A Protagonista Feminina escrita por Star


Capítulo 3
Capítulo 3




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As provocações continuaram. Desde o material jogado na água, até animais peçonhentos escondidos dentro de cada embalagem de lanche que poderia chegar às mãos da protagonista feminina. Da clássica brincadeira do balde de água preso à porta até um falso classificado no jornal escolar onde um anônimo misterioso se passava pela garota e implorava em desespero absoluto por um namorado, alegando carência ao nível de insanidade, o que resultou em um bom número de nerds gordos, desengoçados e fanhos fazendo fila na sua sala de aula.

Chegaram a fazer um site com montagens do rosto magro da garota em corpos barrigudos em posições do kama sutra, e até mesmo as divulgaram para um anunciante de produtos de emagrecimento que adorou a idéia, e logo o rosto da garota que ninguém sabia o nome estava impresso em propagandas de revistas e outdoors, junto de um corpo deformado que não era o seu e fazendo poses vergonhosas que nem Jesus perdoaria para divulgar as novas pílulas de ômega três.

Espalharam outras montagens para o jornal, envolvendo a garota e o professor mais charmoso da escola, transformando-a em um alvo a ser destruído por toda a sociedade feminina de estudantes. As armações não eram sequer algo trabalhoso para os gêmeos, eles tinham dinheiro e poder o suficiente para fazer o que quiserem, além de uma enorme dedicação por algo que pudesse entretê-los em seu tempo livre. Mesmo que tudo isso causasse mais satisfação para um que para outro.

– Está tudo pronto para amanhã, Kaoru – o mais velho falou com um sorriso animado no rosto, jogando-se no sofá com o telefone ainda em mãos.

Kaoru baixou o jornal com a manchete escandalosa “PROFESSOR E ALUNA MANTÊM RELACIONAMENTO ARDENTE EM SEGREDO” seguida de vários pontos de exclamação e muitas fotos pornográficas censuradas que lhe cobria o rosto e lançou um olhar entediado ao irmão.

– Hikaru, não acha que isso já está durando demais?

O mais velho franziu a testa.

– O que quer dizer com isso?

– Foi divertido, nas primeiras... duas semanas. Mas isso já está se tornando cansativo. Por que continuar implicando com a tábua megera? Ela nunca rebate mesmo. Não liga pra nada que façamos. Por que não a esquecemos de uma vez e vamos para a próxima? Nossa caixa de correio está lotada de cartas, você sabe. Há dezenas de garotas que ainda esperam ansiosamente por uma resposta, e aposto que no estado de carência em que estão será fácil convencê-las a fazer qualquer coisa. Ou podemos só dar um tempo com isso.

Hikaru sentou-se no sofá, estava perplexo com o pensamento do irmão. Ele achava que os dois estavam se divertindo da mesma forma como faziam sempre, mas pelo visto estava errado. E mais, como Kaoru pôde cansar tão cedo, enquanto ele ainda tinha tanto entusiasmo? Era tudo tão claro para ele, então porque Kaoru pensava tão diferente? Duas pessoas não podem estar certas com dois pontos de vista tão diferentes.

– Mas Kaoru, não se trata mais de apenas uma vingança, eu...

– Está implicando para tentar fazê-la revidar. É isso, não é?

Hikaru parou, pensando. Era isso o que queria dizer, mas... Bem, não exatamente com essas palavras.

– Eu não estou implicando, - se defendeu, com o orgulho escapando nas palavras - só me aborrece que ela permaneça com pose de inatingível, não importa o que eu faça.

– Hikaru, você só não está acostumado a ser ignorando. Não é tão grandes coisas assim.

Mesmo sendo o mais novo, Kaoru era sempre o mais maduro, e havia percebido a real intenção do irmão há muito tempo atrás, da mesma forma que conhecia seu orgulho teimoso desde que nasceram, e por isso preferira não falar. No entanto, as coisas já estavam se tornando muito cansativas, e era hora de dar um basta antes que o irmão fizesse uma besteira de verdade.

– Pode me esquecer na sua próxima brincadeira. Ficarei para ver, mas não terei participação alguma. E não irei mais ajudar em nada que ande planejando fazer. Pelo menos nada com relação àquela garota. Não encare isso como um fora, estou apenas parando de lutar uma batalha que não é minha.

