Aprendendo a Ser Feliz escrita por Monah


Capítulo 2
Recém chegada ao inferno


Notas iniciais do capítulo

Segundo capítulo trazendo mais história. Por favor, se houver algum errinho de concordância ou digitação me informem. Beijos :-*



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Capítulo 2 – Recém chegada ao inferno

“Apressa-te a viver bem e pensa que

cada dia é, por si só, uma vida.”

(Sêneca)

 

 

          O velho trem de ferro ainda funcionava em County Hills, e ele levara Jenie até a estação sendo ali o ponto final mais distante de Los Angeles. Cada vez mais seu mundo se distanciava até tudo terminar ali, naquela medíocre estação de trem. Primeiro o aeroporto de Los Angeles, depois o de Londres. Dois ônibus até Oxford e por fim o trem de ferro que a levaria ao seu destino final.

 

          Olhou entediada para as pessoas que esperavam do outro lado dos trilhos. Nenhum rosto conhecido seu. Será que a mãe ao menos não havia ido esperá-la? Fazia dois anos que não pisava naquele chão. A última vez fora no verão de 1988, quando ainda tinha treze anos. A Sra. Mary parecia adoentada obrigando o ex-esposo a levar a única filha para uma visita. Ainda assim no curto espaço de tempo que estiveram ali houve oportunidade para discussões. Mary deveria gostar muito de ver James irritado, pois nem depois de tantos anos lhe dava uma trégua.

 

          Um homem alto de cabelos meio grisalhos encarou a mocinha ruiva que esperava sentada num dos bancos de pedra. Pela descrição e pelas fotos que vira, na certa seria aquela a senhorita Jeniffer Rutherford.  

 

          _Por acaso você é a senhorita Jeniffer, filha de Mary Rutherford? _Perguntou sério ainda estudando a menina.

 

          _Por acaso sou. E quem é você? _Ela mediu o homem de cima a baixo.

 

         _Prazer, sou Ronald Endrills, o motorista que trabalha para sua mãe. Vim levá-la até sua casa.

 

        _E por que esta não veio pessoalmente? _Jenie sentiu profundo desgosto. Como sempre sendo rejeitada pela orgulhosa Sra. Rutherford.

 

          _Sua mãe anda muito ocupada com os assuntos da Igreja. Pediu desculpas por não poder vir, mas logo a verá assim que chegar da quermesse beneficente.

 

         _Quermesse beneficente? Desde quando mamãe participa dessas coisas? Enfim... _Tudo lhe parecia mais que estranho. A mãe nunca se envolvera com tais coisas que julgava vulgares e estúpidas.

 

         Tratou de entrar no carro e nele seguiu com o motorista até a rua de sua velha casa. Chagando avistou um gramado bem cuidado, árvores aparadas e flores que cresciam alegres em volta do portão. A casa tinha sido reformada e pintada de azul pálido. Estava um tanto melhor do que da última vez que a vira há dois anos.

 

          Papai deve ter mandado muito dinheiro para cá.” _Pensou Jenie estudando a residência. Mary por ter ficado sozinha sempre cobrara do ex-marido uma ajuda para segundo ela ‘não morrer às mínguas’. O chamava de ingrato, sem-coração e crápula por tê-la abandonado em County Hills, contudo, James nunca a tivera deixado desamparada. Sempre que podia mandava-lhe uma boa quantia para suprir as necessidades. Afinal Mary era a mãe de Jenie, a pessoa mais importante em sua vida.

        

 _Oh, a filha da Sra. Mary! Queira entrar e se acomodar, por favor. _Falou uma mulher já aparentemente madura ao ver Jenie descer do carro.

 

 _Prazer, sou Lucy, uma criada de sua mãe. Esta não está no momento, pois-!

         _Ah já sei! Está numa quermesse beneficente. Era só o que faltava! _Cortou Jenie cansada de tanta embromação. Tão bem de vida estava a mãe agora com criada e motorista. De fato aquilo a irritava. Então era pra isso que o dinheiro do pai servia? Enquanto em Los Angeles eles mesmos se viravam sem nenhum empregado. Sempre levaram uma vida confortável, contudo sem gastos desnecessários e a mãe ali vivendo como perfeita dama inglesa. 

 

         _Creio que deve estar cansada da viagem. Deseja repousar em seu quarto? _Lucy perguntou sem jeito.

 

           _Pode ser. _Respondeu seca a mocinha das longas madeixas avermelhadas.

