Um Novo Começo escrita por hachiikko


Capítulo 3
04.08 - Humilhação


Notas iniciais do capítulo

Reescrito em 2018.



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04/08

Diário,
   Hoje eu posso afirmar com toda certeza que foi o pior dia da minha vida. Honestamente foi muito ruim. Não sei como é possível acontecer tanta coisa ruim de uma só vez. Eu queria deitar agora e não acordar mais. Não queria sair da cama. Mas como você está lendo essas linhas de desespero eu não suporto ficar curioso, então não deixarei os queridos leitores curiosos, pois para estar lendo esse diário até agora devo a você leitor meus mais sinceros agradecimentos. E se eu não quisesse contar era só não ter vindo escrever. Mas estou precisando desabafar então vou escrever. Já parei com a enrolação.
   Eu fui para o colégio com um sorriso no rosto, no mesmo horário que fui ontem. Tinha conseguido dormir muito bem, um sono bastante profundo. E havia pensado em um apelido para me referir ao Amane. Como eu nunca fico amigo das pessoas, sempre crio apelidos para me referir a elas para facilitar gravar o nome de todos. Tinha ido dormir pensando nisso, em como chamar o Shinji e quando abri os olhos ao raiar do sol aquele nome me veio à cabeça. Tora. Eu sei, eu sei. Não tem nada a ver com o nome dele. Mas só de imaginar aquele rosto sério, dando risadinhas de canto de boca com aqueles olhos que pareciam entrar na sua alma, esse apelido parecia combinar muito com ele. Realmente, estava muito ansioso para poder ir para o colégio e vê-lo. Não sei o porquê esta vontade de ver outra pessoa, mas é preciso. Olhá-lo mais, estudá-lo mais, entende-lo mais. 
   Ontem alguns professores já passaram trabalhos e eu como aluno exemplar já fiz todos. Cheguei mais cedo para guardar minhas coisas no armário que havia na entrada, para não correr o risco de esbarrar em ninguém ou enfrentar tumulto. Além de ser uma desculpa para chegar cedo ao colégio, um hábito que eu tinha antes no meu colégio antigo e que era necessário sendo presidente do grêmio. Sempre tinha várias coisas para fazer. E é um hábito que vai ser difícil de quebrar. Antes eu tivesse ficado em casa. Como havia chegado bem cedo, quase não tinha ninguém no colégio. Talvez uns três alunos sentados conversando na entrada do colégio. Logo que guardei meus pertences no armário (menos meu diário e caderno de desenho, ando com eles sempre juntos. Não podem cair em mãos erradas), decidi andar um pouco para reconhecimento do local, já que na hora do almoço de ontem acabei não visitando muitos locais. Comecei a dar a volta no prédio escolar, e no momento em que virei vi que as quadras já estavam sendo usadas pelos times do colégio. Faz bastante sentido ter treinos dos times como futebol, basquete e tênis antes das aulas começarem. Já mencionei que o colégio é enorme? Mesmo sendo usado por uns cinco times, ainda sobrava duas quadras vazias. Havia apenas uma quadra maior que as outras, acredito que deve ser usada em campeonatos. Foi então que eu reparei. O grupo dos meninos encrenqueiros do colégio sentados na arquibancada vendo os jogos. O grupo que Amane Shinji pertencia. O grupo do Tora. Comecei a andar um pouco mais depressa indo em direção a eles, mas só quando fui chegando mais perto que percebi que ele não estava lá. Fiquei um tanto quanto chateado, muito devo completar. Mas decidi não ligar, quem sabe ele chegava dali a alguns minutos e também não sabia como falar no apelido, havia tempo para pensar. Sim, havia passado na minha cabeça a hipótese de falar para ele de um apelido, hipótese que foi logo descartada. Não tem lógica alguma eu virar para uma pessoa que eu não conheço e dizer que tenho um apelido para ele. Quando me sentei na arquibancada, colocando meus cadernos do lado, comecei a olhar o jogo de futebol para matar o tempo. Algo começou a me chamar a atenção. Você está certo que imaginou que era o Shinji jogando. E era ele mesmo. Em carne e osso. Estava trajando uma camisa azul que claramente o engolia assim como a bermuda cinza. Seu cabelo, completamente molhado de suor, acompanhava os movimentos do corpo. Sua pele brilhava de acordo com o suor que havia nela. Tenho a ligeira impressão de que ele me viu sentado na quadra observando seus movimentos, e que sorriu com isso. Impressão, sonho, esperança tanto faz como chame. O resto do treino deve ter levado no máximo uns dez minutos, e os aproveitei com louvor. Quando acabou o treino ele foi direto para o vestiário, seguido de sua trupe. Fiquei observando os grupos de dissiparem e não passou muito, o sinal bateu. Levantei-me e quando fui pegar as minhas coisas meu caderno de desenhos caiu, mas nessa hora ainda não havia percebido. Eu estava ainda meio distraído para notar isso. Uma das coisas que mais gosto de desenhar são paisagens, lugares e coisas assim, mas também adoro desenhar pessoas. E ontem antes de dormir eu o desenhei. Havia desenhado aquele que me despertava certa curiosidade. Ao me dirigir para a sala de aula esbarrei em alguém. Virei para pedir desculpas e me deparei com um par de olhos azuis escuros