Saiu da sala, deixando Hikaru sozinho ainda com o telefone em mãos. O ruivo coçou levemente o maxilar, esfregando a mão pelo rosto.

– A última brincadeira... Hm, tudo bem. Posso viver com isso.

XxX

O sinal das aulas ainda não havia tocado, de modo que eram poucas as pessoas que já estavam nas salas. Dentre elas estavam os gêmeos, a representante de sala, Miyako, e umas três garotas que haviam praticamente implorado para entrar e saborear a brincadeira por um ângulo privilegiado. Hikaru tentava equilibrar o balde de metal sobre a porta entreaberta, com a habilidade natural de quem já havia feito isso uma porção de vezes antes. Sentado no parapeito da janela, Kaoru apenas observava o irmão, com a representante ao seu lado tagarelando sem parar.

– Um balde de novo? Que coisa mais sem graça. Acho que seu irmão está perdendo a criatividade.

Kaoru balançou a cabeça levemente, apesar de estar por fora dessa vez, acreditava no potencial do irmão.

– Só espere e vai ver.

Hikaru terminou seu trabalho e olhou de todos os lados para ver se a trajetória do balde quando a porta fosse empurrada não poderia ser para o outro lado, e estava tudo certo. Assim que escorou-se na parede ao lado do irmão com um sorriso satisfeito, o sinal de começo das aulas tocou. Uma das garotas que riam em um canto tirou de dentro da mochila uma câmera fotográfica.

– Importam-se se eu registrar? Sabe, é pro jornal da escola.

Hikaru deu de ombros.

– Por mim tudo bem.

Podia-se ouvir o movimento de pessoas do lado de fora pelo corredor. Não corriam o risco de um outro aluno sem sorte cair na brincadeira sem querer, porque todos os daquela sala já haviam sido avisados, tanto que tentavam criar grupinhos disfarçados em frente à sala de aula e assistir à peça da vez.

Não demorou muito, e a protagonista feminina apareceu pelo corredor. A sua mochila estava caída em um ombro só, e segurava dois livros de língua estrangeira junto ao peito. Quando passava, ouvia burburinhos e risadinhas soltas em sua direção, mas já havia se acostumado a isso desde o episódio em que se sentara dentro do chafariz porque estava cansada de recolher caneta por caneta de pé ao sol do meio-dia. De longe, viu a porta da sala encostada. Isso era estranho, principalmente devido ao entra-e-sai de alunos indo encontrar os amigos de outras classes. Reconheceu metade de sua sala esperando do lado de fora. E, quando parou prestes a empurrar a porta, sabia com certeza de que havia algo errado. Ela sabia do balde, antes de abrir. Porque ela não era idiota. Abaixou os livros, de modo a tentar protege-los para que, fosse o que fosse, não os sujasse, e foi em frente. A única coisa que tinha em mente é que se e é isso o que ele quer, é assim que vai ser.

Houve o barulho de algo gosmento, seguido de um som abafado. Foram poucos segundos até que os espectadores da sala e do corredor caíssem em gargalhadas. A posição do balde havia sido tão perfeitamente calculada que a garota agora estava com o balde encaixado em sua cabeça, enquanto uma gosma escura de cheiro podre que lembrava xixi de gato e peixe cru misturados escorria pelo seu uniforme. O líquido suspeito criava uma sensação desconfortável pela pele, além de um cheiro nauseante demais para si mesma. A protagonista feminina largou os livros que havia protegido colocando-os pra trás do uniforme no chão, e devagar tirou o balde da cabeça, da mesma maneira cuidadosa que tiraria um esparadrapo de um machucado. A primeira coisa que viu foi ele, o ruivo, escorado na parede, com ar de triunfo. Colocou cuidadosamente o balde no chão, de canto de olhou viu o clarão de um flash vindo da mesma direção das garotas da sala que já estavam com lágrimas escorrendo pelos olhos de tanto rir.

Hikaru esperava, com uma falsa cara de paciente, pela sua reação. Ela iria chorar? Iria explodir de raiva, xingando-o dos piores nomes possíveis? Não importava. Ela sem dúvidas faria alguma coisa. Não tinha como ignorar isso. Não tinha como ignora-lo dessa vez.

