Amor à última Vista escrita por M4r1-ch4n


Capítulo 5
Capítulo 4




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          Parecia que a sorte do moreno havia deixado-o por completo naquela dia: seu braço ainda doía de dois dias atrás, quando Schuldig havia reaberto sua ferida tão gentilmente. Para piorar, naquela manhã uma das freguesas do Koneko havia praticamente se costurado ao seu braço esquerdo, não largando do mesmo por um segundo e causando ondas de dor toda vez que ela se mexia ou pedia um favor para Ken. E por último, a queda de força que obrigou todos os membros do Weiß a andarem com velas pela casa.
          O cansaço de todo aquele dia tumultuado havia feito o moreno ignorar a piada sobre todos darem um jantar romântico para celebrar o retorno das velas por parte de Yohji, se trancando no seu quarto assim que conseguiu subir os dois lances de escada que o separava da cozinha. Atravessando o quarto com parcial dificuldade, já que algumas roupas e objetos estavam espalhados pelo piso, Ken colocou a vela na ponta da escrivaninha que ocupava seu quarto, deitando-se na sua cama logo depois.
          Dobrando o braço direito e colocando-o por debaixo da cabeça, o ex-jogador de futebol passou a observar os desenhos abstratos que a luz da chama da vela desenhava no teto, sua mente relativamente calma e em paz àquela hora. Ele não teria de acordar cedo na manhã seguinte para trabalhar, o que lhe dava tempo para pensar.
          E pensar, ultimamente para o assassino, era sinônimo de tentar entender o que Schuldig tanto queria com ele.
          Ken chegou à conclusão de que o telepata estava tentando enlouquecê-lo. Mas por que ele não conseguia rebater as ameaças e matar o outro de uma vez era um mistério. Ele sabia que poderia ter se empenhado mais nos recentes confrontos que tivera com a figura nada discreta dos Schwarz, mas de alguma forma, decidira contra o lógico.
          A resposta para a questão que o atormentava era simples, mas por sua vez, mais complicada de aceitar que o problema. Virando-se na cama e encarando a parede, o moreno tentou imaginar como seria seu dia a dia sem o alemão atrás dele, em uma perseguição a qual o outro havia praticamente se acostumado. Mas ao contrário da sua rotina, os passos de Schuldig eram sempre imprevisíveis.
          O telepata também não fazia questão de esconder que se sentia atraído pelo moreno, embora Ken não fizesse idéia do por que; ele não era como Aya ou Yohji, com uma beleza notadamente exótica ou até mesmo como Schuldig, que tinha clara consciência do seu físico e sabia usá-lo como ninguém. O quê ele poderia ter que fosse tão particular e especial a ponto de trazer o temido telepata de cabelos cor de fogo até ele?
          Estar sendo cortejado por outro homem não era o problema para Ken, por mais absurdo que aquilo pudesse soar; ele havia se acostumado com isso ainda nos tempos da J-League. Mas o que fazia seu coração parecer apertado e sua cabeça girar era o fato de que a pessoa do outro lado era seu...
          Inimigo.
          E inimigo mortal, por sinal. Enfiando a cara agora no travesseiro e fazendo barulhos estranhos, o ex-jogador de futebol desejou que tudo aquilo parasse e voltasse ao normal, quando sua vida parecia mais simples.
          Com a face oculta pelo seu travesseiro, Ken não percebeu a vela sobre a sua mesa ser apagada, nem ouviu os passos suaves que atravessaram seu quarto em direção a sua cama. O vento que vinha da janela, recentemente aberta, também era mínimo.
          O moreno quase gritou quando sentiu uma respiração muito familiar na sua nuca, mechas de cabelo se arrastando sobre a sua pele em um lugar tão sensível que causava arrepios na sua espinha. Decidido a não se submeter mais ao seu formidável inimigo, o ex-jogador de futebol virou seu corpo, empurrando o alemão para mais longe e sentando na cama, o invasor do seu quarto ficando em uma posição mais ou menos similar.
          A escuridão era total no cômodo, mas a luz terminou por voltar naquele momento, o único abajur que Ken tinha no seu quarto sobre a escrivaninha acendendo sozinho; ele deveria ter deixado o mesmo ligado antes da força cair. Olhando de volta para o telepata, Ken se assustou.
          Era quase como se os olhos azuis do alemão fossem os seus. Ele viu, pela primeira vez no rosto do outro, confusão, raiva e alguma coisa que ele classificava como...
          Desejo.
          Todas aquelas emoções desapareceram dos olhos azuis do alemão assim que o outro piscou. Talvez Schuldig não estivesse esperando pela repentina volta da luz e não contasse com a opção de seus olhos estarem expostos... Ele não podia prever o futuro.
          Pensando em futuro, a mente de Ken retrocedeu até o último encontro com o outro homem e suas palavras. Sua mente trabalhava em uma velocidade alucinante, rápida demais para que até mesmo o telepata ali presente entendesse para onde o raciocínio do moreno o estava levando.
          - Justificativas.
          Sem pensar ou falar mais nada, foi Ken quem alcançou os lábios do alemão com os seus, em uma busca para entender mais sobre si mesmo, mais sobre o outro. Porque afinal, preto e branco são diferentes até a hora em que se fundem e viram cinza.