me encarando. Por um momento fiquei com medo. Ele transmitia um profundo ódio. Quando fui abrir a boca para falar ele começou a gritar comigo. “Minha roupa nova! Essa roupa custa mais que a sua vida! O que pensa o que está fazendo?!” eu tentava balbuciar um pedido de desculpas, mas não conseguia falar nada. Ele me empurrou contra a parede, o que de fato doeu. Foi num piscar de olhos que ele apareceu na minha frente, com os amigos ao redor. “Algum problema?” Sabe aquelas cenas que chamam a atenção de todos? Pois bem, essa era uma dessas. O aluno novo com jeito nerd sendo protegido pelo grupo dos badboys contra um dos populares do colégio. Nem preciso dizer que me olhavam com cara de espanto e por parte das meninas, com inveja. Shinji era o tipo de homem que toda mulher gosta, bonito com um ar perigoso. Ser protegido por ele era como se eu estivesse declarando guerra à legião das fãs dele. O menino que havia me empurrado era mais alto que eu, mas mais baixo que o Tora. Seu nariz, poderia se dizer meio grande, mas continuava sendo proporcional com seu corpo. Seus olhos pequenos me fuzilavam. Alguém chegou por trás dele e colocou a mão sobre o seu ombro, o que pareceu o fazer perder a pose. “Saga, é só uma roupa. Vamos embora.” Esse outro me encarou como se pedisse desculpas. Era, aparentemente, do mesmo tamanho do menino que havia me agredido. Sua boca era bem carnuda, o que é meio diferente para um homem. Ele usava uma calça bem justa e por baixo da camisa do colégio uma blusa vermelha de manga comprida. Todos voltaram a seus afazeres naturalmente como se nada tivesse acontecido. Nem deu tempo de agradecer o Amane porque da mesma forma que ele chegou para me salvar, foi embora. Fui para sala de aula e sentei no mesmo local que havia sentado anteriormente. E como era de se esperar todos olhavam para mim e faziam comentários. Tentei parecer que não sabia o que estava acontecendo, foi então que resolvi pegar meu caderno para desenhar e distrair para evitar um ataque de pânico e não o achei. Quando me levantei para procurar o professor entrou na sala e todos se sentaram. O professor começou a aula, de história dessa vez. Mas a cadeira do Shinji estava vazia. E assim continuou durante três tempos de aula. Eu havia me esquecido, tudo bem que acabei de me mudar para esse colégio mas hoje o intervalo era um tempo antes, porque depois teriam aulas de educação física. Já disse como sou um prodígio em esportes? Não? Pois é. Deve ser porque sou péssimo em esportes. Um zero a esquerda para ser mais exato. Não tenho coordenação motora para isso, quanto menos para correr. E lhe dou três tentativas de adivinhar qual foi a tarefa dada pelo professor. Correr ao redor da quadra cinco vezes. 
   Aquela quadra é muito grande, é como se fosse duas piscinas olímpicas, ou até mesmo três. Todos os alunos tiveram que ser reunidos em um lado da quadra para começarem a correr. Não era preciso olhar para todos para ver que ainda faziam comentários sobre a minha pessoa. Foi engraçado de ver, aquele tal de Saga mal dando uma volta e indo sentar. Ele não era da minha sala mas era do mesmo ano que eu. Durante a educação físcia as três turmas de cada série se reuniam. O mais engraçado é que o professor não disse nada. O menino de ontem ( aquele que esbarrou nas meninas no começo da aula correndo) ao contrário, corria cada vez mais rápido e parecia não se cansar. Pelo visto ele adora correr. Teve um que foi engraçado, ele corria balançando as mãos. Acho que ele que é o representante de turma. O que havia se intrometido quando o outro queria me bater, agora fez sentido porque. Já o Tora nem estava por ali. Olhei por todo o lado e nada dele. Teve uma hora que tive a impressão de ver uma sombra no terraço da escola, mas acho que foi só impressão. Mas segundo o diretor é local proibido para a circulação de alunos. 
   E foi ai, que o pior dia de toda a minha vida começou a ganhar forças. Eu até que estava acompanhando o ritmo da turma, ficando um pouco atrás, mas continuava correndo. Quando surgiu um buraco  na minha frente que eu não vi ou eu tropecei nos meus pés. Se tivesse visto eu não teria caído de cara no chão. E se não bastasse minha humilhação publica no segundo dia de aula o professor veio e me chutou. Chutou não, mas apoio o pé na minha bunda fazendo força para baixo. Ficou empurrando e gritando para eu me levantar. Já era humilhante o suficiente. Como se eu não estivesse tentando. Entretanto era impossível levantar com alguém te empurrando contra o chão. Teve pessoas que olharam para mim com um olhar de pena e outras estavam gargalhando. Sei que é repetitivo, mas foi totalmente humilhante. Nunca havia me sentido tão mal. Lá se foi toda a minha chance de começar de novo. A conseqüência disso tudo foi que eu sai correndo logo após conseguir me levantar, peguei o diário e vim. E vim para cá onde estou agora. O terceiro box do vestiário masculino. Estou aqui sentando escondido, esperando deixar de ficar vermelho, para pelo menos voltar e pegar minhas coisas. Ainda bem que ele não estava lá para ver minha humilhação.