Devagar, viu as duas mãos pegajosas da garota se erguerem até o pescoço e por um segundo chegou a parecer que ela estava tentando se enforcar, mas aos poucos as mãos foram descendo, mostrando que na verdade, ela estava... Tirando o uniforme. Desabotoava calmamente botão por botão, talvez encontrando alguma dificuldade graças à substância grudenta, mas inerte às risadas frenéticas que vinham pela sala e pelo corredor.

– Meu Deus, mas o que ela está fazendo agora? – Falou a representante de sala, entre elegantes risinhos que tentava esconder colocando a mão em frente à boca.

A blusa já escorregava pelos ombros sujos, mostrando parte do sutiã. Ela não parecia estar de brincadeira.

Hikaru estava perturbado, de todas as reações imagináveis, incluindo se atirar da janela do prédio, essa era a única que ele não havia pensando, e tampouco conseguia entender.

– O que você está fazendo? – Repetiu a pergunta da representante, mas a garota a sua frente o ignorou, então tentou novamente, um pouco mais impaciente e desencostando-se da parede. – Ei, o que está fazendo?

– Deixando o seu trabalho mais fácil.

Assim que falou, removeu a blusa desabotoada dos braços cobertos pelo musgo fétido, e abaixou a saia do uniforme escolar, chutando-a para um lado. Pisou nos sapatos e nas meias, removendo-as também. Estava expondo seu corpo magricelo e pálido, coberto apenas pelo conjunto simples de um sutiã branco muito folgado por sinal, e a calcinha de mesma cor.

Os espectadores estavam em choque, mas alguns ainda não haviam parado de rir.

Aparentemente havia algo de muito cômico na figura de uma garota magrela apenas de roupa íntima e coberta por algo verde escuro e misterioso. O dedo da representante do jornal da escola ferveu em cima do botão da câmera, causando inúmeros flashes.

– Se é me humilhar que você quer, então é isso o que vou fazer.

A protagonista feminina deu meia volta, e começou sua caminhada pelos corredores do colégio. A cada passada deixava pegadas feita pela sujeira que lhe cobria, e uma porção de estudantes ia a acompanhando, apontando, dando risadas, ou simplesmente tentando entender o que estava vendo.

Ainda dentro da sala de aula, Hikaru voltou a se escorar na parede, em um movimento tão brusco que parecia ter jogado o corpo inconscientemente. Ele estava em choque e não conseguia entender o que tinha acabado de acontecer.

– Caramba, essa sim foi quente. O jornal de amanhã vai vender mais do que rosquinha em acampamento pra gente gorda – comentou a garota da câmera, conferindo as fotos na tela digital.

Kaoru ignorou o comentário e olhou para a cara confusa do irmão.

– Não me parece que foi essa a sua intenção.

– Não era.

– E o que pretende fazer agora?

Hikaru o olhou, ainda muito confuso e perturbado.

– Como assim?

– Não pretende deixar uma garota seminua e suja perambular pelos corredores e virar um alvo de difamação maior do que já é só por causa do seu orgulho, não é?

Vendo que o irmão não respondeu, Kaoru insistiu.

– Não é?

Hikaru não respondeu, apenas olhou para frente, pros restos do que deveria ser a brincadeira que resolveria tudo e faria a menina finalmente expressar qualquer sentimento com relação à ele, mas pelo visto as coisas não deram muito certo. Por que havia insistido tanto naquilo, afinal? Haviam tantas outras dispostas a vender a própria alma para ele... Que droga, quem estava errada ali era ela, não ele! Ela era uma idiota debochada! Era a porra de um robô sem emoções! E ele precisava falar isso para ela, imediatamente!

E por isso, só por isso, ele saiu correndo da sala, seguindo os pingos de musgo no chão, até encontrar a garota que queria.


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Notas finais do capítulo

Tipo... oi. Tudo bem, talvez tenha ficado mais sem nexo do que eu imaginava. Eu entendo, eu entendo a cara de vocês de "WTF ACONTECEU AQUI?", "como o gêmeo-cabeça-quente-e-tudo-de-bom foi cair de amores pela magricela?", "MAS O QUE INFERNOS DEU NA CABEÇA DESSA MENINA?", entendo, sério mesmo, do fundo do coração. É a respostas pra todas essas perguntas é... bem, eu não sou lá uma boa escritora.Para os que ainda tiverem coragem de acompanhar... review? 8DDDDD''