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Capítulo 11
Lazy Sod




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Era apenas uma saída antes de passar o resto do tempo necessário com meu melhor amigo. Tinha de fazer aquilo, por Julieta e por Evans. Então peguei um papel amarelo e amassado escrito Ju, guardado em uma gaveta especial na escrivaninha e subi para o quarto andar, em direção à sala de despedida.

O elevador estava cheio, assim como o cubículo. Ela era muito querida naquele hospital, mesmo que estivesse lá a menos de seis meses. Sentei-me ao chão, ao lado do sofá vermelho, mas dessa vez, não tinha Hazel para me segurar.

Várias pessoas passaram pela frente da pequena saleta, falando coisas incríveis sobre ela, coisas que eu nem ao menos sabia. Então chegou a minha vez de falar e segui calada até a frente.

Parei, todos os olhos estavam sobre mim e eu fiquei constrangida, mas esqueci por aquela ocasião.

—Primeiramente – pigarreei – queria falar em nome de Evans. Nós temos um acordo, e, sempre que alguém é muito importante para nós, escrevemos uma carta de despedida para essa pessoa, então, se algo acontecer com um dos dois o outro poderá ir lá e ler e não perder a chance de dizer as coisas que devem ser ditas. Ele escreveu para Julieta duas vezes, uma quando a conheceu e outra quando saíram pela primeira vez.

Suspirei, retirei a carta amassada do meu bolso, a desamassei. A letra dele era horrível. Eram poucas palavras e eu sorri, as declamando.

—“Não existem três qualidades sobre ela, porque, a verdade é que não há defeitos. Ela é como você, Violet, uma pessoa que me faz adorar até as coisas que eu odeio, sem nem precisar sorrir ou repetir até que fique fofo. Eu amo desde seus estranhos espasmos em suas pernas descontroladas que sempre me assustam, até aos desenhos que ela faz em minhas costas quando estamos calados, nos olhando, em algum momento íntimo que você não entenderia porque não tem sentimentos. Eu não quero nunca que você tenha de ler isso. Primeiro porque é um lixo, eu poderia escrever e dizer muito mais, mas a ideia me assusta e as letras me fogem. Segundo porque ela ficaria arrasada se alguma coisa acontecesse comigo e eu não quero que ela fique mal nem por um segundo de sua existência. E porque se algo acontecer com ela, quero ao mínimo poder me despedir da risada de porco dela. Eu amo, até com os meus ossos, então por favor, faça com que ela saiba disso.”

Abaixei a carta, com as mãos trêmulas da intensidade do que acabara de ler. A garota que parecia nunca largar seu lenço estava sorrindo, um aberto sorriso contagiante sem a menor lágrima a se formar em algum canto. Ela sabia e aquilo era tudo que importava. Estava mais do que feliz de fazer parte de um momento como aquele.

—Obrigada por fazer isso. – sua voz me acalmou.

—Agora... Por mim... Eu não pensei em nada para te dizer. Realmente, não tenho três coisas para falar sobre você, eu não te conheço o suficiente para isso. Tenho apenas uma coisa boa. – me concentrei em seus olhos, não conseguiria fazer isso se notasse o mundo a minha volta – Você fez o meu melhor amigo se entregar para alguém, depois de anos. Evans pode ser o cara mais positivo do mundo, mas o amor o assusta tanto, e você fez parecer tão fácil quanto ligar alguma coisa na tomada, e o fez o cara mais feliz do mundo. Eu preciso te agradecer por isso, e dizer o quanto é injusto que tenha de ir.

Sem dizer mais nada, suspirei, mas dessa vez não de medo ou de preparação, mas dizer tudo aquilo tinha sido um trabalho árduo, cansativo, quase como um exercício físico. Julieta se levantou e me abraçou, como nunca havia feito antes.

Ficamos ali por um tempo, e foi bom para mim, principalmente porque eu nunca fui fã de carícias e precisava de um abraço agora.

