The Devil Next Door escrita por M4r1-ch4n


Capítulo 17
Capítulo 17




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          Nunca, em toda sua vida, Kaoru demorou tanto para sair de um elevador. E naquele momento, ele só havia saído da ampla cabine porque as portas da mesma estavam prestes a fechar para levar outros passageiros para andares superiores.
          Literalmente se arrastando até sua mesa no escritório, o publicitário engoliu em seco ao depositar sua pasta preta ao lado do seu computador desligado, lançando um breve olhar para a divisória e notando, com pesar, que Toshiya ainda não estava de volta. Ele provavelmente estava condenado a substituir seu colega de cabelos azuis até que toda a história do ensaio fotográfico terminasse.
          Ele simplesmente não acreditava na sua sorte. No dia anterior, o retorno até o prédio onde tanto ele quanto Die moravam havia sido surpreendentemente pacífico: o ruivo não tentou nada de estranho, não dirigiu para becos escuros e inóspitos e nem mesmo tentou roubar qualquer documento importante que o homem mais velho carregava.
          O que não significava que Kaoru havia dormido em paz. Para ele, a falta de ações por parte do ruivo era tão suspeita quanto o excesso das mesmas, e ele honestamente não sabia se preferia a paz ou o sossego das constantes armações que eram cortesia do seu vizinho. Também, não havia muito mais que Die poderia tentar, praticamente tendo executado todos os tipos de enrascadas que existiam na face da Terra.
          Nervoso por causa do ensaio fotográfico que se aproximava, o homem de cabelos roxos tateou os bolsos da sua calça inconscientemente, procurando pelo maço de cigarros que sempre estava com ele. Já fazia algum tempo que ele não se rendia aos prazeres de um bom cigarro, de forma que ele rapidamente se dirigiu para a sacada do andar em que estava, onde os fumantes poderiam ficar em paz consigo mesmos e sem ouvir a ladainha costumeira daqueles que não gostavam nem um pouco de tabaco.
          Assim que se encontrou do lado de fora da parte fechada do escritório, Kaoru acendeu o cigarro que estivera preso entre seus lábios, tragando o mesmo profundamente e fechando os olhos, guardando o isqueiro no bolso oposto ao do maço. O publicitário deu alguns passos para o lado e deixou seu corpo ficar apoiado contra a parede do edifício, ocasionalmente observando a fumaça que saía da sua boca e notando como ela parecia com uma nuvem, porém de cor cinza. Quando o homem de cabelos trouxe o cigarro para perto da sua boca mais uma vez, a sua mente foi curiosamente invadida por uma visão:
          Die com sua bebida no ensaio fotográfico, claramente se divertindo com o canudo colorido da mesma.
          No mesmo instante o cigarro foi ao chão, esmagado com muita força por Kaoru que agora tinha um leve rubor colorindo as maçãs do seu rosto. Suspirando com um misto de raiva e de desesperança, ele murmurou uma praga para Die e voltou para dentro do escritório, lembrando que precisava falar com Yoshiki sobre o adicional do seu trabalho que já era adicional: o de modelo.
          Logo que chegou na ante-sala do escritório do seu chefe, Shinya ergueu a cabeça e cumprimentou-o bem humorado, fazendo com que o homem de cabelos roxos se perguntasse se era possível para o secretário ficar triste ou depressivo. Kaoru respondeu o alegre cumprimento de maneira menos feliz; afinal, ele se sentia como se estivesse indo para a forca, disfarçada como um ensaio fotográfico de verão.
          - Veio ver Yoshiki-san, ne?
          - Hai. Preciso discutir algumas coisas sobre o serviço que Toshiya estava fazendo.
          - Você está substituindo o Totchi?
          - Hai. Aliás, sabe como ele está? - o homem de cabelos roxos perguntou, lembrando do seu animado colega de divisória em um hospital. Ele provavelmente deveria estar entediado, sem ninguém para conversar ou perturbar a paciência.
          - Ah, muito melhor. Ele está se recuperando bem. Acho que em uns dois dias ele volta, no máximo. - o secretário sorriu docemente e se levantou da sua posição, já tendo anunciado a presença de Kaoru do lado de fora pelo seu telefone - Mas ele disse que jamais levará sanduíches de casa para comer no almoço outra vez.
          - Sanduíches? Só sanduíches fizeram isso? - o outro perguntou, ligeiramente abobado. Sanduíches não costumavam deixar pessoas de cama por intoxicação alimentar.
          - Sim... - Kaoru jurou que Shinya havia corado ligeiramente, enquanto abria a porta - Totchi-kun tem um gosto peculiar por alimentos, e dessa vez os sanduíches eram de melancia com kani, ne. Acho que a melancia estragou depois de muito tempo fora da geladeira.
          Mudo de espanto, o publicitário entrou no escritório do seu chefe, nem mesmo percebendo a porta que Shinya havia fechado atrás dele fazer o característico barulho de ter sido trancada. Sacudindo a cabeça e tentando não mais pensar em qualquer combinação envolvendo o recheio do sanduíche do seu colega de divisória, ele fez uma educada mesura ante Yoshiki:
          - Bom dia, Hayashi-sama.
          - Bom dia, Niikura-san. Sente-se, por favor.
          Kaoru obedeceu, notando o quão freqüentes suas visitas ao escritório do diretor loiro estavam ficando.
          - O quê o traz aqui, Niikura-san? - o homem mais velho perguntou, colocando alguns papéis e uma caneta preta brilhante de lado na sua escrivaninha, observando atentamente seu subordinado.
          - O trabalho que estou fazendo no lugar de Hara-san.
          - Ah, o ensaio!
          - Sim, esse mesmo. Hayashi-san, o fotógrafo pediu que eu... Fosse um dos modelos hoje.
          O diretor sorriu atrás da mesa, deixando seu corpo inclinar-se para trás o suficiente para descansar contra a sua confortável poltrona.
          - Ora, Kaoru-san! Isso não é uma coisa boa?
          - Mas eu...
          - Eu sei que você não está sendo pago para isso. Vou ligar para lá e incluir o seu salário de hoje pelos serviços como modelo, então.
          - Mas... - o homem de cabelos roxos abriu e fechou a boca algumas vezes, tentando falar algo e falhando miseravelmente.
          - Sim?
          Yoshiki já havia retirado o telefone do gancho, pronto para discar para a empresa que financiava o ensaio para pedir as mudanças, prontamente atendendo os interesses de Kaoru. O problema era que receber pelo trabalho de modelo não era o quê o publicitário queria. Pelo contrário: ele até pagaria se pudesse se livrar do problema. Mas ao ver seu chefe tão determinado a modificar o contrato por ele, Kaoru desistiu de argumentar.
          - Não é nada, Hayashi-sama.
          - Ah, sou. Ah, Kaoru-san... Se já estiver pronto para ir para o estúdio, faça o favor de procurar por Die-san no andar dele e dizer que Shinya espera na garagem. Está dispensado do seus serviços por aqui hoje.
          - ...Arigatou, Hayashi-sama.
          - Não é nada. - o loiro sorriu, digitando os primeiros números da sua ligação e o outro homem percebeu que era hora de se retirar, de modo que ele levantou e fez uma pequena mesura para o diretor, saindo silenciosamente logo depois.
          De fato, Shinya já não estava no seu lugar, tendo deixado um bilhete que pedia para que o próximo interessado em falar com Hayashi Yoshiki esperasse pelo seu retorno.

           Nem bem o dia havia começado direito e Kaoru já se sentia morto e derrotado. Subindo para os andares que Die administrava, ele saiu com ainda mais lentidão do elevador do que quando chegara ao prédio, sentindo um nervosismo anormal correndo nas suas veias.
          Ouvindo o seu próprio coração bater muito forte, o publicitário atribuiu tudo isso à proximidade das fotos que seria obrigado a fazer e caminhou devagar até a entrada de outro andar preenchido com divisórias e escrivaninhas, exatamente igual ao seu. Ele não precisou se esforçar muito para localizar aquele que seria seu companheiro no ensaio, encontrando a alta figura ruiva parada mais ou menos no meio do grande piso, entre as mesas dos publicitários que tinham o mesmo posto de Kaoru.
          E então, a respiração do futuro modelo parou na sua garganta.
          Ando Daisuke estava em um dia normal de trabalho, alheio à presença do seu vizinho na entrada de um dos andares gerenciados por ele. Ao lado de um homem que aparentava mais idade do que ele próprio ou Kaoru, Die trajava uma camisa social branca com listras verticais azuis, ligeiramente mais claras do que o tom da calça, também social, que ele usava. Seu braço esquerdo estava dobrado contra o seu tórax, carregando um envelope pardo e mais uma pasta amarela, enquanto sua mão direita acabava de encontrar a superfície da mesa do funcionário que ele ajudava, conforme o ruivo se inclinou para a frente a fim de apontar algo na tela do computador com um movimento de cabeça, tendo as duas mãos ocupadas.
          Essa mudança na posição permitiu que Kaoru vislumbrasse o primeiro botão da camisa de Die que, apesar da gravata, estava aberto. Piscando, o morador do 304 subiu seu olhar para o rosto do ruivo, que estava tão atraente como sempre, porém... Sério. Profissional. E adornado por um par de óculos.
          Os óculos tinham lentes quadradas e pequenas, elegantemente apoiados pelo nariz do diretor daquele piso. As mudanças de página no computador, com suas cores e formatos diferentes, eram refletidas nos óculos, a expressão nos olhos escuros do ruivo sempre concentrada e incrivelmente...
          Antes que o homem de cabelos roxos pudesse acrescentar mentalmente a palavra "sexy" ao final do seu último pensamento, ele foi jogado ligeiramente para frente devido ao impacto de uma funcionária distraída com as suas costas. Piscando, os dois trocaram desculpas e Kaoru rapidamente voltou seu olhar para a faceta desconhecida até então do ruivo, inconscientemente suspirando com pesar ao ver a figura do seu vizinho se afastando em direção ao seu próprio escritório.
          Não que a visão de Die caminhando por trás fosse ruim, longe disso. Só era algo mais freqüente e às vezes, deliberadamente feito pelo ruivo.
          Voltando a controlar seus movimentos e esquecendo-se por alguns momentos da sessão de fotos que estava por vir, o publicitário fez o mesmo percurso que o tentador ruivo havia tomado segundos antes, chegando à ante-sala do escritório de Die e não encontrando nenhum secretário por perto; a mesa que um desses profissionais deveria ocupar encontrava-se vazia, inclusive.
          Tomando aquilo como um sinal de que ele mesmo deveria se anunciar, o homem de cabelos roxos bateu duas vezes na porta, esperando com educação por um sinal afirmativo ou negativo do outro. Na cabeça de Kaoru, era estranho que ele estivesse se portando com tanto decoro ali, sendo que o homem que se encontrava dentro do escritório havia invadido sua casa mais de uma vez; mas aquele era o ambiente de trabalho de ambos, e as coisas mudavam de figura. Pelo menos temporariamente.
          - Entre!
          A mente ocupada do publicitário deixou a ordem verbal escapar do seu processamento, de forma que Kaoru quase caiu para trás de susto quando Die veio abrir a porta.
          E logo o rosto do ruivo assumiu as feições que eram tão conhecidas do outro homem: olhos brilhando com malícia explícita e lábios sedutores curvados em um pequeno sorriso de contentamento, além de um visível relaxamento na sua postura.
          O problema era que Kaoru havia descoberto que os óculos, ainda presentes no rosto do seu vizinho, tinham a estranha qualidade de maximizar todos esses pequenos detalhes de Die, quase parando sua respiração por uma segunda vez.
          - Kao... Mas que surpresa agradável.
          A voz de Die saíra baixa e levemente rouca, numa tonalidade que estava próxima de ser indecente; especialmente quando a palavra "agradável" fora pronunciada.
          Sacudindo a cabeça levemente para tentar retomar o controle do seus pensamentos mais uma vez, o homem de cabelos roxos franziu o cenho e devolveu:
          - É Kaoru, Daisuke. Você tem problemas mentais ou não consegue guardar meu nome?
          O ruivo deixou a cabeça cair para trás enquanto ria, divertindo-se com a atitude do outro e expondo, intencionalmente ou não, o seu pescoço delicioso enquanto isso. Kaoru engoliu em seco e observou, com alívio, que o outro havia dado meia-volta e retornado para perto da sua mesa. O publicitário acabou por entrar no escritório, mas permaneceu perto da porta, além de mantê-la escancarada. Precaução no caso de Die tentar prendê-lo novamente em algum lugar.
          - Eu não tenho problemas mentais e consigo perfeitamente guardar seu nome, Niikura Kaoru. - o ruivo respondeu enquanto apoiava-se na sua mesa, sensualidade transpirando de cada gesto e movimento seu - Mas esse controle falha quando meus olhos são intoxicados pela sua presença, Kao.
          - É Kaoru!
          A resposta foi tão automática por parte do publicitário que ele levou vários segundos até corar furiosamente, percebendo o elogio descarado que o outro havia lhe feito. Olhando para a porta e tentando recobrar a cor natural do seu rosto, ele apenas ouviu a risada do outro antes de voltar a encará-lo.
          - Yoshiki-san pediu para perguntar se você está pronto para as fotos. Se estiver, Shin-chan já está esperando por nós na garagem. - ele comunicou o pedido do seu chefe da maneira mais profissional que conseguiu enquanto assistia passivamente a Die desabotoar um outro inocente botão da sua camisa e deixar mais um pedaço do seu corpo exposto.
          - Pronto para tirar fotos com você vestindo apenas uma sunga? - o outro perguntou retoricamente, levantando o próprio rosto pelo queixo com o dedo indicador da mão direita - Sempre!
          Com mais um olhar predatório e carregado com desejo, o ruivo se desencostou da mesa e passou pelo seu vizinho petrificado na porta, deixando a sua mão passear por toda a cintura do publicitário antes de caminhar na direção dos elevadores.
          Vinte e sete segundos depois, Kaoru fez o mesmo.

          Quando os dois homens chegaram ao subsolo, o publicitário deu um longo suspirou de alívio assim que se encontrou mais ou menos distante do outro homem: Die não havia tentado nada no elevador como fizera no prédio do estúdio, mas Kaoru temia que essa trégua só acontecia porque era o local de trabalho de ambos.
          - Hmmm, nada mal.
          Seguindo a voz do ruivo, o homem de cabelos roxos se virou e seus olhos caíram sobre uma...
          - Limusine? Para nós? - Kaoru perguntou com olhos arregalados, observando o longo carro preto que estava perto da saída, exatamente para onde ele e Die caminhavam agora. Desde criança ele tinha vontade de entrar num carro desses, nem que fosse para brincar com os botões que ele sabia existir na parte dos passageiros.
          - Estranho, não é? Não lembro de ter marcado nosso casamento para hoje.
          - É... O quê? CASAMENTO? - Kaoru gritou de repente, tampando a boca com as duas mãos e depois presenteando o ruivo com um olhar mortífero - Não seja idiota.
          O outro homem apenas sorriu sem se afetar com a ofensa, caminhando até a janela do motorista e encontrando Shinya, que sorria para ele.
          - Shin-chan! Vamos nessa máquina para o ensaio hoje?
          - Sim, sim. Yoshiki-san acabou de me ligar... - e ele mostrou o próprio celular como evidência - E disse que a empresa que está financiando o ensaio e o nosso trabalho incluiu a limusine para hoje, já que acabaram por contratar mais um modelo daqui também. O Kaoru-san. - e aí o secretário fez uma cara de profundo espanto, observando o outro homem pelo espelho retrovisor - Não sabia disso.
          - Ninguém sabia. O Amano decidiu do nada. - o ruivo explicou e rumou para a porta de trás - É só entrar, certo?
          - Certo. Não deve demorar muito para chegarmos lá. - o secretário comunicou, fechando sua própria janela. No entanto, ele sabia que nenhum dos dois se importaria em pegar trânsito ou o caminho mais longo naquela manhã.
          O ruivo voltou até onde Kaoru continuava de pé, um olhar maravilhado no seu rosto enquanto ele ainda observava o carro incrível. Adiantando-se e abrindo a porta para o homem mais velho, Die fez questão de entrar somente depois do seu vizinho, o que rendeu olhares cheios de ódio para o ruivo; o publicitário não gostou de se sentir como uma dama depois do atencioso gesto do outro homem.
          Assim que os dois se acomodaram, Shinya virou-se para o par e sorriu, ligando o motor. Kaoru honestamente havia esquecido qualquer preocupação que ele tivera até então, olhando fascinado para todo o interior do veículo, sentindo a maciez do estofamento de primeira linha com uma das mãos enquanto mexia em um dos telefones acoplados ao veículo com a outra.
          Die foi completamente ignorado durante esses momentos, mas o ruivo não se importou, contente em observar a alegria praticamente infantil do outro homem ali dentro. Não era a primeira vez do diretor em um veículo daqueles, mas ainda sim, uma limusine tinha seus encantos. E utilidades.
          - Shin-chan? Se importa se eu subir o vidro?
          - Iie, Die-kun. Pode ir em frente.
          - Okkei!
          Apertando um botão que ficava do seu lado do carro, o ruivo fez o vidro escuro que dividia a área do motorista e a dos passageiros sortudos do belo veículo, isolando a ele e Kaoru dos olhares de Shinya. No entanto, o publicitário não percebeu que o vidro havia sido sequer acionado, examinando o mini-bar que havia logo na frente dele.
          - Hmmm, Kao. Acho que seria uma boa idéia brindarmos ao nosso passeio com champagne, não?
