Garota Camaleão escrita por Aurora


Capítulo 8
Descobertas


Notas iniciais do capítulo

Desculpe a demora, não era a intenção.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/578196/chapter/8

Alison,

Hoje escrevo essa carta direto do cativeiro das lembranças, o seu quarto. Lembro-me bem de você dizendo que este era o único lugar da casa que você podia chamar de lar, qualquer um que preste atenção pode perceber que a atmosfera muda da porta em diante. Pedi a sua mãe um passe livre para entrar aqui e ela concordou sem inseguranças, acontece que estou farta de me encher de saudades e lembranças mas não ter nada concreto para me apoiar, é angustiante.

Posso claramente olhar para a cama e nos imaginar sentadas enquanto você conta alguma de suas histórias, ou então nos ver rindo enquanto comemos pipoca e assistimos um filme, ou simplesmente nos visualizar num daqueles momentos onde o silêncio fala mais alto, ou sentir o gosto de nossos beijos em dias de sorte. Mas eu não posso me lembrar de todos esses pequenos momentos sem me lembrar que você é Alison e que fugiu de mim. A mesma garota que me transformou em amor me transformou em melancolia também, veja só, você Alison.

Acontece que eu me transformei em você também, criei uma rotina em que o único trabalho é pensar em você, talvez se eu não te amasse tanto seria mais fácil, se outra pessoa aparecesse, ou se eu fosse menos propensa a cair em buracos negros, hoje tudo estaria diferente. Mas você chegou suave como uma flor e explodiu-me como uma bomba, parece estranho eu gostar disso, me apaixonar por isso, amar isso, mas descobri recentemente que sou uma pessoa estranha.

Alison, lembra de nossas brigas? Bom, não sei se podem ser chamadas de brigas já que você sempre se irritava comigo por motivo algum. Mas tem uma que não tiro da cabeça. Era dia de chuva, lembro sempre dos dias porque acho que o cenário é importante, estávamos sentadas na beirada da calçada quando você me pediu para ir embora. Sua voz era raivosa, de quem queria mostrar que era o cachorro mais bravo da rua. Eu já estava acostumada com os ataques, pois veja só Alison, você não é uma pessoa normal, está perdida e presa, não pode escapar, foi por estar acostumada que eu fiquei, fiquei e vi você olhar para mim e dizer:

– Por que você insiste em ficar? Por que não faz como as outras pessoas e vai embora? Eu sei o que sou, acredite, também estou cansada disso.

Eu te vi despejando verdades sobre si mesma e sei como aquilo doeu, doeu em você e doeu em mim, porque quando o ódio passa das pessoas para si mesma significa que já não restam muitas escolhas. Sei disso por experiência própria. Eu parei de odiar as pessoas e me odiei, e ai cai em conseqüência, parei de odiar os outros para poder te amar, e me odiar de volta. Mas mesmo com aquilo eu fiquei, fiquei enquanto você dizia palavrões embaralhados com outras coisas e fiquei até você se cansar e ir embora, como se eu não estivesse do seu lado. E então numa última palavra você virou e disse:

– Não vamos nos falar nunca mais. – E mais uma vez eu me peguei impressionada com a facilidade de que coisas tão duras saíssem da sua boca de modo tão natural.

Mas no dia seguinte você apareceu como se nada tivesse acontecido, e era dia de chuva novamente, e nos sentamos na beira da calçada como numa regravação, e sentimos a água molhar o cabelo, o nariz, os olhos, todo o rosto e corpo, e você fechou os olhos e balbuciou alguma coisa, e quanto os abriu olhou para mim, e naquelas íris carameladas eu só vi confusão, confusão de dentro pra fora, dos sentimentos as atitudes, e te amei ainda mais por descobrir o quão vulnerável você era, tão sensível como eu, só sabia lidar melhor com isso, e achou alguém para acompanhar nessa jornada, mas vejo só que ironia, a mais esperta foi a primeira a se perder.

Seu quarto tem cheiro,visual e aura de Alison, é um você em forma de imóvel e tão confuso quanto. E em cima de sua estante, tem uma foto nossa com uma asa desenhada no verso, me lembra uma de suas tatuagens. Me permiti te amar mais um pouco só por isso.

Com saudades, dúvidas, confusão, leveza, mais saudades, felicidade, amor e descobertas,

Lúcia.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado!