Andrômaca escrita por Emmy Tott
O céu de Andrômaca amanheceu cinzento. Algo estava terrivelmente errado. A pacífica cidade era conhecida pela sua calmaria e tranqüilidade, mas o que estava para acontecer não chegava nem perto dessa paz.
-Majestade, Tarumã se aproxima cada vez mais rápido! Devemos proteger o Pomo?
-Não, Odo, a sua missão é proteger Andrômaca e a sua população!
-Mas, Majestade, o Pomo...
-O Pomo estará seguro com Dinânius. Nossa prioridade é o povo de Andrômaca, Odo, não se esqueça disso! Agora vá, já perdemos tempo demais.
-Sim, Majestade!
Odo saiu apressado do palácio com os seus homens, as armas em punho. Corriam contra o tempo. A segurança da cidade corria um sério risco e eles tinham pouquíssimo tempo para agir.
As ruas de Andrômaca estavam desertas. Não se viam nenhuma alma viva, pois as pessoas estavam todas escondidas dentro de casa, desesperadas e em pânico total. Tarumã era um conhecido bruxo das trevas, aliado de Marte e temido por todos. Agora ele ameaçava Andrômaca e o seu precioso "Pomo".
De repente a cidade foi invadida por um mar de soldados das trevas. Eles vinham imponentes em seus cavalos negros e lançavam fogo contra as casas. Muitas famílias, desesperadas, saíam às ruas e eram esmagadas pelos cavaleiros. O caos era total. A toda volta, homens, mulheres e crianças caíam mortas, o sangue escorrendo de todos os lados, tingindo a cidade de um vermelho intenso e devastador. Gritos de súplica eram proferidos inutilmente para os homens de Tarumã, que iam deixando atrás de si um rastro de dor e de destruição incalculáveis.
Paládio assistia aquilo tudo com uma expressão de horror em seu rosto. Custava a acreditar que a sua querida cidade estava sendo reduzida a pó. Seus homens lutavam bravamente, mas estavam muito despreparados se comparados aos homens de Tarumã. Era preciso fazer algo urgente, antes que fosse tarde demais. Paládio sabia muito bem o que Tarumã queria em Andrômaca. Se ele corresse, ainda podia deter aquele cruel derramamento de sangue.
Por sorte o Templo de Vênus ficava a poucos metros do palácio real. Paládio corria o máximo que suas pernas já cansadas lhe permitiam, as vestes se balançando fantasmagoricamente contra o vento. Mas quando ele chegou à porta do Templo, percebeu, com um choque de terror, que Tarumã tinha sido mais rápido. O bruxo já tinha colocado a baixo o pesado portão que protegia o local e entrava no Templo. Era o fim de Andrômaca.
Mas, para a surpresa de Paládio, parecia que Tarumã não tinha encontrado o Pomo.
-Nããão!!! - ele berrava, furioso, com a voz rouca. - Onde está o Pomo?
-Nós não sabemos! - dizia uma voz feminina, visivelmente abalada.
-Não me faça perder a cabeça, mulher! Diga a verdade! - ele ia se aproximando dela com uma fúria gigantesca.
-Ela disse a verdade. O Pomo de Dontono não está mais aqui! - respondeu um velho cego do outro lado do recinto.
-Então me diga onde ele está e eu pouparei suas vidas insignificantes!
-Sinto muito, mas não possuo a resposta de que precisa.
Tarumã ficou roxo de raiva. Já se preparava para avançar contra o velho. Nesse momento, porém, ele percebeu a presença do Rei de Andrômaca.
-Paládio! Seu súdito ousa mentir para mim, o grande conhecedor das artes das trevas! Devo avisa-lo que não costumo ser misericordioso com as minhas vítimas.
-Dinânius não costuma mentir nem para o ser mais desprezível do mundo. Portanto, creio que a afirmação seja verdadeira. - Disse Paládio. Ele parecia forte e decidido, mas, por dentro, era consumido pelo medo.
Tarumã soltou uma gargalhada sinistra, fazendo o ar se tornar mais gélido e pesado.
-Não seja tolo, Paládio! Nós dois sabemos muito bem que Dinânius faria de tudo para proteger o grande "Pomo de Dontono". Mas, talvez, seja preciso uma "forcinha" para que resolvam me contar a verdade, não é?
O medo de Paládio crescia cada vez mais enquanto Tarumã ia se aproximando da mulher. Quando já estava bem próximo, apertou o pescoço da moça com as suas duas mãos, fazendo com que ela soltasse um gemido de dor.
-Não faça isso! Não machuque Anaire, estamos lhe dizendo a verdade! - suplicava Paládio, agora totalmente desestabilizado.