          - Você não vai me embebedar aqui, Daisuke. - o outro redargüiu com desprezo de onde estava, fechando a pequena geladeira antes que Die tivesse mais idéias brilhantes como aquela. Lançando mais um olhar furioso ao ruivo, ele complementou - E é Kaoru!
          - Eu sei. - o ruivo respondeu, relaxando e desabotoando sua camisa até deixá-la completamente aberta. Kaoru perdeu a fala nesse meio tempo, tendo assistido a cada casa sendo desfeita pelos dedos hábeis de Die. Muito hábeis - Por que você também não fica à vontade, Kao? Afinal, o Shin-chan não vai ver nada mesmo.
          Foi nessa hora que o publicitário percebeu que o vidro que os isolava do motorista havia sido acionado. Qualquer coisa que acontecesse ali dentro seria como se eles estivessem entre quatro paredes e uma porta bem trancada. Com a exceção de que agora Kaoru não tinha mesmo como fugir, nem por janelas.
          Mas a mente do homem de cabelos roxos encontrou uma saída, seus olhos localizando o botão que descia o vidro para o seu lugar de origem. Sorrindo internamente, o homem mais velho deu impulso com seu corpo, pretendendo alcançar o botão para reverter o processo do vidro.
          Porém, um pequeno detalhe, imprevisto por Kaoru, arruinou seu plano: Shinya fez uma curva.
          E com a curva foi-se embora o equilíbrio do publicitário, ocasionando uma queda fenomenal e meio longe do seu alvo. Abrindo os olhos depois do acidente de percurso do seu plano, Kaoru não entendeu direito o que havia acontecido.
          - Ah, Kao... - ele ouviu a voz de Die pingando sedução como sempre, mas que no entanto parecia estranhamente vir... De cima? - Esse seu lado cheio de iniciativa me encanta.
          Sentindo a mão do ruivo acariciando de leve suas mechas roxas, o publicitário rapidamente se moveu, levantando o corpo e percebendo que ele havia aterrisado...
          ...Justamente no colo do ruivo.
          Passando por todas as tonalidades de vermelho até chegar em um escarlate berrante, o homem de cabelos roxos abriu a boca para falar algo, mas nenhum som saiu. Ele não sabia se deveria se desculpar, ficar quieto ou explicar o que ele tentara fazer; nenhuma das hipóteses parecia boa o suficiente, sem contar que seu rosto continuava queimando de vergonha.
          Ainda de queixo caído, Kaoru não previu um último movimento de Die, que se aproximou e aproveitou a expressão embasbacada do publicitário para se apoderar da sua boca, deitando o homem mais velho no espaçoso banco da limusine e somente parando com seus beijos famintos quando um gemido, baixo e abafado, chegou aos seus ouvidos.
          - A sua boca aberta e o seu rosto corado são um problema, Kao. Um delicioso problema. - replicou Die, voltando a se sentar como antes e começando a abotoar a sua camisa, já que ambos estavam chegando ao estúdio.
          O outro homem, ofegando e completamente espantado com tudo que havia acontecido até o momento, não teve forças nem para corrigir seu nome, sentando-se novamente no banco momentos antes de Shinya baixar o vidro e comunicar que eles haviam chegado. E ele também resolveu ignorar o modo como seu corpo e um pedaço nada insignificante da sua mente denunciavam como ele havia sentido falta dos beijos incríveis do ruivo.

          Kaoru nunca pensou que fosse ficar feliz em rever Amano, mas guardados os acontecimentos dos últimos minutos, rever o fotógrafo foi quase uma bênção. Ele entrou correndo no estúdio, esbarrando em um câmera antes de ser cegado temporariamente por muito rosa.
          - Já não era sem tempo, Kaoru! Vamos, vamos. Para o camarim! - o outro homem instruiu o publicitário sem qualquer polidez, praticamente empurrando o recém-contratado modelo para uma porta que levava aos camarins e saletas cheias de roupas para fotos.
          O publicitário teve seus pertences imediatamente levados para algum lugar por um dos funcionários, enquanto outros dois faziam com que ele se sentasse em uma confortável poltrona, de frente para um grande espelho cheio de luzes na beirada. Alarmado, Kaoru descobriu que iria ser maquiado para as fotos e ficaria sem poder se esquivar de Die durante os próximos minutos, de forma que ele torceu para o ruivo não cruzar seu caminho até que ele estivesse livre para ir ao estúdio, bem mais amplo do que aquele camarim e que portanto não obrigaria Kaoru a ficar do lado do seu vizinho.
          Nem mesmo o publicitário acreditou quando suas preces foram atendidas e o ruivo não apareceu no camarim. Terminada a sua maquiagem, o homem de cabelos roxos foi levado para um outro cômodo, onde lhe foi dada a primeira peça de roupa que teria de usar: uma sunga preta, do tamanho dele, com duas faixas roxas que combinavam assustadoramente bem com o seu cabelo. Não era muito revelador, mas era definitivamente mais apertado e justo do que qualquer coisa que ele utilizara na última ou década. E ele não queria Die por perto para testemunhar o fato.
          Somente com o maiô e um roupão para protegê-lo do frio que fazia nas partes não aquecidas do estúdio, Kaoru caminhou até o lugar onde as fotos seriam tiradas, encontrando o mesmo cenário do dia anterior e um fotógrafo tão irritado quanto estivera nas vinte e quatro horas que precederam a sua sessão. Suspirando pesadamente e tentando não olhar demais para o rosa, Kaoru deixou que um funcionário levasse seu roupão embora enquanto ele pisava na areia espalhada pelo chão, olhando para o mesmo e querendo sumir: haviam, agora, várias pessoas focando toda a atenção nele, sendo que elas estavam munidas de instrumentos que poderiam eternizar aquele momento que ele tanto queria esquecer junto da sua peculiar falta de vestimenta.