 

          Entrou sem mais delongas. Notou a mobília nova da casa. Tapetes e cortinas de seda por toda parte acompanhando estatuetas de anjos e vasos de flores orientais. Seu quarto estava do mesmo jeito, contudo, preparado para sua chegada. Abriu a janela e perscrutou o horizonte plano que dava vista para a grande planície verde ainda encoberta de flores resistentes ao verão. Dali a dez dias chegaria o outono e quem sabe a paisagem tomaria outras cores e aromas.

 

          Abriu as malas e começou a arrumar suas roupas no closet. Mais coisas chegariam depois com um motorista particular encarregado de trazer tudo o que havia ficado na casa de Los Angeles. Ali viriam não só seus pertences, mas os do pai como sua máquina fotográfica e objetos do estúdio em que ele trabalhava. Sempre fora fascinada pela profissão de fotógrafo do pai. Achava lindo cada vez que este ia à caça das celebridades e depois revelava as fotos para as revistas e jornais. Estava sempre junto de pessoas importantes cheias de histórias. Orgulho. Era isso que Jenie sentia do homem maravilhoso que fora James Rutherford.

 

          Desde pequena se acostumara a saber tudo dos famosos como se eles fossem pessoas do seu dia-a-dia. Ainda criança poderia ser interrogada sobre a festa em que Madona estivera no último sábado, sobre a cor de sapato usada por John Travolta em seu último filme, tudo Jenie sabia dos famosos porque seu pai era mais que informado. Sua maior alegria era acompanhar o pai em eventos sociais onde os jornalistas e fotógrafos se reuniam com os famosos. Tantas vezes conseguira fotos com Michael Jackson, autógrafos de Whitney Houston, beijinhos da Britney Spears. A filhinha linda de James Rutherford, o fotógrafo mais requisitado de Los Angeles pelas estrelas.

 

          Aquele era o mundo de Jenie. Tão cercado de brilho e glamour que lhe ofuscavam os olhos. Crescera atenta para a moda, bonita, popular e comunicativa. Sempre fora bem vista na escola onde as amigas invejavam não ter um pai tão ‘maneiro’ como o seu. Levada desde pequena aos grandes teatros, shows e eventos fora gostando da música, da dança e da fama. As esmeraldas da pequena Rutherford brilhavam ambiciosas sonhando um dia também fazerem parte daquele mundo rico onde o show não podia parar.

 

           E quando aos quinze anos sua flor estava no ponto de ser desabrochada, tudo começava a sair errado. A terrível morte do pai de uma hora para outra e a volta para a Inglaterra onde estava confinada a viver isolada do seu mundo glamoroso.

 

          Jenie sentou-se na cama e suspirou cansada. Por mais que quisesse acreditar que estava vivendo um pesadelo, não era mais possível. O tempo havia passado e era hora de despertar para a realidade. Aquela vida doce na Califórnia não iria voltar. O pai estava morto e enterrado.

 

          Saiu do quarto estudando a casa. Notou que muitos cômodos estavam diferentes e maiores. De fato a casa tinha sido reformada e aumentada. A fachada muito bonita nem parecia a mesma de dois anos atrás. Quase não reconhecera o requinte das paredes todas em papel mosaico muito sofisticado. Na certa a mãe não poupara um centavo para aquilo usando o gordo dinheiro vindo do bolso do ex-marido.

        

            O mais estranho era que há exatamente dois anos o dinheiro vinha sendo mandado para o seu tratamento anti-depressivo, doença apontada como um reflexo ainda da separação conjugal. Ao que pareciam, os gastos com remédios eram mínimos, mas a reforma da casa tinha sido muito bem empenhada com a quantia que James lhe mandava todo mês.

 

          _Ora ora! Mas que surpresa deliciosa! _Exclamou uma mulher de pele alva, cabelos loiros e olhos castanhos. _Eu não pensei que chegaria tão cedo. Perdoe-me por não ter ido buscá-la.

         

          Jenie sorriu para mãe de um modo tímido. Era estranho ter que cumprimentar e abraçar aquela mulher que passara tanto tempo sem ver. Mais estanho ainda era imaginar-se morando naquela casa junto dela.

 

         _Como vai? _Puxou conversa enquanto era arrastada para um saudoso abraço.

 

          _Cumprimente-me direito menina! Oh, deixe-me ver como está moça... Céus! És bela por demais. _Mary contemplou a filha de quinze anos moldada em belas curvas. Pele alva, mas delicadamente bronzeada pelas praias americanas, cabelos lisos e ruivos brilhando até a metade das costas, lábios finos e curvilíneos, olhar expressivo enfeitado por duas esmeraldas reluzentes.  Aquela era Jeniffer Rutherford, a menina que o tempo transformara em moça de um modo sutil.

