#03 episode
                               “Ah! bem me lembro! bem me lembro!
                                       Era no glacial dezembro;
                                Cada brasa do lar sobre o chão refletia
                                         A sua última agonia...”
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Ao contrário do esperado, Simas acordara naquele mesmo dia. Seu sono não durou mais do que duas horas, e a claridade exorbitante ainda era presente. De certo, já não estava mais cansado. Ao contrário, supunha que mais alguns minutos deitado, e seria vitima da insanidade.

Risos.

- Quem ousa entrar em meu aposento sem meu legitimo consentimento?

Risos incontroláveis.

- Por ventura o que é hilário?

Risos incontroláveis e cortantes.

Sim. Ele poderia jurar que o som lhe estourara os tímpanos naquele momento; não só excessivo agudo, como monstruoso. Intencionalmente, suas mãos voaram para seus ouvidos, afim de protegê-los. Mas tão logo aquilo começou, como por fim, encerrou-se.

Levantou. Não aguentaria mais continuar naquele quarto pelo resto do dia. E se possível, manteria distância do mesmo até quando lhe fosse possível.

No mesmo instante em que pousara os dedos na maçaneta da porta, ouvira batidas educadas do outro lado. O ritmo já era conhecido, e não surpreendeu-se ao ouvir a voz de Carter lhe pedindo permissão para entrar.

- Bocchan...?

O mordomo aturdido não completou a frase. Logo que chamou por seu mestre, ele abrira a porta e no mesmo rompante saiu do quarto.

- Carter, prepare-me um banho. Considerando a posição do sol ao alto, devo afirmar que tratam-se das quinze horas...?

- De acordo.

- Por tanto, ordene a Clarisse que me prepare o que comer.

- De acordo.

- Mas nada exagerado, não tenho fome alguma.

- De acordo.

Como sempre, o mordomo concordava sem questionamentos. Esse era o lado bom de ser o lado superior, um Anohiro, ninguém que não lhe fosse do mesmo nível, entraria em oposição. Era algo de fato, formidável.

                        " I was alone,
                            Staring over the ledge,
                              Trying my best not to forget
                                 All manner of joy
                                   All manner of glee"

Mas, assim como todo o prazer que aquilo lhe traria até então, poderia mais tarde lhe ser a porta para o abismo. Ah sim, sem dúvidas... O abismo, lar da deterioração e da angústia... Delicioso, um assunto que me deixa com " água na boca" só de pensar. Pedirei-lhes perdão, mas, no entanto, ainda não é chegada a hora de falarmos sobre tal lugar.

- Estarei aguardando em meu escritório...

- De acordo.

- Alguma atividade pendente, presumo?

- Exatamente, por este motivo vim até aqui. Bocchan, o senhor tem papéis da empresa a serem assinados.

- E onde estão?

- Eu irei entregá-los assim que possível, eles estão lá embaixo. - Colocou a mão sobre o peito, e logo se curvou respeitosamente - Perdoe-me a futura espera.

                        " Baby, did you forget to take your meds?"

Suspirou pesadamente, mas não por desgosto. O dia fugia completamente de sua rotina, e não via motivos para que o fizesse mudar.

- Não será preciso esperar. Irei descer também.

- De acordo.

Dito isso, os dois caminharam em silêncio, o que fez parecer com que a escadaria fosse ainda maior do que o previsto. Não era uma escada normal, era bela. O corrimão dourado reluzia constantemente, como todos os dias após a limpeza diária. Era alta, e chegava a fazer uma curva desnecessária ao meio, formando um círculo gracioso. Os degraus eram feitos da melhor madeira que poderia ser encontrada naquela região, esta não era vista por conta do tapete vermelho que a cobria desde o alto, até o chão; onde se encerrava com outro círculo enorme, e por fim dava vista a madeira do piso.

Assim que chegaram a baixo, o jovem Anohiro foi recebido por três empregadas que ilustravam a tapeçaria, e os móveis do andar.

- Boa tarde, Bocchan.

Saudaram-no em uníssono. E como sempre, ele não respondeu, mas assentiu com a cabeça.

Virou à direita, e caminhou por um longo corredor, que o levaria a mesa. Estava sozinho, e ouvira os risos de antes, mas desta vez com menos volume. Estava assustado, mas preferiu ao menos " fingir" que ignorava, e nada ouvia. 

- Boku wa... Boku wa...

Continuou andando, aquilo era apenas uma peça que sua imaginação o pregava.

- Boku wa...

A curiosidade. Sim, a curiosidade! A mãe do conhecimento, e desvio de condutas. Graças a ela, sua imaginação fantasiava a voz incesata e desconhecida, tentando descobrir o seu dono e de onde ela viria.

                    " Baby, did you forget to take your meds?"

Não podia simplesmente ignorar. Tinha medo, e a muito não sabia o que isso era. A última vez em que teve medo foi anos atrás, ao saber que a doença poderia levar seu pai o deixando sem mais ninguém. No entanto, seu psicológico já estava preparado para o dia em que a morte também o levasse. Sua dor maior ainda seria daquele maldito dia, e nem mesmo o pior demônio o faria sofrer de tal maneira. Quer dizer...

- Boku wa...

- Me deixe em paz!

Risos.

- Cale-se!

Assim que gritou, os seis quadros de sua família, posicionados simetricamente na parede, caíram no chão, e um deles o acertou na cabeça.

                    " Baby, did you forget to take your meds?
                         Baby, did you forget to take your meds?"



Antes que pudesse questionar, ou fugir; a escuridão o invadira.

                     " I was alone,
                           Falling free,
                               Trying my best not to forget"


{ Continues... }