          - Kaoru, quer fazer o favor de olhar para cima? Eu não aceito modelos depressivos no meu trabalho! Deixe suas crises para as colunas sociais, vamos começar!
          O publicitário ergueu a cabeça como mágica nessa hora, suas feições ainda vermelhas por causa da vergonha, embora raiva pudesse justificar o rubor do mesmo jeito. Resmungando palavrões quando Amano se virou, Kaoru esperou as instruções do ser amante do rosa, parado na frente do banco de madeira que Die e Sonja haviam utilizado no dia anterior.
          - Sente-se. - o fotógrafo ordenou de repente, fazendo Kaoru piscar várias vezes antes de obedecer - Eu não tenho o dia todo, Kaoru, então obedeça quando eu mandar. Erga sua perna esquerda e coloque-a sobre o banco, dobrada, deixando a outra para fora. A mão esquerda sobre o seu joelho e a direita sobre essa bola de vôlei que está do seu lado. Agora relaxe pelo amor que tem à sua vida e imagine que está numa praia.
          Se o publicitário havia ficado pasmo com as ordens ríspidas de antes, ele estava positivamente revoltado agora. Ele estava fazendo um favor a Amano e era tratado como se fosse mais um peso na vida do problemático fotógrafo. Acirrando os olhos e matando o outro homem lentamente na sua imaginação, Kaoru fez o que o outro havia pedido mecanicamente. Não porque ele havia se acostumado com a idéia, mas porque era o jeito de se livrar do outro homem intragável o mais cedo possível.
          Pensando bem, seu vizinho ruivo também era um inferno, mas pelo menos ele era bonito, incomparavelmente mais gentil, paciente, dono de uma voz agradável e dedos habilidosos e...
          Um grito escandaloso de Amano trouxe Kaoru de volta à sua triste realidade, de modo que ele ficou na posição certa mais uma vez. No entanto, não era o suficiente.
          - Kaoru, pelo amor de Deus; melhore essa sua cara de enterro.
          - É a única que eu tenho.
          Amano bufou.
          - Kaoru! Isto é uma praia, ninguém fica assim em praias!
          O publicitário pensou em argumentar, dizendo que aquilo não se parecia de modo algum com uma praia: era apenas areia espalhada no chão, com um cenário bonito atrás, um holofote escaldante como sol e um aquecedor defeituoso como calor de verão, porque Kaoru via uma neve suave cair pela janela dali onde estava.
          - Kaoru!
          - Wakatta!
          O homem de cabelos roxos se ajeitou no banco e pensou em alguma coisa que o relaxasse, a visão de Die sendo enforcado surgindo na sua mente.
          Um sorriso curvou seus lábios para cima bem devagar conforme a cena ia se desenrolando: o ruivo tinha uma corda bastante resistente ao redor do seu pescoço e, embora ele não pudesse ver, Kaoru sentia que ele era o carrasco de preto, andando pelo patíbulo onde Die estava prestes a ser executado.
          Com essa história rodando na sua mente, o publicitário foi gentilmente mudando de posição e esquecendo os olhares e os flashes das câmeras, até a hora em que, de repente, o carrasco removeu o capuz e surgiram as feições do ruivo no lugar.
          Piscando, Kaoru então notou que o homem prestes a ser enforcado era ele. De alguma forma eles haviam trocado de lugar, mas como? Por quê?
          - Kaoru! Pelo amor de Deus, quer sair daí e deixar o Daisuke fazer as fotos dele sozinho?
          Caindo de volta na Terra, o homem de cabelos roxos entendeu que era hora do revezamento de modelos. Deixando a bola de vôlei que utilizara cair no chão do cenário litorâneo, Kaoru saiu da areia falsamente espalhada ali, recebendo seu roupão de volta e sentindo que algo havia encostado contra seu corpo no caminho para o cenário, momentos antes:
          A mão de Die.
          O morador do 304, em seguida, cometeu o erro de se virar para averiguar o que tinha acontecido.
          Seus olhos caíram na figura de Die, sobre uma espreguiçadeira. Ele já havia se acomodado e parecia estar confortavelmente deitado sobre a longa cadeira, uma perna charmosamente dobrada enquanto a outra permanecia esticada. Kaoru observou que o ruivo era ligeiramente mais bronzeado do que ele supunha, e o fato de que o diretor parecia muito à vontade com a sunga só complementava a teoria do publicitário de que Die estava acostumado a ir para a praia. Ou então tinha confiança suficiente no seu físico para não se envergonhar ao posar daquele jeito.
          Kaoru chegou à conclusão de que era confiança. Se ele tivesse o corpo do outro, com coxas bem torneadas, seguidas de uma sunga ligeiramente menor que a sua mas que valorizava terrivelmente o corpo do ruivo, seguindo por um abdômen que devia ser fruto de muito exercício ou então sorte genética, mais o amplo tórax e ombros perfeitos que levavam ao rosto enfeitado por um sorriso sedutor e relaxado...
          O publicitário engoliu em seco quando percebeu que Die olhava e sorria para ele, se afastando do cenário com o coração batendo forte. Fotos do seu vizinho daquele jeito, com aquela falta de roupa e especialmente com o jeito que seus lábios se torciam no mais sensual dos gestos deveriam ser proibidas, ilegais, até.
          O intervalo para tomar água foi bem-vindo, porém curto. Nem bem as foto solo de Die haviam terminado e o publicitário já estava de volta, trajando uma espécie de calção agora, muito mais satisfeito com o modelo do que antes. Kaoru ignorou o fotógrafo e sua incomum dose de descortesia, espalhando a areia do chão com os seus pés enquanto aguardava novas instruções. Balançando a cabeça para se livrar de duas mechas roxas que ficam na frente dos seus olhos, o publicitário tomou um susto quando Amano gritou para ele, arremessando algo na sua direção.
