Enquanto Noah cuidava de sua reunião estratégica, Abi vagava pelos corredores. Ela sabia quantas pessoas haviam no prédio, para que lado pendiam suas intenções e se alguma intenção que viesse de fora era perigosa. Não era necessário estar colada em Noah Kristein para protege-lo, assim como não precisava escutar seu plano de ação; aquilo não fazia diferença nenhuma no que precisava fazer.

Porém, havia uma presença que parecia pairar perto dela, e ela só conhecia uma pessoa capaz de realizar aquela proeza. Bastou um girar de pulso para que uma espada jian aparecesse em sua mão e apontasse para atrás de seu ombro.

— Opa! – uma voz masculina soou às suas costas – Calma, eu vim em paz!

— O que está fazendo aqui, Hugo?

Abi viu o homem se tornar visível com a ponta da lâmina tocando seu pescoço, um sorriso nada inocente em seus lábios e as mãos erguidas.

— Vim conversar.

— E o que um servo de Loki quer comigo? – perguntou de cara fechada.

Hugo suspirou teatralmente.

— Será que nossos milênios de amizade nada valem?

Abi encarou-o antes de afastar a espada de seu pescoço.

— Você é tão sem graça – ele reclamou. Suspirou – já fomos uma família maior, não é mesmo? Quando os deuses da natureza ainda estavam despertos... Mas o avanço da humanidade foi tão grande nesse último milênio que os deuses primordiais adormeceram, mesmo que parcialmente, e apenas aqueles que agiam ativamente no comportamento humano permaneceram...

“Loki, o deus das ilusões e da trapaça; Adrasteia, a deusa da mudança e da justiça, mesmo quando essa é feita pelas próprias mãos; Deméter, a deusa da agricultura; Toth, o deus do conhecimento; Bishamonten, o deus da guerra; Dionísio, o deus das festas; Pothos, o deus dos desejos; Hermes, o deus do comércio... Só por isso já vemos o quanto a humanidade está orgulhosa, eles controlaram completamente as catástrofes naturais”

Hugo balançou a cabeça parecendo desapontado.

— Os humanos foram vistos como inferiores aos deuses ao longo da maior parte da história. E agora talvez devêssemos admitir que eles merecem algum crédito. Você acha que eles vão parar por aí?

Abi piscou surpresa com a pergunta direcionada a ela. Se havia algo que ela sabia sobre os mortais, é que eles eram criaturas teimosas e egoístas. Sua resposta automática foi:

— Não! – ela franziu a testa.

— Então como eles poderiam aumentar ainda mais seu poder? – Hugo verbalizou a questão que restava – bom... talvez eles criem seus próprios deuses.

Abi sentiu sua boca entreabrindo de choque e fechando.

— Está brincando... Aqueles satélites controlam o suficiente para que as catástrofes não aconteçam, agora eles vão querer direciona-las...

Perplexa, ela sabia que aquilo poderia muito bem ser verdade. As tecnologias humanas estavam evoluindo muito rápido. Abi se sentiu balançar na sola do pé.

— Satélites – Hugo debochou – se um satélite emitisse qualquer sinal, e um desastre acontecesse, a guerra fria não teria lugar. Os governantes são mais gananciosos do que isso. Assim como os deuses que estão no auge de seu poder... Acho que já falei demais – deu um sorriso.

— Ainda não – voltou a ameaçar com a espada – por que veio falar tudo isso para mim? É algum movimento do Loki?

— Será que é? – Hugo franziu a testa, pensativo – eu só queria retornar um favor antigo...

— Tem algo a ver com Noah Kristein?

— Ora, vamos lá, o que será que Noah vivenciou em seus dias de juventude?

Abi sentiu a boca seca.

— E Loki está de qual lado? – perguntou cautelosa.

Hugo lhe deu um sorriso zombeteiro.

— O senhor Loki sempre está do lado do Loki. Quando será que ficou tarde assim? – falou olhando sobre o ombro.

Abi olhou para trás dele no momento em que o elevador se abria, em um movimento de pulso seu a espada desapareceu, assim como Hugo quando ela não estava mais ameaçando-o.

— Exibido... – Abi murmurou ouvindo um risinho se afastando.

Hugo a tinha feito perder a noção do tempo, digno de um servo de Loki. Noah saía do elevador com um ar cansado, parecendo abatido. Ele engolia alguma coisa ao mesmo tempo que guardava um frasco no bolso. Suspirando, Abi colocou uma expressão despreocupada no rosto e o seguiu silenciosamente. Talvez tudo aquilo fosse mais impactante do que imaginava.