          Esfregando os olhos, o moreno levantou com esforço da cama, ouvindo a porta sendo nada gentilmente espancada por um Yohji de mau-humor. Ken conseguiu colocar um sorriso no rosto a tempo de abrir a porta; o playboy sempre ficava daquele jeito quando era ele que tinha que pegava os primeiros turnos na floricultura e o ex-jogador de futebol era quem dormia mais no dia.
          - Ohayou, Yotan! Dormi tão bem... - Ken se esticou confortavelmente na frente do outro, que tinha os olhos vermelhos da curta noite que ele tivera.
          - Ken. Você vai acabar enforcado no teto se não colaborar.
          - Mas eu não estou fazendo nada! - o outro rebateu com um ar inocente.
          - Claro. - Yohji grunhiu - Tem um pacote para você lá embaixo. Desce logo e assina para o carteiro ir embora, ele está assustando as minhas fãs... - o loiro acabou de explicar, virando-se para descer as escadas e retornar à floricultura. Ken saiu para o corredor atrás dele:
          - Na verdade, Yotan, é a sua cara de sono que está mandando todas elas para longe!
          Rindo que nem um maníaco, o moreno entrou de volta no seu quarto antes que um fio resistente e letal se amarrasse ao redor do seu pescoço. Sentindo-se estranhamente bem-disposto, Ken apenas colocou uma camisa sobre os seus shorts de dormir, abrindo o armário de onde havia retirado a blusa novamente para pentear seu cabelo com as mãos.
          De repente, ele se lembrou da noite anterior. Ou de pelo menos, algumas partes dela. Ele não estava vestido com aquela roupa, muito menos... Virando sua cabeça, encontrou seu abajur apagado.
          Ele não havia apagado aquele abajur também.
          Surpreso, ele descobriu que suas memórias iam até o ponto onde ele havia beijado Schuldig, não restando nada mais depois disso. Por mais que ele tentasse, fizesse esforço para lembrar do que havia acontecido, não conseguia, recebendo apenas um branco como resultado. Era como se ele tivesse caído no sono no momento seguinte após ter beijado os lábios quentes do alemão.
          Como sua roupa havia mudado e como a luz havia apagado ele não tinha idéia. Caminhando até a sua janela que estava aberta, ele notou que uma das árvores da calçada subia até a altura do seu quarto, possibilitando a entrada de qualquer pessoa ali dentro; ele nunca havia dado maior importância para isso porque, sendo um assassino treinado, dificilmente alguém o machucaria tentando entrar ali de noite, já que o moreno perceberia a presença de alguém de imediato. E depois, sua janela ficava geralmente encostada.
          O problema era que agora não era um simples alguém que o perseguia. O sorriso sincero que tinha no rosto para irritar Yohji havia desaparecido, dando lugar a uma leve contração das suas sobrancelhas. Suspirando e desistindo de lembrar o que havia acontecido na noite passada, ele acabou descendo as escadas, sua mente tão preocupada com as últimas horas que havia vivido que nem se lembrou de que ele não estava esperando pacote algum.

