Sete Vidas escrita por SWD


Capítulo 77
vida 5 capítulo 26




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Nathalie Helms sabia que as coisas tinham saído completamente do controle. Ninguém sobrevive 3.300 anos brigando com fatos. Às vezes, é melhor reconhecer logo a derrota e tirar o time de campo. Esperava viver na região por mais dez anos, mas sabia que a cadeia de acontecimentos iniciada com a morte de Mark Levine tornava isso impossível.

Tudo começara com a morte do universitário. Fora a primeira vez que um de seus ghouls matara sem sua ordem ou consentimento um humano desde que ela se estabelecera na região há pouco mais de dez anos. Quando soube, tentou não dar importância ao fato. Um mero aborrecimento. Empregados volta e meia dão aborrecimentos. Humanos morrem. Acabariam esquecendo.

Algum tempo depois, houve o desaparecimento de uma menina de doze anos. Até onde conseguiu descobrir, seus ghouls não tiveram nenhum envolvimento na história. Mas a imprensa fez ligação com a morte do universitário e embolou a investigação policial.

E aí veio a segunda morte confirmada por ataque de ghoul. Mas não foram SEUS ghouls. Um grupo de três ghouls renegados comandado pelo monstrinho que agora exibia a face do garoto Milligan, viera de sabe-se-lá-onde e invadira seus domínios. Selvagens, famintos e descuidados. Pegos em flagrante e mortos pelos forasteiros. Os falsos federais. Os famosos irmãos Winchester. Os netos de Samuel Campbell. Samuel. Sam. Como esquecê-lo? Sorriu, apesar da dor que sentia no braço.

Voltou a sorrir ao lembrar dos recentes momentos de felicidade com Adam Winchester. Também na cama ele lembrava Iάσων. Tinha imaginado mantê-lo junto a si por muito tempo. Bons amantes são raros de se encontrar. E aí chega uma louca e rouba dela o amante. Uma nova Κρέουσα em sua vida.

Respira fundo antes de arrancar a bala alojada em seu antebraço. A dor aguda arranca lágrimas dos olhos fechados e a faz trincar os dentes em volta da correia de couro. A dor física, que muitos descreveriam como insuportável, era pequena perto da dor de uma nova derrota no amor. Outro homem que desejara fora arrancado dela. E, ao invés de vingança, uma fuga humilhante.

Tinha que reconhecer que metade do problema que estava vivendo fora causado por ela mesma e não pelos ghouls. Ela e suas necessidades de mulher. Iάσων destruíra sua auto-estima e a deixara eternamente carente de amor. Incapaz de aceitar uma recusa ou a mera ameaça de voltar a ser abandonada. Sentia uma necessidade constante de se sentir amada. Ansiava por receber um sentimento verdadeiro, mas o medo era maior e se contentava com declarações induzidas por suas poderosas poções de amor.

A fome de amor a fazia agir irresponsavelmente. Era inevitável que o seqüestro do filho do delegado, que também era um ídolo esportivo local, lhe trouxesse problemas. Mas, ele lhe despertara o desejo e ela não aceitava ter seus desejos contrariados.

Talvez o melhor fosse mesmo recomeçar em algum outro lugar. Afinal, ali todos já a conheciam. Todos a temiam ou odiavam. Geralmente, as duas coisas. Ela também odiava a todos. Gostou de ver a população se encolher em pânico quando apareceu o primeiro corpo semi-devorado. Gostou de sentir o medo invadir a vida de todos dia após dia, a cada informação desencontrada, a cada novo incidente. Entretida em seu prazer cruel, deixou as coisas correrem soltas e acabou perdendo o controle dos acontecimentos.

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Na biblioteca secreta, Nathalie abre o Livro. O conhecimento reunido ali não se limitava a seus 3.300 anos de vida. O conhecimento abrangia um período muito maior, de pelo menos 6.000 anos. Segredos de civilizações tidas como lendárias, como a Atlântida e a Lemúria, estavam ali. O Livro era o único registro existente da arte dos maiores feiticeiros que já caminharam sobre a Terra, escritos em línguas mortas há tanto tempo, que somente ela conhecia a pronúncia correta.

