ERA AQUELE VELHO DITADO: Tudo que estava ruim, poderia piorar drasticamente.

Darren acordou no hospital. O quarto era grande e espaçoso, do seu lado tinha um senhor de idade, reclamando com a enfermeira sobre a falta de sal na comida.  Rachel estava na cadeira do seu lado, cochilando.

Espreguiçou-se e sentiu sua costela doer, nesse momento, percebeu que tinha curativos em seu rosto e pontos no seu antebraço.

— Irmã, irmã — chamou, balançando de leve seu braço.

— Oi? — Ela abriu os olhos e limpou a saliva que escorria na lateral da boca. — Que bom que acordou, meu anjo, você está bem? — Levantou-se e o abraçou com cuidado. O perfume dela de lavanda marcando presença.

— Só um pouco dolorido, mas vou sobreviver. — Sorriu. — Cadê a mamãe?

Rachel se afastou e mudou a expressão.

— Ela, ainda não pode vir. Por causa do trabalho.

— Entendi... tá tudo bem, não é como se ela já não tivesse feito isso antes, né?

— Darren, de verdade, sinto muito!

— Tá tudo bem, eu tenho você e é isso que importa. Eu vou sobreviver. — Encarou o chão. — E o Garfield e o amigo dele, estão bem?

— Sim. Foram eles que te socorreram. Só que eles acabaram de sair por causa de um problema na cafeteria, mas logo, logo estarão de volta. Vão ficar muito felizes em ver que você está bem, Gar ficou tão preocupado.

— Não queria fazer com que ele se sentisse assim.

— Ei, você nunca será um incômodo.

O celular da irmã começou a tocar.

— Um minuto. — Rachel pediu, saindo do quarto.

Darren encarou os pontos no braço e engoliu em seco ao se lembrar do momento da agressão covarde, com Morgan em cima de si. Tudo isso por causa de um mal entendido, imagina se descobrissem quem ele verdadeiramente é... ou será que eles já sabiam? Piscou os olhos várias vezes a fim de afastar as lágrimas que se formaram. Do seu lado, o senhor ainda debatia sobre o sal.

— Não é porque sou hipertenso que signifique que não posso comer sal algum. Aqui na receita — Apontou para um papel em mãos. — A médica deixa bem claro que posso comer POUCO sal e não NENHUM, entendeu?

— Mas o senhor é transplantado, por favor, entenda...

“Aquele senhor não era um alienígena”, concluiu, “os aliens tem coisas mais importantes para se preocupar do que isso”.

— Irmão. — Rachel retornou. — Tenho uma surpresa pra você.

— O que é? — Encarou curioso.

— Não posso dizer, mas tenho certeza que você vai gostar. — Pegou sua bolsa. — Ela já está subindo. Até depois.

— Ela? — Inclinou-se na cama. Mas a irmã já havia deixado o quarto, piscando.

O que ou quem poderia ser?

Quase se esgagou com a gelatina que a enfermeira trouxe quando viu Enid Reynolds. Com, agora, seus cabelos roxos e sedosos entrar na sala.

— Enid! — exclamou, institivamente indo ajeitar os cabelos bagunçados.

— Você está bem? Fiquei super preocupada quando soube. Vance é um babaca, mas não se preocupe, nem ele, nem Morgan, nem nenhum dos outros canalhas irão mais te machucar.

— Como pode ter tanta certeza disso?

— A polícia os visitou, vão ficar uns bons meses longe da cidade. — explicou, colocando sua ecobag de “All too well” da Taylor Swift, na cadeira. — Posso te abraçar?

— Claro.

Ela se inclinou e o abraçou com força.

— Fico tão feliz que esteja bem. O que eles fizeram é muita covardia.

— Tá tudo bem, eu vou sobreviver. — Se afastaram, mesmo assim, ela continuou a segurar suas mãos. — Você chegou a ser namorada dele? — Silêncio se fez. — Desculpa se isso soou invasivo...

— Tudo bem, nós chegamos a ter algo, mas... não tem importância, foi perca de tempo, eu sabia que ele era problema desde a primeira vez que eu vi, mas a oportunidade de ser popular e de ser aceita pela escola, falou mais alto — Brincava com suas cutículas. — Burrice, né?

— Que isso, não é burrice. Todos nós queremos ser aceitos de alguma forma. — Ele disse, olhando para ela com compreensão. — E a solidão… bem, ela pode nos levar a fazer coisas que normalmente não faríamos. Sei exatamente como é se sentir assim...

Enid sorriu fracamente. Darren corou ao notar as mãos unidas, sentido seu calor.

— Sabe, eu sempre achei que ser popular me faria feliz. Mas agora, percebo que a verdadeira felicidade vem de estar com pessoas que realmente se importam com você. Como você. — Ela declarou.

Ele sorriu.

— Não precisará mais se sentir sozinho, porque estarei aqui com você, para o que der e vier, e nunca mais vou te trocar por aqueles populares idiotas. — prosseguiu.

— Promete?

— Prometo. — afirmou, o oferecendo o dedinho.

