As Loucas Confissões de Jessica Summer escrita por Miss D


Capítulo 6
Lição de casa


Notas iniciais do capítulo

N/A: Perdão mesmo pela demora! O pior de tudo é que o capítulo já estava pronto, só para postar, mas daí ele DESAPARECEU. Eu tive que escrever tudo de novo, o que não foi nada fácil porque re-escrever uma coisa é péssimo. Nunca sai tão legal quanto da primeira vez - a não ser que você esteja com inspiração para re-escrita. E eu não estava. Moral da história, um século depois... o capítulo!!! Espero que esteja legal - como já disse, não confio nessas coisas escritas pela segunda vez...

*Jessica Falando*: É só o que se passa na minha mente mal-desenvolvida e lesada. Não me julgue por isso.



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  No momento em que passo pela porta, já sei que minha vida acabou. Sério mesmo. Isso me deixa louca.

  Sabe nos filmes, quando a pessoa está prestes a morrer então ela vê sua vida passar toda pelos seus olhos em uma espécie de flashback? Acabou de acontecer comigo. Assim, sabe. Do nada. Só que, em vez de um flashback da minha vida passando diante dos meus olhos, eu vi um foi da última aula. E, vou te contar, não gostei nada, nada disso. Adivinha só? É, TdC (Trabalho de Casa – ou, na tradução estudantil: Tormento de casa).

  O que, se você quer saber, é terrivelmente inconveniente. Eu sinceramente não sei qual é o problema degenerativo que o meu cérebro tem. Por que eu não me lembro dessas coisas em casa, alguém pode me explicar? Trabalho de casa é para ser feito em casa. Só que, se você só se lembra dele no instante em que passa para dentro da sala, quando já deveria estar abrindo o caderno para deixar preparado para a professora olhar, não adianta muita coisa. Tipo, não dá para simplesmente voltar para casa e fazer lá, para depois ir à escola de novo entregar prontinho. Tipo assim, não dá. Se o cérebro da gente tivesse garantia eu já estava pegando a nota fiscal do meu para levar na Assistência Técnica.

  Eu tenho sérios problemas. Sérios.

  Afinal, o que se passava nessa minha cabeça de vento para não lembrar que eu tinha uma lição para fazer? O quê? Não faço idéia. Só pode ter sido alguma coisa muito importante mesmo para absorver minha atenção assim. Tenho certeza. Você sabe, é que eu sempre faço tudo o que tenho que fazer na mesma hora em que me pedem. (É totalmente verdade. Totalmente. Espere um pouco... Ah, desculpe. Era só o Zac Efron me ligando). Rá-rá-rá, engraçadinha. Adoro essas suas piadinhas estúpidas (Que foi? Achei que a gente estava competindo para ver quem diz mais absurdos.). Odeio você. (And I love you, baby ;*). Vai chupar parafuso para ver se vira prego, vai. (Ai, sua grossa!).

 Então, continuando... Detesto quando sou interrompida assim... Meu Deus, eu vou morrer! É isso. Hoje é o fim da Jessica. Adeus. Bye-bye.

  “Eu, Jessica Summer, deixo todos os meus bens financeiros para os meus filhos, que eu nunca tive; também deixo, em virtude da minha morte prematura, minhas ações na empresa que eu pretendia montar, mas que ainda não montei, para os meus netos. Que eu ainda não tenho.

  Ao meu querido e estimado futuro possível marido, eu deixaria todo o meu amor se ele valesse alguma coisa. No entanto, como amor não enche barriga, deixo-lhe a casa e os três carros – que eu ainda não comprei.

  Quero que todo o resto, incluindo roupas e sapatos – que tecnicamente não são meus já que eu tenho que dividir tudo com a Júlia – sejam doados a alguma instituição de caridade.

  Após a minha eventual morte, em detrimento da minha óbvia deficiência mental aguda, espero que todas as fotos que contenham qualquer vislumbre de todo ou parte do meu corpo sejam queimadas.