          Algumas garotas deram gritinhos e exclamações de alegria enquanto apontavam na direção de Ken, o moreno sorrindo brevemente na direção delas e saindo da floricultura, vendo que de fato um carteiro o esperava do lado de fora com um pacote de tamanho mediano debaixo do braço. Depois de murmurar um curto "bom dia" e acenar para um Omi animado como sempre, Ken finalmente se apresentou na frente do carteiro.
          - Hidaka Ken, eu presumo?
          - Hai, sou desu [1].
          - Assine aqui, por favor. - o homem mais velho sorriu e passou a prancheta para o destinatário do pacote, e Ken rabiscou sua assinatura ali rapidamente. O papel com a rubrica do assassino trocou de mãos novamente e o assassino recebeu sua encomenda.
          O moreno entrou de volta para o Koneko, cumprimentando uma das garotas que era uma freguesa mais freqüente, apoiando o pacote no balcão que Aya geralmente usava para fazer os embrulhos, mas como o espadachim não tinha o primeiro turno também, Ken achou que ele estava fazendo alguma outra coisa em casa. Coçando a cabeça, o assassino achou estranho não haver um remetente.
          Franzindo a testa de leve, ele abriu sem dificuldade o embrulho, tirando uma caixa menor de dentro dele. Abrindo a caixa, olhos turquesa se arregalaram ao serem presenteados com a visão de uma camisa de futebol oficial e nova em folha. Piscando, ele retirou a mesma da caixa, desdobrando-a e colocando contra o próprio corpo, surpreso ao ver que ela servia perfeitamente para ele.
          - Ken-kun! Ganhou uma camisa?
          O assassino de codenome Siberian sorriu animado para o seu colega mais novo, exibindo a bonita camisa, branca, enfeitada com linhas nas cores preto, vermelho e amarelo, três estrelas amarelas brilhando sobre o logotipo circular também preto.
          - Acho que você nunca tinha comprado uma da Alemanha antes, ne Ken?
          - Não, nunca comprei. Deve ter sido meio cara...
          - Verdade. - Omi concordou com a cabeça - Sorte a sua ganhar uma agora, tão perto de outra Copa do Mundo. - Omi riu da coincidência - Quem quer que tenha mandado para você acertou em cheio no presente.
          - Não posso dizer que não. - Ken riu de volta para o menor dos Weiß e pegou as coisas do balcão, acenando para os dois assassinos que estavam trabalhando e subindo as escadas de volta, ansioso para provar a sua nova camisa.
          Quem será que havia enviado para ele? Não era incomum que presentes chegassem para eles sem endereço de retorno, já que as meninas que freqüentavam a floricultura geralmente eram tímidas demais para revelarem seus nomes verdadeiros, exceções feitas às garotas que nem a que tinha se agarrado a Ken no dia anterior.
          A memória fez o moreno colocar a língua para fora em uma careta, girando a maçaneta do seu quarto logo depois. Pacote atirado sem maiores cerimônias na cama, o animado assassino abriu de novo a porta do armário que tinha o espelho acoplado à mesma, jogando a sua camisa no chão e colocando a alemã por cima.
          Ao se virar para ver como ficava a parte de trás com um grande número dezenove em baixo da palavra "Deutschland" em preto, Ken notou um pequeno papel branco dobrado caindo ao chão, de dentro da camisa.
          Intrigado, ele se abaixou e pegou o mesmo, abrindo-o rapidamente e lendo as curtas linhas escritas em uma caligrafia corrida, mas ainda sim legível. A mensagem estava escrita da esquerda para a direita, na horizontal, do jeito ocidental, e se tratava de um endereço, não muito longe do Koneko. Acompanhavam também uma data, que batia com aquele dia, e horário, além de uma assinatura, única parte do bilhete que não utilizava nenhum dos alfabetos nipônicos mas sim um ocidental; as letras cheias de curvas do último formavam o nome "Schuldig".


[1] Sim, isso mesmo.


Continua...


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