, ela tinha um cheiro bom de natureza e liberdade.

Não era bem isso o que eu faria ao sair do jardim, mas...  Era um bom momento. 


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