  Para Cynthia, minha mais dedicada amiga, deixo meu eterno agradecimento por ter me suportado todo este tempo. E também minha coleção de livros (cuide bem dos de “A Mediadora”, são uma relíquia)

  Está terminantemente proibida a entrada no meu velório aos seguintes indivíduos:

  • O diretor da minha escola
  • A professora de Arte
  • A professora de Inglês
  • A Marta (provavelmente ela vai querer acender uma vela para que os espíritos da terra levem minha alma em paz. Cruz credo!)
  • A Selena Gomes (Ela falou mal da Taylor Swift. Essa aí nunca vai ter o meu perdão)

  Que não seja permitido qualquer tipo de benzeção/invocação de espíritos/macumba no meu funeral (Marta!).

   Não deixo nada para minha irmã”.

  Bem, pelo menos agora eu tenho um testamento. Posso morrer em paz...

 

  Escuta, como é que alguém pode ficar em paz se vai morrer? Isso não faz o MENOR sentido. Estou dizendo, não são as pessoas que são loucas, é a vida que é uma coisa pirada.

  Ela entra na sala. Faz algum tempo que eu acho que, talvez, esteja sendo perseguida por essa bruxa, mas, nesse instante, tenho certeza absoluta. Ela está olhando diretamente para mim. Acho que pode estar sorrindo, também. Pelo menos eu acho. Quer dizer, até onde uma velha gorda com o rosto enrugado pode sorrir, é claro. E não é muito. Mas certamente é diabólico. Diabólico, está me ouvindo?

  Às vezes eu tenho a nítida impressão de que ela pode enxergar tudo. Até as coisas que estão guardadas e impressionantemente bem escondidas. Como aquele desenho engraçado que eu fiz dela uma vez, e está colado na parte de dentro da capa do meu caderno. Ou as mensagens que eu secretamente passo para a Cynthia enquanto ela fala umas coisas que não fazem o menor sentido para mim.

  Porém, nesse momento, minhas conclusões giram em torno de outras coisas. A certeza quase absoluta que eu tenho de que ela consegue ler. Os pensamentos, eu quero dizer. Mais especificamente os meus. Como se eu fosse algum tipo de lesada, com todas as bobagens que pensa, inclusive as constrangedoras, escritas bem no meio da minha testa.

  E do jeito que eu realmente sou idiota, a coisa deve ser bem assim mesmo. Tomara que esteja escrito em uma letra bem feia para que ela não possa entender.

  Só que, é claro, ela entende. Porque essa bruxa sempre entende direitinho o que não é para ela saber. Sempre.

  Como agora.

 

  Meu Pai do Céu, não posso entrar em desespero, não posso! Tenho que agir normalmente, como qualquer pessoa saudável faria.

  É, acho que este é o problema. Eu NÃO SOU uma pessoa saudável.

  E, sabe de uma coisa? Não posso morrer agora. Não mesmo.

  Tudo bem, talvez seja realmente melhor se eu morresse. Não daria mais trabalho para os meus pais, não desagradaria mais minha irmã Julia, eu deixaria finalmente a Cynthia em paz.

  Afinal, a morte não pode ser tão ruim assim. Tipo, ninguém que tenha morrido votou para reclamar. Não que eu tenha visto. Isso deve ser um bom sinal, não deve? Além do mais, não tem escola, lição de casa, gente chata e nem seus pais pegando no seu pé depois que você morre. É só você, a paz e o sossego. Sem mais nada, É, tem razão.

  Ela ainda está caminhando em direção a sua mesa enquanto eu penso nos prós e contras de estar mortinha da Silva.

 

  Alguns motivos por que você certamente NÃO gostaria de morrer:

 

  1.  Cara, você é muito novo para isso. Provavelmente tem um monte de sonhos que quer realizar, como conhecer a Beyoncé, comprar uma mansão em Miami, namorar o Zac Efron e essas coisas.
  2.  A morte é tão... sei lá, morta. Você não faz nada. Nada mesmo. Fica só parado, num buraco escuro, mofando que nem pão velho e esperando que um monte de vermes nojentos comam você. Eu acho que não deve ser a coisa mais divertida.
  3.  Você tem medo. Morre de medo que chegue a sua hora. (Vou te dar um conselho, quanto mais você foge da morte, mais ela tende a chegar pertinho de você).
  4.  Você só não quer isso. Não agora. Você é popular. Você tem amigos. Sua vida é legal. Por que iria querer deixar tudo para trás?

