Os ensaios eram bem vazios, poucas pessoas realmente se importavam com a peça. Afinal, a maioria da turma era da arrumação do cenário, então com tanto que eles fizessem um bom cenário, já ganhavam sua nota, sem precisar comparecer aos chatos ensaios.

-Isso é ridículo, ninguém se preocupa com a peça. –Daren resmungou sentado em cima da mesa que estava no centro do palco- Não devíamos estar aqui nos preocupando em memorizar esse roteiro idiota.

-Nosso roteiro não é idiota. –os gêmeos choramingaram nas primeiras cadeiras.

-Muito bem, onde está o resto do pessoal, temos que ensaiar isso logo! –Meyr gritou para o pessoal de trás das cortinas ouvirem.

-Estão terminando de experimentar as roupas, Liana só acabou-as hoje de manhã. –Daren informou.

-Ah. –a representante ruiva olhou para o garoto sentado na mesa- E você seu Daren, por que não vai experimentar suas roupas?

-Cara, você ainda acha mesmo que eu vou ser um coelho? –Daren sorriu de canto- Até a apresentação eu conseguirei um substituto para esse papel ridículo, então não preciso me preocupar se aquela coisa vai caber em mim.

-Tá, tá.

-Não faça essa cara como se não acreditasse!

-E eu não acredito, ué.

-Quer fazer uma aposta então?

Os gêmeos somente observavam aonde iria levar aquela conversa. Sorriam, queriam ver até onde Daren achava que estava certo.

-Que tipo de aposta? –Meyr deu um sorrisinho.

-Uhn... Que tal, se eu conseguir um substituto, eu não preciso fazer nada além de assistir e você vai garantir que eu ganhe a pontuação máxima nesse trabalho.

-Nossa você precisa mesmo de nota não é?

-Calada!

Meyr riu.

-Está bem, mas o que ganho que você não conseguir?

-Eu uso aquela roupa de coelho o dia todo. –Daren suspirou.

-Feito. –Meyr sorriu e apertou a mão de Daren, fechando a aposta sobre os olhares cínicos dos gêmeos.

Enquanto isso, atrás das altas cortinas vermelhas era bem escuro e tinha bastante espaço. Caixas de assessórios e partes de diferentes cenários infestavam aquele lugar. Lá mais atrás ficavam os banheiros feminino e masculino onde os pequenos atores terminavam de se arrumar.

-Vocês estão ouvindo a voz do Daren? –Sarae perguntou.

-Ah, ele e Meyr devem estar discutindo pela milésima vez. –Naehe disse simplesmente, enquanto ajeitava a faixa preta na cabeça.

-Será que Alec já terminou de se arrumar? –Julieta perguntava para si mesma alto. Ela havia ganhado o papel de Duquesa, mas só devia estar nos ensaios para ver Alec, suas falas e aparições eram poucas na peça.

-Lá vai você Julieta. –Naehe revirou os olhos- Só vem para ficar secando o Alec com os olhos, não é? Você é só mais uma que não se importa com a peça.

-O quê? –Julieta disse indignada- Não venha me julgando assim, e todo mundo sabe que você só não fez birra que nem o Daren por que quer beijar o Alec.

-Uhn, gente... –Sarae tentou falar.

-Saiba garota que eu estou fazendo isso, pois é trabalho e de um jeito ou de outro vale nota. Não faço isso para sair beijando uns e outros só por que garotinhas como você se derretem por um garoto! –Naehe disse irritada- E estou achando muito engraçado você aí morrendo de ciúmes. –sorriu cínica.

-Eu não estou com ciúmes! Sei que você é tão medrosa que não teria coragem nem de beijar o Alec. –Julieta provocou- E não precisa ficar desesperada, eu vou dar o meu jeitinho, ouviu?

-Você é realmente tão infantil, arruma briguinha e faz uma birra enorme quando não consegue o que quer. –Naehe disse num suspiro- Sabe, isso está me soando como uma competição.

-Ah, então que seja uma competição. Mas saiba que no dia que as cortinas se fecharem, a única que será íntima do Alec vou ser eu. –Julieta apontou para si sorrindo.

-Está feito então.

Naehe já não ligava mais para o que aconteceria, seu interior competitivo já aflorara e não pararia até ser a ganhadora... Seja lá do que. Julieta parecia bem determinada também, o que não facilitaria a garota.

Sarae assistiu a infantil briga das duas e saiu decepcionada com a atitude de sua amiga.

-Como podem fazer tanto caso por uma coisa ridícula dessas? –ela murmurou balançando negativamente a cabeça- Não estamos num conto de fadas, ninguém se apaixona mais por um simples beijo... Beijo... –ela disse triste.

Então a garota passou pelas cortinas vermelhas para começar o ensaio séria.

Mas sua atenção se desviou para Alec, que estava sentado quase deitado na cadeira do meio do palco, com uma xícara não muito bem equilibrada balançando em sua cabeça.

-Hey Sara, saca só! Eu consigo equilibrar a xícara na testa! –ele disse acenando, então a cadeira caiu para trás, levando o garoto e a xícara junto.

“Alec, você não entende mesmo o que pode provocar nelas, não é?”, pensou sorrindo e indo ajudar o menino a se levantar.

Todos os ensaios tiveram bons resultados, ou pelo menos quase todos. Tomás tinha que improvisar bastante o cenário, que muitas vezes estava faltando. Daren seguia a se recusar a usar a roupa, mas com Idan insistindo nele pelo menos atuar nos ensaios, nunca faltava.

Então, depois de muitos escorregões e trapalhadas no palco, chegou o ‘grande dia’. Estavam todos atrás das cortinas, nervosos com a peça que começaria em instantes.

Do lado de fora estava mais da metade da turma, Luza e Meyr, que esperava tudo com um sorriso no rosto. Além de mais uns alunos de outras séries, que pareciam interessados na peça. Ou estavam ali para rir um pouco.

-Eu tenho medo de palco, não dá, não dá! –Tomas começou a surtar.

O arco de orelhas de gato roxas combinavam com a roupa lilás e o cinto com uma cauda da mesma cor. O ‘cheshire’ parecia que ia ter um ataque de asma a qualquer hora.

-Acalme-se Tom, não é nada de mais, só uma peça. –Sarae consolava o garoto.

-Nãããão!! Isso é trágico! Horrível! –Daren chegou irritado e assustado ao mesmo tempo, com um pacote em mãos- Chamem a ambulância, a FBI, a CIA!

-O que aconteceu Daren? –Idan perguntou erguendo uma sobrancelha.

-E-Eu não achei um substituto! E agora? Eu não quero usar essa droga de roupa!

-Para de drama coelho sabido, você sabe as falas e tudo. É só não usar se não quiser. –Naehe disse frustrada.

-Não, eu venho de família nobre e devo cumprir minhas promessas. –disse com um tom melancólico- Mas eu não quero me vestir de coelho...!

-Ah, o coelhinho perdeu a aposta, é? –Meyr colocou a cabeça para dentro das cortinas- Que peninha, agora coloca essa droga e faz uma boa atuação.

-Aposta? –Alec chegou tentando andar sem deixar o chapéu cair.

-Eu e Daren apostamos que se ele não conseguisse um substituto, teria de usar a fantasia o dia todo.

Todos olharam Daren, que estava tentando disfarçar seu rosto queimando de vergonha. Alec não segurou a risada.

-Porcaria.

-Vamos, cinco minutos pra começar! –Meyr sorriu e voltou à sua cadeira na platéia.

Cortinas fechadas. Todos estavam nos seu lugares, menos Daren. Tomás estava em cima da escada alta em que ficaria quase a peça toda, tendo pequenos surtos de medo. Os gêmeos estavam vestidos exatamente iguais, também participariam da peça.

Esperaram um pouco para começar. Cinco, dez, quinze minutos.

-Eu vou lá dentro buscar ele. –Idan saiu andando.

Esperaram mais um pouco, então uma risada.

-A droga da roupa ficou pequena!

-isso que dá ser teimoso e não experimentar antes!

-Calado, eu não vou sair assim! Não importa o orgulho da família, eu não vou! Me solta Idan!

Então os dois voltam, Idan empurrando o namorado. Todos tiveram um pequeno choque.

O arco torto com duas fofas orelhas beges combinava com o rabinho felpudo enorme. No pescoço, um lenço vermelho. A blusa estava certamente curta, e batia pouco depois de seu peito, deixando a barriga de fora.

As calças escondiam as pernas bambas de vergonha dele. Grandes pantufas de pé de coelho serviam de sapatos e luvas fofinhas de patas cobriam as mãos de Daren, que queria matar os gêmeos agora.

Silêncio, então, um ataque em grupo de risos, que fizeram o rosto de Daren corar mais ainda.

-Você tá lindo, hein? –Naehe brincou.

-Arr, calem a boca! –ele disse marchando com passos pesados até seu lugar.

Então as cortinas se abriram, finalmente. Muitos não cessaram de rir da linda fantasia de Daren. Tomás perdeu um pouco do medo, e até riu junto ao decorrer da peça. Julieta e Naehe estavam tensas, esperando o grande final.

Que chegou por fim. A cena final que todos que leram o roteiro esperavam ansiosos.

A última fala e então, os dois se aproximaram. Naehe tinha o rosto vermelho e Alec sorria doce como sempre, estava tão calmo.

Mas então, uma interrupção.

-Nãããão! –uma tal duquesa de nome Julieta se meteu no meio- Como duquesa do reino de Copas, não posso permitir tal ato!

-Isso estava no roteiro? –Matheus perguntou no canto do palco.

-É a arte do improviso. –Mathias sorriu sentado à mesa assistindo.

-Calem-tes, gêmeos bastardos. –Julieta fez uma pose dramática.

-Ela nos chamou de bastardos? –os dois disseram em uníssono.

-Continue o roteiro! O roteiro! –Idan disse entrando em cena para tentar afastar Julieta dali.

-Sai coelho! –ela empurrou o garoto, que caiu no chão.

-Epa, cuidado com ele! –Daren saiu de debaixo da mesa (o que ele fazia ali?) e foi levantar o namorado.

-Sem violência gente. –Sarae disse assustada.

-Epa, epa! –Alec deu um passo para trás.

Naehe, Daren e Julieta se empurravam de um lado pro outro. Acacabaram por derrubar uma cadeira, que derrubou uma árvore que derrubou a escada.

-Ah! –Alec somente disse antes de receber a escadada na cabeça.

-Alec! –Naehe olhou-o.

-Oh deus. –Sarae suspirou.

Então todos congelaram por segundos.

Um beijo. Mas não foi exatamente o que esperavam. Está mais para um... Acidente.

Em cima de Alec estava a figura ruiva, a qual beijara por acidente. Tomás e Alec não perceberam de primeira. Logo abriram os olhos e perceberam que se beijavam.

Por puro acidente, Tomás estava em cima da escada na hora que esta caiu. E por sorte, nenhum dos dois se machucara.

-Vamos fechar as cortinas e acenar sorrindo como se isso fosse o previsto... –Matheus disse baixo forçando um sorriso enquanto as cortinas se fechavam.

-...Que ocasião peculiar, vamos fingir que não vimos isso. –Mathias concordou com seu gêmeo.

Tomás separou o beijo e pulou para o lado, assustado e sem palavras.

-Isso que eu chamo de final surpreendente. –Idan sorriu.

-Agora quero ver piadinha com gays, Alec. –Daren disse glorioso.

-Então vou começar com piadinhas de coelhos. –Alec se sentou e apoiou o queixo na palma da mão.

-Droga.

Julieta e Naehe estavam sem palavras, de olhos arregalados. Tomás não estava muito diferente.

-A-Alec.. D-Desc... –Tomás começou.

-Ah, não se preocupe! –Alec disse olhando-o- Não foi nada.

-Surpresas, meninas? –Sarae olhou as duas dando língua.

-Trégua? –Naehe olhou Julieta de canto.

-Trégua. –disse e olhou Tomás na pura raiva- TOMÁS!!

-Ahh! –o ruivo levantou e saiu correndo, com Julieta correndo atrás.

-Me devolva meu beijo, idiota! Eu vou te fazer engolir as orelhas de gato!

Os seis estavam voltando a pé para casa, todos juntos. Trocados de roupa, todos menos Daren, que andava vestido de coelho pelas ruas.

-Eu odeio minha vida. –disse emburrado- Como vou explicar isso aos meus pais...?

-Pelo menos ganhamos a pontuação máxima. –Sarae deu de ombros.

-Se não ganhássemos eu colocava a Luza na justiça. –Naehe zombou.

-Foi o pé de coelho da sorte do Daren! –Idan brincou.

-Eu não tive tanta sorte. –Tomás disse, com um dos olhos roxos por causa do lindo soco que recebera de Julieta.

-Alec, o que está vendo? –Sarae olhou-o.

-Meyr tirou umas fotos pra mim... Pfff, vai tudo pra internet. –Alec disse provocador.

-O Quê?! Me dá isso agora, Alec! –Daren gritou.

-Nananinanão! –Alec saiu correndo e rindo.

-Volta aqui!!

E assim os dois saíram correndo, seguidos pelos outros quatro.