-Está com medo de perder sua mulherzinha, não é, Paládio?
-Por favor, eu lhe imploro!
-Se não me entregar o Pomo vai ficar sem a sua Rainha, Majestade!
-Já lhe disse que o Pomo sumiu! Não podemos fazer mais nada! - disse Dinânius.
Tarumã soltou um urro de fúria e apertou o pescoço de Anaire com mais força, fazendo seus frágeis ossos se quebrarem. Anaire ainda olhou para o rosto do marido pela última vez, antes de fecha-los para sempre. Paládio foi invadido por uma onda de tristeza incontrolável. Amava muito a mulher e lhe doía muito vê-la cair ao chão, vulnerável, sem poder fazer nada.
-Anaire... não... - ele gaguejou, com um fio de voz.
Agora Tarumã se preparava para atacar o Rei fragilizado, mas naquele momento o Templo foi invadido por Odo, que vinha empunhando a espada em uma das mãos e a armadura na outra.
-Saia de nossas terras agora! Você e seus homens já causaram destruição demais para um único dia! - ele dizia com a voz firme.
-Não sairei daqui sem o Pomo de Dontono, seu insolente!
-Então terá que lutar! - ele o ameaçava com a espada.
-Se pensa que pode me vencer está muito enganado! Pode ir dando adeus para a sua vidinha medíocre!
Tarumã lançou um lampejo de luz cinzenta sobre Odo, mas ele foi mais rápido e posicionou sua armadura para protege-lo do feitiço. O jato de luz atingiu a armadura com um grande estrondo, fazendo Odo estremecer por inteiro. Então o feitiço refletiu de volta e atingiu Tarumã, fazendo-o cair de costas para o chão.
-Isso não vai ficar assim! - ele ameaçou.
Quando Paládio se aproximava dele para detê-lo, Tarumã jogou sua capa preta em cima do seu corpo e desapareceu como fumaça. Paládio se abaixou para Odo, que tremia jogado no chão.
-Odo, você foi um verdadeiro herói!
-Só é uma pena que eu não possa continuar os meus serviços!
-Do que está falando?
-O feitiço que Tarumã me lançou era forte demais. Antes de voltar para ele, eu fui atingido. - ele tirou sua mão da barriga, deixando à mostra um enorme buraco em sua pele, de onde o sangue escorria ininterruptamente.
-Odo... - Paládio não sabia o que fazer.
-Fiz o que pude por Andrômaca... Cuide do meu filho por mim... - foi com grande dificuldade que ele pronunciou sua última fala.
O herói tinha cumprido a sua missão. Seus olhos se fecharam para sempre e sua mão ensangüentada caiu no chão, misturando sangue e terra.
Paládio ficou estático. Nunca imaginou que uma coisa terrível daquelas pudesse acontecer no seu reinado. Perdera tudo: a cidade, a mulher, seus homens, sua dignidade e até o Pomo de Dontono. Estava arruinado, perdido, sem saber por onde começar. O altar construído cuidadosamente para abrigar o Pomo agora estava vazio, sem o seu precioso tesouro.
Dinânius quebrou o silêncio se aproximando do Rei e falando:
-O que aconteceu aqui hoje já estava previsto. Agora é preciso erguer a cabeça e cuidar dos feridos e desabrigados para depois reconstruir a cidade.
-Reconstruir a cidade? Sem o Pomo isso será impossível!
-Nada é impossível, Majestade! O rastro de destruição deixado por Tarumã gerou uma profunda cicatriz no seio de nosso povo, mas ela pode ser curada se agirmos depressa!
-O Pomo protegia a cidade! Ele trazia o equilíbrio e a paz para o povo de Andrômaca e, sem ele, estaremos perdidos! Será o fim de Andrômaca, não percebe isso?
-Entendo suas preocupações, Majestade, mas o Pomo não é o mais importante agora! O círculo divino me revelou que o Pomo passará por um longo período longe de Andrômaca, o qual devemos usar para reconstruir nossas vidas.
-E depois desse tempo? O que acontecerá? Dinânius, eu preciso saber se ainda há esperança para Andrômaca!
Dinânius permaneceu um longo tempo calado, apenas refletindo. Depois, disse por fim:
-Depois desse tempo o Pomo deverá ser reposto a seu lugar de origem. Caso contrário... Andrômaca estará perdida para sempre!
-Mas como vamos recuperar o Pomo?
-A ajuda virá! Os escolhidos deverão trazer o Pomo de Dontono de volta para a sua casa!
-Mas quem são esses escolhidos? E quem poderia ter pegado o Pomo?
-Isso, meu caro, só o tempo dirá! - disse ele sabiamente e encerrando a conversa.
Ainda tinham um longo trabalho pela frente.
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