 

  Ela sabe. Aquela peste sabe que eu não fiz a lição imbecil que ela passou. Como ela pode saber? Não deu tempo de ela respirar dentro da sala. Acho que ela é mesmo telepata.

  Pense, Jessica. O que você estava fazendo de tão importante para não fazer a lição de casa? Hmmm... não me lembro... talvez... AH! Lembrei. Deus, como sou burra. Sabia que era uma coisa muito importante. Porque, bem, se eu não lesse aquela fanfic eu podia morrer, sabe... Um dia eu vi no jornal um artigo que falava sobre como o cérebro pode induzir o corpo à doença. Tenho certeza que o meu faria isso se eu não tivesse ido ler.

  E também, céus, quem foi o palhaço que inventou essa porcaria? Oi! A gente já passa metade do dia na escola, sentado em uma cadeira – e daquelas que eu não agüento nem andar depois, por causa da dormência –, estudando. Cinco horas por dia. Cinco dias por semana. Alguns até mais.

  Não, mas teve um imbecil que achou que não era suficiente. Daí o que foi que ele fez? Inventou essas coisas imbecis. Castigo de casa.

  Sabe, eu tenho vontade de me matar algumas vezes. Mas, na maior parte do tempo, são ESSES IDIOTAS que eu quero arrancar a cabeça. Ah! Quando eu inventar a máquina do tempo... Sim, esse vai ser um dia feliz...

  Eu vou ficar calma. Não tenho com o que me preocupar. Afinal, por que deveria? É só uma lição de casa. UMA SÓ. Sim, é isso. Eu preciso apenas me acalmar.

  Não posso me acalmar, como poderia? Eu não fiz a lição. E já é a quarta vez seguida que eu não faço. E ainda vale um terço da nota. Quero me matar. Antes que ela faça isso.

 

  Os motivos por que, diferente dos outros, eu gostaria de morrer nesse momento:

  1. De qualquer jeito eu vou morrer, mesmo. Faz diferença se vai ser agora ou depois?
  2. Para mim, é realmente preferível morrer por livre e espontânea falta de escolha, do que pelas mãos feias, gordas e enrugadas da professora. Ou, possivelmente, da mamãe, o que seria ainda pior. Muito mais se ela soubesse da minha negligência com a lição de casa. Pela quarta vez.
  3. Seria lucro para todos (Momento depressão...). Minha mãe não teria mais dor de cabeça comigo, meu pai economizaria uma quantia razoável de dinheiro, minha irmã não teria de passar pela constante humilhação de ser minha irmã – porque eu tenho certeza de que é isso que ela acha. Julia nem sequer fala para alguém na escola que eu possivelmente possa ter algum parentesco com ela. De jeito nenhum.
  4. Morrer até que é bom. Nada dói. Você não é pisada por ser menos bonita. Não há qualquer espécie de monopólio escolar pelas meninas bonitas. Você não sente nada, é tudo paz. (Psicólogo, meu bem. Eu já disse. Psicólogo urgentemente).
  5. Como já mencionei antes: não tem escola. Não tem lição de casa. Não tem prova. Não tem detenção, nem diretoria, nem PROFESSORES. Fala sério, o que mais eu posso querer?

 

  Estou calma. Estou calma de verdade. Mesmo. O máximo que pode acontecer é eu levar uma advertência. Daí eu assino o nome da minha mãe. E, bem, rezo para que ela não descubra. Pois se ela sequer imaginar que eu não ando fazendo as minhas coisas... É, certamente eu vou ter alguns hematomas roxos quando voltar à escola. E isso contando que eu volte, óbvio.

  Alguma vez, num momento de total desespero, você já se sentiu assim? Quer dizer, eu estou mesmo calma.

  CÉUS, EU VOU MORRER!

 

  Só tem um jeito, Jessica. Já que você é uma incompetente e irresponsável que nunca faz suas obrigações, é isso. Pode começar a pedir a lição de alguém.

  Se esse é o jeito...

  Sabe qual é o problema de pedir a lição dos outros? A diversidade de alunos. Primeiro, têm aqueles que, como você, não fizeram a lição. Só que a diferença é que eles não estão nem aí. E não é só isso, porque se eles estivessem despreocupados assim e tivessem nota suficiente para que nem precisassem se preocupar com esse ponto de tarefa – que eu obviamente preciso para conservar o 6 no meu boletim, pelo menos –, tudo bem. Mas não, têm um boletim que mais parece uma linda e frutífera horta de tomate e ainda estão lá, numa Nice. Eu realmente não entendo. Depois, tem aqueles que também não fizeram a lição, e estão totalmente desesperados. Então, não adianta nada pedir para eles. E, por último, vêm os que fizeram a lição. Todinha mesmo. Mas sabe qual é a deles? São uns manés egoístas. Eles são, tipo, sei lá. O esquilinho do Shrek e aquela noz dele. Sabe, algo tipo “É meu e ninguém tasca!”. E você tem que ver a cara que eles fazem quando você apenas chega perto da tarefa deles, parece que vão atacar você feito um bando de cães raivosos. Igualzinho àqueles episódios da National Geografic.

  Lógico, eles não são imbecis. Porque eles dividiriam seu precioso conhecimento com alguém?

  (Só lamento, meu bem). Quieta.

  Meu Deus, essa professora me aterroriza! Todas me aterrorizam, na verdade, mas essa extrapola os limites...

  Já assistiu Guerra dos Mundos, naquela parte em que o chão se racha todo? O rosto dela é bem parecido, só que as rachaduras são na pele. E aqueles olhos fundos, então? Às vezes quando ela me olha de relance, furiosa por eu ter feito alguma besteira, tenho certeza de que não vou conseguir dormir à noite. Até me encolho na cadeira. Ela é monstruosa.

  Quantos milhões de anos será que ela tem? Porque só assim mesmo. Vai ver ela estava presente quando a caravela de Pedro Álvares Cabral aportou aqui. Vai saber? Se foi ela quem ajudou os padres jesuítas a ensinar as coisas aos índios, acho que entendo porque eles se rebelaram.

  Este é novamente aquele momento em que penso que morrer talvez não seja tão ruim... (Cena 3, corta!).

  O que minha mãe vai fazer quando souber que eu não ando fazendo a lição? Acho que ela vai me esfolar viva, é isso. Não, pior, vai tirar meus rins e servir com purê e farofa no jantar.

  Já até imagino o sermão que ela vai me dar:

  “Mas, mãe...” – direi eu, tentando apelar para o lado emocional.

  “Não, Jessica. Nem mas, nem meio mas. Não tem conversa. Você não faz nada, não trabalha para fora, não tem nada, absolutamente nada para fazer o dia inteiro, e nem para estudar você serve?! Ah, mas a gente vai conversar, se vai! Eu, você, e aquela cinta do seu pai...” – ela dirá.

  “Eu...” – eu ainda vou tentar falar, mas ela não vai deixar.

  Daí vai começar com aquelas frases odiosas de mãe:

  “Quando eu tinha a sua idade eu trabalhava para fora, para dentro, estudava, não tinha tempo nem para respirar, cuidava dos meus dezenove irmãos – estimativamente –, e conseguia cumprir com as minhas obrigações, agora você...”

  E vai ser então que eu passarei de cidadã brasileira para cidadã brasileira com deficiências físicas. Não deve ser nada confortável andar de muletas, mas... A gente se vira, não é? Afinal, se eu pensar em criar um motim por causa disso e for dar uma passada no Conselho Tutelar... Aí é que a coisa vai ficar preta, meu irmão. E como!

  A brux... er, professora fixa seus olhos profundos e desprovidos de qualquer emoção bem em mim. (Paranóia, pode crer. Só porque a professora olha para a classe quer dizer que está olhando para você/nós? Ah, dá um tempo, Jessica!). Tenho certeza, ela e os outros estão mancomunados para me destruir.

  Tipo, eles dão medo. Medo de verdade.

  Quando eu paro para refletir sobre algumas coisas... (ela quis dizer delirar sobre algumas coisas)...

  Sabe o que eu penso de verdade? De verdade mesmo? Que, em algum momento da antiguidade, em um passado longínquo, quando os homens ainda babavam que nem retardados e tinham AVC por causa de um pedaço de madeira pegando fogo (É, essa é a mais pura verdade. Pelo menos aquela que eles querem que nós acreditemos. Eles ficaram maravilhados não com a invenção da TV de plasma, não com o microondas, não com o Playstation 3, mas com um pedaço de pau chamuscando. Entende o que eu quero dizer? É nisso que as pessoas acreditam. Os seres humanos já começaram manés... e continuam manés), algum alienígena raivoso deve ter ficado muito furioso conosco. As pessoas até 17 anos, quero dizer. Daí ele enviou esses Tormentos-Torturadores-De-Almas-Inocentes para castigar a gente pelo resto da eternidade da nossa juventude. Se você pensar bem, não há nada de muito anormal nessa possibilidade. É dos professores que estou falando, e, se você for um aluno – como eu –, vai entender.

  Eles são criaturas estranhas. Sinistras. E saiba de uma coisa: você nunca pode confiar cem por cento no que eles te dizem. Como eu já disse, eles são sinistros. Têm prazer em ver o nosso sofrimento aplicando todas as espécies imagináveis e inimagináveis e trabalhos absurdos com três exercícios – daqueles com subdivisões de vinte alfabetos –, ou pesquisas intermináveis. Quem quer saber quem foi Josef Stalin? E por que tem que ser manuscrito? Impresso não seria a mesma coisa – até melhor, porque o Word corrige os erros? E, me diz, para quê, só me responda, colocar introdução, sumário, conclusão e todas essas parafernálias? Só isso já consome umas vinte páginas de esforço, tinta de caneta, e tempo de lazer.

  Uma vez, ano passado, uma professora detestável e falsamente aduladora minha, logo depois de dizer que eu era adorável, me apunhalou pelas costas dizendo que eu era a aluna mais desengonçada e feia que ela já tinha visto – tudo bem, é verdade, mas as pessoas não podem sair dizendo isso por aí. – E ainda tem gente que gosta deles... Malucos, só podem ser.

  Alguns professores são piores que os outros, aparentemente. Mas no fim, todos eles acabam se ausentando em sua sala-fantasmagórica secreta para decidir o fim de seus prisioneiros. A sala dos professores (Esse, eu tenho que admitir, é um lugar medonho...). Eu imagino que seja como aquelas cavernas escuras dos filmes de terror, com monstros comedores de gente, fedorentos e de dentes afiados; só que um pouco pior, apesar da camuflagem do lado de fora, porque é REAL. (Ok, viajou legal agora).

  Consigo até imaginar suas caras monstruosas conversando baixo sobre como torturam seus alunos:

  –... E o que você fez?

  – Passei 200 páginas de tarefa para casa – responderia uma voz fina e estridente.

  – Tarefa de casa... Essa sim foi uma invenção de gênio. Digna do prêmio Nobel, devo dizer. Além das torturas em aula, ainda há essas torturas em domicílio. Muito engenhoso.

  E poderia ser bem pior do que apenas isto, coisas que eu nem quero imaginar – eu sempre suspeitei que as lições-de-casa e os professores fossem obras diabólicas.

  E cá estou eu, olhando pesarosamente para esse caderno com as respostas em branco. Isso é bem típico.

  Senti os passos da professora cada vez mais próximos atrás de mim, se aproximando sorrateiramente. Vou entrar em desespero. Não quero morrer assim, não quero...

