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Yagah
ID: 356082
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  • 13/08/2013


  • Eu sempre fui uma má aluna no colégio. Aliás, na escola não existe mal aluno, existe mau aluno. Maus alunos aprendem a ser crucificados desde pequeno.

    Há dois anos, lembro-me que tirei um 2,0 numa prova de matemática. Foi, disparada, a menor nota da turma. Talvez eu tenha nascido ali, no momento em que fiz questão de olhar aquela nota ridícula e encará-la profundamente. Fixei meus olhos no maldito “2,0” bem grande com uma carinha triste ao lado e me perguntei o que aquela prova provava de fato? Eu ainda faria mais algumas dezenas de vezes a mesma pergunta para algumas dezenas de provas “mal sucedidas”.

    Talvez o grande problema do colégio seja o ensino em larga escala. Mas como assim “ensino em larga escala”? Quando se coloca um professor para dar aula a trinta crianças parte-se da premissa de que todos os alunos estão na mesma condição de aprendizado. O que é, indiscutivelmente, um equívoco. O colégio acaba por reduzir trinta crianças a uma. Claro que dará algo errado. Ou seja: o erro da escola se esconde em sua própria virtude. É risível e trágico o terreno em que a escola se constrói é absurdamente leviano. Não estou aqui querendo sugerir soluções ao sistema educacional. Eu sei que isso não vai mudar. Escrevo isso como um desabafo.

    Matematicamente, numa turma escolar, um aluno sempre se dará bem e receberá os mais variados elogios, enquanto outro sempre se dará mal e terá de sustentar sua autoestima sozinho, bombardeado — mesmo que sutilmente — com os rótulos “fraco”, “desatento”, “desinteressado”. E esse é o pior bullying que uma criança pode sofrer. O bullying invisível. Essa violência moral silenciosa travestida de verdade absoluta, que asfixia e tortura a inteligência da criança. Anna Freud, a última filha de Freud, certa vez escreveu: “Mentes criativas são conhecidas por sobreviverem a qualquer tipo de mau aprendizado”.

    Repetindo: eu não tenho nenhuma pretensão de mudar o sistema educacional ou sugerir alguma solução. Eu sei que não há solução. Não há modelo ideal de ensino. Eu aceito isso. Pretendo aqui expor um novo ângulo, mostrar uma nova fotografia da realidade da Educação pela perspectiva de (mais) um mau aluno.

    Gostaria de deixar bem claro que as escolas lidam com crianças e crianças não sabem o que estão fazendo na escola (nem o aluno que tirou 10 na prova sabe). É natural que entre trinta crianças, uma delas não se interesse pela aula. O desinteresse é autêntico. Certamente (e ainda bem) pelo menos uma criança não será atraída por aquilo que está sendo dito em aula. Ao invés de prestar atenção em algo “inútil” para ela, a criança “desatenta” prefere prestar atenção em seu próprio mundo. Isto faz sentido. Quem a escola chama de “fraco” possivelmente é quem possui mais fibra intelectual para rejeitar a opressão travestida de “ambiente de aula”. Isto se chama personalidade. Não quero sugerir o “fim” da escola (a perfeição não existe), estou apenas propondo uma nova forma de enxergar os “maus alunos”, em defesa de minha própria classe.

    Tratando-se de crianças, o termo “desatenção” não se aplica. Não há criança “desatenta”, há criança com atenção voltada àquilo que lhe apetece. É muito fácil dizer que uma criança é “desatenta”, quando na verdade ela está atenta justamente àquilo que o professor não enxerga. É confortável chamar o mau aluno de avoado, difícil é conseguir ser interessante o suficiente para conquistá-lo.

    Uma nota baixa numa avaliação, portanto, muitas vezes prova que este “mau aluno” não está condicionado a engolir qualquer coisa goela abaixo. Prova também o poder de sua busca por coisas mais consistentes. Ao passo que o “bom aluno” na maioria das vezes prova, com sua nota dez, que está 100% submetido àquilo que lhe é imposto. Sinceramente, qual desses alunos podem oferecer saídas criativas para um mundo melhor? Onde está a personalidade de uma criança que acata tudo que lhe é imposto? Em qual lata de lixo largamos a razão quando ficamos felizes com o fato de uma tirar dez numa matéria que ela ainda — definitivamente — não tem capacidade de compreender a importância? Eu gostaria de tirar os holofotes das crianças “responsáveis” e adestradas e apontar as luzes para as crianças desobedientes e saudáveis.



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