O Livro - dizia-se - continha feitiços capazes de afundar continentes e ressuscitar mortos. Afundar continentes, talvez. Ela não tentara descobrir. Quanto a ressuscitar mortos, não era bem assim. O feitiço não trazia a alma de volta. Nem desfazia a ação da morte. Nunca seriam mais que zumbis. Foi por isso que não usara o feitiço para trazer Iάσων de volta.

Nathalie Helms se despe e recita os encantamentos. O primeiro, era um mero feitiço de transporte. O segundo feitiço era mais importante. Um feitiço de esquecimento. Não era o mais eficaz, mas era o único não dirigido. Afetaria a todos, não importa aonde estivessem. Mas afetaria mais os que menos soubessem. Não apagaria completamente os fatos da memória dos diretamente envolvidos, mas criaria lacunas e nublaria os detalhes.

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E então começa a acontecer. Os corpos, e até mesmo manchas de sangue, dos trinta e quatro ghouls mortos na batalha do Hospital Distrital desaparecem subitamente, de uma só vez. O fato de estarem mortos e de ninguém os estar observando facilitava a eficácia do feitiço. Os corpos ressurgem na propriedade de Nathalie Helms, na entrada da Mansão.

A equipe de TV, distraída com os procedimentos para iniciar a transmissão ao vivo, se surpreende ao não encontrar mais os corpos dos três ghouls que, até momentos antes, estavam caídos ao redor do destroçado portão principal.

O cinegrafista ainda podia jurar que vira três corpos, mas o motorista e a equipe técnica já não tinham a mesma certeza. Quando o encantamento se enraizasse, nem o cinegrafista poderia afirmar com convicção ter vistos os corpos.

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No terceiro andar, Dean obedece às ordens gritadas pelo delegado Hayden e deposita com cuidado Adam Winchester no chão. Enfermeiros e médicos que estavam às voltas com Sam Winchester correm para socorrer o novo paciente.

A truculência do delegado era, na verdade, a forma que encontrara de evitar que o policial Levine estourasse os miolos do menino ghoul ali mesmo, na frente de todos. Conhecia Hal Levine bem o suficiente para saber que estava à beira de um colapso nervoso. A morte do Dr. Lawson tinha sido a gota que entornara o copo.

O delegado não conseguia deixar de sentir-se em dívida de gratidão com o menino ghoul que resgatara seu filho. E que agora trazia Adam Winchester ferido, dando-lhe uma chance de sobreviver. Talvez os ghouls não fossem todos iguais. Talvez não fossem todos eles monstros assassinos. Afinal, os homens não eram todos iguais.

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Então, os encantamentos começam a se fazer sentir no terceiro andar e no terraço do hospital. Primeiro, o feitiço de esquecimento. A maioria das pessoas que se refugiara no terraço tivera informações desencontradas sobre a natureza da ameaça que as obrigara a buscar refúgio. Essas seriam as mais afetadas. Já não lembravam do que realmente acontecera, apenas de terem escutado tiros, muitos tiros.

Apenas o segurança sobrevivente lembrava do investigador Robinson entrar gritando no hospital dando o alerta de perigo. Não lembrava dele especificando o tipo de perigo, mas só podia ser sobre o grupo terrorista. Porque fora um ataque terrorista ou não fora? Ao ser entrevistado horas mais tarde, declararia que tinham sobrevivido ao ataque terrorista graças ao investigador Robinson, que se tornaria assim o grande herói da cidade. O que era justo, ele fora realmente um herói.

Então, os ghouls desacordados começam a desaparecer. Owen e Ashley chamam a atenção de todos para o fato, mas as reações variam. O policial Jones, atônito, corre até o canto agora vazio onde os ghouls foram deixados. Mas alguns dos médicos e enfermeiros que estavam socorrendo Sam simplesmente não entendiam o porquê daqueles dois estarem gritando. Não lembravam de nenhum monstro sedado nem naquele nem em lugar nenhum do hospital.

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Gabriel e Kälï trocam olhares que denunciam sua admiração pelos recursos da bruxa.

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E, então, Dean desaparece para espanto de todos. Mas, principalmente, para seu próprio espanto.


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Notas finais do capítulo

22.02.2011



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