  Então ela finalmente chega a minha carteira e pára. Olha de cima para mim com aqueles olhos de leitura óptica – a maioria dos professores tem olhos assim.

  –Então...?

  Então o quê, sua bruxa? Você não quer ver a maldita tarefa? Pois bem, eu não fiz! O que exatamente você quer que eu mostre, o ar? Eu sei do seu plano de me enlouquecer.

  É claro que eu não disse isso.

  – E-e-eu... E-eu... Sim? – por que tenho sempre que começar a gaguejar JUSTO NESSES MOMENTOS?

  – Fez a lição?

  – Eu...

  Milagrosamente, o sinal toca com seu glorioso triiim! barulhento pela sala e eu solto o ar, aliviada. Sabe aquele sinal que nunca te ajuda? Dessa vez ajudou. Essa foi por muito, muito pouco MESMO.

  Ela me olha, enfadada, então sorri diabolicamente. Sério, ela me dá medo.

  – Tragam as páginas 181 a 194 feitas na próxima aula. Vou olhar tudo – olha significativamente para mim e coloca um sinal de menos onde deveria estar um ponto positivo pela minha lição feita.

  No fundo, eu já sabia que ela sabia (Isso faz sentido para você como não faz para mim?). Pelo menos, eu achei que tinha sido por pouco.

  Discretamente, e quase sem fazer nenhum barulho, uma folha aparece sobre minha mesa. Não posso acreditar no que estou vendo. São TODOS OS EXERCÍCIOS RESPONDIDOS. E com uma letra mais ou menos igual a minha. Então, na verdade, eu fiz a lição.

  – Professora! – eu chamo. – Aqui, eu achei a sua lição.

  Ela se vira para mim.  É óbvio que não acredita em uma só palavra do que eu disse. Mas então ela percebe a folha com as respostas, e depois para mim, que estou com aquele sorriso Aluna-Aplicada-Inocente-Não-Sei-De-Nada, e, de má vontade, coloca um traço para transformar o negativo no diário de classe em um “mais”.

  A professora Mercedez sai imponente da sala, com seu ar presunçoso de pessoa que sabe tudo. Mas pode ter certeza de que ela NÃO sabe de tudo, mesmo tendo aqueles livros de feitiçaria que eu sei que ela tem. Talvez ela até freqüente os cultos com a Marta (outra louca...).

  Na verdade, por que os professores sempre acham que são os melhores e sabem de tudo? Ontem, por exemplo, foi a vez do meu professor de matemática. Bom, eu não sou bem o tipo de pessoa que faz as tarefas de casa (Mentira! Não, é sério mesmo?), mas eu estava com tanto medo dessa prova que passei o dia inteiro estudando no domingo. Fiz um monte de exercícios e só deixei alguns que eu não tinha conseguido fazer. E adivinha só? De dez questões, sete eram os que eu não fiz e três eu entendi. Ele não é o máximo, esse professor? De todos os cinqüenta e seis exercícios – estimativamente – que eu resolvi ele tem que pôr na prova os únicos sete que eu não havia entendido. Eu quase saltei na garganta dele (E, acredite, isso teria deixado muitos alunos felizes). Ele fez de propósito, tenho certeza. Não sei como ele sabia que aqueles eram os exercícios que eu não tinha feito, mas ele sabia.

  Sério, tem algum problema muito grave e terrível na alma desses monstros-torturadores-de-pessoas.

  Do meu lado, Cynthia sorri. Ela fez lição para mim. Pisco para ela. Não sei como, mas ela é tão intuitiva com relação a mim e meus problemas mentais que fico assustada.

  É por isso que eu a amo. 

 


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Notas finais do capítulo

N/A: Bem moçada, é isso. Espero que tenham achado divertido (e louco). E, de brinde para vocês, dois capítulos de uma vez - o outro já estava pronto fazia duas semanas, acreditam? Ou seja, o problema era esse capítulo. Ninguém merece... Beijos e desculpas...