          Juntando as duas mãos em segundos, Kaoru curvou seu corpo e recepcionou a bola de vôlei que havia sido atirada na sua direção com uma manchete perfeita, fazendo a bola subir para depois pegá-la com ambas as mãos. Lançando um olhar maligno na direção do fotógrafo que havia jogado o objeto sem aviso ou cerimônia, Kaoru começou a fazer uma série de pequenas manchetes, como se estivesse se aquecendo para uma partida de vôlei na escola.
          Distraído com a bola, ele não percebeu os passos sorrateiros atrás de si que pertenciam a Die, só notando a presença do seu ex-chefe interino quando este pousou o queixo no seu ombro, fazendo com que os braços do publicitário caíssem ao lado do seu corpo e a bola fosse ao chão.
          - Ah, desculpe. Eu não queria que você parasse seus exercícios... É tão bom ver você se divertindo com bolas, Kao.
          - É Kaoru. - ele replicou com os dentes cerrados, rapidamente andando para a frente e deixando de ser o apoio do rosto de Die; o ruivo, no entanto, não perdeu a chance de deslizar seus dedos suavemente pela cintura do outro antes que ele partisse atrás da bola caída.
          E foi somente depois de um assobio apreciativo que o publicitário lembrou que jamais deveria ter abaixado de costas para o outro ao apanhar a bola do chão.
          - Muito bem, vocês dois! Vamos começar a segunda parte! - Amano gritou e os dois se viraram para o fotógrafo, Kaoru notando que uma sombra de raiva havia passado pelos olhos de Die; o ruivo perfeito também parecia detestar a criatura de rosa - Separem-se, fiquem o mais distante possível um do outro no cenário.
          Os dois cumpriram a ordem, o homem de cabelos roxos com alívio, sem perder, no entanto, o belo sorriso que Die lhe dirigiu antes de murmurar que ele sabia esperar pelas coisas que valiam a pena. Lutando para manter o rubor fora do seu rosto, Kaoru ergueu o rosto para fitar seu vizinho, um desafio claro nos seus olhos.
          - Sabe jogar, Daisuke?
          - Muito bem, Kao. - ele replicou, lambendo os lábios e acentuando as leituras subjetivas que a sua resposta tinha - Mas não sei quanto ao vôlei.
          O publicitário permitiu um leve sorriso adornar seu rosto. Ele sabia que o outro havia sido excelente no basquete, mas ele havia sido campeão de vôlei nos seus dias de colegial. Ele iria derrotar o ruivo, nem que fosse a única fez que ele fizesse aquilo.
          - Agora tudo que tem a fazer é jogar, as fotos vão ser tiradas em série. Só parem quando eu mandar. E o que diabos vocês estão esperando para começar? - gritou Amano mais uma vez, e os dois deram início ao jogo. Lançando a bola para cima, Kaoru acertou-a com a mão direita, mandando-a para o lado de Die, que alguns passos para trás e recepcionou a mesma com uma manchete antes de devolvê-la ao homem de cabelos roxos.
          Os dois passaram aproximadamente quinze minutos mandando a bola de um lado para o outro, Kaoru claramente colocando uma empolgação anormal no pequeno jogo que não deveria ser motivo de tanto empenho. Sorrindo malignamente, Kaoru cortou a bola na direção do ruivo com força, e o outro acabou por não conseguir recepcionar, a bola batendo no seu tronco e caindo no chão.
          O fotógrafo gritou que já era suficiente, o publicitário nem se importando em ir atrás da bola. Olhando para o ruivo com um sorriso diferente nos lábios, ele assistiu a Die erguer as duas sobrancelhas e assobiar baixo.
          - Parece que você venceu. - o homem mais novo comentou, enquanto os dois modelos eram enviados de volta ao camarim para a última troca de roupas.
          - Eu sei.
          - Eu não sabia que estávamos competindo, Kao.
          O homem de cabelos roxos parou no meio do corredor, colocando uma mão na cintura.
          - Ah, é? E teria feito melhor se soubesse?
          O ruivo encarou o outro por alguns minutos, maravilhado com o tom de desafio que brilhava nos olhos do outro, além da agressividade e orgulho que a postura corporal de Kaoru exibia. Naquele momento, o publicitário não tinha medo nem receio algum de Die, e essa forma ligeiramente controladora e muito segura de si despertou ainda mais o interesse do homem mais novo no outro.
          - Ando-san, Niikura-san! Por favor me sigam! - uma moça da idade deles apareceu, sorrindo antes de fazer duas mesuras e continuar pelo corredor. Os dois foram atrás dela, chegando em um banheiro grande e amplo, com vários chuveiros. Parecia um vestiário - Amano-san pediu para que tomem uma ducha rápida, vistam os próximos modelos e retornem rapidamente. Não precisam se enxugar muito, Amano-san deseja tirar fotos de vocês como se estivessem saindo do mar.
          Fazendo mais uma mesura e fechando a porta do banheiro, Die notou a forma como a auto-confiança de Kaoru havia desaparecido ao se ver sozinho em um banheiro com o ruivo. O homem mais novo se aproximou do seu colega de fotos, achando engraçado o modo como o outro havia se encurralado ao dar passos para trás conforme ele andava para frente.
          - Sabe, Kao... - o ruivo murmurou rente ao rosto do outro - Você merece um prêmio por ter ganho o jogo, não?
          - Eu não quero prêmio nenhum que venha de você, Daisuke. - o homem de cabelos roxos respondeu com a voz ligeiramente trêmula, vendo Die colocar os braços contra a parede e prendendo-o contra a mesma - E é...
          - Kaoru. Eu sei. Conheço seu nome melhor do que pensa.
          No entanto, Die não falou mais nada, contentando-se em observar intensamente o homem que tinha entre a parede e seu próprio corpo; será que Kaoru tinha noção dos seus próprios encantos e, principalmente, tinha alguma idéia de quão sexy ele era? Ainda mais aprisionado daquele jeito.
          Desconfortável naquela posição e sob o olhar penetrante que tinha sobre si, Kaoru desceu seus olhos e acabou por observar o tórax despido e contornado por gotas de suor, uma visão positivamente interessante. No entanto, conforme seus olhos desceram mais alguns milímetros, ele deixou uma exclamação de surpresa sair da sua boca e um rubor forte colorir seu rosto, ao notar que Die estava empolgado com a presente situação.
          - D-Die... O que você está pensando em fazer? - ele perguntou, sua voz saindo meio quebrada e tensa, rapidamente levantando a cabeça e encarando o outro. Sentimentos misturados dançavam nos seus olhos, fazendo os lábios sedutores de Die se curvarem em um sorriso mínimo.
          - Faria muitas coisas se Amano estivesse longe, Kaoru. Coisas que você nem imagina, mas que com certeza... - o ruivo se aproveitou para traçar a curva do pescoço do outro homem com a sua língua, lembrando-se da noite que eles haviam dividido sobre uma cama - Você jamais iria esquecer.
          E com aquilo, Die se foi para a sua ducha, deixando um Kaoru confuso, intrigado e sobretudo estranhamente excitado com a situação.

          Na segunda-feira imediatamente seguinte ao ensaio fotográfico que havia felizmente acabado, Yoshiki convocou Kaoru para ir à sua sala, explicando ao publicitário que, devido à sua carga assustadoramente pesada de trabalho, ele estava liberado para chegar uma hora mais tarde e sair uma hora mais cedo, até quando os trabalhos de Matsumoto Hideto estivessem completos.
          Agradecendo a delicadeza, Kaoru foi sorrindo até sua mesa onde arrumou suas coisas e explicou rapidamente a sua nova situação para Toshiya, que ficou feliz pelo colega ao invés de demonstrar qualquer tipo de inveja; Totchi era muito sincero e honesto, e essas eram qualidades admiradas pelo publicitário. Despedindo-se rapidamente, o homem de cabelos roxos foi para a sua casa.
          Assim que abriu a porta da sua residência, no entanto, Kaoru encontrou um envelope com o logotipo do seu banco no chão. Acirrando os olhos, o publicitário largou sua pasta no sofá e abriu a carta, surpreendendo-se com o conteúdo da mesma.
          O banco, de cuja filial em Hyogo ele fora cliente, reclamava da falta de pagamento de várias contas e ameaçava iniciar um processo de execução contra Kaoru, caso ele não tomasse as devidas previdências. Piscando, o publicitário observou o endereço e verificou que vinha de sua terra natal; algum problema com a transferência da sua conta de uma agência para a outra havia acontecido.
          Felizmente ele havia saído mais cedo aquele dia, o que lhe dava tempo suficiente para chegar no banco e resolver o problema. Descendo até o térreo de escada para não esperar o elevador, Kaoru perguntou ao zelador se ele sabia onde ficava a agência mais próxima do banco que precisava, mas Koetsu começou a contar uma história de guerra por algum motivo que era totalmente desconhecido pelo publicitário.
          Despedindo-se do zelador e assegurando-o de que ele daria os seus cumprimentos a Niikura, Kaoru suspirou e saiu para a rua, parando uma simpática senhora na calçada que finalmente pôde lhe dar as instruções corretas. Agradecendo com um grande sorriso, o publicitário conseguiu chegar ao banco vinte minutos antes do mesmo fechar.
          A primeira coisa que chamou a atenção do homem de cabelos roxos foi o fato de que as agências da capital japonesa eram muito mais majestosas dos que as encontradas em Hyogo. O prédio era alto e elegante, as paredes do térreo sendo feitas totalmente de vidro, do tipo que impedia a visão de quem estava fora mas permitia a de quem se encontrava por dentro.
          Pisando no saguão da agência, Kaoru olhou ao redor, tentando encontrar a entrada para a área dos gerentes. Segundos depois ele avistou uma grande porta giratória, com os espaços entre as repartições de vidro maiores do que ele estava acostumado. Chegando perto da mesma, ele percebeu que ela era automática e que comportava duas pessoas por divisória. Ela também possuía um detector de metais, de forma que Kaoru se dirigiu a um compartimento que ficava do lado e depositou seu celular e chaves, logo depois escolhendo uma das divisórias para atravessar a porta.
          O que ele não notou foi que uma segunda pessoa entrou atrás dele no mesmo compartimento. E isso não teria sido problema se essa segunda pessoa não estivesse portando algo metálico que bloqueou a porta automaticamente.
          Assustado com o sinal agudo emitido pela máquina e indo de encontro a parede de vidro na sua frente que havia parado de rodar, Kaoru deu dois passos para trás, assustando-se ainda mais por sentir outra pessoa atrás de si.
          O publicitário abriu a boca para pedir desculpas antes mesmo de se virar, mas uma voz mais que conhecida chegou aos seus ouvidos primeiro e assassinou qualquer intenção nobre de retratação que estivesse habitando o cérebro de Kaoru.
          - Kao, Kao. Não é incrível como nós sempre nos encontramos em todos os lugares?
          Dando meia-volta e ficando o mais distante de Die que aquele compartimento permitia, o homem de cabelos roxos fechou o rosto, cruzando os braços na frente do seu terno.
          - Daisuke... Eu acho que isso é incrível porque você me persegue, que tal? - ele falou com desprezo, sem, no entanto, atingir o brilhante sorriso de Die - E é Kaoru!
          - Hmmm. Eu admito que perseguir você é uma distração e tanto, ainda mais olhando por trás. - o ruivo desceu os olhos mais ou menos na altura dos quadris de Kaoru e o outro corou - Mas realmente, acha que eu iria persegui-lo no banco?
          O homem mais velho não respondeu; vindo de Die, qualquer coisa era possível.
          Batidas em uma das portas chamaram a atenção dos dois, que se viraram para encontrar um dos seguranças do banco, encarando os dois.
          - Está tudo bem aí dentro?
          - Sim, está. - Die prontamente respondeu - Acho que esqueci de tirar algum objeto da minha pasta. - ele continuou a sua explicação, erguendo a referida pasta como prova.