[...]

Dois dias depois,

Darren recebeu alta. Rachel cuidou dele o tempo todo. Sua mãe, no entanto, passava a maior parte do tempo bebendo ou dormindo. E Garfield deu-lhe apoio. Assim como, quando a dor nas costelas aliviaram, Garfield sentou-se do seu lado e começou a folhear e a explicar pacientemente uma lista de exercícios da fórmula de Bhaskara e função do 1° grau.

— Muito obrigado por me ajudar. Não é um monstro de 7 cabeças como idealizei.

— Não tem de que. — Bagunçou seus cabelos.

— Sabe, Gar, você é muito gentil e inteligente para ser um alienígena. Por isso, te risquei da minha lista de invasores.

— É muito bom ouvir isso.

Rachel, na porta, deu uma bebericada em seu chá e sorriu.

— Enid me disse que os caras que me bateram foram presos, é verdade? — Darren perguntou.

— Sim. — A irmã respondeu.

— Será que eles vão ficar com mais raiva de mim?

— Querido, por favor, não pense nisso. — Rachel se apressou. — Eles nunca mais vão encostar um dedo em você de novo. Não vou deixar. — Acariciou seus cabelos.

— Nem eu. — Garfield sustentou.

— É... irmã, você acha que eles fizeram isso por eu ser... diferente... — Encarou as mãos pálidas da irmã. Que lacrimejou os olhos.

— Primeiro que você não é diferente, meu anjo. E segundo ninguém além de nós e Enid sabe disso.

— Acha que ela poderia ter vazado algo?

— Eu não sei, você confia nela? O que seu coração diz?

— Eu confio nela, confio demais, é só que... se bem... Vance é um típico babaca que usa o punho para se mostrar o macho alfa, só deve estar perdido no personagem. Não tem porque ter desconfianças dela.

— Viu, ouça sempre o seu coração.

Deram um abraço em trio.

Naquela tarde, enquanto o sol se punha, pintando o céu de laranja e rosa, Garfield, Darren e Rachel se reuniram na sala de estar. O cheirinho de café enchia o ar, trazendo um conforto familiar.

Garfield pegou o tablet e abriu no aplicativo, entregando-o a Darren. Ele retomou a explicação, agora com um problema de equação linear. Apontou para a equação na página.

— Vamos começar com algo simples. Veja esta equação: 2x+3=7. — disse, sua voz calma e constante.

Darren olhou para a equação, franzindo a testa.

— Vou tentar, mas se eu errar, não ria, sou péssimo em matemática… — Ele reafirmou.

— É de família. — Rachel observou.

Garfield sorriu, dando um tapinha encorajador no ombro de Darren.

— Não se preocupe, estamos aqui para aprender. Agora, a primeira coisa que você precisa fazer é isolar a variável, que neste caso é x. Para fazer isso, você precisa se livrar do número que está sendo adicionado a x, que é 3. Como fazemos isso?

Darren pensou por um momento.

— Subtraindo 3 de ambos os lados?

Garfield assentiu.

— Exatamente! Então a equação se torna 2x=7−3, que simplifica para 2x=4. Agora, o que fazemos a seguir?

Darren sorriu, começando a entender.

— Dividimos ambos os lados por 2!

— Isso. E o resultado fica?

— 2. Eba! Um já foi, agora só falta... mais nove questões.

Garfield riu e disse:

— Muito bem, rapazinho.

Rachel, por sua vez, trouxe uma bandeja bege com detalhes pretos, sob ela um copo de suco de laranja fresco, um copo de cappuccino e um copo de chá de hortelã, ao lado de um vaso com folhas verdes exuberantes que se estendiam graciosamente para o alto. O contraste visual era complementado por pratos brancos imaculados.

Bolinhas douradas repousavam ao lado de uma porção generosa de mistos quentes. Em contrapartida, um prato repleto de frutas frescas — morangos e bananas fatiadas.

Riu.

— Está no caminho certo, é se treinando que se chega à perfeição. — comentou. — Aqui estão as frutas e o suco que você adora, para te dar combustível. — Colocou a bandeja na mesa.

— Obrigado. — Sorriu.

Pegou um misto e deu uma mordida. Ele fez uma careta quando o queijo quente queimou sua língua, mas logo riu da situação.

— Cuidado, está quente! — avisou Rachel, rindo junto.

Garfield olhou para os dois, um sorriso suave em seu rosto. Ele pegou uma bolinha de queijo, assoprando-o antes de dar uma mordida.

— Não se preocupe, fiz com queijo vegano.

— Obrigado, amor. Você é incrível! — elogiou, se levantando e beijando estalado sua bochecha. — Agora, qual é o próximo passo do jogo? — Voltou sua atenção para Darren.

E assim, eles continuaram, Garfield guiando Darren através de vários problemas de matemática, enquanto Rachel observava com um sorriso, trazendo suco e bolinhas quando a bandeja ficava vazia.

Foi um momento simples, mas significativo, um lembrete de que, apesar de tudo, eles tinham um ao outro.