Então soltei-me dela e sorrimos. Fui embora, sem cerimônias, havia um lugar em que eu precisava estar.

Evans ainda estava desacordado quando cheguei ao quarto. Sua cabeça no travesseiro, sua respiração calma e controlada, seus olhos fechados, tudo fazia parecer com que ele estivesse apenas dormindo e isso me assustava.

Sentei-me em minha cama, o barulho de sua máquina já não era mais agradável ou reconfortante, era apenas irritante.

A enfermeira entrou no quarto e se sentou ao meu lado, com os olhos preocupados.

—É difícil, não é?

—Convivo com isso todos os dias, já superei a morte de muitos dos que eram meus amigos e amantes e mesmo assim, quando é o loiro, eu perco a cabeça. – suspirei.

Estava me achando fraca, aquela não era uma situação para se deprimir tanto quanto estava e mesmo assim o fiz.

—Você sabe por que escolhi cuidar de vocês dois? – ela passou o braço pelo meu ombro, me trazendo para um abraço, fiz que não com a cabeça e ela continuou – Porque vocês dois são problema. Juntos ficaram presos no telhado quase cinco vezes, liberaram as respostas para mais de dez provas, invadiram duas cirurgias, sempre estão no necrotério e fugiram do hospital mais de quatro vezes. Todas essas vezes vocês dois quase morreram, quando estão um ao lado do outro absolutamente nada pode pará-los, não deixe que um transplante pare. Evans quer ficar, mais do que ninguém esse garoto tem o desejo de viver, você só tem de lembrar ele disso, fazer com que em seu sonho ele note que ao seu lado é o lugar dele.

Sorri. Ela tinha razão. O loiro sairia dessa com mais facilidade do que qualquer outro que conhecíamos.

A enfermeira se retirou do meu quarto e eu sabia o que fazer.

Sentei-me ao seu lado na cama e tomei sua mão.

—Na carta, para Julieta, você disse que iria querer estar aqui caso alguma coisa acontecesse a ela. Eu li a carta, Evans, ela sonhou com a aparição e vai amanhã a tarde. Você disse, como também me disse que voltaria, então eu vou te tirar dessa, da mesma forma como fiz você me amar, com Sex Pistols.

Beijei sua testa. Levantei-me com um sorriso no rosto e segui até a escrivaninha. Liguei meu telefone nas caixas de som e em segundos Lazy Sod começou a tocar em uma altura digna de estourar os ouvidos dos surdos do outro lado do andar. Não esperava um milagre, sabia que ele não iria acordar naquele instante, mas seu coração soou rápido por um tempo, como se ele realmente pudesse me ouvir.

Julieta passou pela porta e sorriu, sabia o que eu estava, desesperadamente, tentando fazer, que essa era a última alternativa para trazê-lo de volta.

Passei o resto da noite conversando com seu corpo desacordado enquanto copiava a matéria do dia perdido. Jantei a comida que foi deixada para mim acompanhado de vários chingos carinhosos sobre a altura do meu som, troquei de roupa e fui me deitar, deixando todas as nossas músicas tocarem com uma intensidade baixa.

O sinal soou, já era de manhã.

Virei-me para Evans. Eu sempre dormia virada para a janela, assim o som batia em meu rosto e eu não tinha outra alternativa se não me levantar. Imaginei que seu corpo ainda estaria parado da mesma forma que foi deixado pelos enfermeiros, de barriga para cima, virado para o teto, mas não estava.

Quando abri meus olhos, conseguia ver apenas as suas costas.

O loiro estava deitado de lado, virado para a porta. Desliguei minha máquina e tirei a máscara do rosto. Levantei-me e parei ao lado de sua cama, poucos passos da minha.

—Evans?

—Mais cinco minutos, por favor. – ele não pode conter o sorriso em seu rosto.

Pulei em sua cama, soltando um grito de felicidade e o abraçando. Seus quentes braços me envolveram. Tudo, agora, estava bem.


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