Porta se abriu. Alguém entrou no banheiro. É só fingir que não estou. Agora é só tentar me distrair para me acaبا...

[..]

Agora meu caderno ficou rabiscado. Não tinha como não ficar. Eu estava escrevendo quando a porta do box em que eu estava foi chutada, risquei de nervoso. Era o Shinji, devolvendo meu caderno de desenhos. Nem preciso dizer que queria esconder minha cara. Não bastasse a humilhação durante a aula de educação física a última pessoa que deveria ver os desenhos estava segurando o mesmo. Depois de abrir a porta ele ficou me encarando e eu tremendo de medo em cima do vaso sanitário. Ele jogou o caderno aos meus pés e apenas disse: “É feio ficar desenhando pessoas às escondidas” Eu gelei. Devo ter ficado imóvel por uns cinco minutos até abaixar e pegar o caderno. Novamente não o consegui encarar. Apenas levantei, fui correndo para a sala de aula pegar as minhas coisas e ir embora. Mas não consigo pensar em matar aula. A classe ainda estava tendo educação física, dava para vê-los da janela. Agora jogavam futebol. E Amane jogava com eles. Mas apesat de ser um aluno modelo eu precisei ir embora. Tive a impressão de que derramei lágrimas, mas não deu para perceber porque sai correndo de lá e voltei para casa. E agora estou aqui, deitado na minha cama, vestindo meu pijama e com meu cachorro ao meu lado pedindo por carinho. Preciso de chocolate para me acalmar, acho que vou fazer um pouco de brigadeiro. Depois devo ir dormir para me acalmar mais ainda.

— Murai Naoyuki


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Notas finais do capítulo

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