          - Muito bem. Vou destravar a porta. Voltem aqui para fora e o senhor retira todos os objetos de metal que estão na sua mala, está bem?
          Die concordou com a cabeça e os dois homens ouviram um pequeno clique, indicando que as portas haviam sido destravadas. Kaoru automaticamente caminhou na direção contrária a que ele havia tomado quando tentou atravessar a porta giratória, mas não percebeu que o ruivo havia ficado na posição de antes, chocando-se contra o tórax do outro.
          - Kao, Kao... - o ruivo segurou os outro pelo braço, sua pasta pendurada em um dos seus braços enquanto ele olhava ligeiramente para baixo a fim de encarar o rosto de Kaoru, oito centímetros abaixo do seu - Olhe para onde anda... - ele sussurrou, aumentando a força que seus dedos aplicavam nos braços de Kaoru e aproveitando para puxá-lo de encontro ao seu corpo novamente, as duas formas se chocando e enviando sensações agradáveis para os cérebros e outras partes de ambos - Venha comigo.
          O publicitário abriu a boca mas seu protesto foi mudo, não acreditando de que Die havia praticamente colado os dois corpos e puxado-o até o lado de fora da porta. O segurança estava olhando para o par com profundo estranhamento, mas o ruivo apenas sorriu.
          - Me desculpe, ele é claustrofóbico.
          O guarda assentiu e se afastou um pouco, enquanto Die largava sua pasta do lado de fora da porta e Kaoru mais uma vez deixava seu queixo ir até o chão, estupefato com as desculpas e manipulações de cada situação que o ruivo exercia.
          - Daisuke, eu juro que quando sairmos daqui eu vou...
          Mas o publicitário não teve tempo de completar a sua ameaça. Logo que Die julgou estar livre de metais ele fez o outro homem dar meia-volta, empurrando-o para a porta e entrando logo atrás dele na divisória. Kaoru estava com a boca aberta, pronto para reclamar de novo da vergonha e do absurdo que era ele ser conduzido daquele jeito quando a porta travou novamente.
          Outro choque entre os dois se seguiu, mas dessa vez, devido à nova posição, foi entre a parte da frente do ruivo e a de trás do publicitário. Ainda com as mãos ao redor dos braços de Kaoru e controlando-as melhor sem a pasta ofensiva de antes, ele não deixou que o outro se movesse para a frente ou escapasse das suas mãos, aproveitando a trava súbita da porta para enterrar seu rosto no pescoço do homem mais velho, sorrindo brevemente contra a pele de Kaoru antes de beijá-lo ali, seu cabelo vermelho sendo suficiente para cobrir os movimentos sensuais da sua boca.
          - Ah!
          O publicitário não conteve um misto de engasgo de surpresa com gemido, sua mente disparando alarmes e lembrando-o de que eles estavam em um local público e muito vigiado por seguranças, além de estarem sido assistidos por clientes também.
          O ruivo pareceu ter lido sua mente e se separou de Kaoru, sua face impassível como se nada tivesse acontecido. Fazendo sinais para o guarda, a porta foi novamente destravada e Die caminhou até onde sua pasta estava, deixando relógio, uma corrente que ele tinha ao pescoço que o outro homem nunca vira antes e o cinto da sua calça.
          Nesse momento, Kaoru arregalou os olhos mais do que nunca, caminhando devagar de volta para a porta, de costas para o compartimento e de frente para o ruivo de modo que nenhum contato... Inadequado pudesse ocorrer entre os dois se a porta travasse novamente.
          O guarda já havia desistido de tentar entender os dois estranhos, mais preocupado com o seu horário de saída do trabalho. Ele liberou a porta novamente, Die e Kaoru em cantos opostos da divisória quando a porta travou. Mais uma vez.
          As costas do publicitário bateram dolorosamente contra o vidro da divisória atrás dele, fazendo com que ele fechasse os olhos e abrisse a boca para emitir uma exclamação de dor. Porém sua boca foi imediatamente tomada pela de Die; apesar do lugar, das circunstâncias e das pessoas que estavam observando a cena, o corpo do ruivo foi prensado contra o seu e a sua boca estuprada pela língua do outro.
          Segundos depois eles se separaram, os olhos do homem mais novo brilhando enquanto ele puxava o cinto de Kaoru para fora da calça do outro. Ainda tonto, o publicitário nem reagiu, sentindo os resquícios da deliciosa agressão de Die contra a sua boca.
          O segurança e o diretor conversaram por alguns segundos, a porta sendo destravada pela última vez e girando sem problemas, permitindo que ambos chegassem à parte da gerência. Atordoado, Kaoru nem se lembrava mais por que estava ali, ao passo de que Die já havia recuperado seus pertences e o cinto. Andando até Kaoru, ele devolveu ao seu antigo subordinado o resto das coisas.
          - Kao... Nunca imaginei que você gostasse de brincar com as portas. Da próxima vez que vier ao banco, me avise, sim? Podemos repetir a dose.
          Dando um último sorriso completamente encantador e capaz de converter a mais dura das pessoas em gelatina, Kaoru observou a figura do outro homem sumir por uma escada, enquanto ele havia ficado parado com as suas coisas na mão. Finalmente recobrando o controle, o publicitário sentiu o sangue subir ao seu rosto e ele corou por todos os incríveis minutos anteriores.
          Ele e Die haviam...
          Eles haviam trocado manifestações públicas de afeto. Como se fossem um casal.
          Nessa hora a mente de Kaoru deu um estalo, e ele rapidamente se voltou na direção em que o ruivo havia ido. Ele desejava mais do que nunca saber o que se passava na cabeça do seu antigo chefe, porque ele não conseguia entender nem seus próprios pensamentos naquele momento.



Continua...


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Notas finais do capítulo

FELIZ NATAL! :D

Como estou viajando no feriado, decidi passar rapidinho e deixar mais um capítulo para vocês. Em breve terei mais surpresas na fic, ohoho!

Beijos e boas festas!
Mari-chan.