 

          _O-Obrigada. _Corou com o olhar métrico da mãe. Se fosse o pai na certa lhe piscaria o olho e riria com tal caretisse. Dizer que estava uma mocinha, que era bonitinha ou coisas do tipo poderiam incomodar a rebelde Jenie, mas sempre lhe parecia orgulho bobo de pai coruja.  Com a mãe aquilo era estranho, era como ser elogiada por um desconhecido pela primeira vez. A falta de intimidades preocupava a menina.

 

           _O motorista e a empregada disseram que estava numa quermesse beneficente para a igreja. Confesso que fiquei muito surpresa ao vê-la envolvida com essas coisas. _Segredou Jenie.

 

             _Oh sim, acredito ser uma surpresa até mesmo pra mim. Mas sabe, chegou uma hora em minha vida em que percebi a necessidade de me apegar com Deus e ser um pouco útil a ele ajudando a quem precisa. _Falou comovida a Sra. Rutherford.

 

           _Quer dizer que se tornou caridosa? _Jenie tentou disfarçar o sorriso de deboche. A mãe nunca tinha sido daquele jeito, nem tão pouco fora apegada à religião.

 

           Mary apenas sorriu à filha como se quisesse evitar delongas.

 

          _Bem, depois falo mais sobre isso. Vamos tomar um chá.

 

         _Eu preferiria que fosse um milk-shake de chocolate, mas tudo bem. Me esqueci do velho e típico chá inglês.  

 

          _Pois bem, vai ter que mudar alguns de seus hábitos alimentares, filha. No final das contas será bom pra você. Essas comidas calóricas, massas, hambúrgueres e refrigerantes com os quais está acostumada só farão mal a sua-!

 

          _Ok, vamos logo tomar esse chá e pronto. _Jenie cortou o discurso nutritivo da mãe que começava a tornar-se irritante. Era sempre assim quando falavam algo de que ela não estava a fim de ouvir.

 

           Sempre fora acostumada a ouvir só aquilo que queria. Rebelde por natureza, a garota crescera à medida que criava suas próprias leis. Com o pai quase não tinha problemas, pois esse fora a pessoa que mais a amara, entendendo-a sempre. Com os amigos da escola e da rua é que nunca levava desaforo pra casa, sendo sempre mandona e intransigente, muitas vezes sem baixar a cabeça. Ninguém questionava sobre a personalidade geniosa da jovem Jenie.

 

            Sentaram-se à mesa. A criada de olhos e cabelos castanhos bem presos num coque serviu à mãe e à filha um chá com ervas finas. Mary levou dois goles do líquido quente à garganta e parou para atender ao telefone.

           

            _Desculpe-me querida, mas tenho que sair. Deixe-lhe contar que arranjei um emprego temporário dentro desses dois anos. Faço parte de uma associação que cuida de crianças carentes da cidade e da região. É como se fosse uma assistência social. A igreja é a responsável por acolher essas pobres crianças e eu e mais algumas pessoas corremos atrás de quem possa mantê-las com alguma ajuda de custo.

 

           Jenie não se importou muito com as explicações da mãe. Apenas levantou uma sobrancelha ruiva como se dissesse “É mesmo?”. Deixou que a ocupada mãe saísse para seus afazeres. Sempre fora assim, deixada de lado por outras coisas mais importantes. Mary nunca lhe tivera suprido a carência de afeto. Com James as coisas eram diferentes. Depois que chegava da escola, se queria conversar ou estar com alguém, Jenie ia com o pai em seu trabalho. Sempre davam um jeito para que tudo ficasse bem.

 

           Ao lado da mãe a história mudava. Ela se sentia só e pior, não tinha nem intimidade suficiente para reclamar disso. Sua mãe sempre fizera com que se sentisse outra pessoa bem diferente de quem era. Tinha um jeito estranho, era arrogante, dona da verdade, sempre tão exigente consigo mesma e com os outros... Alguém muito difícil de entender e mais ainda de se conviver.

 

           Jenie sabia de tudo isso, e sozinha com os olhos sobre a enjoativa xícara de chá refletia sobre seu destino ao lado de Mary Rutherford.


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Notas finais do capítulo

Espero que estejam gostando. A partir daqui a vida de Jenie com certeza vai mudar. Ainda tem muito para acontecer, aguardem...



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